segunda-feira, dezembro 26, 2022

O tio de churrasco

O conceito de “tio de churrasco” é brasileiro (lá diz-se mesmo “tiozão de churrasco”). Trata-se de qualificar aquele familiar, normalmente mais idoso, que um dia cai numa reunião de família e se sente à vontade para soltar opiniões inconvenientes, sob o alibi da “autoridade” da idade ou do seu estatuto, dizendo coisas que já nem pressente como desagradáveis, mas que deixam as pessoas presentes constrangidas, ideias que confrontam “l’air du temps” ou o mínimo de bom senso.

O risco de cada um de nós se tornar num “tio de churrasco” é elevadíssimo, pelo que me policio sempre a mim próprio, antes que me “interditem”, quanto mais não seja pela criação de um embaraçante e penoso silêncio à minha volta. Mas, um dia, arrisco-me a ter esse infortúnio.

Ontem, contudo, tive imensa sorte. Numa jovial reunião de família, alguém sugeriu que duas das pessoas mais velhas, uma das quais eu, entrassem num jogo de debates: eram-nos propostas teses radicais, absurdas pelo seu caráter imperativo, cabendo a cada um dos dois, respetivamente, defender essa tese e atacá-la. Depois, essas mesmas pessoas colocavam-se exatamente na posição contrária, arrasando aquilo que tinham acabado de defender, supostamente com argumentos diferentes dos que tinham sido usados pelo interlocutor. 

O jogo foi divertido, a dialética soltou-se e cada um de nós dois teve a possibilidade de levar até ao absurdo algumas ideias que, num ambiente de conversa serena, nunca defenderíamos. A vintena de assistentes, entre as quais eu tinha uma dúzia de sobrinhos, “desculpou-nos” o extremismo das nossas doutrinas, tanto mais que, no minuto seguinte, nos ouviram dizer exatamente o contrário, com a mesma enfática “lata”.

Mas por que é que lhes estou a dizer isto, com evidente prazer? Porque, lá no fundo, de algumas das barbaridades que ontem por ali deixei ditas, transpareceu-me intimamente, sem que os auditores pudessem suspeitar, o “tio de churrasco” que já habita escondido em mim…

Conselho

E agora, estejam à vontade: o importante não é o que se come e bebe entre o Natal e o Ano Novo. Grave, grave é o que comemos e bebemos entre o dia de Ano Novo e o próximo Natal.

domingo, dezembro 25, 2022

Tanto fazia

Como era óbvio desde o primeiro momento, o assassino de Paris não pretendia matar especificamente cidadãos curdos, queria apenas mostrar o seu ódio aos imigrantes estrangeiros, em especial muçulmanos. A trágica ironia é que os mortos tanto podiam ter sido curdos como turcos.

Natal


O espírito de Natal dos pobres de espírito.

Café duplo


O senhor João trouxe as duas chávenas de café para a nossa mesa, ontem, ao almoço, na Imperial de Campo de Ourique. Quando fez menção de colocar uma das chávenas à frente da minha mulher, ela retorquiu: “Obrigado, mas eu não tomo café”. O senhor João optou então por pousar as duas chávenas à minha frente: “Eu sei que o seu marido, no fim da refeição, acaba muitas vezes por pedir dois cafés…” E ali ficaram as chávenas.

A cena seria banal, não fosse o conteúdo das chávenas não coincidir. Uma delas era café. O líquido que vinha na outra era um tanto transparente. A minha mulher não tinha notado que o senhor João tinha discretamente colocado nessa segunda chávena uma dose de Bushmills. Vende-se por aí tanto café e poucos se dão conta de que um dos melhores do mercado acaba por vir da Irlanda. 

sábado, dezembro 24, 2022

Almanaque

 


Gosto de oferecer livros no Natal. 

Na vida, quase sempre me aconteceu passar os Natais em Vila Real. (Isso só não sucedeu por três vezes: uma, em 1991, quando vivia em Londres, outra, em 2011, em Paris e, este ano, aqui em Lisboa). Por essas alturas, em Vila Real, começo por me abastecer com algumas coisas que o meu amigo Alfredo tem à venda na Livraria e Papelaria Branco. Como não encontro ali tudo o que quero, passo pela Bertrand do shopping a horas mortas (das oito às oito e um quarto, aquilo é um sossego) e compro o restante.

Gosto de oferecer livros, mas só quando isso é possível. Ontem, passei pela Ler, em Campo de Ourique, e comprei dois livros. Para evitar esperas (sou um comodista nato, intolerante com perdas de tempo, para quem ainda não tivesse suspeitado), pedi sacos e evitei o atraso dos embrulhos. Zarpei dali para as Amoreiras, para adquirir o resto que necessitava. Pois isso! Na Bertrand, estavam filas quilométricas. Na FNAC, idem. Vim-me embora. Desconfio que muita gente vai ficar sem livros oferecidos por mim neste Natal.

Há dois dias, na Férin, comprei o livro que a imagem mostra: um excelente estudo de António Araújo sobre a revista “Almanaque”. (São agora quase cinco horas da manhã de sábado e, com exceção da antologia de textos, já o li todo). Este livro é, como imaginarão, uma prenda de Natal. Para mim. Complementa três outros livros que, há dias, chegaram de França, pela Amazon. Foram também uma oferta a mim mesmo. 

Eu não lhes tinha dito que gosto de oferecer livros no Natal?

sexta-feira, dezembro 23, 2022

Evaristo Cardoso


Foram muitos os anos que levou a construir e consolidar o prestígio daquilo que hoje é o Solar dos Presuntos, um caso de sucesso na restauração de Lisboa, um lugar internacionalmente conhecido, que, há pouco tempo, recebeu o prémio Maria de Lourdes Modesto, anualmente atribuído pela Academia Portuguesa de Gastronomia a um restaurante onde se pratique e promova uma genuína cozinha tradicional portuguesa.

À frente do Solar dos Presuntos esteve, por muito tempo, o seu fundador, Evaristo Cardoso, um minhoto de Monção, que agora nos deixou. 

Fica aqui a minha sincera homenagem a alguém que recordo que sempre me recebia com o seu proverbial e amável sorriso. 

quinta-feira, dezembro 22, 2022

“A Arte da Guerra”


Esta semana, em “A Arte da Guerra”, o podcast sobre temas internacionais do “Jornal Económico”, falo com o jornalista António Freitas de Sousa sobre o que pode significar a deslocação de Vladimir Putin à Bielorrússia, o estranho “record” que constitui uma taxa de abstenção superior a 90% nas eleições legislativas na Tunísia e as tensões entre o Qatar e a União Europeia sobre fornecimento de gás.

Pode ver aqui.

