domingo, outubro 31, 2021

Outono em Vila Pouca


Cabrito, castanhas, javali, cogumelos. O menu, sazonal, andava por estas coisas. Claro que a posta de vitela também estava ali ao lado e até se provou uma alheira, para picar, antes da chegada das coisas mais substanciais. Para dar lastro líquido, escolhi um reserva de Arcossó, terra da minha bisavó. Tudo estava mais do que excelente, mas, se me permitem um destaque, a sopa (um “velouté”) de castanhas e míscaros era de comer e chorar por mais. Ainda olhei o bolo de castanha, mas não quis fazer mais uma asneira, embora, como diz um amigo, só se vive uma vez e esta é a última, ao que consta.

Que bem que se continua a comer na casa da família Machado, no restaurante Costa do Sol, no hotel Aguiar da Pena, em Vila Pouca de Aguiar!

quinta-feira, outubro 28, 2021

Mesa Dois


O “Procópio”, na sua Mesa Dois (na imagem), continuou a ser uma casa inspirada, na noite da crise política. 

Perguntava alguém: “Então agora que o Costa tinha derrubado o ‘muro’, o PCP puxa-lhe o tapete?”. 

Respondia outro: “É natural. Afinal, não foi por vontade dos comunistas que o Muro de Berlim caiu…”

O dilema

 Um país entre a foice e o Marcelo! 

Vá lá! Acertaram!


 

quarta-feira, outubro 27, 2021

Vai ser bem melhor!

É claro que o PCP e o Bloco fizeram muitíssimo bem ao terem rejeitado um orçamento que não aceitava as suas propostas!

É mais do que óbvio que, com um governo PSD/CDS, todas essas ideias irão ser recebidas com grande carinho.

segunda-feira, outubro 25, 2021

domingo, outubro 24, 2021

“Observare”


A vida faz-se de ciclos. E os ciclos fecham-se. 

Há um ano, o professor Luís Tomé, que dirige o centro de investigação “Observare”, na Universidade Autónoma de Lisboa, foi desafiado, pelo então jornalista da TVI Pedro Pinto, a organizar um programa de análise e debate sobre relações internacionais na TVI 24, que passaria a ter o nome daquele centro. 

Luís Tomé e Pedro Pinto convidaram o professor Carlos Gaspar e eu próprio, ambos colaboradores daquele centro de investigação, a integrar, em permanência, o programa.

O “Observare” da TVI 24 durou precisamente um ano. Pedro Pinto saiu, entretanto, da estação e Filipe Caetano e Pedro Bello Moraes assumiram a coordenação do programa. Ao longo deste ano, outros investigadores da UAL foram chamados a participar, nas nossas faltas ou para aprofundar temáticas em que eram especialistas.

A TVI24 vai passar a ser, dentro de um mês, a nova CNN Portugal. O “Observare” não fará parte da sua grelha, pelo que o nosso programa fica por aqui.

Um forte agradecimento ao Luís Tomé, que me formulou o convite para integrar o núcleo de colaboradores residentes, mas igualmente aos jornalistas da TVI que nos acompanharam, pelo seu profissionalismo e pela simpatia da sua companhia. Foi uma experiência muito interessante e estimulante, creio que para todos nós. 

Mas desejo, muito em especial, deixar a minha gratidão a quantos acompanharam o programa, alguns dos quais nos foram fazendo chegar reações e sugestões, ao longo destes 12 meses. Foi para eles que trabalhámos.

O ciclo do “Observare” na TVI encerrou agora. A vida continua.

sábado, outubro 23, 2021

Aristides de Sousa Mendes


(Intervenção que ontem proferi na homenagem a Aristides de Sousa Mendes, na Casa das Artes, no Porto, numa iniciativa promovida pelos deputados do PS ao Parlamento Europeu)

Quero, antes do mais, manifestar o meu agradecimento à Dra. Isabel Santos, pelo amável convite que me formulou, para estar intervir nesta ocasião, representando, nesse seu simpático gesto, todos os colegas do seu partido no Parlamento Europeu. 

É, para mim, um privilégio - ao mesmo tempo, pessoal e profissional - a circunstância de estar aqui hoje, neste que é um tempo feliz, um tempo de tributo nacional à figura de Aristides de Sousa Mendes, personalidade que o Panteão Nacional, a velha igreja de Santa Engrácia, acaba de consagrar. 

De certa forma, esta tardia atitude de reconhecimento e de justiça para com esta personalidade, que hoje aqui nos reúne, acaba por assemelhar-se às históricas atribulações temporais da construção da igreja onde a sua memória fica para sempre guardada. Ironicamente, quase que poderíamos dizer que a justiça em torno de Sousa Mendes também seguiu um penoso caminho, similar àquele que marcou as “obras de Santa Engrácia”, como o povo antes dizia.

Há dias, dei comigo a pensar - e julgo que todos quantos estão nesta sala poderão fazer um idêntico exercício - quando teria sido a primeira vez que ouvi falar da figura de Aristides de Sousa Mendes. Ontem mesmo, decidi fazer essa pergunta a três conhecidos historiadores contemporâneos portugueses: quando é que tomaram conhecimento da existência de Aristides Sousa Mendes? 

Sem exceção, todos ficaram na dúvida, mas também todos tinham uma comum certeza, a mesma que eu tinha: isso só aconteceu após o 25 de abril, já na década de 80. Note-se que estamos a falar de acontecimentos ocorridos nos anos 40. Só quatro décadas depois é que eles chegam ao domínio público em Portugal, mesmo a entidades especializadas.

E a sensação que tenho é que essa informação, pelo menos no que me toca, surgiu de fontes do exterior, creio que de origem judaica, que seriam depois retomadas entre nós. 

Eu já era então funcionário diplomático - entrei para a carreira nesse belo ano que foi 1975 - quando soube que tinha havido um diplomata português que, durante a Segunda Guerra Mundial, havia desobedecido às ordens da ditadura - melhor, às ordens do ditador, que era então também ministro dos Negócios Estrangeiros do governo que chefiava. Essa pessoa, esse diplomata, havia decidido facilitar a emissão de vistos para Portugal a alguns milhares de refugiados, que apressadamente procuravam escapar à sina que a invasão nazi da França lhes dava como sinistro destino.

Terá sido por esses tempos, em que o nome de Aristides de Sousa Mendes surgiu pela primeira vez a muitos de nós, não há muito tempo aportados ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, que fomos confrontados com uma outra surpresa: afinal, Aristides de Sousa Mendes era bem conhecido dentro do ministério em que trabalhávamos. É verdade: ficou logo muito claro que, no seio das Necessidades, o nome de Aristides de Sousa Mendes estava longe de ser desconhecido. 

Sousa Mendes fazia já parte, como o tempo ajudou a constatar, daquilo que era considerado uma “vergonha” para uma certa carreira. Uso a palavra com todo o peso como a ouvi, por mais de uma vez. É que ele tinha sido a cara de quem tinha ousado dizer não a uma determinação do Estado Novo. O facto dessa instrução ser ignóbil - e é pedagógico lê-la, para se saber do que falamos - não absolvia minimamente quem se opusesse ao seu cumprimento. Era a questão da disciplina - temo mesmo falar de lealdade - que separava Sousa Mendes de quantos entendiam que ordens com um selo oficial eram para cumprir sempre, não eram para discutir nunca.

