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sábado, agosto 25, 2012

O cunhado

Claro que não era uma ordem, até porque tinha vindo de Lisboa por via indireta, cordial e amigável. Mas o recado segundo o qual aquele ministro português "gostaria muito" se a embaixada em Londres pudesse arranjar dois lugares, destinados a um seu cunhado e a um professor deste, para uma final da Taça de Inglaterra em Wembley, configurava aquele género de pressão a que é difícil dizer que não. O problema é que os bilhetes para o jogo estavam esgotados, há muito. Eu conseguira comprar um, para mim, mas já há largos meses.

Na embaixada, descobriu-se alguém que tinha um amigo na federação britânica. Essa pessoa, por especial favor, conseguiu dois acessos, depois de ter explicado que havia um ministro por detrás do pedido. A resposta da federação foi, aliás, melhor do que se poderia supor: atendendo a que era um pedido "oficial" de um membro do governo português (não sei bem o que disseram à federação), ofereciam dois convites, gratuitos, para uma zona especial, tipo camarote, onde ficavam os convidados da federação. Porque era uma área do estádio alheia às claques, relativamente "neutral", a federação apenas pedia alguma parcimónia na exibição de bandeiras ou símbolos dos dois clubes em liça. Esses ficavam para as duas imensas claques, uma londrina, do Chelsea, outra do Sheffield Wednesday. 

Era na cidade de Sheffield que o cunhado do ministro estudava. Estava assim explicado que quisesse fazer um gesto e trazer o professor para ver o seu clube. E, com certeza, para mostrar o que era a importância de ser cunhado de um ministro, capaz de mover mundos e fundos para arranjar duas entradas, ainda por cima de borla, para uma "Cup final". Ao cunhado do ministro, lembro-me que alguém transmitiu a indicação da necessidade de serem respeitadas as limitações coreográficas assinaladas pela federação, tendo ficado combinado deixar os dois convites num determinado local de Londres.

No dia do jogo, lá fui para Wembley. Como o meu bilhete era relativamente central, fora das claques, podia avistar, com facilidade, os camarotes. E foi então que lá os vi, no meio de um largo grupo de pessoas que não ostentavam nem bandeiras nem cachecóis: aquele que me pareceu ser o professor e um miúdo, jovem adolescente, ambos vestidos, da cabeça aos pés, de evidentes fãs do Sheffield Wednesday, a destoarem vivamente, pela cor e pela agitação que fui observando, dos responsáveis federativos e seus convidados. Imagino que alguém da federação deva ter estranhado bastante aquele golpe de "entrismo" lusitano.

O cunhado do ministro telefonou, dias depois, a agradecer, dizendo que tinha ficado "adoentado" e que, por essa razão, tinha dado o seu bilhete ao filho do professor. Pois...

Porque a sorte protege os audazes mas não necessariamente os espertalhaços, o Sheffield Wednesday perdeu contra o Chelsea e os dois "convidados" terão ficado com uma cara similiar à dos seus correlegionários da foto (mas não me lembro se algum deles usava o elegante capacete da "farda").

Passou-se isso numa tarde de sábado dos anos 90, um dia em que eu percebi melhor por que razão a palavra cunhado pode ter a ver alguma coisa com a palavra "cunha". Ontem, ao assistir, pela televisão, à terceira (e merecida) vitória consecutiva do Chelsea na edição deste ano da "league" inglesa, lembrei-me deste episódio. E que, daquela vez, até fiquei satisfeito pelo facto do Chelsea ter ganhado, coisa que só me voltaria a acontecer nos tempos de Mourinho, Scolari e Vilas Boas. Porquê? Porque, em Londres, eu "sou" do Arsenal, claro!

sexta-feira, agosto 24, 2012

A "chance" de Poulidor

E continuamos no ciclismo. A decisão de Lance Armstrong, ontem anunciada, de renunciar à sua defesa perante as acusações de dopagem que lhe são feitas, deve resultar na sua desqualificação como vencedor de sete "Tours de France".