Visão


Um belo número é o da “Visão” desta semana. Mas sou suspeito: meti por lá uma colherada escrita.

terça-feira, dezembro 20, 2022

Também

As pessoas que criticam António Costa pela forma menos feliz como se referiu à Iniciativa Liberal deveriam assumir idêntica exigência face ao modo incívico como esta força política agride publicamente Costa e o seu governo, através de uma propaganda visual insultuosa, rasteira e desrespeitosa, espalhada pelo país.

Portar

Muitos aceitam a imigração, “desde que eles se portem bem”. O grande teste à xenofobia é sempre este: estamos dispostos a aceitar os estrangeiros, mesmo que se “portem mal”? Tal como aceitamos os portugueses que se ”portam mal”?

Libé

Cada vez mais me convenço de que o mantra liberal tem uma imensa simplicidade: menos Estado, menor Estado e o que sobrar que fique ao nosso serviço.

“She”

Depois de ver os episódios da série de Netflix sobre os príncipes desavindos com a coroa britânica, cheguei a uma conclusão simples: a série devia chamar-se “She”. O jovem anda por ali, com ar aturdido, a fazer o papel de compère. Ela, sim, sabe o que quer.

segunda-feira, dezembro 19, 2022

Vistoria


No domingo, depois do jogo, fui fazer uma “vistoria” à minha terra. De há muito que, preferencialmente a horas mortas, faço um passeio a pé pelo centro da cidade, sempre que venho a Vila Real. Dizer que calcorreio desde o Cabo da Bila até à Câmara, passando pela Rua Central e pelas três esquinas do “slalom” intermédio (Rosas/Excelsior/Alarcão, Zézé/Santoalha/Ourives e Gomes), não deve dizer rigorosamente nada aos leitores deste espaço. Mas que se há-de fazer?! Embora seja difícil de acreditar, ainda há gente que não conhece Vila Real.

ps - o príncipe (por definição encantado) de penugem na cabeça que percorre o parapeito do castelo (na imagem), à porta de uma loja comercial da Rua Direita, há muito que perdeu o braço. A idade dos vila-realenses tem, aliás, um belo critério de medida: os que ainda se lembram do braço do príncipe e os que nunca viram tal coisa. A questão agora é outra: será que o príncipe, mesmo amputado, vai sobreviver às obras que por ali detetei, na minha “vistoria” de domingo?

domingo, dezembro 18, 2022

É isto, desculpem lá!

Não é popular dizer isto, eu sei, mas hoje é o dia em que, gostemos ou não (e eu não gosto), Leonel Messi fica consagrado, sem a menor dúvida, como o melhor jogador da atualidade e um dos três ou quatro melhores de sempre.

Pensando bem…

Sempre me escapou a racionalidade de um jogador protestar por lhe ter sido marcada uma falta. Até hoje, ainda não vi um árbitro a arrepender-se e dizer: “De facto, pensando bem, você tem razão: não havia justificação para eu ter apitado. Desculpe lá!”

sábado, dezembro 17, 2022

Casa do Baixinho



Como se lá chega não sei explicar, mas qualquer GPS ajuda a percorrer, a partir da A4 ou do centro de Paredes, uns escassos quilómetros até chegar à Casa do Baixinho, no nº 447 da rua do Paço, numa zona rural. 

Entra-se por um pátio onde, diz-me a dona Paula, a dona, no verão se come ao ar livre. Dentro, o ambiente é o que se vê e não difere muito de casas similares: pedra, madeira, lareira. Ah! E não há por ali ninguém “baixinho”. É o nome da quinta!

A lista é curta, mas as entradas são abundantes. Entre outras, somando o couvert, anotei queijo, presunto, salpicão, pataniscas, feijoada, cogumelos recheados, croquetes, entrecosto, rojões, azeitonas, moelas, pimentos, etc. Se resistir a tudo isto (resisti a menos de metade…), pode avançar para os pratos: há dois bacalhaus (escolhemos o folhado, com creme béchamel, que estava muito bom, havendo outro com broa) ou um naco com feijão preto e arroz. Às quintas, há arroz de pato. Ao domingo (só abre ao almoço), têm cabrito e vitela assada. Por encomenda (tlf. 255 785 808), há mais escolha. As sobremesas são variadas e debitadas pela dona Paula, mas podem ser vistas numa mesa no meio da sala, de onde discretamente surripiei uns figos secos.

A lista de vinhos, com o Douro naturalmente a predominar, não sendo deslumbrante, é muito aceitável. O preço final foi muito honesto, pelo que só posso recomendar uma visita. Permanece uma dúvida: quem terá sido o amigo que, há meses, me “receitou” esta Casa do Baixinho? Não é por nada, é só para lhe agradecer!

Não nos queixemos!

Devemos olhar para o lado antes de nos queixarmos. Há sempre outros, afinal, que têm menos sorte do que nós. Há dias, uma amiga, a quem eu dizia que, em 80% das vezes em que abro uma caixa de medicamentos, me sai o lado da bula, confessou, chorosa: com ela, acontece 100% das vezes. Muita sorte temos nós, afinal! 

Itamaraty

Vale uma aposta? Uma das primeiras iniciativas internacionais do governo Lula - com a China, com a Turquia ou com ambos - será uma tentativa de intermediação de um cessar-fogo, ou mesmo de uma negociação para a paz, na Ucrânia. Mesmo sabendo que isso não terá o mínimo sucesso.

Lugares da memória


Há hotéis onde se vai para passar uma noite. E há hotéis onde se volta para nos impedirmos de os esquecer.

Esplendor no verde


Se os proprietários deste café do Porto tivessem visto as tacadas de um bilharista que eu cá sei, na segunda metade dos anos 60, nas mesas do primeiro andar, não teriam fechado a casa. Ou talvez o fizessem, porque o bilharista, a bem d’zer, nunca foi grande coisa… A sério: não tenho saudades, só tenho pena.

sexta-feira, dezembro 16, 2022

Passagem à disponibilidade



Lá se foi mais um Embaixador...

País da aletria

Tive um despique, à saída de Coimbrões, com um camião de uma empresa, que teimava em não me deixar espaço na fila. Passei-o e olhei o nome: "Lingerie Ternurinha". Este país não existe!

Contradição

A grande novidade dos últimos tempos é o facto de um país como a Ucrânia estar a demonstrar algo que é quase contraditório: embora tema a Rússia, deixou de ter medo de lhe fazer frente.

Nomes…

Ninguém se surpreende que Zelenski seja a personalidade internacional do ano, na imprensa portuguesa (e não só). Que outro nome poderia ser? Mas há quem se espante com o facto de António Costa ser a personalidade portuguesa do ano. Repito a pergunta: quem poderia ser? Vá! Nomes!

quinta-feira, dezembro 15, 2022

Santos


Lá vai Fernando Santos à vida! Nada que surpreenda, depois da eliminação do Mundial. É dos livros que nada fica igual após um desaire, neste caso contra muitas expetativas otimistas. Há muita gente que acha que, com o “material” que tinha à sua disposição, ele deveria ter feito muito melhor. Não sei de futebol o suficiente para me pronunciar. Apenas direi que me pareceu ser um treinador para quem a cautela estava sempre à frente da ousadia. Agora, só peço que não ponham lá o Jorge Jesus!