E aqui entronca uma segunda dimensão, porventura já com um viés político, e até social, que marca o olhar das Necessidades sobre as ações do cônsul rebelde. É que Sousa Mendes - e este é um aspecto muito interessante e que espero que entendam na aceção que quero significar - era “um deles”, era alguém que sempre se mostrara consonante com as finalidades do regime, que até tinha um irmão que fora ministro de Salazar. 

Sousa Mendes não era sequer um dissidente ideológico, alguém que se passara para o “outro lado” do mundo a preto e branco do Portugal de então, desses tempos das listas do MUD e resistência frentista contra o Estado Novo. Sousa Mendes era, muito simples e dignamente, uma pessoa de formação conservadora e o facto de o ser, a circunstância de não haver, por detrás das suas ações, uma motivação ideológica que pudesse ser vista como de oposição, torna - a meu ver - muito mais notável e genuína a sua revolta contra desumanidade que as circulares lhe queriam impor.

Nesse seu sobressalto ético, Aristides de Sousa Mendes encarna um corpo moral de valores que passa por cima de todas as ideologias. Fosse ele um homem de esquerda e dir-se-ia que cumpria uma agenda política. Ora sendo ele uma figura com anteriores e evidentes simpatias pelo Estado Novo, que então lhe queria “forçar a mão”, o seu gesto representa o que de mais nobre uma figura humana pode ter: a coragem de lutar, sem medo, pelo direito mais básico do seu semelhante, o direito à proteção e à vida.

No Ministério dos Negócios Estrangeiros, infelizmente para a honra do convento de Nossa Senhora das Necessidades, o tom oficioso predominante, por muito tempo, mesmo já bem dentro da democracia, e até titulado por figuras já aparentadas com essa democracia, era marcado por uma diabolização da imagem de Aristides de Sousa Mendes. Esse tom ia desde uma miserável e até hoje recorrente imputação de motivações financeiras, até a uma, mais benévola mas não menos menorizante, sobranceira desculpabilização, feita na base de uma perturbação mental que teria embotado, sem remissão, o equilíbrio do seu comportamento.

Como disse, tudo isto se passava já bem dentro do regime democrático, através de figuras que tenho por pessoas de bem (e eu gosto do conceito, não admitindo que ele seja apropriado por ninguém ), pessoas que eu me tinha habituado a respeitar profissional e humanamente. Essas pessoas, e não eram tão poucas quanto isso, sendo por décadas maioritárias em postos elevados da casa, continuaram, alguns mesmo até ao final da sua vida, completamente “colonizados” por esses preconceitos.

Alguns estarão a pensar: afinal não será de estranhar, atenta a estirpe social e política que sempre marcou a natureza da Carreira durante o Estado Novo, onde as escassas exceções de gente comprometida com a democracia mal sobreviviam num mar de obediência quase acrítica face ao regime. As coisas podem não ser bem assim, há “nuances” a considerar, mas admitamos, por simplificação, que esta pode ser uma justificação satisfatória.

Portanto, se por esse lado não há surpresas, por que razão o “outro lado“ nunca abriu a boca, a clamar do escândalo? Por que será que nunca ninguém, na oposição democrática portuguesa, alguma vez suscitou o facto de ter havido um funcionário público do Estado Novo que arruinou a sua profissão, a estabilidade da sua vida e dos seus familares, num gesto que, tendo configurado, no plano formal, uma desobediência burocrática, tinha atrás de si uma clara motivação ética, com consequências humanas que se vieram a revelar extraordinárias? 

Caramba! Passaram décadas! Havia panfletos, denúncias, sobre demissões, atos arbitrários e outras patifarias do fascismo. Nem uma palavra sobre Sousa Mendes! E, nesse outro lado da moeda, tinha havido um homem que, com coragem e dignidade, salvara muitas vidas. Lutando abertamente contra a vontade de Salazar!

Ninguém sabia? Ora essa! Se as Necessidades tinham sabido, e bem, ao ponto de o demitirem, a ala democrata que sempre existiu lá dentro, por muito escassa que fosse, não o sabia também? Por que é que isso aconteceu? Porque ele não era - outra vez - “um dos nossos”? Porque não era um anti-fascista, porque Sousa Mendes não tinha credenciais populares ou de esquerda? 

Imagino que possa ser considerado de menos bom gosto trazer aqui esta questão, nos termos em que a coloco. Mas faço-o porque acho extraordinário que os democratas portugueses, tantos anos decorridos depois da revelação dos pormenores deste caso, nunca tenham posto em causa a cumplicidade objetiva que, com o seu silêncio, acabaram por ter com o comportamento miserável da ditadura portuguesa.

Esta questão da “invisibilidade” do fenómeno Sousa Mendes, na vida política de quantos lutavam pela democracria em Portugal, podia-nos levar muito longe.

Há precisamente 27 anos, a Associação Sindical dos Diplomatas Portugueses, cuja direção eu integrava, decidiu criar um prémio para estudos académicos em matéria de política externa portuguesa. Recordo-me bem de logo ter sido aproximado por colegas - mesmo da minha geração - que entendiam que o nome de Aristides de Sousa Mendes, que tínhamos proposto para ser o nome do prémio, pudesse afinal vir a ter outros titulares, em moldes rotativos. Conhecendo bem “do que a casa gasta”, pressenti logo o que aí viria, no futuro, em matéria de patronos alternativos…

Nos anos seguintes, Jaime Gama, ministro dos Negócios Estrangeiros em dois governos do PS que tive o gosto de integrar, soube assumir as atitudes que se impunham, para a recuperação da imagem e estatuto de Aristides de Sousa Mendes. 

Teve como opositora a resistência de algum “establishment”, que procurou convencê-lo de que pairavam sobre Sousa Mendes persistentes nuvens de suspeição, que recomendavam grande prudência no reconhecimento da legitimidade das ações do cônsul rebelde. O movimento contra Sousa Mendes só se atenuou quando as leis inexoráveis da vida se foram impondo aos seus detratores. 

Quando, em 2007, era eu então embaixador no Brasil, um programa e concurso televisivo, em torno dos “Grandes Portugueses”, trouxe o nome de Aristides de Sousa Mendes à ribalta, escrevi um artigo de regozijo no “Diário de Notícias”. Logo recebi três cartas iradas de antigos colegas de carreira, lamentando a minha solidariedade com a figura do cônsul ostracizado.

Por estes tempos, essas vozes desapareceram, mas talvez não seja por acaso - melhor, sei bem que não é por acaso - que uma nova força política, que faz do ódio e da discriminação o eixo da sua doutrina populista, surge, por estes dias, a espalhar as habituais insídias contra Sousa Mendes.

Sousa Mendes ainda incomoda um certo país, ainda incomoda um certa camada diplomática tributária da pior herança do antanho, ainda motiva um certo ranço discriminatório, a que não é alheio algum anti-semitismo - é preciso dizer isto alto, com todas as palavras.

Sou, fui, um diplomata da democracia, com quase quatro décadas ao serviço da República. Tive um grande orgulho em ter sido um servidor público. Habituei-me a trabalhar sobre regras de disciplina e de lealdade funcional, num regime democrático que nos oferece todos os necessários “checks and balances” de um país livre.

O exemplo de Aristides de Sousa Mendes foi, até ao final da minha carreira pública, uma forte inspiração, no sentido de me ter ajudado a concluir que um serviço público sem ética, desprovido de valores e de sólidos referentes morais, que não questione a legitimidade daquilo que é levado a promover, numa espécie de “realpolitik” oportunista, é algo cuja dignidade não só é muito duvidosa como é simplesmente amoral. 

