Algumas vezes, a pontual notoriedade dos embaixadores só emerge por motivos que nós próprios bem dispensaríamos. Mas que, nem por isso, deixam também de ser a razão pela qual estamos em posto e nele nos compete defender a imagem e os interesses do país. É o caso de "prestações" televisivas como a que fiz, há dias, na BFM Business, o canal de televisão económico-financeiro, e, ontem, na LCI, uma espécie de SIC-Notícias francesa.
Como não podia deixar de ser, foi a difícil posição portuguesa no quadro da crise internacional que esteve no centro dessas duas aparições. No somátório de ambas, tive oportunidade de reiterar:
- a intenção do governo português de não recorrer aos mecanismos europeus de ajuda financeira;
- o carácter muito rigoroso das medidas orçamentais recentemente aprovadas;
- o facto dessa aprovação ter sido feita depois de um acordo que envolveu as duas principais forças políticas do país;
- o facto de, entre 2005 e 2007, já termos feito uma contração do nosso déficite de 5,9% para 2,8%, isto é, mais de 3% - a comparar com os 2% que nos propomos fazer entre 2010 e 2011;
- a realização atempada de uma profunda reforma no nosso sistema de segurança social, que lhe assegura condições de sustentação no tempo;
- a circunstância do nosso défice face ao PIB, da nossa dívida face ao PNB e da nossa taxa de desemprego não terem divergências dramáticas das médias europeias e, em especial, das de outros países que ainda aparecem poupados pelo nervosismo dos mercados;
- o anúncio de um ambicioso plano de privatizações entre 2011 e 2013, com impacto importante sobre a redução da dívida e, por consequência, sobre o peso do serviço da dívida no défice;
- o não sofrermos das "doenças" financeiras (estatísticas pouco fiáveis ou disfarçadas, "bolha imobiliária", crise bancária) que afetam outros países que também sofrem dificuldades de financiamento.
- os sinais positivos da nossa balança comercial recente.
Em ambas as entrevistas, foi-me colocada a questão, bem francesa, sobre se as medidas de austeridade aprovadas podem vir a gerar desregulações sociais difíceis de controlar. Embora sem poder prever o futuro, e não deixando de reconhecer que o desemprego e as dificuldades económicas conduzirão naturalmente a algumas situações de tensão social, fui de opinião que a experiência histórica portuguesa não aponta no sentido de convulsões com impactos políticos diretos.
Uma coisa tenho deixado claro: não alimentamos teorias conspirativas e entendemos que os mercados se movem pela raiz natural da sua lógica - o lucro, seja a que preço for. Teríamos gostado, no entanto, de ver a atitude desses mercados - e das agências de "rating" que, frequentemente, os antecipam - basear as suas avaliações em números e em factos, não em perceções algo impressionistas. Mas, provavelmente, isso seria querer demais.