domingo, março 17, 2024

Nuno Júdice (1949-2024)


Poema 

Em um novo poema sobre a morte, sem me ter ainda convencido
de que, embora morto, algo permanecia no meu ser que partici-
pava da Vida e do movimento inumerável dos objectos batidos
pelo vento, afirmei que a Poesia me acompanhava.
Como se a Poesia fosse algo que eu nomeasse fisicamente… que tocasse…
E ao constatar uma impossibilidade objectiva, fiz uma experiên-
cia que a confirmou definitivamente: li tudo o que tinha escrito.
Foi como se não tivesse lido nada. Sem me dar conta sequer
de um estilo, de uma gramática, da própria língua… Foi
como se não soubesse ler.
Ao apresentar a narrativa exacta do que aconteceu, descubro
que também aqui não tenho nenhum objectivo, nenhum
pretexto, nenhum facto que justifique o poema. Mas ele
existe apesar disso. E é por isso mesmo que, sem arte
poética e sem argumentos, o apresento e mantenho.

(1972)

3 comentários:

Flor disse...

Que em Paz descanse.

Flor disse...

"......E se me disserem que tenho
excesso de peso, deixarei tudo isto em terra,
e ficarei só com a tua imagem, a estrela
de um sorriso triste, e o eco melancólico
de um adeus.
NUNO JÚDICE, in "Navegação de acaso""

Anónimo disse...

Ainda recentemente li e reli o seu livro "As máscaras do poema" que me ajudou bastante para fazer um trabalho acerca da poesia popular.
Faço votos que, agora, o seu espectro de morto de alguém que deixou belos poemas vivos consiga sobreviver entre os que virão.

jose neves

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