Como pessoa de bem, Aristides de Sousa Mendes, nessas horas angustiadas e confusas de Bordéus, terá prenunciado Régio: “Não sei por onde vou, não sei para onde vou, sei que não vou por aí”. 

Não foi. Para sua honra e para nosso orgulho.

quinta-feira, outubro 21, 2021

Dona inflação

Está aí a chegar. Devagar, como quem não se quer fazer sentir de forma súbita. É uma senhora que todos nós conhecemos, de quem muitas vezes nos queixamos, mas que, por muito surpreendente que possa parecer, faz falta aos ciclos da nossa vida. Chama-se dona Inflação.

“A Arte da Guerra”


Esta semana, a minha conversa com António Freitas de Sousa, no “A Arte da Guerra”, o podcast da plataforma audiovisual do “Jornal Económico”, começa por abordar a posição alemã no processo de diálogo europeu com Ancara, bem como as ambições regionais da Turquia, com especial nota para a sua pouco abordada mas muito forte agenda africana. Depois, falamos do crescendo de tensões entre o Reino Unido e Bruxelas, pelo flagrante incumprimento britânico do protocolo que subscreveu sobre a Irlanda do Norte, não obstante recentes gestos de apaziguamento da Comissão Europeia. Na terceira parte do programa, tratamos da exemplaridade do processo democrático em Cabo Verde, demonstrado nas últimas eleições presidenciais. É feito um paralelo com os casos, também muito diferentes entre si, de São Tomé e Príncipe e da Guiné-Bissau.

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quarta-feira, outubro 20, 2021

As democracias de que a América gosta


Joe Biden tinha anunciado, ainda antes da sua eleição, a intenção de fazer uma Cimeira das Democracias, logo no primeiro ano do seu mandato. 

Assim, nos dias 9 e 10 de dezembro, um grande exercício telemático terá lugar, sob convite do presidente americano, envolvendo 77 países. 

Dois deles não são membros da ONU: o Kosovo, já com independência declarada mas só reconhecida por alguns, e Taiwan, uma democracia também sem o estatuto de membro da ONU e que os EUA sempre consideraram, formalmente, ser um território da “única” China).

As Nações Unidas têm, nos dias de hoje, 193 países. Descontados o Kosovo e Taiwan, fica a saber-se que Washington acha que há 118 países que não cumprem os “mínimos” para serem considerados democráticos (tirando o Butão, Andorra, Mónaco, Lichtenstein e São Marino, que, pelos vistos, não se “veem” da América, embora todas as ilhotas do Pacífico e Caraíbas por ali estejam).

Tem alguma graça olhar constatar que, nessa matriz de generosa escolha, se irão encontrar grandes expoentes democráticos como são Rodrigo Duterte, das Filipinas, ou Jair Bolsonaro, do Brasil. 
Atenta a lógica dessas e de outras presenças, é legítimo estranhar algumas ausências: Marrocos, Bósnia-Herzegovina, Jordânia. Outras, embora esperadas, como a Turquia e a Hungria, não deixam de ser de notar. 

Nenhum país no norte de África figura na lista dos convidados, tal como acontece com qualquer monarquia do Golfo. E Moçambique, a par da Guiné-Bissau e a Guiné Equatorial, é um Estados membros da CPLP que não foi escolhidos.

Joe Biden só por demagógica precipitação se deixou enredar neste estranho e inútil exercício seletivo. 
A pergunta é, eu sei!, uma impossibilidade absurda, mas merece ser feita: se a América ainda estivesse no tempo de Trump, com o seu sistema eleitoral “in shambles” e um Capitólio sob ataque de uns maluquinhos estimulados pelo chefe do Estado, será que seria convidada para a cimeira?

O PS e o seu orçamento

Em 2015, aquando da criação da Geringonça, o potencial efeito negativo pressentido na imagem externa do país, pela associação do PCP e BE à área de poder, viria a ser compensado pela criação de um “firewall” nas questões dos compromissos europeus, da NATO e em tudo quanto aqueles dois partidos tinham de mais desviante face ao que até então fora qualificado como o “arco da governação”.

O facto de um presidente com o perfil de Cavaco Silva, depois de todas as suas cassândricas adivinhações, ter acabado por dar posse ao governo de António Costa, acabou, ironicamente, por conferir a este maior credibilidade do que aquela que derivava da lógica política da solução encontrada. (O recente artigo de Cavaco Silva no “Expresso” é o pedaço de pão com que tenta tirar a espinha que traz encravada na garganta, desde 2015).

A fim de ser entronizado no poder, o PS teve de pagar um preço na reversão de privatizações nos transportes, bem como em algumas outras medidas de sentido idêntico. Fê-lo, contudo, com conta, peso e medida, por forma a não assustar investidores e prejudicar uma primeira impressão que queria criar.

Um terreno em que o PS foi sempre muito cauteloso foram as leis laborais, onde o “risco” Portugal poderia facilmente subir. É que os socialistas sabem que operam sempre num ambiente de potencial suspeição, quando adotem medidas que possam ser lidas, numa União Europeia muito “market-oriented”, como incompatíveis com os níveis nacionais de competitividade e, por isso, como menos sustentáveis na ação dos operadores económicos nacionais. Salvo escassas exceções, algumas apenas conjunturais ou de oportunidade, estes últimos não costumam esbanjar grande simpatia face ao Largo do Rato.

Grande parte da imprensa económica, aliás, é um espelho tão perfeito do preconceito que até se converteu num reflexo caricatural desses mesmos meios. Há também por aí um micro-partido que se esforça, à saciedade, para ser visto como leal súbdito político desses interesses.

À esquerda, o “abraço do urso” do PS aos parceiros acabou por tornar-se algo desconfortável para estes, pelas consequências eleitorais que se conhecem: os votantes tenderam a agradecer ao partido que lidera o governo e acabaram por ser “ingratos” para quem, afinal, terá forçado o PS a certas medidas.

Mas será que “forçou” mesmo? O PS é, gostem alguns ou não, um partido de esquerda e há nele muito boa gente que apreciou vê-lo seguir uma agenda de reversão das loucuras do tempo da Troika, fosse isso feito por pressão à sua esquerda ou por convicção própria. O caso das 35 horas na Função Pública é um caso típico de uma medida que visivelmente agrada às bases de votantes socialistas. No PS, há muito quem pense que, se é para executar políticas de direita, então há outros partidos no mercado. (Não vale a pena tentar conciliar o inconciliável: uns verão sempre as 35 horas como uma medida injusta e sem racionalidade económica, outros considerá-la-ão um passo no caminho certo e um gesto de justiça e de grande alcance).

O PS não o dirá nunca mas há que reconhecer que governou, embora com habilidade, nas margens da sua própria credibilidade política, no modo como esta é vista à esquerda. Na utilização imoderada do perverso mecanismo das cativações, que chega a ser insultuoso face à vontade democrática que antes aprova os orçamentos em sede parlamentar, e no incumprimento objetivo de compromissos assumidos com os parceiros, muitas vezes apenas para fazer “um bonito” na Europa, o PS foi, algumas vezes, longe demais. E está a pagar por isso.

