quinta-feira, julho 04, 2024

Roland Dumas



Roland Dumas, que morreu agora aos 102 anos, era uma figura relevante nesse mundo complexo que eram os amigos de François Mitterrand, pessoa a quem foi leal toda a vida. 

Advogado de profissão, sedutor por vocação e com grande sucesso, teve um tempo interessante à frente da diplomacia francesa. No ambiente político, a sua imagem esteve sempre muito longe de ser vista como imaculada, bem antes pelo contrário, o que o tempo veio provar que fazia jus aos factos e à verdade objetiva das coisas. 

Dumas era um realista cínico, o que ajuda sempre muito em diplomacia, provando, contudo, por várias vezes, que tinha limitados escrúpulos na sua vida privada. Isso, porém, não pareceu preocupar em demasia o seu grande amigo Mitterrand. 

Hoje, o "Le Monde", jornal com quem Dumas teve em tempos fortes "accrochages", traça-lhe um perfil bastante "mauzinho". Até a grande imprensa tem destes reflexos menores.

A certo passo dessa nota necrológica, o "Le Monde" anota: "Après que François Mitterrand a remporté la présidentielle, le 10 mai 1981, lorsque la gauche remonte à pied jusqu’au Panthéon, Roland Dumas figure au premier rang, seul à porter un costume crème et les cheveux dans le cou, bien visible parmi les fidèles." 

O jornal fica-se por aqui no relato. Estou certo que Dumas teria gostado que o artigo tivesse explicado que o inusitado traje claro, impróprio para a função, se devia ao facto de, nessa manhã, ele ter saído diretamente de casa de uma amante, sem ter hipótese de passar pelo seu apartamento pessoal, para recolher um fato mais discreto, em tons de Estado. Dumas sempre gostou de viver à altura dos seus estimados vícios. E isso, no fim de uma vida cheia, não deixa de ter a sua graça.

Uma opção

"Dans la mesure où, contrairement au RN, le NFP n'a aucune chance d'avoir une majorité absolue, l'équivalence "ni RN ni LFI" ne tient plus. Ceux qui votent LFI en se bouchant le nez pour éviter le RN ne sont pas en train de voter pour "Mélenchon 1er ministre", et ne sont pas des "traîtres" ni des "alliés de l'antisémitisme", juste des gens qui préfèrent la peste au choléra, ce qui est respectable." - Raphaël Enthoven

quarta-feira, julho 03, 2024

Orbán em Kiev


Estive uma única vez numa conversa privada com Viktor Orbán. Foi em Budapeste, em 1999. Ele era então primeiro-ministro da Hungria. Impressionou-me logo o seu olhar. Um olhar "pesado" - é a palavra que me surge. Nos últimos anos, a evidente arrogância que transparece daquela cara tem vindo a acentuar-se. Há por ali um fácies que denota mesmo algum desprezo por tudo e todos quantos dele divirjam. Orbán tem a clara consciência de que a máquina da União Europeia (e um pouco a da NATO) está hoje refém da posição húngara. Já aprendeu que pode esticar a corda, embora só até um certo ponto. Perante um Europa assarapantada e empanicada com a situação ucraniana, com a unanimidade a ser requerida ainda para muitas coisas (e a unanimidade, nos tratados, só se reverte por unanimidade), ele sabe bem que não pode dizer que não até ao fim; sabe que, na soleira desse fim, Bruxelas irá comprar a sua saída da sala, para não prejudicar o ramalhete da posição esforçadamente comum. A conversa de Orbán com Zelensky - adorava "ser mosca" ali - prova, se ainda fosse necessário, a completa irrelevância atual das presidências rotativas. Orbán, nessa conversa, não representou minimamente a União Europeia: representou-se a si próprio e à heterodoxia da Hungria. E, com um mandato ou não, ter-se-á sugerido como uma ponte para Moscovo. Ao ter de recebê-lo, Zelensky mostra a sua fraqueza, talvez o seu desespero. Orbán é outro dos que está à espera de Trump.

Vou ler, Pedro!

Extremos

Pode ver e ouvir aqui a minha conversa com Pedro Bello Moraes, sobre as eleições francesas:

https://cnnportugal.iol.pt/videos/nao-equiparo-nunca-a-extrema-direita-a-extrema-esquerda-em-franca-ou-em-portugal/66851c7a0cf2a41c2ee0193d

Nela tive oportunidade de dizer que não me revejo minimamente na ideia de que a política francesa esteja polarizada entre a extrema-direita e a extrema-esquerda. 

De facto, num dos polos está a extrema-direita, com a sua agenda excludente, xenófoba, em suma, sinistra, perante os valores da decência, europeus e humanistas.

Porém, do outro lado não está apenas uma agenda com atores extremistas - embora também esteja. Há por ali socialistas, ecologistas e até um Partido Comunista que, nos dias de hoje, tem como bandeira um programa sensato e nada radical. E, de caminho, lembrei que a esquerda foi responsável por muitos e bons anos de gestão governativa em França.

Mas disse mais: sublinhei, nessa conversa, que por muito que algumas das propostas da "esquerda da esquerda" me possam ser alheias, eu não equiparo nunca a extrema-direita à extrema-esquerda. Em França ou em Portugal.

A propósito, recordo um texto com mais de quatro anos, em que falo disto. Leiam-no aqui: https://duas-ou-tres.blogspot.com/2020/02/extremos.html

The final countdown


Faltam exatamente dezasseis dias úteis para a praia. Antecipo já a desagradável impressão da areia nos Timberland, o ter de ir estacionar longe da toalha, a barulheira do carro do lixo a arruinar-me as manhãs, aquele calor sinistro, os restaurantes apinhados. Bolas! Nunca mais chega o raio da praia!

França


Álvaro Vasconcelos reuniu ontem, num jantar, mais de uma dezena de pessoas, para discutir as eleições legislativas francesas, numa iniciativa no âmbito do Forum Demos. Foi uma bela discussão, animada, com polémica e algumas divergências. Eu terei sido culpado por boa parte delas.

Fausto


Lá estivemos ontem, muitos, na Voz do Operário, a prestar a última homenagem ao Fausto. 

terça-feira, julho 02, 2024

Franco Charais, o MFA e o CDS


Morreu Franco Charais. Para as novas gerações, o nome dirá pouco. 

Franco Charais foi um oficial de Artilharia que esteve fortemente envolvido no 25 de Abril. Integrou o Conselho de Estado, fez parte do Conselho da Revolução, foi comandante da Região Militar Centro e foi um dos subscritores do chamado “documento dos nove” - um manifesto de nove figuras moderadas do MFA, publicado no auge do “Verão quente” de 1975, de “resistência” ao “gonçalvismo”. Foi uma figura de grande equilíbrio no período revolucionário, com um perfil sóbrio de militar e genericamente apreciado pela sua seriedade.

Cruzei-me com Franco Charais no palácio da Cova da Moura, em maio de 1974. Ele era tenente-coronel. Eu era então aspirante a oficial miliciano e adjunto da Junta de Salvação Nacional, ligado às questões da extinção da PIDE/DGS, colocado no gabinete do general Galvão de Melo. 