Julgo que a imagem da popular prova ciclística francesa, bem como a do ciclismo em geral, vão sofrer fortemente, em matéria de credibilidade, particularmente se somarmos este escândalo aos tantos outros que mancham a competição e tornam cada vez mais duvidosas (e, pelos vistos, precárias) as vitórias a que vamos assistindo. Devo dizer que, como ativo adepto - de sofá e televisão - do mundo do ciclismo, entristece-me ver esta mítica modalidade, que tanto mobilizou a minha atenção desde a juventude, entrar "pelas ruas da amargura". E começa a ser ridículo - mas compreensível - que os resultados ciclísticos acabem por ser ditados nos laboratórios (como alguns do futebol o são "na secretaria")

Um amigo, ontem, ao telefone, comentou: "Não és tu que és um fã do Poulidor?". 

Para o leitor menos avisado, diga-se que Raymond Poulidor foi um grande ciclista francês, vencedor de várias provas no país e no estrangeiro, mas que nunca conquistou o "Tour de France", nem nele sequer vestiu alguma vez a "camisola amarela", embora tenha ganho várias etapas. Mas, nesse mesmo "Tour", foi três vezes segundo classificado e cinco vezes terceiro. É hoje um ídolo para várias gerações francesas e é uma figura por quem, desde sempre, nutro uma imensa simpatia, nesta minha incontrolável tendência para gostar dos gloriosos e dignos "losers".

Perguntei ao meu amigo por que diabo me vinha falar do Poulidor. "É que, por este andar, ainda vão acabar por desclassificar o Anquetil e o Merckx, nalguma "revisão de provas", pelo que o Poulidor pode ainda ter uma "chance" de ganhar uma Volta à França ...". 

segunda-feira, agosto 13, 2012

América, América

Os Estados Unidos são um país que não para de surpreender.

Depois da relativa desilusão que havia sido a sua prestação nos jogos olímpicos de Pequim, a América desportiva renasce, mais forte do que nunca, nas jornadas londrinas que ontem se encerraram, com a Europa num lugar secundário.

Mas há surpresas de outra natureza que também surgem do outro lado do Atlântico. Quando todos presumiam que o candidato presidencial republicano, Mitt Romney, ia "compensar" a sua imagem de conservadorismo com um companheiro de "ticket" que pudesse abrir caminho ao voto do centro, eis que surge nesse lugar uma figura de uma direita que está próxima do Tea Party, o que pode ser uma inesperada boa notícia para a recandidatura de Barack Obama. Será que o efeito de um candidato de um modelo ideológico tipo Sarah Palin vai beneficiar o atual presidente? Ou será que, em caso de vitória de Romney, poderemos ter uma reedição de uma "escola" de vice-presidentes como Spiro Agnew ou Dan Quayle? Ou será que somos nós, para quem o desfecho do que se passar em Washington não é nada indiferente, quem está a ler a realidade americana à maneira europeia?

domingo, agosto 12, 2012

Moniz Pereira

No final da maratona olímpica que hoje se concluiu em Londres, e por uma qualquer razão bem concreta, lembrei-me da figura de Mário Moniz Pereira.

Nos idos de 70, quando proliferaram em Portugal as "associações de amizade" entre Portugal e alguns países (normalmente do "socialismo real", como era o caso da Portugal-Polónia, de que fui membro), Moniz Pereira tomou a iniciativa (que já não recordo se polémica) de criar uma "associação de amizade Portugal-Portugal", sublinhando a necessidade de cuidarmos das nossas relações conosco mesmos. Nos dias que correm, pergunto-me se não valeria a pena recuperar essa instituição.

Testemunho

Ontem, no final da estafeta de 4 x 100 da Olimpíadas, um burocrata "bife" impediu o jamaicano Bolt, que tinha "apenas" acabado de bater o record do mundo (num grupo que conseguiu uma média superior a 40 km por hora, se já fizeram as contas), de ficar, como recordação, com o testemunho utilizado na estafeta, aquele tubo amarelo que se vê na imagem.

Confesso que não percebi por que razão Bolt lhe entregou o objeto. Acaso o funcionário iria atrás dele?