É que os socialistas sabem que o PCP opera sempre com uma agenda “de rua”, seja para compensar a sua fragilidade nas urnas, seja para reforçar o seu poder, quando este ainda não declinara. No dia em que o PCP pressentiu que o custo de apoiar o PS na AR se tornava demasiado, essas “tropas” ficaram muito mais à solta. (Há uma interessante dialética entre o PCP e a CGTP que é uma das chaves da vida política na esquerda portuguesa, coisa que só raramente aconteceu entre o PS e a UGT). Terá chegado o momento do divórcio?

Nas horas que correm, para o PS, a questão é que muitas das medidas que os parceiros exigem para votarem este OGE, a serem aceites, poriam em causa a imagem de rigor que, desde 2015, quis preservar a todo o preço - perante o país e face à Europa. Essa é a fronteira que António Costa sabe que não pode atravessar. Não lhe invejo a tarefa! Mas desejo-lhe muito boa sorte.

domingo, outubro 17, 2021

“Hush-hush”


Não, não é um fantasma. É o reflexo no espelho de uma senhora que, desde que saímos de Campanhã, fala incessantemente com uma amiga a quem passa segredos que “peço que não contes a ninguém”. A amiga pode não contar, mas eu estou farto de os saber e também farto de a ouvir. Durará a chamada até Coimbra B?

Um recado a Moedas

O excelente jornal ”Mensagem de Lisboa” ouviu algumas pessoas, a quem pediu uma - e só uma - sugestão para o novo presidente do município de Lisboa, Carlos Moedas. Aqui fica a minha:




Mesas seguras


Tenho a mania de experimentar novos restaurantes. Mas há dias em que me sinto mais conservador e decido ir a locais seguros, sem surpresas, onde sei que não vou ter novidades mas tenho uma garantia segura de qualidade.

Foi o caso de ontem e hoje, nas menos de 24 horas que passei no Porto, onde, esta manhã, vim fazer uma “função” numa universidade.

Ontem, chegado a Campanhã, passei pela “Cozinha do Manel”, onde o Zé António tinha guardada para mim uma mesa, numa noite (felizmente) bem cheia de clientes. É a minha “cantina” preferida no Porto, ao lado de um hotel onde habitualmente me alojo, um ambiente solto, amável, de cozinha portuguesa tradicional. 

Hoje, antes de regressar a Lisboa, apanhando o Alfa Pendular em Campanhã, fui almoçar ao Líder, um pouso igualmente muito seguro perto da praça Velasquez, nas Antas, regido pela simpatia do Manuel Moura. Um restaurante de famílias aos fins de semana, de negócios nos dias úteis. 

As boas mesas nunca passam de moda.



sábado, outubro 16, 2021

“Observare”


No “Observare” desta semana, um programa que cumpriu precisamente um ano de existência, desde que surgiu na TVI24 - inicialmente, sob a moderação de Pedro Pinto e, depois, de Filipe Caetano e Pedro Bello Moraes - Luís Tomé, Carlos Gaspar e eu próprio falamos das reticências das instituições polacas face aos compromissos europeus do país, das contradições entre os discursos de Beijing e de Taipé e das tensões entre o Japão e a Rússia em torno das ilhas Curilhas. Pela minha parte, abordo o que parece poder ser o início de alguma “normalização” da Síria por parte dos seus vizinhos, o atentado terrorista na Noruega e o gesto positivo da Comissão Europeia para facilitar uma solução para a Irlanda do Norte, no contexto do Brexit.

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Touros


Acabo de descobrir, no caos das minhas estantes, um livro que há muito já havia perdido de vista.

Creio que foi em 1996, em Estrasburgo, que o Álvaro Guerra me brindou com este “La Corrida du 1er Mai”, de Jean Cocteau, primeira edição, de 1957.

A oferta tem uma história. O Álvaro, como bom vilafranquense, era um grande apreciador de touros e da tauromaquia. Eu, pelo contrário, era e sou um opositor das corridas de touros.

Durante os extraordinários jantares (digo bem, extraordinários, pelo requinte e sofisticação que a Helena colocava nesses ágapes) que o casal Guerra me oferecia na sua residência em Estrasburgo, onde ele era embaixador junto do Conselho da Europa, durante os anos em que dirigi as delegações às reuniões ministeriais da organização, tínhamos constantes mas sempre amigáveis discussões sobre a “legitimidade” das festas de touros no mundo contemporâneo.

O Álvaro desfiava-me então, para além de gente de esquerda, nomes e nomes de pessoas de grande qualidade intelectual, que adoravam espetáculos de touros - de Hemingway a Mailer, a Georges Bataille e a tantos outros. Numa dessas noites, deu-me esta obra admirativa da corrida, escrita por alguém que era um génio que ele sabia que eu apreciava - Jean Cocteau.

Não me convenceu, claro, e eu desafiei-o: “Escreva aí no livro uma dedicatória, para ficar bem registado o seu esforço em fazer-me mudar de convicções”. O Álvaro recusou: “Desculpe, mas não faço isso. Só assino livros meus, nunca livros que ofereço”. E fazia bem. Por isso, neste livro, comprado por ele num “bouquiniste” alsaciano, não consta o seu nome.

Ao encontrá-lo, há pouco, no dia em que, em Portugal, foi anunciada a lei que sobe a idade com que se pode assistir a uma corrida de touros, num óbvio “cerco” progressivo àquele espetáculo, lembrei-me de que este não seria um dia muito feliz para o Álvaro Guerra, um excelente amigo, jornalista e escritor que a vida fez diplomata. Mas isso que importa, se ele já se foi desta vida, há quase 20 anos?

sexta-feira, outubro 15, 2021

Partido

Não creio existir, na vida política portuguesa, partido mais autofágico e compulsivo destruidor de líderes do que o PSD. Descontando, claro, o PPD.

Ciro

Ciro Gomes, candidato presidencial brasileiro, é conhecido pelo descontrolo verbal, que sempre o leva a nunca perder uma oportunidade para perder uma oportunidade. A sua inegável inteligência é desservida por uma ambição desmedida. O que disse, de “grosso”, sobre Dilma Rousseff não só passou o limite como foi revelador da sua cumplicidade póstuma com golpes políticos baixos. Ciro conformou assim, a muitos mais, o que bastantes dele já pensavam.

Varela

Declaração de desinteresse: já tentei, mas não consigo interessar-me pelo caso Raquel Varela - seja contra, seja a favor. Mas desejo as maiores felicidades a quem se dedica ao assunto.

CD era…

"Uma direita democrática, liberal, conservadora, de matriz democrata-cristã devia saber que sociedade defende e com que medos e fantasmas se recusa a conviver. Qualquer hesitação baralha os eleitores, legitima discursos dúbios e dilui fronteiras fundamentais". Raquel Vaz Pinto

Ebulição política

Os jornalistas que escrevem sobre o PSD têm algum subsídio especial por estarem sempre a fazer horas extraordinárias? É que a ebulição política laranja obriga a uma cobertura mediática única…

Lei de cernelha?

Se o governo fizer uma lei a determinar que só possam assistir às touradas maiores de 16 anos (era para ser 18, mas não houve coragem?) e, no texto, logo abrir um “buraco” a subterfúgios e interpretações dúbias, não tenho um nome para isso que me evite a suspensão das redes sociais.

Quando um homem quiser?

As primeiras iluminações de Natal em Lisboa não rimam bem com o verão que ainda por aí anda.