Recordo-me que Charais ocupava por ali um belo gabinete com azulejos, que toda a gente invejava, num dos extremos do primeiro andar do palácio. Dizia-se então: "Aqui no palácio, mais bonito só o do Spínola, no andar de baixo". Sou um sortudo. Duas décadas depois, em 1994, eu viria a ocupar, por uns meses, como subdiretor-geral dos Assuntos Europeus, o então gabinete de Charais e, de 1995 até 2001, "mudei-me" para o antigo gabinete de Spínola. 

Voltemos a 1974. Por essa época, o CDS estava a ser alvo de uma forte campanha política adversa, com atos de violência que, nomeadamente, levaram ao saque da sua sede nacional em Lisboa e ao boicote sistemático de muitos dos seus comícios, um pouco por todo o país. Casos houve em que os seus dirigentes tiveram de abandonar os locais pelos telhados das casas e correram riscos de integridade pessoal.

A acusação mais vulgar, feita pelas forças de esquerda, era a de que o CDS era uma formação política onde se refugiara muita da direita saída diretamente do salazarismo e do marcelismo. Ora isto, não sendo necessariamente mentira, estava longe de esgotar a verdade. Muita gente conservadora, sem atividade política no Estado Novo, a quem o 25 de Abril abrira a possibilidade de intervenção e defesa democráticas das suas ideias, não se revia no socialismo e nos partidos da esquerda dominante, optando igualmente por não seguir as ideias em torno das quais Sá Carneiro instituíra o PPD. E havia decidido apoiar o partido que Freitas do Amaral criara logo após a Revolução e que apelidou de "centrista", pretendendo identificá-lo com uma matriz democrata-cristã. 

Um dia, um grupo de responsáveis do CDS, chefiado por Victor Sá Machado e integrado por Emídio Pinheiro e uma outra personalidade que até hoje não recordo quem era, foi recebido, a seu pedido, pelo Movimento das Forças Armadas (MFA), numa reunião que teve lugar naquele que é hoje o Instituto de Defesa Nacional, na calçada das Necessidades. 

Não consigo precisar a data, mas tenho a ideia de que deverá ter sido em fins de outubro ou novembro de 1974, isto é, depois do 28 de Setembro, que forçou o afastamento de Spínola e levou ao isolamento temporário de um importante setor da ala direita militar. 

A delegação do MFA era dirigida pelo então tenente-coronel Franco Charais, meses mais tarde graduado em general e que viria a chefiar a Região militar do centro. Com ele, em nome do MFA, estavam três pessoas.

Nessa reunião, Sá Machado expôs, com elegância e sem dramatismos, a penosa existência do novo partido, praticamente desde a sua criação. Ele sabia, de certeza segura, que o CDS estava longe de ser visto com bons olhos no seio da maioria dos setores que haviam feito a Revolução, mas também não desconhecia que as Forças Armadas, que conviviam com Diogo Freitas do Amaral no Conselho de Estado, não se podiam dar ao luxo de aceitar a exclusão da vida política, por via da força, de um partido que afirmara cumprir os princípios básicos que orientavam a Revolução e cuja ação não suscitava objeções importantes. 

A certo passo da sua intervenção, feita no tom calmo embora um tanto pomposo que era o seu, Sá Machado inquiriu se as Forças Armadas estavam ou não disponíveis para garantir condições básicas de segurança para as sedes e as reuniões de propaganda que o CDS procurava organizar pelo país. Recordo ele ter dito mais ou menos o seguinte: "São os senhores que têm de decidir se querem ou não que continuemos a existir. Se o direito de reunião e organização política nos continuar a ser negado, talvez tenhamos de vir constatar que deixa de haver condições para o exercício da nossa atividade enquanto partido. Nesse caso, o MFA deve ter consciência de que um setor da opinião pública portuguesa se sentirá alienado do sistema político instituído pelo 25 de Abril. E isso terá naturalmente as suas consequências na própria legitimidade futura do regime". 

Foi uma declaração frontal, corajosa para os padrões da época. Vários partidos considerados extremistas de direita e saudosistas haviam já desaparecido (Partido do Progresso, Movimento Federalista Português, Partido Liberal) e, com isso, o CDS ficara "colado" ao limite direito do espetro político.

Charais reagiu, dizendo que "outros partidos de direita, como o PPD" (nem o CDS se assumia como de direita, quanto mais o então PPD, mas a linguagem dos tempos era essa...), também sentiam dificuldades em organizar-se em certas regiões, mas que isso era devido ao facto de, nesses locais, CDS e PPD serem "o refúgio dos fascistas", pelo que a aceitação "popular" da sua legitimidade de afirmação política passava muito por uma escolha mais criteriosa dos seus quadros, que deviam ter "sólidas credenciais democráticas". Sá Machado retorquiu que o CDS não permitia a adesão de pessoas ligadas ao anterior regime e que, por isso, eram infundadas as acusações feitas ao seu partido. 

A discussão prolongou-se por bem mais de meia hora. Já não me lembro se houve algum "follow-up" no âmbito militar. Mas a mensagem passou. À distância dos anos, há que reconhecer que a criação do CDS acabou por permitir a organização de um espaço político para enquadramento democrático de uma certa direita. E isso não foi um serviço menos relevante que o CDS prestou à vida política portuguesa. O facto do partido, um ano depois, não ter votado a Constituição emanada da Assembleia Constituinte, viria a fixar claramente a sua identidade no contexto político-partidário futuro. Mas, nesse futuro, o CDS não deixou de evoluir muito, de uma forma que se pode mesmo considerar singular. Até ser o que hoje é.

Lembro este episódio no dia da morte, com 93 anos, desse democrata e homem de bem que foi Manuel Franco Charais, que, nos últimos anos, viveu no Algarve, onde se dedicava à pintura.

segunda-feira, julho 01, 2024

Costas quentes

É Diogo Costa! Foi António Costa! Eu nem quero dizer nada... 

a) Seixas da Costa

Ni-Ni

O vergonhoso "Ni-Ni" ("ni Rassemblement National, ni Nouveau Front Populaire") de Édouard Philippe e François Bayrou, que pode entregar o poder à extrema-direita, dá, uma vez mais, razão póstuma a Mitterrand: em França, "le centre n'est ni de gauche, ni de gauche"... 

Pode?

O prémio da cretinice do dia vai para uns energúmenos, escondidos atrás da sua incultura, que andam hoje aí a insinuar que o Fausto, nas suas canções, fazia a apologia do colonialismo. É nestes dias que me surge a tentação da peça de Kark Valentin, "E não se pode exterminá-los?"

Refletir sobre a França


Ver aqui.

Simples

Para alguém da esquerda moderada, a chamada extrema-esquerda, tal como a direita democrática, são adversários políticos. A extrema-direita, pelo contrário, é, sempre, um inimigo. A diferença é abissal. As coisas são mais simples do que parecem.