"A Arte da Guerra"


A corrupção no Parlamento Europeu, a estranha tentativa de golpe na Alemanha e a crise política no Perú foram os temas abordados na conversa com o jornalista António Freitas de Sousa, no podcast do Jornal Económico, “A Arte da Guerra”. Ver aqui

quarta-feira, dezembro 14, 2022

Ora bem!


Jogo, jantar e, depois, este Jacobs pós-Jacobs que me chegou pela Amazon. A dia vai acabar pela noite.

Quando a Guerra Fria parecia ter acabado


A Guerra Fria, que durante décadas opôs os ocidentais, sob a liderança dos Estados Unidos, à União Soviética, atravessou, a certo passo, um período de alguma distensão, conduzindo à laboriosa negociação de um “modus vivendi” que tentou reduzir os riscos existenciais e estabelecer alguns canais de regular comunicação.

Foi no quadro da chamada CSCE (Conferência para a Segurança e Cooperação na Europa) que se procurou desenvolver várias “dimensões” de um diálogo entre o Leste e o Oeste, na tentativa de diluir antagonismos e fixar os pontos comuns possíveis entre aqueles dois mundos bem diferentes. Com o fim da União Soviética, a CSCE viria a institucionalizar-se na criação da OSCE (Organização para a Segurança e Cooperação na Europa).

A partir de 1994, a OSCE passou a ser a plataforma multilateral onde se tentou, e por muito tempo conseguiu, garantir uma linguagem comum sobre as questões de segurança no espaço euroatlântico e da antiga União Soviética. Mais de meia centena de Estados sentam-se, ainda hoje, à mesa dessa estrutura sedeada em Viena.

Em cada ano, a OSCE é presidida por um país diferente, que conduz a organização durante 12 meses. Há precisamente duas décadas, durante o ano de 2002, Portugal assumiu essa presidência. No final desse exercício, as conclusões propostas pela presidência portuguesa, que, como era de regra, passaram a ser uma “bússola” para o futuro imediato da organização, foram aprovadas por consenso pelos então 55 Estados membros.

Perguntar-se-á: mas, na OSCE, até então, as conclusões não costumavam ser aprovadas por unanimidade? É verdade, mas também é verdade que, a cada ano, esse exercício de harmonização de perspetivas estava a revelar-se mais difícil, pelo que será interessante destacar que acabou por ser com a presidência portuguesa que isso aconteceu pela última vez. 

Desde então, desde há 20 anos, o consenso desapareceu na OSCE. Nunca mais foi possível ter conclusões que contassem com o acordo de todos os Estados. Há dias, na Polónia, mesmo com a ausência forçada da Rússia (cuja delegação oficial foi impedida de participar na reunião final deste ano), a organização esteve muito longe de chegar a qualquer consenso.

Serve isto para dizer que quem conhece o mundo da OSCE sabe que a organização reserva ainda uma memória muito positiva desse trabalho da diplomacia portuguesa, concluído na reunião do Porto, em dezembro de 2002.

Caídos na rede

Foi a pandemia, foram os incêndios, foi o lugar do novo aeroporto ou a linha avançada da seleção. São sempre os mesmos, por aqui, pela redes sociais, sempre zangados, indignados, de adjetivo na tecla e no comentário. Por estas horas, nem imaginam o que eles sabem sobre alterações climáticas, sobre o que se “devia fazer” e não foi feito! É uma malta! 

Português de lá

O português que se fala no Brasil tem uma criatividade única. Chamar “revogaço” a um conjunto forte de medidas revogatórias de decisões anteriormente tomadas é uma extraordinária “trouvaille” semântica.

Na cidade de Niemeyer

O que me impressionou mais no ambiente de confusão (os brasileiros usam “baderna”) que se instalou nas ruas de Brasília é a cobardia das forças de segurança, o medo ou a relutância em impor a ordem democrática.

… e, depois, há Messi!

Percebo que alguns possam não gostar da equipa da Argentina. Mas não entendo que, quem goste um mínimo de futebol, não reconheça o génio, na atualidade incomparável, de Messi. A jogada e a assistência no terceiro golo contra a Croácia são extraordinárias.

terça-feira, dezembro 13, 2022

O dia


Não sei de estado da arte em outros lados mas, por aqui, a coisa começa a compor-se e ainda acaba num belo dia de sol a pôr-se…

Agenda muito doméstica

Dia “às pinguinhas”: reunião, 11:00, Marquês (“pode ser 5ª?”); almoço, 13:30, Campo de Ourique (“é melhor adiar, não achas?”); reunião, 17:30, Baixa (“temos de encontrar outro dia”); jantar de empresa, 20:30, à beira-rio (“cancelado”, diz a SMS). E o zoom das 16:00? Manter-se-á?

segunda-feira, dezembro 12, 2022

12.12.12


Faz hoje 10 anos, dia por dia. Eu era embaixador em Paris e preparava-me para "fechar" a minha carreira diplomática, no final do mês de janeiro de 2013, chegado à idade limite para prestar serviço no estrangeiro. 

Tinham decorrido quase 38 anos, desde que entrara para as Necessidades. Como antes já tinha sido funcionário público por quatro anos, decidi pedir a aposentação, a ter efeitos imediatamente após o meu regresso a Lisboa. Não recorri ao estatuto da "jubilação", que me faria andar pelos corredores do MNE até à idade em que seria obrigado a ir compulsivamente para casa, embora isso fosse financeiramente um pouco mais vantajoso. Queria ficar completamente livre, para poder fazer o que me apetecesse.

A minha reforma ia ser bastante baixa (embora muitos teimem em não acreditar, um diplomata tem sempre uma reforma baixa, porque não lhe é permitido descontar sobre o que ganha quando está colocado no estrangeiro). Tinha, contudo, assegurado já a possibilidade de dar aulas numa universidade privada (não podia lecionar nas universidades públicas, porque isso é incompatível com ser-se pensionista do Estado). Ia ser um apenas um modesto “part-time” que me ajudaria a arredondar os meses.

Porém, nesse dia 12 de dezembro de 2012, todos os meus planos de vida se alteraram.

Com intervalo de algumas horas, recebi três telefonemas de Lisboa. Vinham de três pessoas de áreas muito diferentes, que apenas tinham em comum a circunstância de todos terem lido na imprensa que eu me ia aposentar. Uma não me conhecia pessoalmente, com outra tinha tido apenas um breve contacto, da terceira era amigo. Cada um à sua maneira, os três disseram-me que gostavam de poder vir a contar com a minha colaboração, para aconselhamento estratégico, no âmbito das entidades que dirigiam - duas empresas e uma fundação. Todas essas entidades tinham uma ação internacional relevante. Em nenhuma delas iria ser um trabalho "from nine to five", mas sim reuniões e tarefas pontuais: análises de conjuntura, avaliação de riscos políticos em mercados, estudos prospetivos, com algumas viagens internacionais pelo meio. Eram propostas muito sedutoras, em todos os sentidos.

