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quinta-feira, dezembro 22, 2011

Artur Santos Silva

A Fundação Calouste Gulbenkian acaba de escolher Artur Santos Silva para seu futuro presidente.

A Gulbenkian é uma instituição que, desde sempre, tem prestigiado fortemente o nosso país. Artur Santos Silva, como aqui referi há alguns tempos, é uma das raras personalidades portuguesas que reúne uma quase unanimidade, pelo que dá totais garantias de poder vir a preservar, com o seu dinamismo e abertura, o fantástico legado de Calouste Gulbenkian. A sua escolha é a prova de que o bom-senso ainda prevalece neste país.

Um forte abraço de parabéns, Artur!

quarta-feira, dezembro 07, 2011

João Caraça

João Caraça, até agora diretor do serviço de Ciência da Fundação Calouste Gulbenkian, será, a partir de janeiro de 2012, o novo diretor do Centro cultural da Fundação em Paris. Conheçam-no melhor pela sua página e por esta entrevista.

João Caraça sucede a João Pedro Garcia, que agora retoma, em plenitude, em Lisboa, o serviço de Relações Internacionais da Gulbenkian, depois de um notável trabalho, de cerca de sete anos, em Paris.

A relação entre a Embaixada e a Fundação Calouste Gulbenkian, em Paris, é, de há muito, um caso exemplar de bom entendimento e colaboração. É muito bom ver um amigo ser sucedido por outro. Por isso, aqui deixou um forte abraço de boas-vindas ao João Caraça.

segunda-feira, novembro 21, 2011

Edgar Morin

A vida tem destas coisas. Ando há anos para ouvir Edgar Morin, de quem li muito e sempre com proveito. Ao final da tarde de hoje, ele faz uma conferência do centro cultural da Fundação Gulbenkian, aqui em Paris. Estava a deliciar-me com a possibilidade de o escutar sobre a crise, a Europa e a crise na Europa. Pois não é que essa é a única hora que consegui para uma visita de urgência a um dentista?! Há dores que são duplas.

segunda-feira, novembro 14, 2011

Cultura portuguesa

Na passada semana, homenageei na Embaixada, em ocasiões diferentes, duas figuras cuja importância para a promoção da cultura portuguesa em França pude testemunhar, durante a minha estada em Paris.

Reuni jornalistas, livreiros e editores franceses para saudar Michel Chandeigne e os 20 anos das "Éditions Chandeigne", que têm levado a cabo uma importante tarefa de divulgação da língua e da cultura de Portugal e dos países que, pelo mundo, se exprimem em português. Na pessoa de Michel Chandeigne e dos seus colaboradores, lembrei igualmente o magnífico trabalho desenvolvido pela sua livraria que, desde há um quarto de século, torna acessíveis obras de diversas origens, servindo todas as culturas que se exprimem em português.

Noutra ocasião, juntei dezenas de amigos e figuras próximas de João Pedro Garcia, o qual, durante sete anos, dirigiu o Centro cultural da Fundação Calouste Gulbenkian, em Paris. A Gulbenkian, como eu costumo dizer, é uma outra "Embaixada" portuguesa nesta cidade e, graças ao entusiasmo, dinamismo e competência do seu diretor, transformou-se num espaço insubstituível, pela organização de grandes eventos culturais, que muito dignificam a imagem de Portugal. Agora que João Pedro Garcia regressa a Lisboa, para retomar em pleno o seu lugar de diretor internacional da Fundação, quis deixar-lhe uma nota de grande apreço, em especial pela inexcedível colaboração com que dele sempre pude contar.

A cultura portuguesa tem, infelizmente, um elevado défice (outro...) de afirmação no exterior. Figuras como Michel Chandeigne e João Pedro Garcia dão uma grande ajuda para reduzi-lo.

sábado, setembro 03, 2011

Notas de fim de semana

1. É muito bem escrita, como sempre, a crónica de ontem de Ferreira Fernandes, no "Diário de Notícias". Esta é sobre o estilo de discurso do professor Vitor Gaspar, o novo ministro das Finanças. Já conhecia o tempo e modo desse estilo quando, há já bastantes anos, fiz com ele parte de um júri, no Ministério dos Negócios Estrangeiros. O que a mim mais me impressiona, na forma da sua expressão, que agora é algo de verdadeiramente inédito na política portuguesa, é o ritmo desarmante que sustenta, impávido, perante os estímulos provocatórios dos interlocutores. 