BRE


Faço parte de uma geração diplomática para quem os interesses da indústria têxtil portuguesa estiveram sempre na primeira linha das preocupações profissionais. Passei horas, dias, anos a tentar explicar a ouvidos estrangeiros que, por detrás da invejada capacidade competitiva dos nossos têxteis, havia vidas, gente, empregos. Era difícil fazer entender aos nossos interlocutores o que era a tragédia social que se anunciava no Vale do Ave, se o nosso têxtil tivesse dificuldades em ser exportado. Vivi isso, anos seguidos, na União Europeia, no auge de uma globalização que se procurou fazer muito à nossa custa. Mas já me tinha acontecido antes.

As minhas angústias com o têxtil português tinham começado na Noruega, quando fui, como primeiro posto, para a nossa embaixada em Oslo, no final dos anos 70. Ambos os países eram então membros da EFTA. Nesse contexto, Portugal tinha-se obrigado a “auto-limitar”, dentro de rígidos limites quantitativos, aquilo que, em matéria têxtil, exportava para a Noruega. Foi a saga dos BRE, os Boletins de Registo de Exportação, uma espécie de autorização “rara“ que os nossos produtores disputavam junto do Instituto dos Têxteis: quem não obtivesse BRE não exportava e, ano após ano, era-nos exigido que emitíssemos menos, em mais posições pautais.

Numa tarde desses anos, passei pela montra de uma loja de Oslo. Estava à venda uma belíssima camisola tradicional norueguesa, bege, com desenhos em tons de castanho. Era muito cara. “Ficava-te lindamente!”, disse-me a minha mulher. “Não compro têxteis a esta gente! Era só o que faltava! É uma questão de princípio!” E continuámos a passear, pela neve.

Semanas depois, no dia do meu aniversário, acordei com a camisola embrulhada, como presente. Fiz de conta que me zanguei. 

Há dias, na minha terra, em Vila Real, abri uma gaveta e lá estava ela. A bela camisola norueguesa! Ainda gosto dela, mais de quatro décadas depois. Mas olho-a como uma eterna traição ao têxtil português.

quinta-feira, outubro 14, 2021

Obrigado, JL


O JL - Jornal de Letras, Artes e Ideias, teve a amabilidade de fazer uma nota sobre o meu “A Cidade Imaginária”. Fico muito grato ao JL.

Kongsberg e Vidago


Ontem, a comunicação social falou muito de Kongsberg. Um desvairado, naquela cidade da Noruega, matou e feriu bastante gente, usando um arco e flechas (!!!).

Kongsberg é um terra muito agradável, a umas dezenas de quilómetros de Oslo. Tenho por lá um amigo, Johan Jarnaes. Foi professor de Português na universidade de Oslo e, nos anos 70 do outro século, havia sido contratado pelo embaixador Fernando Reino para ser tradutor na nossa embaixada.

Um dia, ao tempo em que eu também trabalhava na nossa embaixada em Oslo, com ele e com a sua mulher, de nacionalidade checa, que havia abandonado a Checoslováquia depois da invasão de Praga pelas tropas soviéticas, em 1968, passámos um calmo fim de semana em Kongsberg.

Durante esse período, aprendi que a minha vocação não era, decididamente, apanhar cogumelos pelos campos, atividade a que se dedicava toda aquela família, filhos incluídos, que tão amavelmente nos acolhia. Fazia-o com um fervor que não consegui partilhar.

O português da Johan Jarnaes tinha várias limitações, perfeitamente naturais em quem nunca tinha tido oportunidade de viver em Portugal, para exercitá-lo. Semanas antes da minha chegada a Oslo, o modo como traduzira uma palavra, com que um membro do governo trabalhista qualificara politicamente o então primeiro ministro Francisco Sá Carneiro, quase que criou um incidente diplomático: a palavra usada, que já não recordo, tinha em português um significado bem mais duro do que em norueguês. E esse sentido era muito difícil de traduzir.

Na conversa desse fim de semana em Kongsberg, Johan Jarnaes quis aproveitar para resolver um “mistério” que há muito tinha com a nossa língua, relativo ao modo como referimos as localidades. Dizia-se “em Castelo Branco” ou “no Castelo Branco”? Expliquei-lhe, com vários exemplos, que não havia a menor regra fixa, que cada caso era um caso.

Como forma de sublinhar ainda mais essa arbitrariedade, dei-lhe também um outro exemplo que me ocorreu. No caso da localidade de Vidago, perto da minha terra, quem não é da região diz “em Vidago”, quem é das redondezas diz “no Vidago”.

Johan Jarnaes ficou a matutar uns segundos. E, recordo-me como se fosse hoje - e já lá vão mais de 40 anos! -, disse-me: “Kongsberg então é como Vidago. Para ‘em Kongsberg’, tanto se pode dizer ‘på Kongsberg’ como ‘i Kongsberg’ “.

Imagino que nem a malta de Vidago sabe disto!

Espero que o meu amigo Johan Jarnaes e a sua simpática família nada tenham sofrido com a loucura do Guilherme Tell do mal que ontem saiu em rifa à sua cidade.

quarta-feira, outubro 13, 2021

Essa é que é essa!

 


“A Arte da Guerra”


Na minha conversa com António Freitas de Sousa, no podcast do “ Jornal Económico”, falo esta semana das eleições municipais em Itália, do surgimento de Éric Zemmour na campanha presidencial francesa, da conflitualidade crescente entre a Polónia e a União Europeia, da atitude desta face ao alargamento aos Balcãs Ocidentais e, finalmente, sobre as atribulações da nova liderança do Perú, enquadrada no contexto da América do Sul.

Pode ver aqui : https://fb.watch/8CVa8ANrZ9/

Receitas


São sempre uma ruína para mim os encontros com o António-Pedro Vasconcelos. “Receita-me” livros, com um ar tão imperativo e convincente que acho que os não posso perder. Fiado no seu conselho, compro-os, na esperança de que irei ter tempo para os ler. A verdade é que ele quase sempre acerta.

Hoje à tarde, ao cruzarmo-nos, na “Ler”, em Campo de Ourique, vinguei-me: “Já leste o último Le Carré?”, perguntei-lhe. Ele não tinha lido. Nem eu. Só na manhã de hoje soube da existência do livro, “Silverview”, uma obra póstuma. A “Ler”, que acabara de o receber da D. Quixote, ainda nem sequer tinha o livro na montra.

Comprei o “Silverview”, o António-Pedro também. Não sei se é bom. Logo verei, veremos. Desconfio bastante de obras póstumas. Mas eu não lhe “receitei” o livro. Como ainda tenho alguns outros livros para ler antes (além de que comecei a ler um álbum do Tintin por dia - e tenho ainda para 18 dias), só daqui a uns tempos saberei se vale a pena ou não. Se for mau, o António-Pedro vai “cobrar-me”, pela certa. Mas, “Perdido por cem…”

Seitas



Hoje, tive um almoço de uma das minhas ”seitas”. 

Marcámos “falta” ao José Manuel Galvão Teles, ao Alberto Martins, ao Jorge Strecht, ao Fernando Cruz, ao José Augusto Antunes e ao Américo Madeira Bárbara. 

Fizémos um saudação pela ausência eterna do António Dias, do António Silva e do José Carlos Serras Gago.

Foi um belo almoço. Outros haverá.

“Com a Pide não se brinca!”

No tempo do fascismo, dizia-se: “Com a Pide não se brinca!”. A Pide espiava, perseguia, prendia, torturava e matava. Ser “da Pide” - agente ou informador - era sinónimo supremo de indignidade. 