Apreciei muito os convites, o terem-se lembrado de mim. E aceitei-os. Sentia-me particularmente à vontade para o fazer, porquanto essas entidades estavam a convidar alguém que, no plano político, era público e notório nada ter a ver, em termos de proximidade, com o governo que, no nosso país, chegara ao poder, pouco mais de um ano antes. Aliás, muito pouco, no trabalho que eu iria fazer, tinha a ver com as atividades dessas mesmas entidades em Portugal.

Tinha conhecido muitos colegas diplomatas - noruegueses, britânicos, espanhóis, franceses, brasileiros, etc. - que, após se terem terminado o seu serviço público, tinham ingressado, com naturalidade, no setor privado, para iniciarem uma nova carreira, que pudesse aproveitar a sua experiência de décadas. Em Portugal, contudo, salvo uma meia dúzia (se tanto!) de casos, de que tenho o privilégio de fazer parte, não havia nem há essa prática de reaproveitamento profissional dos diplomatas. É pena. Acho que o setor empresarial português perde bastante com isso, embora eu seja suspeito ao dizê-lo. Por essa ausência de oportunidades, brilhantes colegas meus, acabados de sair de postos e de experiências valiosíssimas, passaram, de um dia para o outro, de uma atividade intensa para o passeio quotidiano do seu cão. No meu caso, eu nem sequer tinha cão.

Nos dias de hoje, continuo ligado, em pleno, a duas das entidades que me contactaram, faz hoje uma década. Com a terceira, concluí, há meses, nove anos consecutivos de agradável colaboração. Quem me está a ler compreenderá agora melhor a razão pela qual a data de 12.12.12 me diz bastante.

E o resto?

Faria muito bem à legitimidade do Parlamento Europeu se procurasse estar atento à ação de alguns deputados que ali funcionam como regulares “porta-vozes” e “influencers” em favor de certos regimes estrangeiros, mesmo que a paga, neste caso, possa não ser material mas apenas em “satisfação” pela cumplicidade política.

O Qatar a ver-se grego

A confirmarem-se, são bastante graves as acusações de corrupção que impendem sobre a deputada europeia grega e o grupo que o Qatar terá financiado para tentar edulcorar a sua imagem europeia. 

Teremos de concluir que Doha, com este episódio a somar-se a todas as controvérsias que antecederam o Mundial, não parece estar a ter um período de “relações públicas” muito brilhante.

Conversas em família

- É um escândalo, de facto! O dinheiro que esta deputada europeia grega recebeu do Qatar! Devia andar de Rolls-Royce!

- Mas quem é que quer andar de Rolls-Royce? Já pensaste o que deve ser estacionar um Rolls-Royce?

Rimo-nos os dois e, nesse instante, vi um lugar para deixar o Smart.

Bolas


Lídia Paralta Gomes, uma jornalista do "Expresso" cujo nome li hoje pela primeira vez, escreveu há pouco, em modo sinédoque, este "filme" do Euro que ganhámos: "Moutinho ganha a bola, dá para William Carvalho, este, com aquela leveza que ainda hoje traz no pé, passa para Ricardo Quaresma que devolve de primeira para João Moutinho. O médio vê Éder, entrega a bola ao avançado, que ganha posição a Koscielny e remata."

Gosto destes ritmos de balanço para a glória e, por isso, e para quem tiver idade para isso, trago aqui esta bela "peça" que, há meses, o Manuel Magalhães e Silva me recordou, bem de outros tempos, talvez do Nuno Brás: "Corre Hernâni, levanta a cabeça, procura a quem dar, amortece na coxa, arma o tiro, aponta, executa e ... golo".

O "falar" do futebol é uma arte de antologia. Conseguir dizer que um jogador "chutou com o pé que tinha mais à mão" ou que, como um dia disse o clássico Alves dos Santos, "lá vai o jovem Simões, agilidade na cabeça, inteligência nos pés" são tiradas que confortam a nossa alma de eternos adeptos da "modalidade".

Há "coisas" mais bonitas do que o futebol? Há e eu já fui apresentado a algumas. Mas a arte da bola é magnífica, desculpem lá!

domingo, dezembro 11, 2022

Um senhor do tempo


O Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas editou a obra de homenagem “Adriano Moreira - Para Além da Espuma do Tempo”.

Trata-se de um conjunto de textos que analisam a passagem por diversos palcos de intervenção de uma figura marcante da pedagogia e do pensamento estratégico do nosso país, que há pouco nos deixou.

Ao olhar o título desta obra, veio-me à ideia que o conceito do tempo esteve bastante presente na bibliografia de Adriano Moreira. Senão vejamos: “Notas do tempo perdido “, “O tempo dos outros”, “A espuma do tempo. Memórias do tempo de vésperas”, “Nunca é tarde para o homem”, “Futuro com memória”, “A nossa época”, “Este é o tempo!”.

É compreensível, para quem iria viver um século, esta atenção ao tempo.

À Alves Redol


Cá por casa, há uma secção de camisas chamada, desde há muito, “à Alves Redol”. Têm quadrados largos, cores diversas, algumas berrantes, a lembrar as camisas que o escritor vestia em fotografias, idênticas às dos pescadores e presumivelmente dos gaibéus, por mim compradas em momentos de completa insconsciência estética, deslize neo-realista ou, simplesmente, saldos a que não soube resistir. Nos dias de hoje, quase só as uso quando tenho a certeza de que não vou sair de casa, porque algumas são mesmo inapresentáveis. 

Há tempos, tocou à campaínha um amigo, antigo exilado em França, e, vendo-me com aqueles quadriculados largos sobre o corpo, exclamou: “É pá! A tua camisa faz-me lembrar Paris!” Paris? Porquê? Ele explicou: “Não te lembras da eterna montra da Casa de Portugal, na rue Scribe, no tempo do fascismo? Tinha sempre uma guitarra, um xaile de fadista, umas redes e um pescador com barrete e uma camisa como a tua. Isso ainda se vende?”. 

Embatuquei. Vou fazer a sugestão à Catarina Portas, para incluir as camisas de pescador - podia chamar-lhes “à Tenreiro” - no catálogo de “A Vida Portuguesa”.

Os verdadeiros artistas

Gostaria de lembrar que, se Ronaldo não deixa de ser um génio do futebol, tenha ele as birras e atitudes que tiver, o mesmo se aplica à classe técnica de Messi, apesar da sua detestável falta de desportivismo. A qualidade de um “artista da bola” supera tudo.