2. Sei que vai chocar algumas pessoas que se diga isto. Mas a revolução líbia só ficará consagrada, na plenitude das suas credenciais de tolerância, no dia em que puder haver rádios, jornais e partidos políticos que critiquem abertamente, sem sentirem o medo de quaisquer represálias, as novas autoridades, ainda que transitórias, que vierem a assumir o poder em Tripoli. E isto, claro, antes de quaisquer eleições.

3. Recomendo vivamente o texto (não tem link livre) de Pedro Mexia, no "Expresso" de ontem, intitulado "Os Alfonsos Guerras". E, mais ainda, recomendo o já antigo livro de Jorge Semprún, que serve de pretexto à crónica - "Frederico Sanchez vous salue bien" -, no qual ele conta a sua experiência de homem do mundo da cultura inserido na política. Só não o recomendo a Francisco José Viegas porque sei que ele já leu tudo.

4. É excelente a notícia de que os trabalhos fotográficos de Gérard Castello-Lopes, de cerca de meio século de atividade, vão ser apresentados no novo Centro Cultural Gulbenkian, em Paris, em abril de 2012. A partir de última semana de outubro, a Gulbenkian de Paris abandonará as instalações da avenue d'Iéna e passará a estar aberta num prédio no boulevard de La Tour-Maubourg.

quarta-feira, julho 13, 2011

Gulbenkian

A Fundação Calouste Gulbenkian vai mudar de instalações, em Paris, a partir do segundo semestre deste ano. No edifício da avenue d'Iéna onde, desde há quase meio século, tem estado instalado o seu Centro Cultural, e que foi a casa do próprio Calouste Gulbenkian ao tempo em que por aqui viveu, está aberta, até Setembro, uma curiosa exposição intitulada "Memória do sítio", a qual, para além de recordar a vida de Gulbenkian, faz um interessante passeio pela vida da própria casa - que, em si mesma, é um belo objeto arquitetónico. O catálogo da exposição é excelente, por ser, ao mesmo tempo, um útil repositório histórico.

Ontem estive por lá, naquele que foi um dos últimos atos culturais destes tempos do edifício da avenue d'Iéna. Com Emílio Rui Vilar, presidente da Fundação, tive oportunidade de encontrar Paula Rego, que vai ter uma sua exposição naquele espaço, daqui a uns tempos. 

Aproveito a ocasião para deixar aqui uma palavra de grande admiração, pessoal e institucional, pelo magnífico trabalho, que tenho tido o ensejo de testemunhar, ao longo destes mais de dois anos, levado a cabo pelo diretor do Centro Cultural Gulbenkian em Paris, e, simultaneamente, diretor internacional da Fundação, João Pedro Garcia. A ação da Gulbenkian em Paris, onde foi o oitavo diretor da história do Centro, não teria tido o brilho que teve se não tivesse sido dirigido pela sua mão culta e eficaz.

A foto que ilustra este post é de Jorge Molder, está na capa do catálogo da exposição e representa a escadaria da casa de Gulbenkian em Paris.

quarta-feira, abril 27, 2011

Marcel Gauchet

Uma "habituée" das sessões do centro cultural Gulbenkian, aqui em Paris, interveio para dizer que se tratara da mais interessante conferência-debate a que por ali assistira. Não sei se estava certa, mas a verdade é que quem ontem, ao final da tarde, ouviu Marcel Gauchet falar das "Metamorfoses da democracia" não perdeu o seu tempo.