Na morte do Fausto


Tinha então o ar típico de um menino "certinho", acabado de aterrar em Lisboa, vindo da Angola onde nascera para a música e concluíra o liceu. Projetava uma imensa simpatia, um sorriso sereno que, com naturalidade, construia amizades. Tínhamos exatamente a mesma idade (nós, a malta de 48, não é, Zé Ferreira Fernandes?), os mesmos 20 anos que Paul Nizan achava que não eram "a idade mais bela da vida", mas estava errado.

Naquele ambiente universitário atípico, há 56 anos, naquele que era o Instituto Superior de Ciências Sociais e Política Ultramarina - leram bem, "ultramarina" -, uma escola de formação de quadros para a administração colonial, que Adriano Moreira esforçadamente procurava transformar numa incipiente escola de ciências sociais, recordo-me dele se ter integrado muito bem, fazendo mesmo a "ponte" entre os filhos, mais ou menos rebeldes, de uma Lisboa "social" que por ali andavam a queimar os dias nas mesas de "king" e a turbamulta associativa que então se divertia a subverter a ordem salazarenta que se respirava na maioria dos setores da casa. 

Pelos muitos poisos de conversas no Palácio Burnay, à Junqueira, tal como em noitadas da Rua da Paz, essa nova e improvável versão meio anarca da "Casa dos Estudantes do Império", onde imperavam a política, os copos e grandes tainas, construí com ele uma amizade para a vida.

Não nos víamos muito. Antes da pandemia, com o João Paulo Guerra, calhou irmos almoçar na sua "Tertúla do Silêncio", no Paço do Lumiar, e também jantar, com famílias, no "Miudinho", em Carnide. Há uns anos, consegui juntá-lo com alguns outros amigos do tempo da Junqueira num animado almoço em minha casa. Um dia, telefonou-me a desculpar-se por ter utilizado o meu nome, sem antes me consultar, num programa da Fátima Campos Ferreira. (Ora eu tinha ficado "flattered" pela lembrança dele). Mais recentemente, liguei-lhe a saber da saúde, que sabia debilitada. 

A pessoa que motiva este texto chama-se Carlos Fausto Bordalo Gomes Dias. Todos o conhecem: é o Fausto, do "Por este rio acima". Morreu hoje, ao que me diz agora Viriato Teles, que sobre ele está a fazer um livro e com quem falara há semanas sobre o Fausto.

Nesse mesmo e inesquecível ano de1968, ambos fizemos parte da mais radical lista associativa que aquele venerando ISCSPU vira nascer. E ganhámos, numas eleições divertidas, bem coloridas, com gente muito diversa, mulheres lindas, sob uma bandeira programática que fora beber o essencial ao maio parisiense, escassos meses antes. Quem, por esse tempo, leu o (proibidíssimo!) n° 1 da revista "Ibis" sabe do que estou a falar.

A nossa vitória, contudo, viria a ser algo pírrica: semanas depois, o Ministério da Educação Nacional informou que toda a lista eleita fora "não homologada", porque, como era a regra da época, a democracia parava à porta da vontade arbitrária da ditadura. E o ditador de turno, precisamente por esses dias, até mudara: chamava-se Marcelo Caetano. A Associação viria mesmo a ser saqueada, à nossa frente, pelos esbirros do capitão Maltez e o sonho lindo foi adiado, com a raiva a subir.

O Fausto, já por essa altura, compunha coisas musicais bem interessantes, embora ele talvez se reconheça menos numa canção em que se falava de "meninos com olhos de cratera", com letra do João Bettencourt da Câmara, que então gravou num (hoje raríssimo!) 45 rotações. O mesmo Fausto que cantava nos "convívios" da Junqueira, em tardes em que o Tossán e o José Carlos de Vasconcelos declamavam o neo-realismo empolgado das poesias das "notícias do bloqueio". O Fausto que então namorou a Rita Vinhas, a mais bonita colega das nossas tardes do magnífico jardim e da "sala verde". (Um beijo para ti, Rita, que ainda há pouco tempo me perguntavas pelo Fausto).

Dois anos mais tarde, o Fausto e eu voltámos a ganhar as eleições para a Associação. E, dessa vez, para alguma surpresa nossa, o ministério não ofereceu quaisquer objeções à lista. Eu era presidente da Assembleia Geral e o Fausto era membro da direção. O ano académico foi muito turbulento. No meu caso, tinha mesmo sido objeto de um processo disciplinar.

No ano seguinte, apresentámos uma nova candidatura. E voltámos a ganhar. Só que, dessa vez, o presidente da Assembleia Geral cessante (isto é, eu) recebeu uma carta do Secretário-Geral do ministério, num tom muito formal, informando "V. Exa. de que a lista vencedora nas eleições para os corpos gerentes da Associação Académica do ISCSPU foi homologada por despacho de S. Exa. o Ministro da Educação Nacional". Tudo igual ao ano anterior? Não. O texto não acabava aí e acrescentava "... , com exceção dos senhores Francisco Manuel Seixas da Costa e Carlos Fausto Bordalo Gomes Dias, que estão superiormente impedidos de tomar posse".

A "medalha" de termos sido "não homologados" pelos dois ministros da Educação da ditadura já na sua versão marcelista, Hermano Saraiva e Veiga Simão (este último que o destino me levaria a cruzar à mesa do mesmo governo, um quarto de século mais tarde), ninguém nos tira, ao Fausto e a mim.

O Fausto, além de se dedicar ao ensino, teve a carreira musical brilhante que o país conhece. Construíu alguns dos álbuns mais notáveis da música portuguesa contemporânea e, amizades à parte, faz hoje parte desse (julgo) indiscutível "top five" que integra com Sérgio Godinho, José Afonso, José Mário Branco e Jorge Palma.

Lembro-o com muita saudade, na hora da sua morte. 

Iliteracia eleitoral

Nas eleições francesas, como é de regra nos sistemas eleitorais em que há circunscrições uninominais, é eleito à primeira volta o candidato que tenha mais de 50% dos votos expressos.

No caso de nenhum candidato obter esse resultado, haverá obrigatoriamente uma segunda volta, que terá lugar no dia 7 de julho. Quem passa a essa segunda volta? Passam sempre os dois candidatos mais votados nessa circunscrição na primeira volta, independentemente do nível dos seus resultados. Mas pode passar também à segunda volta um terceiro (e, teoricamente, mesmo um quarto) nome. Em que condições?

É sobre isto que anda aí uma grande confusão. Desde há dias que, na imprensa, em rádios e canais televisivos, se repete a afirmação de que podem passar à segunda volta os candidatos que, na primeira volta, tenham obtido um mínimo de 12,5%. de votos.

É falso! 

Para passar à segunda volta, um candidato tem de obter o voto de 12,5% DOS ELEITORES INSCRITOS nessa circunscrição eleitoral, NÃO 12,5 % DOS VOTOS EXPRESSOS. Ora isto faz uma imensa diferença, tendo em conta as abstenções. Por exemplo: se a abstenção, nessa circunscrição tiver sido de 50%, um candidato só passa à segunda volta se tiver obtido 25% dos votos expressos.