Havia de ser comigo! Ou pior: se fosse comigo, o homem era capaz de me apanhar...

terça-feira, agosto 07, 2012

Londres olímpica

Visto aqui de Paris, que continua a ser o maior centro urbano de atração turística à escala global, percebe-se muito bem o fantástico aproveitamento, em termos de promoção como destino de visitantes, que Londres está a fazer com estes Jogos olímpicos. A espantosa qualidade das imagens televisivas cobre diversos cenários do Reino Unido, os quais, sem a menor dúvida, vão atrair, no futuro, muita gente de todo o mundo - não obstante a insegurança do clima. 

Tudo indica que estamos perante uma operação bem conseguida, para uma economia britânica que bem dela estava necessitada. E alguma coisa também me diz que os ingleses não vão cometer os mesmos erros da Grécia, em 2004, quando, numa iniciativa algo megalómana, se envolveram numa insensata aventura olímpica, sem um retorno suficiente, o que terá contribuído para agravar a sua já então periclitante situação financeira.

segunda-feira, agosto 06, 2012

Diplomacia e ping-pong

Devo dizer que ontem fiquei muito surpreendido - positivamente surpreendido - com a excelente prestação dos nossos jogadores de "ping-pong" (dizer "ténis de mesa" acho normal, mas chamar à modalidade "tenisdemesismo" como ontem surgiu na televisão, é de um ridículo atroz) nas Olimpíadas. Não fazia a mais leve ideia de que o desporto tivesse evoluído tanto, em Portugal.

Veio-me à memória, neste contexto, que a Embaixada de Portugal em Luanda organizou, nos anos 80, um torneio de ping-pong entre todos os seus seus funcionários. Chefiava aquela nossa imensa missão diplomática o embaixador António Pinto da França, que conferia ao trabalho uma dinâmica muito pouco usual, feita de empenhamento profissional e da geração de um excecional ambiente de relações humanas. Leia-se, a este propósito, o seu divertido (e bem instrutivo, para se perceber Angola) diário de Angola*, a que se seguiu a publicação do um outro diário sobre a anterior estada na Guiné-Bissau**, a que só não faço excessiva publicidade porque fui o autor do prefácio.

Julgo que a ideia do torneio foi do nosso colega Júlio Vasconcelos, tendo merecido grande entusiasmo por parte de toda a gente, numa terra onde havia muito pouco de lúdico para fazer. Juntaram-se várias ofertas para prémios, que já não sei bem como foram obtidas, numa Luanda onde havia uma quase total ausência de bens à venda nas lojas. O embaixador anunciou-nos que decidira contribuir para os prémios do torneio, com a oferta de uma dúzia de garrafas de um vinho da Adega Cooperativa de Tomar. Tratava-se de um temível "néctar" cuja mais notória qualidade tinha sido consagrada como "bom para decapante"- expressão consagrada pelo Fernando Andresen Guimarães, pelo José Guilherme Stichini Vilela e por mim próprio -, tal a sua acidez e agressividade no paladar. Nos frequentes e muito simpáticos almoços e jantares promovidos pelo embaixador na sua residência, o tal vinho "imbebível" surgia, a espaços, à mesa, o que logo nos levava a uma forçada e conjuntural abstinência, feita sob a troca de olhares cúmplices entre nós, com alguma surpresa do embaixador, que observava incrédulo a nossa conversão coletiva a uma pontual cura de águas.  

Como "vingança" pela presença do nabantino produto, surgiu então, entre nós, uma ideia. Decidimos que o 3º classificado do torneio de ping-pong teria direito a 7 garrafas, o 2º classificado a 4 garrafas e o 1º classificado seria "punido" apenas com 1 garrafa, cumulados com outros prémios. (O critério seguia uma historieta, à época famosa, sobre os supostos "prémios" atribuídos pelo PCP a jovens "pioneiros", que entravam num concurso: o 3º classificado tinha tido direito a três semanas de férias na Bulgária comunista, o 2º classificado a uma semana e o 1º classificado a um fim-de-semana.)

E lá teve lugar a cerimónia de entrega dos prémios, presidida pelo próprio embaixador. Nunca percebemos se ele se deu conta do estranho critério de premiação seguido. Nada nos disse, mas todos ficámos com a sensação de que poderá não ter apreciado excessivamente o nosso gesto de humor, que apenas pretendia transmitir um subtil protesto... Um destes dias pergunto-lhe!