O filósofo fez um curioso bosquejo da evolução da prática democrática, concordando com quantos colocam a nossa Revolução de abril na abertura da terceira vaga de libertação, que haveria de descer à América Latina, para retornar à Europa da centro e leste. Repetindo que "os homens fazem a História, mas não sabem a História que fazem", Gauchet singularizou o mítico "homem novo" como a tentativa de criar um ator que sabia a História que protagonizava. Nos debates, falou-se, entre outras coisas, da vitória do individualismo, com a "autodestruição doce" do poder coletivo. E a questão da legitimodade, em torno dos modelos de representação política, com as suas contradições e deceções, foi também abordada.

Saí da conferência "como uma seta": tinha à espera o Real-Barça... A filosofia era outra.

quarta-feira, abril 20, 2011

Michel Barnier

No âmbito de um excecional conjunto de palestras sobre a Europa que o Centro Cultural Gulbenkian, em Paris, tem vindo a levar a cabo, uma sala cheia ouviu, na segunda-feira, o comissário europeu Michel Barnier falar do projeto europeu, na ótica das suas responsabilidades no quadro da regulação do Mercado Interno.

Barnier é uma figura com um interessante percurso governativo - em França, foi ministro adjunto dos Assuntos Europeus, da Agricultura e dos Negócios Estrangeiros. Tem uma grande experiência europeia, como deputado e comissário com diversas responsabilidades.

Na ocasião, entendi dever prestar o meu testemunho sobre um homem de quem sou amigo há mais de 15 anos, um europeu que acredita na Europa e que sempre teve, para com Portugal, uma atitude de grande simpatia e disponibilidade. Passámos centenas (não é exagero!) de horas a negociar os tratados de Amesterdão e de Nice, cruzámo-nos nas discussões do acordo de Schengen e muita coisa tratámos no âmbito da política regional europeia. Estive em Paris, por mais de uma vez, a seu convite, recebi-o em Portugal, em várias ocasiões, visitei-o em Bruxelas outras tantas. Michel Barnier é um homem de convicções, que joga com as cartas em cima da mesa, o que não é vulgar, nas lides bruxelenses. Por isso, como elogio, qualifiquei-o mesmo como uma "exceção europeia".

terça-feira, dezembro 07, 2010

"Hard times"

No dia em que a revolucionária ideia do ex-futebolista Éric Cantona, de provocar uma corrida aos bancos franceses, se terá saldado por um  previsível insucesso, o centro cultural da Fundação Gulbenkian em Paris ouviu com atenção a palavra do vice-presidente do Banco Central Europeu, Vitor Constâncio.

Apresentado pelo presidente do BPI, Artur Santos Silva, Constâncio deixou claro que não parece haver espaço para uma reforma profunda do sistema financeiro internacional, atenta a continuidade previsível do dólar como principal moeda de referência. Contudo, o mundo entrou num novo tempo do processo de globalização e assiste-se hoje a uma sensível mudança do equilíbrio de poderes, favorecendo os países emergentes, que parecem fadados a anos de crescimento bem mais sustentado que o das economias dos mundo industrializado. Não obstante, o paradigma essencial do sistema de Bretton Woods não parece suscetível de ser subvertido.

No tocante à Europa, as perspetivas que Vitor Constâncio nos deixou, a médio e longo prrazos, em termos de crescimento económico, de saldo demográfico e de produtividade não foram de moldes a sossegar ninguém na sala, muito embora o conhecido europeísmo do orador procurasse dar uma nota de otimismo, na fase final da sua conferência.

Ao meu lado, o antigo diretor-geral do FMI e ex-presidente do BERD e do Banco de França, Jacques de Larosière, dizia-me, no final, que Constâncio "teve a coragem de ser realista".

Estes vão ser, de facto, "hard times", para utilizar a expressão de Dickens.

terça-feira, novembro 30, 2010

Soares e a Europa

Ontem, o Centro Cultural Gulbenkian, em Paris, encheu para ouvir Mário Soares falar da Europa, das suas desilusões com o estado do projeto integrador e, muito em especial, da história de Portugal nessa mesma aventura, da qual foi um dos principais atores.

