terça-feira, março 13, 2018

A noite arménia



“Pede uma mesa no andar de cima, junto à janela. Já não está tempo para se jantar na esplanada”, foi o conselho que dei, pelo telefone, de Lisboa. 

Aquele meu colega chegaria a Yerevan, na Arménia, ido de uma bela cidade europeia, um dia antes de mim. Eu iria daqui. Foi há cinco anos. Ao tempo, eu era diretor-executivo do Centro Norte-Sul do Conselho da Europa. Ambos intervínhamos numa determinada Conferência internacional. Combinámos jantar juntos no dia da minha chegada. Eu tinha-lhe recomendado um restaurante local.

“Como é que se pode saber, de fonte segura, onde jantar decentemente, lá em Yerevan? Se perguntarmos no hotel dizem-nos uma espelunca qualquer", tinha-se ele questionado.

“Onde se come quase sempre bem é no Ai Leoni. E não fica muito longe do nosso hotel”, respondi.

“Mas tu conheces Yerevan?”, surpreendeu-se ele.

“Conheço lá eu outra coisa! Marca uma mesa no Ai Leoni e vais ver que não te arrependes. O Bruno cozinha lindamente!"

O meu colega tomou nota e, com lógica, levou a minha sabedoria da restauração arménia à conta da minha consabida "mania" dos restaurantes e também dos tempos que eu tinha passado na OSCE - essa organização de segurança sedeada em Viena, cuja representação portuguesa eu tinha chefiado por alguns anos, e que tinha as confusões do Cáucaso, em particular a velha crise entre a Arménia e o Azerbaijão, por virtude do território do Nagorno-Karabakh, na sua agenda prioritária de interesses.

Dias depois, após umas viagens atribuladas, cada um ido do seu lado, lá nos encontrámos no hotel de Yerevan. E, perto do jantar, partimos, com um amigo francês comum, para o “Ai Leoni”, onde a nossa mesa estava devidamente reservada.

Não era muito longe, aí uns dez minutos a pé. Fui indicando o trajeto. “Conheces bem isto”, comentavam, à medida que eu apontava a direção do restaurante, pelas ruas da capital arménia. Eu servia de cicerone, até para as estátuas que íamos cruzando.

Entrámos finalmente no restaurante, a nossa mesa lá estava, chegaram os menus. O nosso amigo comum, francês, pediu conselho: “O que é que recomendas?” Desfiz então o embuste: “Eu? Sei lá! É a primeira vez que venho à Arménia!” 

E, entre gargalhadas, expliquei. Tinha descoberto o restaurante num guia que comprara em Londres. Depois, na internet, vi as fotografias do lugar, bem como o nome do “chef”. Com o mapa da cidade, identifiquei (e decorei) facilmente o trajeto, "apimentando" a história com uns monumentos que também vinham assinalados no guia. 

Contei-lhes então a história de um jornalista americano que tinha escrito um guia sobre um país da América Central, sem nunca lá ter posto os pés. Nos dias de hoje, tudo é possível!

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Agostinho Jardim Gonçalves

Recordo-o muitas vezes a sorrir. Conheci-o no final dos anos 80, quando era a alma da Oikos, a organização não-governamental que tinha uma e...