Como fazer passar esta mensagem?

Fausto


O fato claro era de quem tinha acabado de chegar de África, nesse final de 1968. O cabelo era standard para a época, com umas patilhas à maneira. Morreu agora. Morreu-nos a todos, à nossa geração. Lá se foi o Fausto, por esse rio acima. 

A questão

Não me parece justo criticar os outros por não votarem como nós. Temos de ser modestos. Partindo da óbvia evidência de que nós é que estamos certos - um princípio básico, na política como na vida - há que tentar perceber por que estranhas razões os outros não nos seguem...

Simples

Os números são claros. No termo da primeira volta das eleições legislativas, a esquerda francesa tem menos de 6% de votos do que a extrema-direita. Há cerca de 30% de votos nas mãos do centro e da direita democrática. Estes não conseguirão governar, mas estará nas suas mãos o futuro imediato da França. Respeitarão eles o princípio republicano (a expressão, em França, tem pouco a ver com o seu significado em Portugal) de barrar o caminho à extrema-direita ou serão tentados pelo abismo, pelo repúdio primário da esquerda?

Aviso à navegação

Dei comigo, pela primeira vez, a planear serenamente os meus dias. Para já, até dezembro. Não aceitarei escrever rigorosamente nada, pago ou de borla, salvo estes textos ligeiros para as redes sociais. Pelo menos até ao final do ano, não me peçam artigos, prefácios, posfácios ou depoimentos escritos de nenhuma natureza. E também não vou escrever nenhum livro, claro. Ah! E não vou estar disponível para dar aulas e fazer palestras, salvo nos escassíssimos casos em que já me tinha comprometido (não têm nada que agradecer). No resto, continuarei focado no trabalho nas empresas com as quais regularmente colaboro - e sinto-me muito bem e útil ao fazê-lo. Mas, além disso, o que vou fazer? Viagens? Nem por isso. Vou ler, muito. O meu programa de leitura até dezembro é ambicioso. E ouvir bastante música. E procurar estar mais com os amigos, sempre sem a menor agenda. Não me invejem: isto é apenas um sintoma de serena velhice. Embora alegre.

A rua

Imagino que para um eleitor francês conservador, que desteste a extrema-direita e não confie em Le Pen e suas descendências, o surgimento de manifestações violentas de rua, ontem organizadas em protesto contra o bom resultado dessa mesma extrema-direita, não deve ser um fator estimulante para o levar a um voto na esquerda mais-ou-menos-unida. A abstenção na segunda volta pode assim ser o destino da sua vontade política.

Não esquecer isto

Nestas horas de debate, a propósito das eleições francesas, sobre quem vai desistir a favor de quem parece esquecido o pequeno pormenor de que ninguém é proprietário do voto do eleitor. Os líderes podem aconselhar um sentido de voto, mas, à boca da urna, o cidadão votará sempre e só em que lhe der na real gana.

domingo, junho 30, 2024

Os eufemismos

Teve imensa graça ouvir há pouco Alain Duhamel, velha raposa do jornalismo francês, que sempre tratou o Rassemblement National como um grupo de extrema direita, usar o qualificativo de "nacional-populismo, saído da extrema-direita". A aproximação de um partido ao poder acaba por trazer estes efeitos.

Dois irresponsáveis da política contemporânea

 


Eleições em França


Ver aqui.

Agora

A esquerda francesa devia apresentar, desde hoje, um nome para chefe do governo que, simultaneamente, pudesse federar as suas fações e surgir como aceitável por quantos, no centro e na direita, se disponham a usar o seu voto, na segunda volta, para derrotar a extrema-direita.

Tentação da prosa


Recordo-me que, quando Luís Castro Mendes iniciou as suas crónicas semanais no "Diário de Notícias", fiquei com alguma curiosidade em perceber o tom que ele iria escolher no fixar dessa sua nova aventura na escrita. Conhecia-lhe já a prosa, a sua limpidez, a riqueza vocabular, o fluir fácil e elegante do estilo, saído de alguém para quem a produção de textos constitui um óbvio ato de prazer. Logo ficou claro que, por opção própria, iam ser crónicas abertas, sem tema fixo, no pleno exercício da liberdade do autor, ao sabor dos estímulos da conjuntura e dos humores do dia. Enfim, no verdadeiro espírito das crónicas num jornal. Desde muito cedo, dei por mim a pensar: isto, daqui a uns tempos, pode vir a resultar num livro muito interessante. Não me enganei, ele aí está. 

Diplomata por profissão e por vocação, o Luís manteve sempre uma segunda vida, que o acompanhou e que ele soube bem harmonizar com a primeira: a poesia. A regular produção poética, que já vinha da juventude, foi-o seguindo nas suas andanças pelo mundo, garantindo-lhe uma espécie de pouso de recuo lúdico que, para além de dever ser profundamente enriquecedor, é visivelmente fautora da sua realização pessoal. Digo isto porque nunca pressenti que o Luís fosse um poeta cuja pena se arrastasse por angústias e pela sofrida descoberta alambicada das palavras, tiradas estas a ferros, em horas penosas, olhando a folha branca. A sensação que tenho, até porque ele o confessa, é que o nosso autor adora cultivar a escrita poética e retira dela um prazer saudavelmente egoísta - e isto é dito no bom sentido -, antes de altruisticamente a fazer partilhar. E já lá vão muitos livros! 

Por tudo isso, o Luís não necessitava de uma experiência na prosa para se realizar na escrita. Mas este seu tempo na crónica, ao que sei sem minimamente lhe ter atenuado a vocação poética essencial, abriu-lhe um espaço complementar de intervenção pública. Para quem o conhecia menos bem, estas crónicas vêm revelar algumas facetas interessantes da sua forma de olhar a vida. Para quem o conhece melhor, estes textos ajudam a perceber o modo como ele vai encarando o mundo que evolui à sua volta. E não deixam de ser uma revelação. 

Habituado a uma infância e juventude itinerantes, por virtude da profissão do seu pai, o nosso autor veio também a escolher como destino uma atividade onde mudar de casa, de quando em vez, é uma das regras do jogo. Daí que as referências às viagens, às cidades, aos lugares, ao sentido saltitante de vida surjam, com frequência, em muitos dos seus textos. Se já na sua poesia isso era visível, as crónicas vieram a dar mais expressão a esse seu deslumbre pelos encontros com novas realidades, com contrastes e experiências. Dito isto, ao reler estas crónicas, constato que o Luís, embora sensível aos ambientes onde o percurso profissional o conduziu, preserva-se sempre bastante e opta por não "go native", fugindo ao tropismo dos que vivem a carreira diplomática deslumbrados com as cores da "National Geographic". 