Numa introdução, o presidente da Gulbenkian, Rui Vilar, um europeísta, antecipou a leitura crítica do conferencista. Depois, António Coimbra Martins - académico, antigo embaixador em Paris e ministro da Cultura num governo de Soares - traçou um percurso muito interessante do seu amigo. Lembrou, a certo passo, que, quando Mário Soares foi deportado pela ditadura de Salazar para S. Tomé, em 1968, Jean-Jacques Servan-Schreiber escreveu no "L'Express" que "deportar Soares para S. Tomé é como se a França deportasse Miterrrand para as ilhas Kerguelem".

Na conferência de cerca de uma hora, Mário Soares foi igual a si próprio, na sua fé europeísta, na sua denúncia dos desregulações que desigualizam o mundo, nos seus elogios a Obama, por contraste com a cegueira de tantos outros. Traçou um retrato do Portugal do século XX, com vivacidade, testemunhos pessoais e muita graça.

No período das perguntas, coloquei-lhe uma questão "simples": "amanhã, dia 1 de Dezembro, fará precisamente um ano que entrou em vigor o Tratado de Lisboa. Devemos comemorar?" Màrio Soares respondeu-me que esse Tratado, que tem apenas um ano, é já hoje, em função da realidade que lhe sucedeu, um tratado "velho".

segunda-feira, julho 05, 2010

O panorama de Gulbenkian

Na passado sábado, estive em Enclos, perto de Deauville, a acompanhar o presidente da Fundação Gulbenkian, Emílio Rui Vilar, na inauguração do Parque Gulbenkian, a formalização da doação à região de um espaço natural adquirido por Calouste Gulbenkian, em 1937. Trata-se de uma mistura imaginativa de jardins, prados e bosques, um projeto que revela uma sensibilidade que talvez nos ajude a "ler" melhor a mentalidade do filantropo. A presença do Coro Gulbenkian, vindo expressamente de Lisboa, trouxe uma nota de grande beleza à cerimónia.

A certo ponto da visita, e apontando-me um panorama soberbo que Gulbenkian criara deliberadamente, como linha de harmonia entre duas alas de verde - de imensos e diferentes verdes, que nos ajudam a perceber melhor alguma pintura impressionista -, o delegado local do Ministério francês da Cultura explicou-me que esse panorama, até ao infinito onde é visível, está hoje protegido por lei, sendo insuscetível de ser palco de qualquer construção ou mesmo de um mero rearranjo arbóreo, sem autorização legal, sob pena de procedimento criminal.

"Pobre" país este, a França, cuja paisagem não pode ser beneficiada com a instalação de um qualquer barracão de zinco de cores berrantes, com a graça de uma pedreira a céu aberto ou o girassólico romantismo de uma eólica!

terça-feira, junho 08, 2010

Filosofia portuguesa

Com esta bela foto de Helena Almeida na capa (que, estou certo, vai fazer as delícias do Criativemo-nos), foi ontem apresentado, ao fim da tarde, no Centro Cultural da Fundação Calouste Gulbenkian, aqui em Paris, o nº 68 da revista Rue Descartes, dedicada ao tema "Philosopher au Portugal aujourd'hui".

Os cultores dessa escola de autoflagelação que hoje domina o sentimento comum português - uma linha teórica que poderíamos apelidar de "comentar e lamentar" - dirão que o título deste volume é um contrasenso. Deixemo-los a falar sozinhos, nos seus blogues e nas suas colunas de padecimento biliar.

Para o que nos interessa, este número do Rue Descartes é um retrato sobre o pensamento filosófico contemporâneo em Portugal. Foi um gosto ouvir falar especialistas franceses e portugueses, em hora e meia de interessante reflexão e escalpelização dos textos, sob a condução de Maria Filomena Molder, sobre alguns dos percursos da nossa filosofia. O texto de Fernando Gil que sobressai nesta publicação - "O hospital e a lei moral" - serviu de eixo para uma análise fascinante de Jean Petitot.

E, já agora, para os visitantes de Paris recomendo, até Outubro, a magnífica exposição de pintura inglesa dos anos 60 que enche as salas do edifício da Gulbenkian na avenue d'Iéna - "Ainsi font les rêveurs/As dreamers do". Verão que não se arrependem. 

segunda-feira, maio 03, 2010

Pina Martins (1920-2010)

Como aqui se tem referido, o Centro Cultural da Fundação Calouste Gulbenkian, em Paris, é, desde 1965, uma das "caras" mais importantes de Portugal na capital francesa. Pela sua direção têm passado figuras ilustres da nossa cultura.

