domingo, março 18, 2018

Aos domingos


Lembrei-me ao passar por lá, há pouco. Exatamente no local onde fui agredido, por uma primeira e única vez, pela polícia da ditadura (sou um “antifascista” sem história de repressão: foi uma simples bastonada num ombro, que nem uma “negra” deixou), no funeral de Ribeiro Santos, nasceu agora um “Subway”. É no largo com o nome desse estudante, assassinado por um “pide”, em 1972, aqui em Lisboa.

Mas o que é que isso tem de notável? É porque estamos na madrugada de domingo e, em todas essas madrugadas de sábado tardio e domingo a despontar, em Londres, no início dos anos 90, aí pela uma da manhã, eu saía de casa e ia invariavelmente a uma loja da “Subway”, perto da estação de metro de Gloucester Road. Comprava uma braçada de todos os semanários (já) de domingo, acabadinhos de chegar para venda: “Sunday Times”, “Independent on Sunday”, “Observer” e “Sunday Telegraph”. E, sempre, uma bela baguette de pão francês, crocante, acabada de sair do forno. O indiano de turbante que me vendia tudo aquilo olhava-me com um sorriso divertido, estranhando os meus gostos (cumulativos) de imprensa.

Regressava deliciado a casa, sacava do frigorífico uma cerveja, e ali ficava eu “na engorda”, com uma pilha de quilos de jornais, a ouvir música e a ler pela noite dentro, no andar de baixo da minha casa em Elvaston Place. Tenho uma memória boa das noites desses dias.

A imprensa dominical britânica era muito interessante, viva, com “caixas” e extraordinários comentários, numa bela escrita. A vida política local era então movimentadíssima, com Thatcher em declínio, Heseltine e Major à espreita, o “Labour” de Kinnock e depois de John Smith a tentarem a sua sorte no pós “block vote”, que só viria a sorrir anos mais tarde a Tony Blair, acomodado que foi Gordon Brown, com o liberais-democratas de Paddy Ashdown no seu eterno caminho das pedras. E havia o Iraque, e a Bósnia em chamas, e o IRA, com Adams e McGuiness por detrás, a pôr bombas, e a Escócia a pedir ”devolution” e Joe Bossano a berrar em Gibraltar. E a “bloody” Europa, com o odiado Delors, a guerra dos “opt out”. Uma festa! 

Passado o tempo do “respeitinho” a Buckingham, a contenção informativa foi-se diluindo e a imprensa - particularmente a de domingo - “soltou-se” face à família real, começou a tratar das escapadas de Diana, das gaffes de Fergie e, finalmente, dos amores de Charles e Camilla. Foi muito curioso ver essa mesma imprensa hebdomadária - a que correspondiam, respetivamente, na ordem atrás mencionada, nos dias normais de semana, o “The Times”, o “The Independent”, o “The Guardian” e o “The Daily Telegraph” - começar a posicionar-se, no estilo e na ousadia jornalística, já um pouco entre os tablóides e o estilo mais sóbrio dos “jornais-mãe”. Muito iria mudar, nos anos seguintes, nesse mundo em crise dos jornais de papel.

O nosso “Subway” de Santos nem deve ter o “Expresso”, ou mesmo o clandestino “O Sol”. Mas, verdade seja, a julgar pelas sondagens, com isto por cá está transformado numa pasmaceira política, só animada pelo inacreditável grupo de que Rui Rio se rodeou, para que é que são precisos jornais?

3 comentários:

Rui Oliveira disse...

Sr. Embaixador

Por que razão chama clandestino ao jornal "O Sol"?

Cumprimentos

Anónimo disse...

Pau que nasce torto nunca se endireita...

Anónimo disse...

"O nosso “Subway” de Santos nem deve ter o “Expresso”, ou mesmo o clandestino “O Sol”. Mas, verdade seja, a julgar pelas sondagens, com isto por cá está transformado numa pasmaceira política, só animada pelo inacreditável grupo de que Rui Rio se rodeou, para que é que são precisos jornais?"

O tripé governativo constitui por si só uma stand-up comedy, que lamentávelmente conduzirá a nova bancarrota típica dos governos PS (que apesar dos tiros nos pés do grupo que menciona),mas desta vez com um estrondo ensurdecedor!

No tempo do Salazar existia censura e líamos nas entrelinhas, agora com o actual governo os médias auto-censuram-se; uma "melhoria"(face ao estado novo).

Tudo corre no melhor dos mundos, salvo quando ocorre algum notícia "não controlada" e logo os comissários diligentes vão a correr apagar "os fogos"....

Agostinho Jardim Gonçalves

Recordo-o muitas vezes a sorrir. Conheci-o no final dos anos 80, quando era a alma da Oikos, a organização não-governamental que tinha uma e...