Uma das curiosidades que eu tinha, na observação do início destas crónicas, era perceber o modo como o Luís iria passar a trabalhar, nos textos, a sua faceta de cidadão politicamente empenhado. Uma passagem breve pelo governo havia culminado, em termos institucionais, uma vida em que o posicionamento ideológico, se bem que nunca escondido, esteve sensatamente atenuado, por muitos anos, por óbvio dever de ofício. As crónicas permitiram fazer vir ao de cima alguém que se confessa ser na razão um radical, embora no temperamento seja um moderado. A esquerda corre-lhe nas veias, uma constante indignação com as quebras na decência cívica é visível na rejeição de um certo mundo que vive nos antípodas daquilo que ele sente como desejável para o Portugal de Abril, que desde há muito o orienta e o faz combater a indiferença. Com elegância mas com firmeza, as crónicas de Luís Castro Mendes zurzem, quando oportuno, quem ele acha que merece ser zurzido. E acha bem, digo eu. 

Dos textos, das citações e dos nomes, resulta uma saudável obsessão do autor em torno dos livros. Na vida do Luís, os livros, os livros lidos, estão um pouco por todo o lado: ocupam muitas horas e muitas estantes, fruto de uma desesperada e infrutífera tentativa, quase renascentista, de conseguir acompanhar o que de bom é publicado, aqui e lá fora, com a França bastante nesse horizonte. Devo dizer que, não estando próximo de muitas das suas opções temáticas, tenho uma infinita compreensão e solidariedade por esta angústia, que conheço bem, que arruina a bolsa mas ilumina os dias. Como fruto dessas suas experiências, o autor revela-se atento, cuidadoso e escrupuloso nas referências que partilha, dessa forma enriquecendo as crónicas e partilhando generosamente as suas leituras. 

Acabado o livro, fico com a sensação de que Luís Castro Mendes se assume, por inteiro, nestes seus textos. Quero com isto dizer, por exemplo, que ele não hesita em carrear para as suas crónicas a alegria da vida familiar, gozada neste seu novo tempo. Aqui ou ali, pode não disfarçar alguma melancolia que o avançar do calendário lhe traz. Mas, do que deixa escrito, resulta o retrato claro de quem se sente de bem com o que a vida lhe trouxe, ou melhor, com aquilo que nela soube e pôde construir. As crónicas de Luís Castro Mendes espelham alguém que olha os dias que aí vêm, para todos nós, já sem algumas das ilusões geracionais, mas com notas permanentes de esperança e de otimismo. E delas transparece uma imensa e invejável felicidade no usufruto daquilo que o presente lhe proporciona. 

(Texto do prefácio que fiz para "Tentação da Prosa", livro de crónicas de Luís Filipe Castro Mendes)

sábado, junho 29, 2024

Too late?


Clinton e Obama saíram em defesa de Biden, depois da desastrosa prestação deste, no debate com Trump. Para além da consideração pessoal e política pelo esforço do presidente, quererão dar nota de que já é tarde para encontrar um nome capaz de derrotar Trump. Se calhar, têm razão.

Baryshnikov


Desde há muitos anos, e até há minutos, vivia na convicção de que Mikhail Baryshnikov, o famoso bailarino com nacionalidade americana e letã, tinha nascido no mesmo dia que eu. Ele em Riga, eu em Vila Real.

Depois de ler a entrevista que hoje dá ao New York Times, constatei que, na realidade, ele é um dia mais velho do que eu. 

Olhei entretanto a fotografia com que o jornal ilustra a peça e concluí que essa diferença no calendário é uma evidência, tão óbvia, afinal, como são todas as evidências que nos confortam o ego.

(E houve quem levasse este post à letra! A ironia não tem vida fácil!)

Novas da guerra


Ver aqui

Eleições em França


Ver aqui.

sexta-feira, junho 28, 2024

Costa no triângulo europeu


Ver aqui.

A França e os judeus

Um dos fenómenos mais marcantes na atual política interna francesa está a ser a transição da clássica questão do anti-semitismo da extrema-direita para a esquerda radical. O tema, que foi sempre uma nuvem negra sobre Le Pen e os herdeiros do colaboracionismo, passou agora a manchar os setores da esquerda que criticam fortemente Israel e mantêm uma linguagem que alguns consideram equívoca sobre o Hamas. É muito curioso ver o Rassemblement National conseguir escapar ao tema e observar a atrapalhação de setores do La France Insoumise, perante o embaraço dos seus parceiros do Nouveau Front Populaire. A questão judaica é um dos temas mais penosos na sociedade francesa.

Costa em Bruxelas


Ver aqui

Carmo Afonso

A alegria com que, em alguns meios, foi recebida a notícia da suspensão da coluna que Carmo Afonso mantinha no "Público" só demonstra o saudável incómodo que os seus textos provocavam na direita da paróquia. E ainda torna mais suspeita a decisão do jornal.

Alexandra Leitão

Alexandra Leitão é uma figura socialista assertiva, cujo sucesso causa engulhos a muita gente. A descontextualização de uma sua frase, com um sentido perfeitamente óbvio, está a ser explorada de forma desonesta pelos seus inimigos. A política é também saber resistir à má fé.

Teoria

Há a tese de que a CNN, uma estação claramente democrata, estimulou a realização deste debate antecipado, que não tem precedente na memória eleitoral americana, para provocar um sobressalto nas hostes democráticas, como derradeira pressão para forçar a desistência de Biden.

Um sorriso no Kremlin

É muito tarde em Moscovo, mas acho que Putin não deu por mal empregado o serão.

Mentiras

O que é extraordinário na vida política americana é que um mentiroso compulsivo e despudorado como Donald Trump tenha conseguido, em horário mais do que nobre, engatilhar uma imensidão de falsidades e de exageros, sem ter sido minimamente "fact-checked" e denunciado. 

Surpresa

Não consigo perceber por que houve pessoas surpreendidas com a prestação de Biden. Terei sido só eu quem, ao longo dos últimos anos, sempre viu Biden com esta mesma postura, estas mesmas hesitações e lapsos, ilustrando à perfeição a palavra inglesa "frail"?

Bye, bye, Biden


Alan Katz, antigo embaixador americano em Portugal, escreveu, há precisamente dois anos, um corajoso artigo na "Newsweek", apelando a que Joe Biden se afastasse, dando espaço a um novo candidato democrático.

O debate de ontem provou que Alan Katz tinha toda a razão.

Trump


É importante ouvir o que Trump disse sobre a Ucrânia e a Rússia, tal como é muito significativo o facto de ele ter iludido a questão sobre o modo como a guerra pode terminar. Não fica a menor dúvida de que, se for eleito, proporá a Putin um acordo em termos favoráveis à Rússia.

Biden


Já me enganei algumas vezes, no passado, na política americana. Mas hoje reforcei a minha perceção de que Biden não conseguirá ser reeleito no dia 5 de novembro.

Depois do sono

Daqui a pouco, vou assistir ao debate Biden-Trump. Depois (espero que não seja durante...), vou dormir umas boas horas. Quando acordar e tiver almoçado, direi que penso.

Ganda capa. Grande verdade

 



Procurem...

Continuo a achar que não se deve pedir à senhora procuradora-geral da República para se demitir. A senhora dever ser demitida e já. A decência e a autoridade do Estado já deviam ter conduzido o primeiro-ministro e o presidente da República a esse gesto. Por que não o fazem?