Dei-me agora conta que, há dias, desapareceu o professor José Pina Martins, que durante mais de uma década (1972-1983) dirigiu aquele centro. Pina Martins, que também presidiu à Academia das Ciências de Lisboa e foi professor catedrático da Universidade de Lisboa, era um reputado especialista no período do Renascimento, com uma vasta obra publicada, em Portugal e no estrangeiro.

Há pouco mais de um ano, descobri, quase por acaso, o seu curioso "Histórias de Livros para a História do Livro", uma peregrinação erudita por livros (e não apenas por textos) que o marcaram e sinalizaram a sua vida intelectual.

quinta-feira, fevereiro 25, 2010

Marcello Mathias

A propósito de uma troca de comentários sobre os diplomatas e a escrita, suscitado pelo anterior post sobre Eça de Queirós, lembrei-me de anotar aqui hoje a figura de um meu predecessor neste posto, o embaixador Marcello Mathias (1903-1999).

Em 1973, surgiu nas livrarias de Lisboa um romance, editado pela Bertrand, com o título "Lusco Fusco", assinado por Pablo la Noche. A obra tinha uma real qualidade literária, apoiada numa escrita culta, um tanto nostálgica, mas com passagens de uma vivacidade inesperada. Foi bem acolhida pela crítica e viria a obter um prémio literário. Veio então a saber-se que o autor era, nem mais nem menos, o embaixador Marcello Mathias, o que suscitou grande curiosidade. Mais tarde, o romance veria a ser editado em França pela Robert Laffont, onde ganhou também um prémio literário, já com o nome verdadeiro do autor e tendo por título o pseudónimo utilizado na edição portuguesa: "Pablo la Nuit". Em Portugal, foi recentemente reeditado pela Quetzal.

Marcello Mathias é uma das grandes figuras da diplomacia do Estado Novo. Muito próximo de Salazar, seria por este convidado para o cargo de ministro dos Negócios Estrangeiros, função que exerceu entre duas estadas como embaixador em Paris, cidade onde permaneceu mais de duas décadas. É do maior interesse para a história contemporânea o livro que publicou sob o título "Correspondência Marcello Mathias/Salazar (1947/1968)". Num registo de curiosidade, por ele se fica também a saber algo mais do propalado romance sentimental entre o ditador e a jornalista francesa Christine Garnier.

Deve muito à habilidade e inteligência diplomática de Marcello Mathias o resultado favorável da  complexa negociação que permitiu a ida para Portugal do valiosíssimo espólio artístico que Calouste Gulbenkian possuía em Paris, uma tarefa para a qual contribuiu a sua grande influência junto do poder político francês da época. O facto muito excepcional de, como embaixador, ter recebido das autoridades francesas a Grand-Croix de la Légion d'Honneur diz muito. 

Há já uns bons anos, num jantar algures no mundo, ao lado de um dos seus filhos, o também meu predecessor em Paris, embaixador Leonardo Mathias (outro filho, Marcello Duarte Mathias, é um consagrado escritor e também embaixador), Manuela Margarido, à época representante diplomática de S. Tomé e Príncipe em Bruxelas, contou uma história curiosa. Com várias peripécias interessantes, Manuela - uma personalidade  notável, infelizmente já falecida - revelou que fora graças a uma intervenção de Marcello Mathias que, um dia, conseguira evitar ser presa pela PIDE.

À conversa, estavam presentes dois jovens governantes da mesma geração política, um português e outro estrangeiro. Ambos partilharam uma forte e quase jocosa surpresa pelo facto de um dignitário do anterior regime se ter recusado a ser cúmplice de uma arbitrariedade. Talvez porque não percebessem que, sendo embora um fiel "da situação" - como se designavam os apoiantes do regime -, Marcello Mathias era um homem que havia já tido um papel importante na libertação de Alain Oulman, o compositor francês de Amália, das cadeias do regime.

