quarta-feira, julho 03, 2024

Orbán em Kiev


Estive uma única vez numa conversa privada com Viktor Orbán. Foi em Budapeste, em 1999. Ele era então primeiro-ministro da Hungria. Impressionou-me logo o seu olhar. Um olhar "pesado" - é a palavra que me surge. Nos últimos anos, a evidente arrogância que transparece daquela cara tem vindo a acentuar-se. Há por ali um fácies que denota mesmo algum desprezo por tudo e todos quantos dele divirjam. Orbán tem a clara consciência de que a máquina da União Europeia (e um pouco a da NATO) está hoje refém da posição húngara. Já aprendeu que pode esticar a corda, embora só até um certo ponto. Perante um Europa assarapantada e empanicada com a situação ucraniana, com a unanimidade a ser requerida ainda para muitas coisas (e a unanimidade, nos tratados, só se reverte por unanimidade), ele sabe bem que não pode dizer que não até ao fim; sabe que, na soleira desse fim, Bruxelas irá comprar a sua saída da sala, para não prejudicar o ramalhete da posição esforçadamente comum. A conversa de Orbán com Zelensky - adorava "ser mosca" ali - prova, se ainda fosse necessário, a completa irrelevância atual das presidências rotativas. Orbán, nessa conversa, não representou minimamente a União Europeia: representou-se a si próprio e à heterodoxia da Hungria. E, com um mandato ou não, ter-se-á sugerido como uma ponte para Moscovo. Ao ter de recebê-lo, Zelensky mostra a sua fraqueza, talvez o seu desespero. Orbán é outro dos que está à espera de Trump.

4 comentários:

manuel campos disse...


É bem capaz de estar mesmo muita gente, mais do que se julga, à espera de Trump.

Uns para que ele lhes resolva um problema que não querem continuar a ter.
Outros para que ele lhes dê a desculpa para não terem que ficar com ele, numa de "Nós até queríamos, mas sem os EUA não dá".

Erk disse...

Não é fantástico como a extrema esquerda portuguesa também está à espera de Trump?

Não é demonstrativo como o programa dessa extrema esquerda alinha quase perfeitamente com o de gente como Orban, Putin, Trump?

Unknown disse...

Desespero, fraqueza? Não necessariamente.

J. Carvalho disse...

"extrema esquerda portuguesa"? Onde? É que não a vislumbro.

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