Um dia (creio que já) de maio 2002, ao tempo em que era o representante de Portugal nas Nações Unidas, em Nova Iorque, um colaborador perguntou-me se estava interessado em ir à última reunião em que o 'Comité dos 24' iria abordar a questão de Timor.
Como a minha agenda era então um "inferno", e raramente tinha tempo para ir a comités na ONU, lembro-me de ter hesitado, por um instante. Mas a muita atenção que dávamos a tudo quanto se referisse aTimor-Leste fez-me logo dizer que sim. Porém, só um pouco depois tive a consciência do que essa reunião, na realidade, significava.
O "Comité dos 24" (até 1962 conhecido por "comité dos 17", em função do número dos países que o compunham) é uma fórmula redutora para um nome bem mais longo: "Comité especial encarregado de examinar a situação relativa à aplicação da Declaração sobre a concessão da independência aos países e povos coloniais". É também chamado "Comité especial para a Descolonização". Foi criado em 1961, após a aprovação da referida Declaração pela Assembleia geral da ONU, em 1960.
Ainda em 1962, Portugal foi convidado a estar presente numa reunião do "Comité dos 17". (Recordo que, em fevereiro e março de 1961 tinham tido lugar os primeiros graves incidentes em Angola e que o Estado da Índia veio a cair em mãos indianas em dezembro desse mesmo ano). Considerando que, à época, na perspetiva do governo de Lisboa, não havia, sob a sua tutela, colónias ou territórios passíveis de se enquadrarem nos objetivos do Comité, o governo português veio a recusar-se, a partir de então e até 1974, a colaborar com aquela estrutura. Aquele veio a ser um dos mais ativos instrumentos internacionais de denúncia do colonialismo português.
Com a aceitação da autodeterminação e independência das suas colónias, a partir da Revolução de 25 de Abril, tudo mudou. E, desde 1975, apenas o caso de Timor-Leste, dentre os antigos territórios coloniais portugueses, permaneceu como um processo em aberto nessa instância, neste caso concentrado já na denúncia da ocupação indonésia.
Por essa altura de 2002, aproximava-se a independência de Timor-Leste, que iria ter lugar no dia 20 de maio, em Dili. A reunião do Comité para a qual eu era convocado era assim a última na qual uma questão relativa à história colonial portuguesa era evocada.
Já não me recordo do que disse na sessão, o que deve constar da respetiva ata oficial e do relato desta que terei feito para o MNE (eu não guardo cópia de documentos oficiais). Mas lembro-me bem de que, nesse momento, tive a consciência de que a presença de Portugal naquele ato culminava, de certa maneira, um tempo histórico.
Com a independência de Timor-Leste, no dia 20 de maio de 2002, fechou-se um ciclo de uma aventura imperial iniciada em 22 de agosto de 1415, com o assalto militar português à fortaleza mourisca de Ceuta.
Na reunião do "Comité dos 24", em que eu participei em nome de Portugal, dias antes daquela independência, encerrava-se formalmente o derradeiro capítulo do longo processo que conduziu ao fim do tratamento internacional da questão colonial portuguesa, que tinha sido iniciado meio século antes. Para mim, acabou por ser um inesperado privilégio.
2 comentários:
Negociar? Os EUA e o Ocidente tiveram muito tempo para negociar e recusaram todas as propostas russas de forma arrogante. Agora que estão a perder a guerra e têm o "rabo entalado", já querem negociar?! Temos pena, meu caro Seixas da Costa, mas a Federação Russa agora já não está interessada em negociações para perder tempo, uma vez que está a ganhar a guerra, já destruiu o Batalhão Azov e está a desferir o golpe final nas forças ucranianas no Donbass, segue-se Odessa, depois a ligação à Transnistria e por fim, Kiev. Os tanques russos só vão parar quando estiverem na fronteira da Polónia. Bye, bye Ucrânia!
Este anónimo acima deve ter razão a "Ucrânia Bye Bye", e quem deve pensar assim deve ser a Suécia e a Finlândia...e antes que seja tarde!
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