Na troca de palavras que se seguiu, para além de terem provavelmente entendido que as voltas da vida não são tão lineares como as lógicas das ideologias, só posso dizer que os dois governantes aprenderam algumas coisas sobre a dignidade, coisa que o exercício episódico do poder nem sempre ensina.

quinta-feira, janeiro 28, 2010

Camões

Ao final da tarde de ontem, o centro cultural Gulbenkian proporcionou-nos uma conferência de António Coimbra Martins sobre temática literária, ligada a Lorenzo di Medici e a Luiz de Camões.

Intelectual e académico, António Coimbra Martins viveu grande parte da sua vida em França, onde teve ação destacada nas fileiras da oposição à ditadura portuguesa. A partir de 1965, criou e dirigiu a biblioteca do centro cultural Calouste Gulbenkian - a maior e mais importante existente fora de Portugal, depois da biblioteca do Real Gabinete Português de Leitura, no Rio de Janeiro. Dirigiu, depois, o próprio centro cultural Gulbenkian (1997-98). Anos antes, havia exercido funções como embaixador português em França (1974-79) e, mais tarde, como ministro da Cultura em Portugal (1983-85).

Ontem, ouvimo-lo, no "seu" centro Gulbenkian, enquanto académico, especular de forma brilhante sobre curiosas coincidências entre aspetos de obras de Médici e de Camões. A quem não é do "ramo", fez imensamente bem ouvir argumentos inteligentes situados em temáticas distantes do nosso quotidiano.

quarta-feira, janeiro 27, 2010

Europa

O Tratado de Lisboa foi o pretexto, mas Hubert Védrine foi muito para além disso na excelente conferência que, ontem ao final da tarde, fez no centro cultural Gulbenkian, aqui em Paris.

Apresentado por Teresa Gouveia, que deu uma bela lição de como se deve fazer a introdução de um conferencista, o antigo MNE francês terá surpreendido pela franca lucidez do seu raciocínio, na abordagem da situação internacional, em geral, e da Europa, em particular.

Hubert Védrine atacou alguns mitos fundacionais da unidade europeia, revelou alguns dos logros em que o pensamento dominante no continente se deixou enredar por décadas e foi de um realismo muito frio quanto às possibilidades da Europa se afirmar como potência no cenário mundial. Por isso, e uma vez mais, volto a recomendar o seu mais recente livro, de que já falei aqui.

segunda-feira, janeiro 25, 2010

Jorge Molder


Esta é uma ocasião única que a Fundação Gulbenkian nos oferece para apreciar um vasto conjunto de obras fotográficas de Jorge Molder. A exposição foi há pouco inaugurada no seu Centro Cultural em Paris, com a presença do autor.

São três tempos diferentes e complementares do trabalho do artista que nos são apresentados, o mais recente dos quais é a sua colorida "interpretação dos sonhos" - em letra minúscula,  para não se confundir com a obra homónima de Freud, como ironizou o próprio Molder.

São trabalhos poderosos, com grande intensidade dramática, onde predomina o jogo preto-e-branco a que Molder nos habituou, com magníficas expressões de movimento, algumas "memórias" do cinema e uma sempre muito imaginativa exploração dos espaços. Pelo menos, foi assim que eu vi as coisas.

Uma grande exposição, uma excelente "marca" da cultura portuguesa, que uma vez mais ficamos a dever ao magnífico trabalho que a Gulbenkian faz em Paris.

sábado, novembro 14, 2009

Cidade Universitária (2)

Foi muito interessante poder testemunhar o início do encontro de diversas gerações de antigos estudantes, que hoje se reuniram na Casa de Portugal, na Cité Universitaire de Paris. Muitos vindos de Portugal e alguns de bem mais longe, como foi o caso da pintora Isabel Pavão, que viajou desde Nova Iorque para poder estar presente no encontro. Dele pode vir a nascer uma Associação de antigos residentes, feito na base de um inventário mais completo do imenso número de pessoas que, desde a criação da Casa, nela habitaram.

