Um antigo colaborador de Aníbal Cavaco Silva escreveu-me esta manhã, notando não ter sido eu exato, num artigo que publiquei, quanto à ausência de visitas do anterior presidente a algum do locais da repressão da ditadura. E assinalou uma visita que Cavaco Silva fez ao forte de Peniche, em 2010.
A pessoa que me escreveu merece-me, de há muito, grande consideração pessoal. E, por isso, faço aqui o meu “mea culpa”: Cavaco foi, de facto, a Peniche, acompanhado do presidente da Câmara local e de um governante socialista, avaliar os projetos de obras de reconversão do forte, como a imagem ilustra.
Mas vou mais longe, coisa que ninguém fez até hoje, que eu tivesse notado. Vou transcrever, pela primeira vez, as palavras de Cavaco nessa visita. Elas aqui ficam, para a posteridade:
“É com alguma emoção que, como chefe de Estado do Portugal democrático, visito da Fortaleza de Peniche. Por aqui, pela prisão política que, por décadas, existou neste forte, passaram centenas de pessoas que sacrificaram a sua vida na luta contra a ditadura que, por quase meio século, se abateu tristemente sobre o nosso país. Um regime que perseguiu, prendeu e torturou, que conduziu Portugal a três trágicas guerras coloniais. Daqui, desta prisão, fugiram uma noite Álvaro Cunhal e alguns dos seus companheiros políticos, numa ação que ficou nos anais da luta da oposição ao Estado Novo. É a esses portugueses, de todas as convições políticas - anarquistas, comunistas, socialistas ou simples democratas e republicanos - que o chefe de Estado quer hoje deixar aqui uma palavra de gratidão, pelo seu honroso sacrifício, como construtores de uma liberdade que chegou nesse “dia inicial inteiro e límpido, onde emergimos da noite e do silêncio”, como Sofia de Mello Breyner cantou a data fundadora que foi o 25 de abril”.
A imprensa, preconceituosa como sempre, nada disse sobre estas palavras de Cavaco. Nenhum dos seus acompanhantes ao forte de Peniche as notou. Cavaco, ao que consta, terá mesmo ficado surpreendido ao ouvi-las sair da sua própria boca.
Mas eu, que quero sempre a História escrita com o rigor de um José Hermano Saraiva, aqui as deixo, na sua sólida inteireza.
Embora ainda me pergunte se o primeiro dia de abril não seria, talvez, a data mais adequada para as evocar. É que ainda estamos nos “idos de março”.
5 comentários:
Lamento, mas já vamos a 4 das Calendas de Abril
Excelente !!! Não sei qual é o melhor comentário para esta “trouvaille” :
A Diplomacia é a arte patriótica de mentir para o seu país, ou
Mentir é necessário por vezes quando se é bispo.
O primeiro não me recordo de quem é, mas o segundo é de Rousseau.
Excerto retirado da página da presidência.
E o "outro" diria: "!Se não visse, não acreditava!"...
Eu julgo que ele "teve" que ler este discurso, mas não foi o autor das palavras. Evocando o celebre Vasco Santana dirá "aonde é que eu já listo isto".
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