Justiça

Devem ser lidas com atenção as declarações da ministra da Justiça sobre a intervenção que anuncia pretender fazer no Ministério Público. A sua importância será sempre proporcional ao desagrado que as medidas vierem a provocar, em especial nos usufrutuários mediáticos do costume. 

To Renew an opinion...

O mundo é muito engraçado. O Renew, o partido liberal europeu, votou favoravelmente o nome de António Costa para presidente do Conselho Europeu. Quem é vice-presidente do Renew? : Cotrim de Figueiredo, da IL. Sim, esse mesmo, que disse que nunca votaria a favor de António Costa. 

quinta-feira, junho 27, 2024

Manuel Fernandes


Tinha uma voz rouca, inconfundível. E tinha, entranhado, um imenso e saudável sportinguismo. Um dia, numa sala de espera da SIC, disse-lhe do gosto que tinha em conhecê-lo pessoalmente, a ele que quase não fazia ideia de quem eu era, mas a quem eu devia alegrias que não esquecia. Falámos uns minutos, já nem sei bem de quê. Morreu agora, com 72 anos.

Estranho

Há coisas estranhas. Consegui não ver um único debate nas eleições europeias em Portugal. Esta semana, já vi dois debates eleitorais em França, esta noite vou ver o Biden-Trump e ainda tenho que assistir ao Sunak-Starmer. 

António Costa


Escrevi isto aqui há exatamente cinco anos:

"Nos últimos três dias, passados com colegas de um projeto que envolve todos os Estados membros e instituições da União Europeia, recebi imensas perguntas sobre o “futuro europeu” de António Costa. 

Espontaneamente, várias foram as pessoas que me disseram que o primeiro-ministro português é, nos dias de hoje, uma personalidade muito respeitada na União, com o seu nome a ser crescentemente mencionado para um cargo dirigente na próxima repartição de posições cimeiras. A função de presidente do Conselho Europeu foi a mais referida."

Pelos vistos, era verdade.

A bem dizer...

Estejam atentos: daqui a dias, quando o Rassemblement National francês ganhar as eleições legislativas, o jornalismo "fofo" e algum comentariado "facho-friendly" vai deixar de usar o qualificativo de "extrema-direita" para o designar. Já o fazem, desde há uns tempos, com Meloni, notem bem.

quarta-feira, junho 26, 2024

Geórgia


Comprei este óleo na Geórgia, em Tblissi, há 20 anos. (Os picuínhas de serviço escusam de dizer que se escreve Tiblissi ou Tblisi ou coisas assim. Aqui é Tblissi). Nunca fez a unanimidade cá em casa. Sei lá bem porquê, lembrei-me hoje dele.

2 - 0


Eu continuo a gostar muito do António Silva.

Comuns


Que me recorde, o "The Economist" tem um histórico muito positivo, em termos de acerto nas projeções eleitorais na política interna britânica. Daí que seja muito significativo o que acaba de publicar.

Nesta previsão, os conservadores cairiam para cerca de metade ou mesmo um terço dos seus atuais deputados e os trabalhistas mais do que duplicariam a sua representação (com maioria absoluta folgada). Liberal-democratas e escoceses do SNP não contariam minimamente para o equilíbrio final. A única verdadeira curiosidade parece ser o resultado dos ultra-conservadores e populistas do Reform. O regresso de Nigel Farage à sua liderança trouxe um sopro de entusiasmo - e de desgaste correlativo dos conservadores -, mas a peculiaridade do sistema eleitoral britânico pode não recompensá-los em termos de mandatos.

Hollande


François Hollande, numa entrevista à BFMTV, apresentou aquela que, a meu ver, foi, até ao momento, a mais eficaz defesa da lógica do "Nouveau Front Populaire", de que é candidato a deputado.

Afinal...


Com o comportamento selvagem do "povo" pelas estradas da "Volta à França", quase atropelando os ciclistas e frequentemente obrigando-os a desvios, fica absolvido o nosso pessoal na Torre e na Senhora da Graça.

Os liberais no Mundo

Cotrim Figueiredo "constatant qu’il n’avait pas les soutiens requis, a finalement abandonné. Valérie Hayer a su convaincre certaines délégations de rester à ses côtés. D’autres jugeaient son concurrent potentiel trop à droite." - no "Le Monde", hoje.

... e há as exceções, claro!

 


The Tories Saga


Começou na liderança trapalhona de Cameron, que levou ao Brexit, no nem-carne-nem-peixe de May, na arrogância ofensiva de Johnson, na incompetência obscena de Truss, no chico-espertismo sem rasgo de Sunak. Acabou assim. 

A carta forte dos socialistas

 


Ver aqui.

Ainda a tempo...

 


As Europas


A propósito do destino próximo de António Costa, deu-me para repetir um post que aqui publiquei em 15 de fevereiro de 2013:

"Hoje, ao estacionar o meu carro na área da rua de S. Caetano reservada a algumas viaturas de quem trabalha no Centro-Norte Sul do Conselho da Europa, que atualmente dirijo, uma senhora parou em frente a mim e disse: "Eu conheço-o de qualquer sítio! É isso, vi-o na televisão! Trabalha 'na Europa', não é?".

Desvanecido com o reconhecimento, porque o nosso ego é afagado com maior facilidade à medida que avançamos (ou recuamos) na vida, disse que sim, e que agora trabalhava ali, numa estrutura do Conselho da Europa, como se podia ler na placa de estacionamento colocada na rua.

Sempre amável, a senhora inquiriu: "Essa coisa do Conselho da Europa é onde também trabalha o dr. Durão Barroso, não é?".

Desta vez com uma paciência cuja dimensão a senhora não era obrigada a adivinhar, expliquei-lhe que não, que o dr. Barroso não mandava nada por ali. E, para sua aparente surpresa, disse-lhe que o Conselho da Europa é a mais antiga instituição europeia, criada em 1949, muito antes daquilo a que hoje se chama União Europeia, que é "onde trabalha o dr. Durão Barroso".

A senhora agradeceu e disse que se lembrava de ouvir dizer, há dias, que o primeiro-ministro português estivera no Conselho da Europa.

Aí voltei a esclarecer: o dr. Passos Coelho nunca esteve no Conselho da Europa, que tem sede em Estrasburgo, ao lado do Parlamento Europeu, mas sim no Conselho Europeu, que é a instituição onde se reúnem os chefes de governo da União Europeia, geralmente em Bruxelas.

"Mas o Parlamento Europeu não é em Bruxelas? Tenho uma amiga que trabalha lá".

Aí, críptico, expliquei: "Tem razão, o Parlamento é em Bruxelas mas também é em Estrasburgo. Reune lá uma semana por mês..."

"Há-de concordar que isto é tudo uma grande confusão!", disse-me a senhora, sorridente.