* "Angola, o dia-a-dia de um embaixador, 1983/1988
** "Em tempos de inocência - um diário da Guiné-Bissau"

quarta-feira, julho 11, 2012

Agostinho

Nestes tempos de "Tour de France", o jornal "Le Parisien" tem trazido memórias das canções criadas em torno da maior prova ciclística do mundo.

Sou hoje surpreendido com uma canção dedicada, em 1989, a Joaquim Agostinho, cinco anos depois da sua trágica morte em 10 de Maio de 1984. Confesso que nunca tinha ouvido falar da existência dessa canção. É uma bela homenagem de uma França que nunca esqueceu os dois terceiros lugares conseguidos no "Tour" (entre oito classificações nos dez primeiros lugares em vários outros anos) e a sua famosa chegada vitoriosa ao Alpe-d'Huez, em cuja famosa curva 14 está um marco a lembrar o feito.

Ouçam aqui a canção.

quinta-feira, junho 28, 2012

Bolas!

Há países com azar? Há países com sorte? Nós temos azar e os espanhóis têm sorte? Isso só é assim na aparência. Tem azar quem não tem sorte e ter sorte é uma coisa que dá muito trabalho. As bolas não entraram, quando deviam ter entrado? Pois é, a isso chama-se futebol. Depende e não depende de nós.

Pronto, já passou! Vamos agora ao jogo do défice e da dívida. Esse é o "euro" que não quero perder.

segunda-feira, junho 18, 2012

Ironias

Há ironias que só o destino sabe desenhar. Ver a Grécia a defrontar a Alemanha no Euro (com todos os trocadilhos a que isso vai levar) é uma dessas deliciosas ocasiões.

No que nos toca, aconteceu o que já estava nas cartas: fazendo o trabalho a que nos tínhamos comprometido, poderíamos acabar por ser ajudados pela Alemanha...

domingo, junho 10, 2012

Eu, a Alemanha e a bola

Portugal perdeu com a Alemanha. Todas as pessoas que entretanto encontrei, desde essa hora, foram unânimes: podíamos ter empatado. Melhor!: com alguma sorte, até podíamos ter ganho. Pois é, mas, no final, perdemos. E, quando se perde - mesmo que estivéssemos "à bica" de ter empatado ou, mesmo, de ter ganho -, a verdade é que... perdemos.  Podia ter sido diferente, pois podia!, mas não foi.

Claro!, mas, c'os diabos!, perdemos contra a Alemanha da senhora Merkel, a Alemanha do velho marco (de que o euro é um mero pseudónimo em europês), a Alemanha onde fica o BCE e quem nele manda, a Alemanha que nos faz ver os eurobonds por um canudo! Todos sabemos que ganhar à Alemanha seria sempre muito difícil, que empatar até seria bem bom e perder (vá lá!) até já é quase normal. Não fica mal perder contra Alemanha em futebol (alguns, historicamente, teimam em não perder com a Alemanha noutros campeonatos), em especial quando, em "jogo jogado" (que saudades tenho do Gabriel Alves, que nos dizia isto tão bem, num futebolês suave, sem o MBA do inenarrável Rui Santos, a quem só falta usar o "alavancar" do léxico dos gestores espertalhotes), "não ficámos atrás". É verdade, saímos "de cabeça levantada", jogámos "taco-a-taco", aquela bola na trave esteve "quase lá"! Pois é. mas, desculpem estar sempre a lembrar isto, no final, perdemos!

Provavelmente, um embaixador português não deveria dizer este tipo de coisas, devia estar aqui "puxar" pelo ânimo do país, a ser tão otimista como um espanhol até ontem, até à véspera do pedido de resgate. Mas, confesso, já não tenho paciência - deve ser da idade, embora eu suspeite que é também por outras razões - para edulcorar os meus sentimentos profundos: enquanto nos não libertarmos desta miserável, e também miserabilista, linguagem "sportinguista", das "vitórias morais" e do "quase", não vamos lá. No futebol, aliás, como no resto.