A jogar

A brincar, a brincar, o Qatar lá conseguiu que o futebol embrulhasse em relativo esquecimento os Direitos Humanos e as acusações que impendem sobre país. Isto não significa, contudo, que, no saldo deste Mundial, a sua imagem não passe a ter uma nódoa no imaginário mundial.

Quem gostarias que ganhasse o Mundial?

Perguntaram-me isto. A pessoa ficou espantada quando lhe respondi, muito sinceramente, que não sabia. Gostaria que Portugal ganhasse, claro, porque os cidadãos do meu país teriam ficado satisfeitos - e o bem-estar das pessoas que nasceram para cá do Caia é uma das medidas simplórias do meu patriotismo. Porém, afastado que foi Portugal (e o Brasil, ”my second and last best”), é-me indiferente, em absoluto, quem vai levar a taça. (Fiquei muito chocado com a falta de desportivismo da Argentina. Mas o facto de ter por lá o melhor jogador do mundo ainda em prova empata-me o sentimento). Nunca percebi por que diabo, sempre que há um jogo de futebol, temos de escolher um lado pelo qual “torcer”? Durante o Inglaterra-França, dois países onde vivi e fui feliz, onde tenho amigos e a cujas culturas (e livrarias!) estou muito ligado, não me senti minimamente a favor de um ou de outro. Ou melhor, tive pena que o Kane falhasse o penalti, mas apenas porque tal me permitiria ter mais meia hora de bom futebol. Mas confesso que me estou completamente ”a borrifar” para quem vá ganhar o Mundial. Gostaria é que as quatro partidas que faltam, e que verei com atenção (falhei alguns jogos, mas poucos), resultassem em jogos animados, com muitos golos e com excelente futebol. Só isso! A sério! 

p.s. - tenho a certeza, quase absoluta, que cada comentário a este post trará um país que o seu autor privilegia. É que não conheço muita gente que reaja como eu. E durmo lindamente assim, acreditem.

sábado, dezembro 10, 2022

Marrocos


Era uma mulher muito bonita. Chamava-se Christine Keeler. Morreu há cinco anos.

A história que vou contar - e que dedico à Célia Rocha e ao Frederico Alcantara De Melo, leitores desta página e testemunhas inconscientes do episódio - passou-se nos anos 70 do século passado.

Naqueles tempos, as chamadas “comissões mistas”, as visitas técnico-políticas de membros dos governos aos seus homólogos de outros países, para assinar ou cumprir acordos, demoravam vários dias, entrecortados de trabalho e de algum lazer. Bons tempos esses!

Estávamos em Marrocos, no início da minha carreira, e eu fazia parte de uma dessas delegações, chefiada por um político jovial e mundano, saído de uma área técnica que não vem para o caso referir.

Acabado o jantar oficial do primeiro dia, em Rabat, o nosso governante chama-me à parte e coloca-me uma questão: “Você é muito mais novo que eu, mas já ouviu falar do caso Profumo?”.

Eu conhecia bastante bem a história do ministro da Defesa britânico, John Profumo, que, uns bons anos antes, havia caído em desgraça, com grande escândalo público, por, em Londres, partilhar uma bela amante com o adido militar soviético.

Estranhei um pouco que a curiosidade prosseguisse, numa linha inquisitiva: “E lembra-se do nome dela?”. Com algum gozo, mostrei a minha familiaridade com a intriga política londrina e disse-lhe que ela se chamava Christine Keeler. Ele ficou satisfeito.

Mas o que eu não sabia, e ele logo me revelou com um sorriso cúmplice, é que, segundo informações seguras de que dispunha, Christine Keeler vivia então em Marrrocos, mais precisamente em Casablanca, onde dirigia nada mais nada menos que uma próspera “casa de meninas”.

Chegado a este ponto, o nosso político – que, diga-se de passagem, não foi muito longe na sua carreira governativa – lança-me o desafio: “Meu caro, você é um homem do mundo, lá dos Estrangeiros e agora vai ter de mostrar o que vale. Tem como missão arranjar maneira de, numa destas noites, eu dar um salto lá à “casa” da Keeler. Fale com o protocolo marroquino, eles estão habituados a estas coisas. E você, se quiser, até pode vir comigo. Tome bem nota: será um encontro com a História!”.

Caí das nuvens, confesso. Fiz-lhe ver que, andando nós com batedores, com uma delegação relativamente numerosa e enredados em compromissos oficiais vários, era um pouco delicado e difícil montar uma escapada lúdica daquele porte, para uma cidade a quase uma centena de quilómetros da capital. Mas o nosso político insistia e, praticamente, só não ameaçou queixar-se de mim em Lisboa porque, apesar de tudo, este tipo de tarefas não fazia parte, pelo menos obrigatória, da “job description” dos nossos diplomatas.

A minha discreta e pouco empenhada missão junto do protocolo marroquino não teve, porém, aquilo que se possa qualificar como um acolhimento entusiasmado. No entanto, para atenuar os fulgores do nosso político, lá se conseguiu para ele um programa alternativo, através de uma espécie de “room service” feminino, que a viúva de um antigo chefe da polícia de Rabat tinha à época instalado para clientes VIP, no hotel onde nos alojávamos. Do mal o menos e o homem lá se acalmou.

John Profumo morreu já há alguns anos, bem depois no nosso episódico governante. Christine Keeler, que morreu com 75 anos (na bela foto que reproduzo tinha 19), acabou por ganhar renovada fama, em 1989, com o filme “Scandal“, onde era relatada a sua aventura política de alcova. Não verifiquei, na autobiografia que publicou, os relatos das suas posteriores noites de Casablanca. Mesmo que o tivesse feito, e graças à minha lamentável imperícia diplomática, eles não poderiam incluir qualquer nota sobre a visita de um fogoso político português, nos idos da década de 70. A menos que outros por lá tivessem andado! Quem sabe?...

Hoje é dia para trazer esta memória de Marrocos. 

Glória

À volta do Telefunken lá de casa, em Vila Real, na transição dos anos 50 para 60 do século que teima em não me passar, o meu avô, o meu pai e eu, com as senhoras da família um pouco mais distantes, mas atentas, ouvíamos, com patriótica ansiedade, os relatos dos Portugal-Espanha ou Portugal-Itália que ditavam, nesse ano, o campeão europeu em hóquei em patins, modalidade onde, por uma vez, “éramos” (plural majestático da glória que estava mais à mão) bons. Perdíamos, ganhávamos, e, por uns dias, aquilo era um verdadeiro oxigénio moral. Depois, vinham os dias normais.

Amanhã, serão esses dias. Toda a vida me tenho interrogado sobre esta inevitabilidade de nos dedicarmos nervosamente ao absurdo das equipas, das cores, das pátrias. Mas tudo indica, seja lá por que for, que a vida é mesmo assim.

Aprender

De uma vez por todas, é preciso compreender que ter posse de bola não significa necessariamente controlar o jogo.