Aí retorqui: "Ó minha senhora! Concordo em absoluto! Nem a senhora sabe da missa a metade..." "

António Costa


António Costa vai ser o próximo presidente do Conselho Europeu. Afinal, ainda há boas notícias!

terça-feira, junho 25, 2024

A liberdade de ser diferente

A Rússia revela a sua natureza repressiva ao proibir o acesso da imprensa ocidental. Confirma ter medo que uma "outra leitura" dos factos. E nós? Ao aceitarmos bovinamente a decisão da União Europeia de proibir o acesso aos canais russos, tivemos medo de quê? Os cidadãos são adultos e livres.

Queima

O ALDE, a ala mais à direita dentro do grupo liberal europeu, procurou explorar o mau resultado do partido de Macron e tentou contestar a atual presidência francesa do "Renew". O neófito líder dos liberais portugueses foi utilizado, como se diz em futebol, para "ir à queima". Viu-se já o resultado. Começa "bem" a IL no seu grupo europeu.

segunda-feira, junho 24, 2024

António


Há gente excelente e há gente genial. 

Um forte abraço, António! 

Carpe Diem


Ele, do norte, ao telefone, há pouco: "Já viste como o tempo anda depressa? Daqui a pouco, estamos na praia. Logo depois, "rentra" setembro e é um saltinho até ao Natal. Passa o ano e, num instante, mete-se o Carnaval, salta a Páscoa e já estamos a alinhavar o próximo IRS! E ainda não paguei este! Ufa!

Anne Lauvergeon


Há cerca de duas semanas, na excelente livraria "Passages", em Lyon, deparei-me com um livro sobre o qual tinha lido uma recensão elogiosa. Chama-se "La Promesse" e é assinado por Anne Lauvergeon.

Anne Lauvergeon é um nome muito conhecido e prestigiado no meio empresarial francês, com uma longa estada à frente da Areva, a grande empresa da energia nuclear. Recordava, ao tempo em que fui embaixador em França, que o seu nome tinha sido citado para cargos ministeriais no consulado de François Hollande. Dizia-se também que, ainda antes disso, Nicolas Sarkozy tentara recrutá-la, num dos seus movimentos de "abertura" governativa à esquerda.

Também sabia, vagamente, que Lauvergnon tinha trabalhado na presidência de François Mitterrand. O que eu desconhecia é que, no Eliseu, onde tinha entrado com 31 anos, havia sido "sherpa" para o G8 (sucedendo a Jacques Attali), chegando a secretária-geral adjunta. (Um outro secretário-geral adjunto do Eliseu "mora" agora por lá. Chama-se Emmanuel Macron). 

Também não tinha a menor noção de que, durante esses anos, ela tinha criado uma relação de grande intimidade com François Mitterrand, até à morte deste. É essa ligação, de amizade e grande dedicação pessoal, aparentemente sem dimensão carnal, que terá levado o antigo presidente a pedir-lhe que escrevesse este livro. E daí o seu título.

Trata-se de uma memória sentimental, mas é igualmente um retrato muito interessante do estranho e complexo mundo que Mitterrand foi criando à sua volta, desde a infância e os tempos políticos muito diversos em que se envolveu, com as suas redes de amigos e conhecidos, com as duas famílias paralelas que mantinha, com a gestão hábil, cínica, mas eficaz, dos seus 14 anos na chefia do Estado - tempo de mandatos imbatível O texto guia-nos também, como agilidade de escrita mas também com delicadeza, pelos dramáticos tempos de doença de Mitterand.

O livro está bem construído, o que é uma agradável surpresa. Lê-se com prazer e aprendem-se algumas coisas mais sobre a V República, tempo político francês de que há muito me tornei um viciado.

Tinha deixado o livro na minha pasta, no regresso de Lyon, onde lhe tinha ligeiramente "pegado". Ontem, agarrei as suas quase 400 páginas de um fôlego, com intervalo para o Alemanha-Suíça. Ah! E deixei outros livros que estavam no "pipeline" para trás, claro.

domingo, junho 23, 2024

Ucrânia


Se se sentisse alguma hesitação da parte de Paris, isso seria altamente significativo no equilíbrio do apoio europeu.

Ver aqui

Exemplo


Exemplo de afixação de propaganda eleitoral em escassos locais próprios, desmontáveis no termo das campanhas, em países onde prevalecem leis que proibem a poluição visual dos espaços públicos, onde os cidadãos não têm de ser agredidos com propaganda política no seu quotidiano.

Ronaldo (2)

Não me tinha apercebido de que abordar, com distanciação emocional e de forma crítica, a atual fase desportiva de Cristiano Ronaldo constitui um crime de lesa-pátria. Pois parece que é.

sábado, junho 22, 2024

Verdades

Hoje, as conversas oscilavam entre saber se a senhora tinha mentido ou se tinha sido miserável sujá-la àquele martírio. As duas coisas não se excluem: a senhora pode estar a mentir, mas não sei mesmo se será legítimo obter toda a verdade de uma mãe que está a passar por aquilo.

Dilema


Na TV Cine, está a dar o "Apocalypse Now - Final Cut". Nunca vi esta versão. São três horas. Tenho de optar: vê-la ou avançar em três livros que ando a ler. Eu digo quais são: o diário "Desoras" de Marcello Mathias, o "A Vida por escrito", de Ruy Castro, e  o "Hell and Other Destinations", de Madeleine Albright. 

O que é que eu posso ganhar em rever este filme, que já não conheça? Devo tê-lo visto aí umas cinco vezes, a primeira quando vivia na Noruega, duas outras em Luanda, poucos anos depois, num cinema ao ar livre junto à estação ferroviária, não longe do Hotel Presidente. A cópia era má, o som ainda era pior e o muito tempo que eu por ali tinha fez-me voltar ao cinema duas noites seguidas. É que ver um filme de guerra num país em guerra é mesmo outra coisa.

É isso! Já não vou ver o "Final Cut" do "Apocalypse Now". Há coisas a que, com a idade, sei que não voltarei. Há dias, numa paisagem deslumbrante da ilha Terceira, dei comigo a pensar: com toda a certeza, já não regresso aqui. Não senti a menor pena, ainda tenho tanta coisa para ver. Mas não será aquela vista ou este filme.

Facciosismo

Havia um conhecido dirigente um clube com nome de bairro lisboeta, juíz de profissão, que apregoava, sem vergonha: "quero que o meu clube ganhe com um golo depois da hora, em "off-side" (dizia-se assim), marcado com a mão". Estou certo que ele gostaria deste golo à (da) Turquia.

Ronaldo

Cristiano Ronaldo habituou-nos a criar uma sensação iminente de perigo quando a bola lhe andava por perto. Agora, em idênticas circunstâncias, dou comigo a conjeturar de que forma ele vai falhar o lance. Tenho muita pena, mas é o que sinto.

Real Gabinete


Portador amigo trouxe-me um exemplar do magnífico livro recém-publicado sobre o Real Gabinete Português de Leitura do Rio de Janeiro, que a respetiva direção teve a gentileza de me oferecer. O antigo embaixador português no Brasil agradece muito a atenção.