Sempre tive para mim que ser colaborador anónimo da polícia política do fascismo era bastante pior do que ser seu agente. Este último, ao ter essa profissão, assumia, pelo menos, a coragem de ter o seu nome escrito no “Diário do Governo”. Na minha terra, em Vila Real, as três famílias onde havia pessoas que eram agentes da Pide tiveram de viver com essa nódoa social.

Ser “informador” da Pide foi sempre, na minha perspetiva, o grau mais mais baixo da canalhice a que se pode chegar. Ser pago, ou fazê-lo pro bono, por zelo sectário ou por ódio, para informar, sob anonimato, a propósito de um amigo ou um conhecido, dando à Pide dados que permitiam incriminá-lo por atitudes ou atos de combate à ditadura, era o cúmulo da miséria. Ingressar em grupos políticos que combatiam o fascismo para, do seu interior, ajudar a perseguir e a prender quem se opunha a um regime criminoso era o mais baixo a que se podia descer na escala da indignidade cívica.

Nas últimas horas da sua existência, na rua António Maria Cardoso, no dia 25 de abril de 1974, beneficiando de um atraso no seu desmantelamento, que hoje tem nomes responsáveis que a História acolheu mas não puniu, a Pide destruiu arquivos que permitiriam identificar os verdadeiros nomes por detrás dos pseudónimos dessa matilha de informadores. Muitos escaparam impunes. Outros, felizmente, não. O objetivo não era prendê-los, mas apenas deixá-los como exemplos negativos à sociedade cuja libertação tinham procurado evitar.

Este texto surge a propósito de um caso que tem vindo a provocar uma forte polémica, nos últimos dias. António Valdemar, um nome prestigiado da nossa imprensa, denunciou, nas páginas do “Expresso”, que Pedro da Silveira, um conhecido intelectual açoreano, há muito já falecido, havia sido informador da Pide. Dos arquivos da polícia política constam, de facto, relatórios assinados com esse nome. Mas não era vulgar, era mesmo muito raro, alguém assinar esse tipo de denúncias infamantes com o seu verdadeiro nome. Só este facto deveria levar qualquer investigador a ter o maior cuidado. 

Ora sabe-se que os textos que surgem, nos arquivos da Pide, assinados com esse nome são, afinal, da autoria de uma pessoa com outro nome verdadeiro, já há muito identificada. Esse “Pedro da Silveira” seria, assim, apenas um pseudónimo dessa outra figura. O verdadeiro Pedro da Silveira nada teria a ver com o assunto, pelo que acusá-lo de ser informador da Pide configura um ato da maior gravidade, uma imensa infâmia. 

Aguarda-se, assim, uma rápida retratação de António Valdemar e do “Expresso”, para encerrar, com a possível honra para todas as partes, este triste episódio. É que se “com a Pide não se brinca!”, com o bom nome das pessoas perante essa associação de malfeitores também não.

(Em tempo: António Valdemar e o “Expresso” já se retrataram. Ainda bem!)

terça-feira, outubro 12, 2021

E a Diana?

Ontem, numa rede social aqui ao lado, houve gente que se abespinhou pelo facto de alguém ter “anunciado” que a figura de James Bond morre, no final do seu último filme, que acaba de estrear. A pessoa em causa foi insultada e bloqueada por muita gente, porque essa “surpresa” deveria ter sido guardada para o momento de visualização do filme.

Esta é uma questão, de facto, grave. Ainda há dias, vi escrito algures, sem o menor sentido de responsabilidade, que, na próxima temporada do “The Crown”, da Netflix, os autores se preparam para “matar” a princesa Diana. Será verdade? Há mesmo rumores de que a morte será encenada num desastre de automóvel, numa capital europeia. Mas, sobre este ponto, nada parece confirmado.

Uma coisa é certa: é lamentável que, com este tipo de revelações extemporâneas, se quebre o “suspense” de uma série, para assinantes pagos. Eu diria mesmo mais: isto devia ser proibido! Com fortes coimas, claro. No mínimo.

segunda-feira, outubro 11, 2021

Ucronia


Por alguns anos, existiu na praia do Ourigo, na foz do Douro, um restaurante muito agradável, chamado Shis. A estrutura era em madeira. Um dia, o mar invadiu o espaço e o restaurante teve de fechar. 

A mesma gerência reabriu depois um restaurante com “conceito” parcialmente similar, com o nome de Wish, numa área próxima (para os “iniciados”, no local onde antes ficava o restaurante Oporto). Ainda há dias jantei com o cliente que lhe “inventou” o nome. O Wish é também um excelente restaurante, onde também vou sempre que posso. 

(Já agora, para que se saiba, reabriu há dias, também na mesma zona, redecorado, o Cafeína, a que a pandemia tinha suspendido a atividade. Primeira impressão, deste cliente também de muitos anos: têm de se esforçar um pouco mais e pôr a música mais baixa. É tudo o que quero dizer, por ora. Ah! Em frente ao Cafeína, continua a valer a pena ir ao Terra, que, noutras encarnações, já se chamou Oriental, como muitos se lembrarão).

Há meses, soube-se que o Shis, ou algo com ele parecido, iria renascer no espaço anexo àquele que o mar destruira, agora com uma estrutura de cimento, mais resistente (mas sabe-se lá por quanto tempo!) à fúria dos elementos. A obra acabou embargada.

Olhando hoje, num jornal, a fotografia, entendo melhor a agressão que aquela construção iria representar, pelo que não posso senão concordar com a reposição do “statu quo ante”. 

Mas lá que (egoísta e intimamente) seria muito agradável poder almoçar naquele espaço, num dia de sol, com o mar a bater por perto, lá isso seria! 

Mas não vai. Um novo restaurante não existirá por ali. Esse hipotético almoço não deixará assim de ser uma ucronia, palavra que aprendi há dias - porque nunca somos velhos demais para aprender coisas.

“Observare”


Esta semana, sob a moderação de Pedro Bello Moraes, o trio habitual do “Observare” - Luís Tomé, Carlos Gaspar e eu - discutiu as tensões em torno de Taiwan. No que pessoalmente me tocou, analisei as decisões europeias sobre os Balcãs Ocidentais, o surgimento de Éric Zemmour nas pré-candidaturas às eleições presidenciais francesas de 2022, bem como o funcionamento da alternância política na democracia de S. Tomé e Príncipe.

Pode ver o programa clicando aqui.

Nobel

Por esta altura do ano, aquando da atribuição do Prémio Nobel da Paz, algum jornalismo desatento fala, por sistema, da decisão “da Academia Sueca”. 

É um erro. De facto, todos os restantes Prémios Nobel são dados pela Academia Sueca. Mas a exceção é o da Paz, atribuído pelo Comité Nobel da Noruega.

Travessa da espera


Há médicos que nos fazem esperar eternidades, antes da consulta. Mas, na verdade, nós sabemos ao que vamos. Por isso é que a sala onde nos colocam se chama, sem qualquer disfarce, … de espera!

Onde?

Não deixa de ter alguma graça a preocupação de Nuno Melo de que o congresso do CDS não coincida com o congresso do Chega. Será receio de que alguém tenha o dom da ubiquidade?

CDS

Nestes momentos de crise, em que uns se engalfinham contra os outros, o CDS chega a dar a impressão de que tem por lá muita gente. Infelizmente para a democracia portuguesa - digo isto com a maior sinceridade -, não tem!