Isto é Portugal, não no seu melhor, mas no seu real que, infelizmente, parece ser, de facto, o seu melhor. Um Portugal que é tão verdadeiro como o daquele "patriota" que, na assistência, exibia meio garrafão de vinho na cabeça, pintado a verde e a vermelho, "representando" o seu país. Significava um país que, não por acaso, também é o meu. Mas não havia no estádio alemães com cornos e capacetes ridículos? Claro que havia! Mas com o ridículo dos alemães posso eu bem... Porquê? Não percebem? Porque ganharam, caramba! Como o diria o Ricardo Araújo Pereira: "estou chateado? É claro que estou chateado!". Ainda não tinham percebido?

quinta-feira, junho 07, 2012

Banho de bola

As próximas semanas prometem muito, em matéria de futebol. Conhecendo-me a mim próprio, já imagino as noitadas que vou ter de fazer para recuperar os jogos perdidos durante o dia, com as correspondentes olheiras matinais seguintes e reações irritadas no trabalho, por falta de sono.

Como estou em fase de intenso lóbi para alguns interesses portugueses na UNESCO, com vários encontros por dia com colegas e estruturas da organização, vou ter de estar atento aos respetivos resultados nacionais, para poder ganhar algum coeficiente acrescido de boa vontade. Não chegarei à hipocrisia de me mostrar contente com as suas eventuais vitórias, mas garanto a simpatia de os felicitar por elas.

Contrariamente à esmagadora maioria das pessoas que conheço, não sou dado à mais leve preferência em termos de países, com natural exceção da seleção portuguesa e dos Estados que falam a nossa língua. A minha atitude na observação dos jogos, para além do simples disfrute do bom futebol, é sempre a mesma, desde há muito: não consigo ter simpatia por seleções de países com regimes ditatoriais ou autoritários e desejo a vitória da equipa tida por menos favorita e por mais fraca. Às vezes, a conjugação de todos estes critérios leva a inevitáveis contradições, mas consigo resolvê-las na minha irrevelável diplomacia íntima. Raramente me desviei desta linha, que, como há tempos me dizia um velho amigo, é "a mais política maneira de ver futebol que alguma vez conheci".

Só que a vida diária de um embaixador é complicada. Como exemplo que julgo significativo, por compromissos simultâneos, não vou poder assistir, em direto, a nenhum dos jogos da seleção nacional portuguesa, na primeira fase. Nem sei se isto é bom ou mau. Logo se verá, "com toda a tranquilidade".

Em tempo: ... e "puxarei"pela Grécia, que nos derrotou na final do Europeu 2004, por todas as razões de atualidade e também pelo facto do português Fernando Santos ser o treinador da equipa.

sábado, junho 02, 2012

Sapatos vermelhos

Há dias, alguém me dizia que a Ucrânia, onde vai decorrer, daqui a pouco, uma parte do campeonato europeu de futebol, é um dos países mais perigosos do mundo. Fiquei intrigado. Já por lá andei e não me recordo de ter sentido que fosse mais perigoso do que qualquer das outras repúblicas vizinhas. Esse meu velho conhecido esclareceu: "Experimenta ir lá sozinho, sem a tua mulher, e logo verás se não é "perigoso"...". Aí, entendi. E olhando para o impublicável título do grupo de jovens que pretende combater a onda de prostituição que, no seu entender, por lá terá lugar, livre e pelos cantos, para os prolongamentos e para os foras-de-jogo do campeonato, reconheço, de facto, esse imenso "perigo".

A Ucrânia é um grande e belo país, com uma relação sempre muito complexa com Moscovo, polarizado política e humanamente entre uma tentação pró-russa e uma dinâmica favorável a uma maior aproximação com o ocidente, maxime com a União Europeia, que o seu parceiro nesta aventura futebolística, a Polónia, sempre procura estimular. Por lá se cruzam, assim, culturas políticas algo contraditórias, que oscilam entre as dinâmicas autoritárias a leste e os ventos da liberdade que sopram do oeste. E porque, nos dias de hoje, o desporto é uma arma política, graças à potenciação mediática, não nos espantemos se virmos este campeonato transformar-se num palco de reivindicações dessa natureza.