Recordo, nesta ocasião, o que, há poucos meses, escrevi para o "Jornal de Letras ", a convite de José Carlos de Vasconcelos, um artigo a que dei o título "O Real Gabinete no tempo". Ele aqui fica:

"Quando a vida profissional me proporcionou alguns anos como embaixador no Brasil, levava comigo a curiosidade de tentar perceber um pouco melhor aquela que havia sido a mais histórica e duradoura aventura migratória portuguesa pelo mundo.

Já conhecia, embora muito ao de leve, aquele país onde iria representar Portugal, mas sabia, como todos fomos educados a saber, que essa experiência fora única e deixara uma marca singular, em todas as dimensões, desde logo na língua.

A França, a América, a África do Sul ou a Venezuela, com a África colonial pelo meio, haviam sido algumas das paragens de destino de muitos e muitos milhares de compatriotas saídos do retângulo europeu, o mais das vezes pela pior das razões: pela necessidade.

Mas o Brasil era manifestamente um caso diferente e, fazendo parte integrante dessa experiência ímpar, havia uma obra - cultural e assistencial - de que havia ficado uma muito interessante marca edificada, em várias cidades do país. É que a comunidade portuguesa no Brasil, desde tempos idos, tinha cuidado em criar uma rede de acolhimento e acompanhamento das sucessivas levas dos portugueses que ali aportavam, que acabava por funcionar como uma imagem de prestígio para a própria presença dos que os tinham antecedido.

De toda esse património de memória, que consegui conhecer em toda a sua extensão, de Belém a Salvador, do Recife a São Paulo, com outras marcas menos significativas e algumas outras já desaparecidas ou em acentuado declínio, o Real Gabinete do Rio é um caso sem par.

Num edifício de desenho eclético, onde prevalece um neomanuelino com distorção transatlântica, que recorda um pouco a estação do Rossio ou o hotel do Buçaco, aí repousam centenas de milhares de livros em língua portuguesa, de que o Gabinete é hoje, a uma grande distância, o maior repositório existente fora de Portugal.

Infelizmente, o Real Gabinete não é muito conhecido dos brasileiros, nem sequer dos muitos turistas portugueses que, no Rio, lhe preferem o Calçadão, Ipanema ou o Leblon. Situado numa zona que veio a tornar-se algo periférica, só lentamente começa agora a surgir nos itinerários turísticos e culturais.

Em tempos idos, para os portugueses desafetos ao regime ditatorial que vigorou no seu país até 1974, o Real Gabinete representava também uma certa "colónia" de matriz saudosista, que tendia a confundir o respeito pelo nosso passado com a adesão a quantos utilizavam esse mesmo passado como arma de arremesso contra os que pretendiam forçar os caminhos do futuro.

Com o passar do tempo, as clivagens atenuaram-se. Foi com gosto que, quando vivi no Brasil, constatei ter-se criado uma relativa consensualização em torno do Real Gabinete, erigido em marca comum da presença portuguesa. O retrato de Salazar ainda anda por lá, mas é agora um fantasma que já não assusta ninguém. E caras bem democráticas da nossa colónia passeiam-se hoje por lá e frequentam-lhe as cada vez mais abertas atividades.

Em 2008, aquando das comemorações dos 200 da chegada da Corte ao Brasil, tomei a iniciativa de propor a realização de uma cerimónia no Real Gabinete, na presença dos então chefes de Estado dos dois países. Não foi fácil ver isso aceite pela parte brasileira, mas levei a minha teimosia até ao fim.

Recordo para sempre o olhar espantado de Lula da Silva, a observar, com visível deslumbre, aquele bizarro mas magnífico espaço, recheado de um património cultural cujo impacto no seu país ele seguramente não tinha experimentado até então. Nesses breves instantes, o antigo operário nordestino Lula da Silva, mas também o líder de um PT que sempre alimentou nichos de endémica lusofobia, bem como o presidente que sempre se mostrou simpático para com Portugal, todos eles, os três, se terão reconciliado um pouco com essa coisa sempre polémica mas incontornável que é o peso da História. A qual, goste-se ou não, foi comum."

sexta-feira, junho 21, 2024

O destino de Israel


Ver aqui.

As hipóteses de António Costa



Ver aqui

Os amigos de Putin


Ver aqui.

... e os factos!

Na guerra da Ucrânia, temos para todos os gostos. Uns: "A Rússia está a avançar, dia após dia, e a Ucrânia, não tarda, vai claudicar". Outros: "O vento mudou a favor da Ucrânia e, com o novo apoio ocidental, a guerra já inverteu o curso". E há também um pormenor chamado factos.

Onde isto chegou!

A miserável exploração do sofrimento de uma mãe para chicana politica transforma o parlamento num circo.

Fascismo nunca mais! (2)

No fascismo, a Emissora Nacional criou um programa que tinha por lema: "A verdade é só uma e Rádio Moscovo não fala verdade". Nos dias de hoje, emergem por aí opiniões censórias que parece quererem emular o fascismo. Ora cada um deve poder dizer o que quiser. É isso a liberdade.

Fascismo nunca mais! (1)

Que fique bem claro que, picardias aparte e preservado que seja o respeito pessoal mútuo, aprecio imenso a diversidade de opiniões no programa que, às 5ªs feiras, faço com Diana Soller e Agostinho Costa na CNN Portugal. Sem essa pluralidade, o programa não teria o menor sentido.

Um sincero obrigado, Sô Francisco


Numa noite de 1966, no programa de rádio escolhido pelo motorista, no percurso entre o Porto e o pavilhão dos Carvalhos, dentro de autocarro que levava a equipa de andebol da Faculdade de Ciências, em que eu era um esforçado guarda-redes, ouvi, pela primeira vez, "A Banda". Fixei bem a ocasião, sei lá bem porquê.

À época, eu não fazia ideia de quem cantava aquilo. O som era diferente daquilo que eu conhecia da música do Brasil - e, verdade seja, conhecia muito pouco. Nesse tempo, era aquilo que vinha do mundo anglo-saxónico que mais me interessava, à mistura com alguma música francesa e até italiana. O Brasil que estava na moda, por cá, era o primeiro Roberto Carlos, do "Calhambeque" à "Namoradinha de um Amigo Meu". Na nossa (única) televisão, passavam outros sons do Brasil, da importada Mara Abrantes aos dramas vocalizados roucamente pela Maysa Matarazzo. A Bossa Nova, que vinha já dos anos 50, só nos iria conquistar mais tarde.

A simplicidade de "A Banda" era magnífica. "A moça feia debruçou na janela, pensando que a banda tocava pra ela" era uma bela imagem. Começou aí, para mim, Chico Buarque de Hollanda que, nesse ano de 1966, tinha 22 anos e que agora tem 80. Deixo meu sincero agradecimento ao meu homónimo, pelo tanto que, desde então, nos deu. Eu sou, agora, como ele, "o velho fraco (que) se esqueceu do cansaço e pensou que ainda era moço pra sair no terraço e dançou".

Ouçamos uma vez mais "A Banda" aqui.

A Rússia, a Coreia do Norte e o Vietnam


Ver aqui.

Queijos

Parabéns ao nosso excelente queijo!  Confesso que estou muito curioso sobre o que dirá a imprensa francesa nos próximos dias.