Brasil (2)

Há a regra não escrita, de mínimo bom senso, de que um ministro indigitado, mas que ainda não tomou posse, se deve abster de comentários públicos sobre as temáticas do seu futuro cargo. No Brasil, alguns titulares indicados por Lula estão já a “mandar bitaites”. Mau começo.

Brasil (1)

Há qualquer coisa no ar que me diz que os próximos vinte dias, no Brasil, podem não ser fáceis.

Santos da casa

Fernando Santos não é, na tática futebolística, o mais corajoso treinador do mundo - e isto é um óbvio “understatement”. Mas, na vida, como hoje o demonstra, é um homem com muita coragem e forte personalidade. Se se enganar, acabará hoje o seu contrato. Se acertar, logo se verá!

Senhor dos Passos

Sem clarificar nunca o seu “end game”, Pedro Passos Coelho adota a santanal atitude de “andar por aí” a falar. Assume um registo sebastiânico que reduz o espaço aos protagonistas de turno na direita. Vou dizer isto de forma elegante: Passos Coelho nem “atua” nem sai de cima…

Vizinhos

É num dia como o de hoje que nos devemos lembrar de que a distância entre Lisboa e Rabat é mais curta do que aquela que separa as capitais portuguesa e espanhola.

Guerras

A eventualidade de Alcácer Quibir e do rei Sebastião virem à baila por aqui, no dia de hoje, é elevadíssima.

Isto é miserável!

 


sexta-feira, dezembro 09, 2022

É a bola!


O Brasil foi eliminado pela Croácia. O futebol é isto. Achei o Brasil melhor, criativo e com um jogo muito mais interessante, uma equipa que, este ano, parecia ter a “estrela” para ser campeã do mundo. A Croácia foi teimosa, resistente, com a genialidade de Modrić a puxar pelo conjunto. No início da segunda parte, os croatas pareciam já não poderem “com uma gata pelo rabo” mas, com um guarda-redes excecional, conseguiram segurar o jogo. Nos penaltis, tudo é sempre possível! Um grande abraço de pesar aos meus muitos amigos brasileiros, que imagino desolados, neste momento. É a vida! É a bola!

O escrete do Planalto

Bons nomes anunciados por Lula para o futuro governo. José Múcio na Defesa é um “safe pair of hands”, Mauro Vieira no Itamaraty é um nome sólido, embora um pouco factotum de Celso Amorim. Haddad é um político de mão cheia e pode surpreender na Fazenda.

Eutanásia

Tenho muitas dúvidas sobre a questão da eutanásia. Mas já ouvi muitos bons argumentos a favor, por parte de gente por cuja opinião tenho muito respeito.

Spectator

“NHS waiting lists have reached a new record high of 7.2 million in England, figures released today revealed. Rishi Sunak last night attended a taskforce on trying to cut the backlog, which is expected to grow further.”

No sapato…

A maior prova de falta de imaginação, neste Natal, é oferecer livros sobre a Rússia, a Ucrânia e respetivas figuras.

Chama-se a isto presciência…

 


Se trabalhassem…

Os três episódios que a Netflix divulgou sobre a saga dos príncipes britânicos desavindos são uma obra-prima de promoção da senhora e de vitimização do casal. Parece serem uma almofada sentimental para a “pancada” na família real que virá nos próximos episódios. Se trabalhassem…

Feito ao bife!


Passei ontem por lá, pelo Café de São Bento, na hora noturna pós-espetáculos em que mais gosto de ir. Tinha lido que houve mudança de gerência e que iria haver alterações. Por ora, que eu desse conta, são poucas: algum pessoal novo mas simpático, aumento sensível de alguns preços e fim das meias garrafas de vinho (truque desagradável para promover o cada vez mais rentável vinho ao copo). O bife continua muito bom e essa é a medida clássica de uma casa onde, contudo, quase sempre nos esquecemos de que existem outros pratos. Por exemplo, o “strudel” de bacalhau estava excelente. O serviço continua com grande simpatia e profissionalismo, o que foi sempre uma marca da casa. Que as futuras mudanças não levem o Café de S. Bento a perder-se e a perder a afetividade de quem dele gosta, como é, de há muito, o meu caso, é tudo o que desejo.

Pois!

Ontem, um reputado médico e professor universitário português, que está longe de ter a menor simpatia por este governo, dizia-me: “Não consigo entender como é que a nossa comunicação social não esclarece que a situação que se vive nos serviços de urgência, por toda a Europa, não é muito diferente daquela que se passa em Portugal. Os serviços públicos de saúde, em França ou no Reino Unido, estão hoje numa situação pior do que aquela que se vive no nosso país e as operações em atraso atingem números extraordinários, muitos piores do que os nossos. E, no entanto, o tema, por lá, não costuma abrir os telejornais”.

quinta-feira, dezembro 08, 2022

País de marinheiros

 


человек года


Alguém já verificou quem será ”o homem do ano” para a Pravda ou para o Izvestia? Ou para o Sebastopol Times? Faço uma aposta…

O sal e a vida


Não estou a exagerar, garanto! Desde há décadas, de cada vez que, num restaurante, sou tentado a colocar um pouco mais de sal na comida, vem-me à ideia a figura, sorridente e de “papillon”, do professor Fernando Pádua, que, através da televisão, educou gerações de portugueses a serem parcos na utilização do cloreto de sódio, como forma de prevenir a hipertensão.

Fernando Pádua morreu hoje. O meu agradecimento pessoal pela sua lição de vida.

Eduardo


Um insuperável conflito de calendário impediu-me de estar presente na homenagem que ontem foi prestada a Eduardo Ferro Rodrigues, na Assembleia da República. Tenho muita pena de ter sido forçado a essa ausência e ele sabe isso. Teria gostado de poder dar-lhe um abraço, não apenas de forte amizade mas, igualmente, de sincero agradecimento pelo seu permanente exemplo cívico, pela impoluta figura de Estado que sempre foi, que muito honrou a democracia e a nossa geração. Fica aqui esse abraço, caro Eduardo.

quarta-feira, dezembro 07, 2022

“A Arte da Guerra”


A guerra e o petróleo, novo governo em Israel e os equilíbrios parlamentares nos EUA - três temas que, com o jornalista António Freitas de Sousa, desenvolvo em “A Arte da Guerra”, o podcast semanal sobre política internacional do “Jornal Económico”. 

Pode ver clicando aqui.

Falando de Cristiano Ronaldo


Cristiano Ronaldo é, a uma distância incomparável, o maior jogador português de todos os tempos. Com todo o respeito e imensa simpatia que me merece a figura do grande Eusébio, estamos a falar de “outro campeonato”. 

Cristiano Ronaldo tem disputado com Lionel Messi o título do melhor jogador do futebol contemporâneo. Eu, confesso, sempre hesito em escolher entre eles.