Fui à Ucrânia, pela primeira vez, há muitos anos, ao tempo em que era parte da União Soviética. Viajando numa baratucha excursão norueguesa, passei uma semana nas praias do mar Negro, com a curiosidade acrescida de poder sentir, com os meus próprios olhos, o ambiente do palácio de Livadia, onde, em 1945, muito do destino que o mundo de hoje ainda anda a viver foi desenhado pelas conversas entre Stalin, Churchill e Roosevelt. Sem autorização para sair da cidade mais do que alguns poucos quilómetros, quase sem ter acesso a lojas e com escassos pontos turísticos acessíveis, pouco havia para fazer nessa estranha vilegiatura, numa cidade que já fora deslumbrante e que então sofria de uma decadência sem graça.

Uma tarde, passeando em Ialta, à beira-mar, com ar de uma oriental Riviera datada, demo-nos conta, de repente, de que imensas mulheres que conosco se cruzavam usavam sapatos vermelhos, todos do mesmo tipo. Eram dezenas, sem exagero, umas a seguir às outras. Quase por acaso, fomos dar a um grande armazém, o qual, como era de regra na URSS, muito pouco tinha à venda (ainda me arrisco a ser contraditado neste blogue por algum nostágico, que por lá tenha andado de férias pagas pelo "Komsomol"). Entrámos, escapando a uma fila de mulheres que, de forma paciente, se formava escada acima, não se percebia muito bem para quê. O mistério desfez-se, minutos depois: eram os sapatos vermelhos que "estavam a sair", expressão que, poucos anos mais tarde, muito ouviria em Luanda, nos momentos mais folgados do "socialismo esquemático" (expressão local que significava um tipo de socialismo cujo quotidiano só se podia suportar graças a "esquemas"). Nesse dia, como novidade, só havia à venda esses sapatos vermelhos... Estou certo que as belas ucranianas de hoje já não usam sapatos desses, quanto mais não seja porque muitas foram aculturadas a detestar o vermelho.

A nós, na Ucrânia, em termos futebolísticos, vai-nos competir descalçar uma das botas mais difíceis deste torneio, num grupo "impossível". Se assim não conseguirmos, e como povo que ciclicamente coloca a salvação da sua alma nacional na biqueira de uma Nike, de uma Adidas ou de uma Puma, lá teremos nós um traumatismo... ucraniano!

Em tempo: quanto os resultados, há dias, com a Macedónia e, ontem, com a Turquia, não "liguem": nós sempre fomos um país que cuidou em fazer gestos simpáticos aos candidatos à União Europeia...

segunda-feira, maio 14, 2012

São Moreirense

Acabo de saber e rejubilo: o Moreirense subiu à Primeira Liga!

Há tempos, um cronista de restaurantes que, na revista "Sábado", dava pelo nome de Augusto Maria de Saa, deu a um seu artigo o título de "Já viu jogar o Moreirense?". Que raio de pergunta! Nunca vi jogar o Moreirense, nem faço tenções de o fazer. Mas então, qual a razão do júbilo? 

Porque o texto chamava a atenção para o facto de, precisamente ao lado do estádio do Moreirense, se situar aquele que, para muitos, é o melhor restaurante de Portugal - o "São Gião". (Por mim, já o tinha dito aqui)

Agora, com a equipa vizinha ascendida à divisão principal do nosso futebol, o "São Gião" vai passar a ter nova e farta freguesia. Nestes tempos de troika & tralhas correlativas, é muito bom que o negócio do "São Gião" progrida. Só peço ao Fernando Pedro Nunes que os preços não "sofram" com a avalanche e que continue a garantir-me uma mesa nessa incomparável "catedral" de restauração de Moreira de Cónegos.

domingo, abril 29, 2012

Nóbrega (1942-2012)

Acabo de ler, num jornal, que morreu o Nóbrega, com 70 anos. Na minha juventude vila-realense, o Nóbrega era um ídolo da cidade, em particular depois de ter saído do nosso Sport Clube, onde o vi jogar por várias vezes. Um dia, um qualquer "olheiro" assinalou-o ao FC do Porto, onde viria a ganhar o lugar de "ponta esquerda". Por lá ficou uma dúzia de anos, nas décadas de 60 e 70, seguindo depois a habitual peregrinação que o destino aponta aos ex-jogadores, como treinador de pequenos clubes de província.