A Casa de Portugal foi construída pela Fundação Calouste Gulbenkian, com desenho do arquitecto José Sommer-Ribeiro e tem uma história muito interessante, de que já aqui falei, em especial por nela se terem reflectido alguns períodos da vida política francesa e portuguesa, como o Maio de 1968, o 25 de Abril e o período revolucionário que se lhe seguiu.

Segundo se lê em "Les Portugais à Paris" (Chandeigne, 2009), a Casa de Portugal foi inaugurada em 1967, tendo passado a ter o nome de André de Gouveia em 1972 (ver aqui). Dos originais 29 quartos, a residência passou a ter 170, após uma recente reforma. Salazar comentaria, a propósito dos estudantes que a utilizavam: "Eles vão para Paris para, de seguida, irem para Moscovo". Em alguns casos, teve razão...

Durante o encontro de hoje, suscitei a ideia de se poder fazer uma recolha de testemunhos sobre a história da Casa de Portugal, por forma a permitir reconstituir uma memória escrita de um dos locais emblemáticos da presença portuguesa em Paris. Prontifiquei-me a colocar a Embaixada disponível para ajudar nessa tarefa.

Cidade Universitária (1)

Hoje à tarde, conduzindo o meu carro, fui à Cité Universitaire de Paris, para estar presente no encontro de antigos residentes da Casa de Portugal, a residência André de Gouveia. Porque conheço mal o espaço, fui-me guiando pela sinalização interna da Cité. E com que deparei? Com indicações como Casa do Líbano, Casa do Cambodja, Casa do Brasil e RAG. RAG? Isso mesmo, a sigla da "Residência André de Gouveia". Quanto à menção a Portugal, nada... Chegado à Casa, olhei com mais cuidado e lá estava, como única indicação, RAG, no revestimento da intervenção arquitectónica que a casa sofreu, com subsídios da Fundação Calouste Gulbenkian! Nem uma nota existe de que se trata da Casa de Portugal.

C'os diabos!? Como é que foi possível ter-se deixado desaparecer a indicação Casa de Portugal?

Na minha intervenção, feita em frente de todos os antigos residentes e da principal directora da Cité Universitaire, não deixei de manifestar esta minha perplexidade, que traduz também o meu desagrado. Pessoal e como embaixador. E que fica aqui registado, para todos os fins úteis.

terça-feira, outubro 20, 2009

Aliados

A literatura lusófona tem, em França, um aliado seguro: as Editions Métailié. Há 30 anos que as letras do Brasil começaram a merecer a sua atenção e há 25 anos que os autores portugueses aí começaram a ser acolhidos.

(Devo confessar, em jeito de nota à margem, que cada vez sinto uma tentação para trabalhar na promoção da língua portuguesa através do conceito da lusofonia, sem com isso descurar a minha obrigação primeira de tratar do que é especificamente português.)

Hoje, ao final da tarde, na Gulbenkian de Paris ("where else?", diria George Clooney), a fundadora e directora da editora, Anne Marie Métailié, lado-a-lado com alguém que por aqui é um "embaixador" constante e teimoso do Portugal cultural, Pierre Léglise-Costa, falaram desses já longos anos de bom trabalho. Por aí estiveram também, em mesa-redonda, escritores como Lídia Jorge, José Eduardo Agualusa e Pedro Rosa Mendes - sendo este último o novo delegado da Agência Lusa em França, um "luxo" jornalístico-cultural de que poucos países se podem gabar.

Léglise-Costa é responsável na Métailié pela "Bibliothèque Portugaise", onde também já foram publicadas obras de escritores como Vergílio Ferreira, José Régio, Jorge de Sena, Mário Cláudio, Maria Gabriela Llansol, Eduardo Lourenço ou Agustina Bessa Luís.

O debate foi muito interessante, com Pedro Rosa Mendes a falar, entre outras coisas, do destino complexo da língua portuguesa em Timor-Leste, com Lídia Jorge a defender a importância da narrativa na literatura e com Agualusa a chamar ao português "uma língua com afeição a diversas geografias".

Confesso os figos

Ontem, uma prima ofereceu-me duas sacas de figos secos. Não lhes digo quantos já comi. Há poucas coisas no mundo gustativo de que eu goste m...