IVA

Há dias. A senhora falava ao telefone, dentro do balcão da loja, para uma amiga: “Ai achas que ainda estou ’na casa dos quarenta’? Ó filha, quem me dera! Pois fica sabendo: eu cá tenho 28 mais IVA…”

domingo, outubro 10, 2021

Obrigado, Zé!


A doutrina continua a não ser pacífica em torno da origem do cognome de “Bomba”, que lhe é carinhosamente dado pelos amigos. A ideia de que isso possa derivar do recorte físico a que os frequentes ágapes, com o tempo, possam ter conduzido o seu apolíneo perfil, está há muito afastada. Porque sim, pronto!

O meu amigo José Luiz Gomes, é dele que falo, é um dos mais finos espíritos diplomáticos que me foi dado cruzar, nas décadas que passei nos claustros das Necessidades. O facto de ter tido o privilégio de cruzar zonas do mundo muito diversas, de Washington a Moscovo, da Austrália ao Zimbabwe e outros interessantes postos, dotou-o de um quadro interpretativo da realidade internacional, o qual, associado a um espírito nada dogmático e a um sentido autocrítico invejável, lhe permite decantar leituras de extremo bom senso e grande realismo. Não foi seguramente por acaso que Francisco Pinto Balsemão, como primeiro-ministro, o teve como seu indispensável assessor diplomático.

Mas não é do embaixador de excelência que hoje quero falar, mas sim do grande amigo, que acaba de completar os 80 anos, uma idade redonda que um bando heteróclito à sua volta ontem celebrou, num Nobre lugar, com muito e bom barulho, vários e animados brindes, como sempre com muitas “piquenas” por perto, em que esteve em especial destaque a mesa das “bombettes” - um oásis doirado de riso e boa disposição.

O Zé é uma das pessoas mais bem dispostas e divertidas que conheço. Sempre pronto para alinhar numa festarola ou numa conversa bem alimentada e melhor regada, culminada pela inevitável nuvem de fumo com que muitas vezes desafia as regras dos locais, ele é também o persistente mobilizador de um grupo de colegas que, há mais de uma década, se reúne semanalmente - é verdade, semanalmente!, apenas com as pausas a que o calendário, às vezes, obriga - numa almoçarada, sempre com um quorum máximo definido, para não “partir” a conversa à mesa. 

Por ali falamos da vida, às vezes da profissão que nos uniu, do dia-a-dia e até de política, vejam lá! Como episódicos convidados para essas ocasiões, já por lá estiveram antigos presidentes e ministros, vários colegas e outra gente sempre interessante. A nossa ”Chatham House rule” é: não há, por ali, conversas chatas! Também não temos qualquer agenda, só histórias e opiniões, sempre sem o menor radicalismo e com respeito pelas diferenças de perspetiva. É graças ao Zé, o grande maestro da orquestra, que hebdomadariamente nos convoca por SMS e que decide a “venue” em função do tamanho da mesa, que a nossa vida na reforma fica (ainda) mais alegre e divertida. 

Tenho ainda o privilégio de, com o Zé, ser o único membro do grupo a fazer parte de uma outra tertúlia, a da “Mesa Dois” do Procópio (onde a pandemia nos pôs num “lay off” que agora acabou), superiormente gerido pela “Sedona” Alice Pinto Coelho, uma imensa amiga do Zé. Contudo, é no Procópio que uma grande divergência se cava entre mim e o Zé: não coincidimos no destilado escocês que nos enche os balões, como o Luís avisadamente bem sabe. É a vida!

Sei que a amizade não se agradece, mas eu não me contenho e digo: obrigado, Zé! Sem ti, tudo isto tinha muito menos graça.

sábado, outubro 09, 2021

Notícias de Alcácer

Aníbal Cavaco Silva revela que vive desconfortável com a ideia de que Pedro Passos Coelho monopoliza o saudosismo sebastianista dentro de um certo PSD.

Todos tão amigos!

Há qualquer coisa de bizarro (mas parece que já ninguém estranha!) na reiterada prática lusitana de se produzirem tempos televisivos, visíveis em todas as estações, em que uns artistas entrevistam outros colegas de profissão, quase sempre para a promoção dos seus espetáculos futuros, todos sempre mostrando-se muito amigos entre si e bastamente elogiosos uns dos outros. Aquilo mais parece um “Time Out” entre amigalhaços, ficando, no entanto, por esclarecer qual será o papel desempenhado nessas aparições (que vão da pimbalhada a coisas mais sérias) pelas agências que gerem a carreira de atores, cantores e “tutti quanti” - e que, como é sabido, não trabalham ”a feijões”…

sexta-feira, outubro 08, 2021

Seinfeld


Nunca me tinha apercebido de que os episódios da série Seinfeld eram tão curtos. Agora na Netflix, tenho-os visto “a eito”. Aquilo é de um imenso primarismo de realização, mas é magnífico! Ainda não surgiu o “mau” do Newman, única hipótese de eu me reconciliar com os Correios. Mas o meu personagem de eleição, bem acima de qualquer outro é Kramer.

Nazis

Os nazis deviam ter uma saúde de ferro! A guerra ter terminou em 1945 e ainda andam à procura desse pessoal…

Livro



O meu livro “A Cidade Imaginária”, editado no início de setembro sob a chancela da Biblioteca Municipal de Vila Real, teve uma tiragem limitada - não estando prevista qualquer reedição. A maior parte dos volumes que foram postos à venda foi adquirida na sessão de lançamento e, posteriormente, nas três livrarias onde foi colocado. A Livraria Ler, em Lisboa, já não tem livros para venda. Para quem eventualmente estiver interessado, sou informado de que há ainda alguns exemplares na Livraria Branco (259 322 829) e na Livraria Traga-Mundos (259 103 113), ambas em Vila Real, creio que com eventual possibilidade de envio pelo correio. A Biblioteca Municipal de Vila Real não comercializa o livro.

Crime


Cá em casa, há quem veja imenso a Fox Crime. Quando entro na sala, pergunto quantos mortos já houve no episódio e a resposta é sempre animadora para o negócio das funerárias.

McCann

Fica cada vez mais claro que a morte de Madelaine McCann se transformou num filão inesgotável para a indústria da especulação. É assim como uma espécie de Camarate.

Trotinetes


Vai ser preciso que morram, em acidentes, alguns passeantes de trotinetes elétricas para que soe o alarme de que não é possível continuar a ter gente a circular irresponsavelmente por ruas, passeios e passadeiras, sem seguirem a menor lei, às vezes com penduras e sempre sem capacete.

quinta-feira, outubro 07, 2021

Racismo


Na diplomacia, no estrangeiro, herdamos relações sociais. À volta das embaixadas, de todas as embaixadas, em todos e de todos os países, pululam figuras que, por uma qualquer razão do passado, fazem parte da chamada “lista social” da casa.

Quando chega um novo embaixador, essas personalidades locais, que tanto podem ser diplomatas reformados como “socialites” da mais variada natureza (há uma quota abundante de “singles”, que dão imenso jeito para compor mesas, em falhas de última hora), quase sempre gente educada, fazem um subtil esforço para renovar os laços com o novo chefe da missão, o que lhes permite garantir convites para os dias nacionais ou a inclusão em jantares e outros eventos da embaixada. São, em geral, pessoas muito agradáveis, mas quase sempre inúteis sob o ponto de vista de préstimos para os interesses práticos da embaixada. Contudo, é indelicado “deixar cair” essas pessoas.