Cristiano Ronaldo está, a meu ver, entre os dez maiores jogadores de futebol de todos os tempos, num grupo onde, para mim, estão Messi, Maradona, Beckenbauer, Pelé, Platini, Cruijff, Di Stefano, George Best e Puskas - e talvez pudessem estar Eusébio, Bobby Charlton, Van Basten, Muller, Romário, Zidane, Ronaldo, Ronaldinho Gaúcho e uma meia dúzia de outros mais.

Cristiano Ronaldo levou e leva o nome de Portugal pelo mundo, num sentido positivo, granjeador de um apreço e simpatia que se refletem na imagem do nosso país. Temos de agradecer-lhe por isto. Os portugueses que andam por fora sabem bem do que estou a falar.

Cristiano Ronaldo demonstrou, desde muito cedo, uma vontade de auto-superação que o tornou altamente respeitado e um exemplo mundial de profissionalismo. Além disso, não obstante alguns deslizes de comportamento, Cristiano Ronaldo soube, por muito tempo, conduzir a sua vida pessoal com um apreciável equilíbrio, o que o tornou merecedor de grande admiração. Não deve ser fácil gerir um estatuto - profissional, mediático e sócio-económico - como aquele que hoje é o seu. 

Cristiano Ronaldo tem, nos últimos tempos, dado passos e assumido atitudes que não apenas contrastam com o perfil a que nos tinha habituado como o fazem entrar, por vezes, num inesperado registo de “prima dona”. E porque esse comportamento surge, precisamente, naquele que começa a ser o óbvio início do ocaso da sua carreira, fica a sensação, talvez injusta, de que ele não está a saber lidar bem com essa fase, trágica mas inevitável, do seu tempo profissional.

Porém, Cristiano Ronaldo, por tudo aquilo que foi, pelas alegrias que deu a quem, como eu, sempre apreciou imenso o seu percurso, é merecedor da nossa eterna admiração. E merece mais: merece que esse seu passado seja protegido e preservado de tudo quanto, de menos bom, o seu presente ou futuro possam vir a trazer.

Ventozelo


No dia 14 de dezembro, com o jornal “Público”, é editado um caderno das “Conversas em Ventozelo”, coordenado pelo professor Luís Valente de Oliveira, sobre os 20 anos do Douro Património Mundial, um trabalho a que tive o gosto de prestar a minha modesta colaboração.

Évora, capital europeia da Cultura 2027

 


Excelente escolha! 

terça-feira, dezembro 06, 2022

Pois é assim!

Ronaldo no banco. Tinha de ser. E se perdermos? Se perdermos? Perdemos.

Perejil

Quem conhece a relação entre Marrocos e a Espanha percebe bem o significado do resultado de hoje entre as duas seleções.

Pode ser isto

Bela síntese do “Financial Times”, na sequência do artigo de Olaf Scholz, primeiro-ministro alemão, na “Foreign Affairs”: “Germany is a case study of a western state that made a “strategic bet” on globalisation and interdependence — and was now suffering the consequences.. It outsourced its security to the US, its export-led growth to China, and its energy needs to Russia.”

Notícias de Kiev

Por simpatia ou mero realismo, dificilmente qualquer órgão de informação irá escolher uma “personalidade do ano“ que não seja Volodymyr Zelenskyy.

Só talvez a “Pravda” e o “Izvestia” se inclinem para um conhecido senhor do Kremlin. Ah! E “A Bola” para Mbappé, claro.

segunda-feira, dezembro 05, 2022

Que ferro!


Foram sete, contei-os bem, os livros que me apetecia comprar e não comprei, na passagem, depois do almoço, nas livrarias Bertrand, FNAC e Férin. Porquê? Nem consigo tempo para ler as resmas que tenho em atraso cá por casa, quanto mais juntar-lhes novos parceiros. “Que ferro!”, diria o Eça.

domingo, dezembro 04, 2022

Trump

Trump tenta, a todo o custo, regressar às notícias. Depois de um lançamento de recandidatura que caiu em saco roto, não despertando entusiasmo nas hostes republicanas, fez agora uma proposta para anular as eleições de 2020 e suspender a Constituição. E disse isto sem rir!

Vergonha

Se acaso não ficar evidente uma reação forte por parte das autoridades, o escândalo das condições de vida dos trabalhadores estrangeiros no Alentejo pode vir a ter um efeito reputacional negativo sobre o nosso país idêntico àquele que, no passado, ocorreu com o trabalho infantil.

Sobe e desce

Olhando a onda de críticas a Marcelo, cada vez mais me convenço de que o sentimento português pende para a ciclotimia: cansaço com as figuras seráficas, subsequente escolha de “porreiraços” e, depois, regresso ao primeiro modelo. Afinal, a democracia também é isto.

Irão


A realidade parece estar a ter muito peso. Há sinais de que as autoridades iranianas se preparam para desmantelar a “polícia dos costumes”, destinada a regular as práticas comportamentais em sociedade que possam infringir as regras corânicas. A ver vamos!

Jill Jolliffe


Acabo de ler a notícia da morte de Jill Jolliffe, aos 77 anos. Nela se diz que os seus últimos anos foram passados em Melbourne, num estado de crescente demência.

Conheci Jill Jolliffe nos anos 80, quando ela viveu em Portugal. (Escolhi, na net, uma fotografia com a imagem que dela recordo). Criámos uma boa relação, estabelecida já não sei através de quem. (Terá sido o Benjamim Formigo?) Almoçámos algumas vezes. Recordo que, invariavelmente, nos encontrávamos à porta do Palácio Foz, onde ela frequentava o ponto de apoio ali existente para os jornalistas estrangeiros e íamos comer para tascas na Baixa, que ela conhecia como ninguém.

Jill era uma jornalista australiana fortemente dedicada à causa timorense, num tempo em que o tema não mobilizava muitos setores portugueses. Era uma mulher com um sorriso suave, por detrás do qual se notava uma forte convicção. Tinha “uma história eterna com Timor”, como um dia me disse. Tinha andado por lá, testemunhou momentos dramáticos, escreveu sobre isso e dedicava-se abertamente àquela causa. Nas conversas comigo, procurava sempre sondar do estado de espírito da nossa diplomacia face à ocupação indonésia de Timor-Leste e ao apoio possível à guerrilha. Como eu, nas Necessidades, não tratava minimamente do tema, sabendo muito pouco sobre o modo como ele era abordado politicamente, nunca lhe dei nenhuma ajuda. Até um dia.

Um dia, Jill Jolliffe pediu-me um favor: se eu podia encaminhar uma carta de Xanana Gusmão para o primeiro-ministro de então, Cavaco Silva. A carta, que vinha aberta, era um pedido de material, de diversa natureza (recordo que incluia material de comunicações), de que a guerrilha necessitava. Fiz o que me pediu e obtive um contacto para ela poder fazer um “follow-up” do assunto. Nunca cheguei a saber se a carta teve uma resposta, positiva ou não. 

