quinta-feira, maio 04, 2023

Na Haia


Leio que o presidente da Ucrânia faz hoje uma visita à Haia, à sede do Tribunal Penal Internacional. E, a propósito, lembrei-me de uma cena passada há quase 20 anos, em Sarajevo, a martirizada capital da Bósnia-Herzegovina, num jantar social a que estava presente, como convidado, um membro do governo daquele país.

O equilíbrio político na Bósnia-Herzegovina, um país resultante da fragmentação da antiga Jugoslávia, é muito difícil, dado que do executivo fazem obrigatoriamente parte representantes de três diferentes etnias, com um complexo historial de conflito entre si: bósnios, croatas e sérvios. 

O jantar, num agradável espaço ao ar livre, tinha um caráter relativamente informal. Como não podia deixar de ser, a conversa cedo derivou para a política.

A certa altura, veio-me à memória que numa das minhas visitas a Sarajevo, nos anos 90, tinha conhecido Jadranko Prlic, um membro do governo da Bósnia-Herzegovina, pertencente à minoria croata. Era um homem agradável e cordial, com quem eu havia criado uma relação de simpatia, reforçada por contactos posteriores na Grécia, onde ambos tínhamos estado a convite pessoal de Georgios Papandreou, de quem éramos amigos comuns. Perguntei por esse antigo ministro da Bósnia-Herzegovina.

Notei que o nosso convidado, muçulmano, ficou um pouco embaraçado, mas respondeu:

- Está na Haia.

Uma pessoa presente ao jantar, menos dada a interpretar, com a rapidez da nossa profissão, este tipo de informações, perguntou:

- Como embaixador?

Não sei se fui eu que me adiantei ou se foi o ministro que esclareceu que "estar na Haia" significava estar detido sob ordem do Tribunal Penal Internacional, neste caso para a ex-Jugoslávia, que julga os crimes de guerra e que tem sede na capital dos Países Baixos.

Mudámos logo de conversa...

Vim mais tarde a saber que Jadranko Prlic acabou por ser condenado 25 anos de prisão.

4 comentários:

Luís Lavoura disse...

uma cena passada há precisamente 20 anos

Há aqui uma coisa estranha. Há 20 anos, foi em 2003. Ora, de acordo com a wikipedia, Prlić foi condenado somente em 2013, ou seja, muito depois da cena narrada pelo Francisco. Como é possível que Prlić já estivesse na Haia dez anos antes de ter sido condenado?
Dar-se-á o caso de Prlić somente ter sido condenado dez anos depois de ter sido aprisionado?

Francisco Seixas da Costa disse...

Luis Lavoura. Eu NUNCA minto deliberadamente. A cena em Serajevo que relatei, e que tem duas testemunhas portuguesas vivas, ter-se-á passado em setembro de 2004 (e não 2003, como por lapso referi), segundo agora verifiquei. Se tivesse ido um pouco mais longe do que a Wikipedia, poderia ler este documento de 2004: https://www.icty.org/x/cases/prlic/tord/en/040730e-prl.htm onde está escrito isto: "On 5 April 2004, the accused were all transferred to the seat of the Tribunal".

Luís Lavoura disse...

Francisco, mas eu disse que você mentiu, deliberadamente ou não? Eu não disse tal coisa!

Só disse, e repito, que é estranho que Prlić estivesse na Haia em 2003, supostamente como prisioneiro, quando somente foi condenado dez anos mais tarde.

Luís Lavoura disse...

Salvo melhor informação, permito-me concluir, pois, que Prlić esteve dez anos prisioneiro na Haia sem condenação. O que nos diz volumes sobre os métodos e padrões de justiça aplicados nessa cidade por esse trbunal.

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