Os embaixadores recém-chegados, nos seus primeiros meses em posto, são, como regra geral, convidados por elas, incluídos em ocasiões sociais em suas casas, muitas vezes organizadas em honra do próprio diplomata. E aí irão conhecer outras pessoas, algumas interessantes, outras menos, o que lhes permite ir alargando um círculo de conhecimentos locais em que também vai assentar a convivência no seu tempo em posto. Quando partem, o sucessor herda essa teia de contactos.

Muitos dos jantares para que os embaixadores são convidados acabam por tornar-se numa inenarrável seca. Outros são-no menos, havendo técnicas de conversa que, em ocasiões-limite, podem ser utilizadas para “sobreviver”. Eu, como todos os meus colegas, fui criando algumas…

Em Paris, numa dessas ocasiões, num jantar em casa de gente muito rica, fiquei em frente a um cavalheiro que, desde o primeiro momento, percebi ter uma conversa um tanto incontrolável. Era um empresário já reformado, que conhecia Portugal, e que começou por me felicitar pela “sorte” de eu ter sido compatriota de Salazar, a quem fez imensos elogios. Em especial, a política africana do ditador merecia-lhe todos os louvores - “Et je connais très bien l’Afrique, monsieur l’ambassadeur!”. Fui tentando desviar a conversa, mas o homem teimava.

A dona da casa, uma senhora simpatiquérrima, também com fortes vínculos conservadores em Portugal, percebeu que as coisas não estavam a ir no caminho certo, e procurava introduzir outros temas. Mas sem sucesso. Estava-lhe a ser impossível isolar da conversa um dos quatro temas tabu clássicos, para ambientes de gente bem educada que não se conhece bem entre si: política, religião, dinheiro e “falatório” sobre pessoas ausentes.

A certo passo, o nosso homem, quiçá animado pelo excelente vinho francês que esta a ser servido, que complementava um extraordinário champanhe que tinha sido provado à entrada, começou a falar das colónias africanas e do papel histórico aí representado pelos países europeus. E saiu-se com esta, a propósito dos africanos: “São uns selvagens! Eu, confesso, sou racista”.

Na mesa, fez-se um súbito silêncio. Os franceses têm uma expressão para caraterizar estes momentos de coletiva paralisia: “un ange passe!”. A dona da casa voltou a tentar uma manobra de diversão, carreando para a conversa outro tema. Mas, qual quê!, o palavroso amigo não desarmava. E eu voltei à ribalta: “Et vous, monsieur l’ambassadeur? Comme tout le monde, vous êtes aussi un peu raciste, non?”.

A mesa olhou para mim. Eu, sem “espaço”, tive uma súbita tentação de arrogante chauvinismo lusitano (embora a expressão seja adequadamente francesa) e, muito sério, respondi: “Moi? Non, monsieur, je suis pas raciste. Je suis portugais”. E olhei-o fixamente, com a cara fechada.

Imagino que ninguém por ali acreditasse, por um instante, que os portugueses não fossem (também) racistas. Nem eu próprio acreditava. O racismo não tem fronteiras e é óbvio que há imenso racismo para cá do Caia. A colonização portuguesa, salvo para alguns líricos ou hipócritas, está imbuída dele até às entranhas do império, com discriminações e todos os vícios de qualquer processo de colonização. (Ah! E desde já aviso que não entro na velha e relha avaliação quantitativa de que os portugueses são menos racistas do que outros povos ou que, no plano qualitativo, de que a nossa colonização foi ”melhor” do que as outras.)

Aquela minha cartada verbal defensiva foi entendida por todos, com naturalidade, como uma benévola manobra para procurar calar o meu impertinente interlocutor. Porém, ao dizer o que disse, naquele ambiente franco-francês bem conservador, eu deixava implicitamente uma nota de que ser francês talvez fosse, em matéria de racismo e (vá lá, de xenofobia) uma coisa bem diferente do que era ser português. Os portugueses que viviam em França sabiam isso bem! Só o excesso do palavroso convidado me tinha dado um alibi para dizer ali uma frase que, não obstante ser curta, era diplomaticamente bem pesada.

A conversa mudou. O homem, tanto quanto me lembro, calou-se e manteve-se, a partir daí, silencioso, pelo menos até à chegada do Armagnac, que terá vindo com o café, que foi servido depois das “profiteroles”.

Por que é que me lembrei disto? Porque me chegou ontem, pela Amazon, o último livro de Éric Zemmour, o surpreendente “cometa” que, nos últimos meses, emergiu na cena política francesa, que as sondagens, de há horas, colocam já à frente de Marine Le Pen e logo abaixo de Emmanuel Macron, para as presidenciais francesas do próximo ano. E Zemmour, esse sim, é claramente racista e xenófobo.

(Já estou a imaginar alguns amigos a perguntar: “Então mandaste vir um livro de uma figura de extrema-direita?”. Comigo a responder: “Eu quase só leio coisas com que não concordo!”)

Boa tarde


Passamos o tempo a dizer ”boa tarde” às pessoas, sem pensarmos que, às vezes, há mesmo boas tardes. Como hoje aconteceu.

Um erro desnecessário

Esteve mal António Costa ao colar-se ao mantra europês sobre o processo de adesão dos países dos Balcãs à União Europeia. E esteve ainda pior ao fazer a avaliação que fez sobre o último grande alargamento, repetindo o discurso simplista de que a União deveria ter sido aprofundada antes de ter procedido ao aumento dos Estados que fazem parte da atual União a 27. Isto é tanto mais surpreendente quanto António Costa não desconhece qual foi o sentido geopolítico que esteve subjacente àquele alargamento.

Um comentador pode dizer o que António Costa disse. Um primeiro-ministro, que se cruza na mesa do Conselho Europeu com os seus colegas que chefiam países que são hoje membros da União graças ao “timing” dos últimos alargamentos, não deve dizer que eles estão por ali por virtude de um erro temporal estratégico. E, no tocante aos Balcãs e ao eventual futuro alargamento da União a essa área europeia, António Costa deveria ter tido o cuidado de guardar os seus comentários para o recato do Conselho Europeu, não para os jornalistas.

Há, no entanto, uma boa notícia, na decorrência do que António Costa disse: é que, se porventura, ele tinha alguma ambição no sentido de vir a ser futuramente presidente do Conselho Europeu, essa hipótese ficou enterrada com a sua declaração de ontem. E isso permite aumentar a possibilidade de ele se manter como primeiro-ministro a partir de 2023 - e isso é uma excelente notícia para o país.

Dito isto, regresso ao que comecei por dizer: com a sua declaração de ontem, António Costa não fez um favor à política externa portuguesa, “to say the least”.

Outono?

 


O outono já não é o que era!

quarta-feira, outubro 06, 2021

“A Arte da Guerra”


Nos meios audiovisuais do “Jornal Económico”, em “A Arte da Guerra”, falo esta semana com António Freitas de Sousa sobre os “leaks“ relativos aos “paraísos fiscais” que estão a agitar a sociedade política internacional, sobre as dificuldades algo inesperadas que Joe Biden está a encontrar no seio do Partido Democrático, sobre as tímidas aberturas democráticas no Qatar e a situação nos restantes Estados do Golfo Arábico, bem como a propósito da questão das provocações militares de Beijing ao regime de Taiwan, com análise ao peculiar estatuto internacional deste território.

Pode ver o programa aqui.

Os borregos

Pierre Bourguignon foi, ao tempo em que eu era embaixador em França, um dos grandes amigos de Portugal. Deputado à Assembleia Nacional franc...