O Nóbrega era um futebolista muito rápido, com um excelente pé esquerdo, na época em que os "pontas" ("esquerda" ou "direita") corriam colados à linha, avançando, tão longe quanto possível, para centrarem "adiantados", evitando os fora-de-jogo (habituei-me, com o meu pai, até hoje, a dizer "off-side"), com cruzamentos sobre a área, onde os "pontas de lança" aproveitavam as suas jogadas. Julgo que o Nóbrega ganhou as suas quatro internacionalizações, de que a cidade muito se orgulhava, tirando o lugar ao Fernando Peres ou ao Oliveira Baptista, já não sei bem. Sei apenas que ambos eram do meu Sporting...

Lembro-me muito bem do pai do Nóbrega, o sr. Nóbrega, homem grande e com forte vozeirão, morador na Fontinha (ruela em que eu seguia para a minha primária "escola do trem"), logo à saída do "cabo da bila" (é assim, com "b"), famoso columbófilo e com fama de homem de esquerda, que tinha como profissão o ser artesão de pintura (ainda me recordo de ver, lá por casa, um tabuleiro metálico, com as armas da cidade, pintado pelo sr. Nóbrega, objeto de beleza mais do que discutível).

Quando o Nóbrega, o jogador, ao tempo em que era vedeta, se passeava pela cidade, esta olhava-o com evidente admiração. (Vila Real nunca teve muitos futebolístas conhecidos: com algum destaque, apenas o meu amigo Amaral e o Fraguito, ambos idos do Sport Clube... para o Sporting*). Recordo-me muito bem de ver o Nóbrega, de visita à cidade, um pouco curvado para a frente (ou talvez seja sugestão minha, pela forma como me habituei a vê-lo jogar), caminhando pela rua Direita (a maioria dos leitores não conhecerá a rua Direita, mas basta que saibam que é o "eixo" essencial da cidade), com o fácies grave e fechado que muitos adultos de Vila Real sempre exibem, creio que como forma de serem levados a sério. Nesses regressos, o Nóbrega, acolitado por alguns orgulhosos amigos locais, saudava, generoso, os conhecidos com quem se cruzava, que logo ficavam reconhecidos pela confiança recebida de um personagem famoso.

Era assim a minha cidade, a cidade do Nóbrega.

*(E Simão Sabrosa, que desconheço se jogou no SCVR e que foi... para o Sporting. E Paulo Alves, que, esse sim!, jogou no SCVR e teve êxito... no Sporting. E, claro!, o Costa, que foi para o FC do Porto, onde jogou vários anos).

quarta-feira, abril 18, 2012

Ardiles e Messi

Em Londres, em 1982, durante a guerra entre o Reino Unido e a Argentina, a propósito do arquipélago das Falkland/Malvinas, testemunhei o facto do fantástico jogador argentino Oswaldo Ardiles ter de ser cedido temporariamente pelo Tottenham, em face do ambiente hostil que se criou à sua volta.

A crise política que agora se instalou entre Madrid e Buenos Aires, por virtude da nacionalização conflitual de uma empresa petrolífera com capitais espanhóis, está, felizmente, muito longe de ter a dimensão do conflito desse mês de abril, há precisamente 30 anos. Por isso, tenho esperança em que um outro génio argentino do futebol, como Lionel Messi, não veja a sua brilhante carreira afetada por esta nova tensão. 

Será que o futebol pode escapar, por completo, à política?

quarta-feira, abril 04, 2012

"Encarnados"


Uma tarde, há muitos anos, numa sala de um serviço do MNE na Visconde Valmor, anunciei a um colega, sportinguista como eu, que tinha decidido ir nessa noite apoiar o Benfica, à Luz, num jogo internacional qualquer. Ele olhou-me, grave, e, em voz baixa, esclareceu-me, definitivo e alvaladicamente crítico: "um verdadeiro sportinguista nunca deseja uma vitória do Benfica, seja contra quem for". 