Várias vezes, nos últimos anos, me tinha perguntado sobre o que seria feito de Jill Jolliffe. Tal como em outras ocasiões já me aconteceu, acabo por saber da vida de alguém na altura em que recebo a notícia da sua morte.

sábado, dezembro 03, 2022

Taberna do Adro


Ainda antes de sair do bulício ruidoso e multitudinário do Alentejo, para regressar à calmaria desértica da paisagem urbana olissiponense, decidi passar por Vila Fernando. A aldeia, que já teve no seu centro uma instituição correcional para jovens, bem memorada na arquitetura ali construída, sofre hoje de um claro declínio demográfico. Não terá mais de 300 habitantes. 

O saldo populacional, contudo, aumenta um pouco às horas de almoço e jantar, por via dos utentes da “Taberna do Adro” (que fecha às quartas, desde já aviso). Pela mão hábil da Dona Maria José Sousa uma cara hoje muito popular para quem gosta de aprender culinária pela televisão, com o marido no “backstage” e o filho e o neto a oficiarem às poucas mesas, ali se apresenta uma cozinha alentejana tradicional, sem arrebiques nem efes-e-erres, a preços pré-guerra, num ambiente agradável e acolhedor. Miguel Esteves Cardoso fez-lhe adequada menção no “Fugas” e a nossa Academia Portuguesa de Gastronomia consagrou, há pouco, a genuina divulgação mediática da cozinha alentejana que a Senhora faz (40 programas, gravados em Madrid, já há uns tempos, contou-me).

Há alguns anos, tinham sido os alertas gastronómicos dos meus amigos Fortunato da Câmara e Fernando Melo que, respetivamente no “Expresso” e no “Diário de Notícias”, me tinham obrigado a anotar este endereço, onde a vida, contudo, ainda me não tinha trazido.

A experiência desta refeição trouxe-me agora à memória, gustativa e não só, outros tempos da primeira morada do Chana do Bernardino, na Aldeia da Serra, da época originária do Chico, em São Manços, ou dos alvores do Manuel Azinheirinha, no Escoural. Da lista, que não é longa, o que se saúda, ficaram por experimentar o pastelão de espargos, que a casa recomenda, a tomatada de galinha, o cachaço de porco preto e os pezinhos, e algumas sobremesas. E nem digo o que se comeu.

Onde fica Vila Fernando? Não fica longe de Elvas, não fica longe de Estremoz e não fica longe da A6. Como diz o “Michelin”, para aquilo que se recomenda, “vaut le détour”. Fá-lo-ei mais vezes. Deixo a capa da lista, debruada a pano. Fechada, para abrir o apetite de quem lê.

Estremoz, ora bem!

 


sexta-feira, dezembro 02, 2022

Azulejos



Joe Berardo é uma figura muito polémica, “to say the least”. Mas Berardo não é chamado a esta conversa (e agradeço que o não seja). Porque não é dele que quero falar agora.

O que hoje quero dizer é apenas que o museu do azulejo que leva o seu nome, no centro de Estremoz, merece uma visita e justifica mesmo uma deslocação à cidade.

Trata-se da exposição de dezenas de milhares de azulejos, de muitas e bem diversas origens e períodos, divididos por cerca de 40 salas, num edifício muito bem recuperado, com espaços onde as peças “respiram” bem. 

Fosse eu estremocense (assim se chama a quem nasce em Estremoz) e estaria muito satisfeito com este excelente ativo cultural da cidade.

Alentejo, pois

 


Alentejo, claro

 


quinta-feira, dezembro 01, 2022

“A Arte da Guerra”


Depois de uma semana de pausa, regressou “A Arte da Guerra”, o podcast com o jornalista António Freitas de Sousa para o “Jornal Económico”. Nesta edição, falamos da China e das reações públicas à política de ”covid zero”, das polémicas em torno do Qatar e da possível incursão militar turca na Síria. Para ver clicando aqui.

Outros tempos



Em outros tempos, hoje era sábado. Aos sábados, tinha saído o “Expresso” (que ainda não tinha saco e que agora sai às sextas). Porque era fim de semana (hoje não é), eu vestia calças de veludo cotelê e (às tantas!) camisola de losangos, que sempre tive por traje “oficial” do cliente das Pousadas. A sala da Pousada (esta é em Estremoz, mas podia ser qualquer outra) era assim. Há, no entanto, uma pequena e despicienda diferença: por esses tempos, eu andava na casa dos 30 ou dos 40 anos.

A diplomacia e a independência


A propósito dia que hoje se comemora, é bom que se saiba que está prestes a sair o livro “A Diplomacia e a Independência de Portugal”, com um conjunto de palestras em que tive o gosto de colaborar.

A glorious day!

 


“Andas no Larau?”



Um amigo, depois de ler por aqui algumas notas sobre uma passagem minha por Évora, telefonou-me ontem, à hora de jantar. Apanhou-me num restaurante em Estremoz, com imenso barulho. Fiquei com a impressão que disse: “Andas no Larau?”.

Fiquei intrigado. Eu estava, de facto, a jantar no restaurante Larau, mas como diabo sabia ele isso?

Na verdade, esse meu amigo tinha dito uma coisa mais prosaica: “Andas no laréu?”. (“Andar no laréu”, para quem não saiba, é andar na “boa-vai-ela”, andar na boa vida, sem nada fazer). Eu é que tinha percebido mal.

O Larau é a mais recente novidade gastronómica de Estremoz. Um restaurante muito agradável e criativo. Uma bela surpresa, que me tinha sido soprada por mais de uma fonte. (Já agora: Larau é o nome que se dá ao pano de sarapilheira utilizado na apanha da azeitona).

Há anos, Estremoz já tinha sido brindado com o surgimento do excelente restaurante que é a “Mercearia do Gadanha”. Depois, num “split” matrimonial deste, surgiu o “Alecrim”, onde se come também bastante bem. Sempre tive isso como uma “compensação” pelo facto de por ali ter desaparecido o saudoso “São Rosas”.

É que, em Estremoz, há muito que também vão os tempos áureos do “Águias de Ouro” e só resta mesmo a memória da típica “Adega do Isaías”, tão típica que cheguei a ali ver ratos entre os tonéis. (Dizem-me que o nome reabriu sob a batuta de Zé Varunca; lá terei de ir um dia!) Com o restaurante da Pousada fechado, sobrava, ao lado, a “Cadeia Quinhentista”, a que sempre resisti a ir, sei lá bem porquê. Fui lá hoje e comi muito bem! Fica a faltar-me a recomendada contemporaneidade da mesa do “Howard's Folly”. Numa outra vez será.

Agora, “ando no laréu…” Já não se pode vir “trabalhar” ao Alentejo sem suscitar comentários dos amigos! Tal está a moenga, hem!

Isto é verdade?