Imaginei ontem esse colega, cofiando o bigode, consolado, lá no Luxemburgo, com o golo (portista?) de Raul Meireles, que colocou um ponto na ambição europeia dos encarnados. (Sabiam que, por assim ter sido determinado pela censura, no tempo de Salazar, nunca ninguém mais ousou dizer ou escrever "vermelhos", referindo-se ao Benfica, embora não se hesite fazê-lo quando se fala dos cartões?). Esse amigo, no entanto, terá de convir que, para além do resultado, o Benfica fez um grande jogo, lutou com imensa dignidade e foi fortemente prejudicado por uma arbitragem tendenciosa.

Talvez seja por ser um "mau" sportinguista, mas confesso a minha incapacidade em não desejar a vitória de qualquer equipa portuguesa que dispute competições internacionais. 

sábado, março 24, 2012

Isolados

Sporting "isola-se" (!), provisoriamente (!) no 4º (!) lugar, depois de bater o ameaçado de descida de divisão Feirense (!), por 1-0 (!), de penalti (!)- leio num site qualquer, que também regista os "bocejos dos adeptos, uma contradição de emoções, felizes por ganharem, mas cansados com a monotonia".

Caramba! Que alegria deve ser, a julgar pela imagem junta! Porque será que, embora assumido "leão", não me apetece comemorar (muito)?

sexta-feira, março 23, 2012

Clubites

O Futebol Clube do Porto apresentou uma queixa contra uma professora que, nas suas aulas, divulgou uma corruptela do "Atirei c'o pau ao gato", a qual acaba dizendo: "“vai-te embora pulga maldita/batata frita/viva o Benfica". Azul de indignação, o pai de uma criança "violentada" por esta terrível distorsão educativa, terá mobilizado a atenção da agremiação nortenha para o que se considerou serem os novos "fascistas do gosto". Para o clube, em severa declaração pública, "mais grave é que a adulteração da letra é prática diária e repetida três vezes ao dia, não só no jardim-infância da Ericeira, mas também em todas as escolas do pré-escolar do agrupamento e noutras de Lisboa e Cascais".

Sendo este blogue - por insuperável e endémico "lagartismo" - totalmente insuspeito da mais leve simpatia por ambas as partes envolvidas neste decisivo conflito - desde os "lampiões" do Colombo aos "andrades" do Pérola Negra -, apetece deixar aqui uma imensa gargalhada informática face a estes sintomas de ridícula clubite, só possíveis num país que ainda se permite levar a sério uns maduros que, com ar grave e espaço mediático, transformam um divertido espetáculo, em que uma maioria de estrangeiros dá uns pontapés e umas cabeçadas numa bola, vestidos com camisolas atulhadas de publicidade e com "patrióticos" emblemas que a maioria dos "artistas" só traz no coração porque andam junto ao peito, num severo "casus belli" educativo. Só espero que ninguém, dos lados de Alvalade, venha a lembrar-se de subscrever este protesto contra o "outro lado da segunda circular".

Serei eu que estou a ver mal as coisas ou anda tudo doido? 

terça-feira, março 20, 2012

Arbitragens

Não faço parte de quantos acham que há por aí uma permanente conspiração no mundo da arbitragem. Nem de quantos, por regra, consideram que as derrotas (ou as vitórias) se devem essencialmente aos árbitros.

Mas há uma coisa que nunca entendi: por que razão um jogador, um treinador ou um dirigente não têm o direito, no final de um jogo, de considerar que a arbitragem foi péssima ou que o árbitro e os seus auxiliares foram, pura e simplesmente, incompetentes ou profissionalmente incapazes? Percebo que, sem provas, não devam acusá-los de desonestos ou corruptos, mas nunca entendi por que diabo um ator do jogo não pode manifestar, abertamente, a sua livre opinião sobre o trabalho desenvolvido por uma equipa de arbitagem, sem ser, de imediato, alvo dessa coisa patusca a que chamam "justiça desportiva".

De tudo isto resulta a sensação de que o futebol é uma espécie de um Estado dentro do Estado... a que isto chegou.

Os borregos

Pierre Bourguignon foi, ao tempo em que eu era embaixador em França, um dos grandes amigos de Portugal. Deputado à Assembleia Nacional franc...