sexta-feira, março 10, 2023

Notícias do reino


O governo conservador britânico, pelas mãos do par de governantes de que aqui deixo um retrato, acaba de dar a conhecer uma das medidas mais discriminatórias, face a imigrantes, de que há memória na história democrática da Europa.

Sei lá bem porquê, lembrei-me deste episódio passado comigo, já lá vão uns bons anos, lá por Londres.

Foi em 2016, no caminho para o aeroporto, num “mini-cab”. Viviam-se os tempos anteriores ao referendo sobre o Brexit.

Perguntei ao motorista o que é que ele pensava da possibilidade do Reino Unido vir a sair da União Europeia.

O homem, de tez escura e sotaque iniludível, tinha ideias firmes sobre o assunto: nas últimas eleições tinha votado pelo partido anti-europeu UKIP, por achar que havia toda a vantagem em que o país abandonasse “essa coisa de Bruxelas”. E logo acrescentou: “Não sei de que país o senhor é, mas nós já estamos cheios de estrangeiros, não queremos cá mais”.

Expliquei que era português, mas que não vivia no Reino Unido. Ele comentou, pouco afável: “Há já cá muitos portugueses”.

Deixei “pousar” a conversa. “Onde é que nasceu?”, perguntei, minutos depois. O homem: “No Sri Lanka. Vim há 11 anos para cá. Tenho nacionalidade britânica”. Não me enganara e não resisti a comentar: “Como a rainha...” Calou-se.

Um cidadão da Comunidade britânica, como era aquele motorista, sentia-se “um deles” (lembrei-me da expressão clássica de Margareth Thatcher: “one of us”). E “eles”, sentiriam o mesmo?

Estrangeiro, para aquele homem, era um português ou um grego que, graças a “essa coisa de Bruxelas”, andava a disputar-lhe os postos de trabalho.

Semanas depois, no referendo, esse meu motorista ocasional iria votar “leave”. Ao seu lado, exatamente com o mesmo sentido de voto, iriam estar milhões de cidadãos nascidos e residentes fora das grandes cidades do Reino Unido. Essa sua atitude era, entre outras razões, o resultado dos crescentes receios contra a imigração, nomeadamente de pessoas como o meu motorista, o qual, por outro motivo, iria também ser favorável ao Brexit.

A graça do mundo é que ele nunca é linear.

8 comentários:

Francisco disse...

Diz o Francisco, que o governo conservador britânico acaba de dar a conhecer uma das medidas mais discriminatórias, face a imigrantes, de que há memória na história democrática da Europa. Estou de acordo. Falta talvez acrescentar, que esse esforço Britânico, vai ter, ao que tudo indica, uma comprometedora cumplicidade do lado de cã do canal.

Paulo Guerra disse...


Sobretudo o mundo do populismo! Num Ocidente sem jornalismo livre e independente que já não distingue causas e consequências na política com Trump também há beira da reeleição nos US! Está bonito o mundo pá! Já sobre o satélite de Londres completamente falido, esperar o quê? Depois de duas estrelas como o BoJo e a Liz Lettuce? O que me ri noutro dia com o BoJo na televisão a queixar-se que nunca o avisaram que o RU também dependia do petróleo russo?! Depois de anos a despejar milhões em armamento na Ucrania. E parece que o tipo também foi PM. Ou pelo menos ia às festas no nº10!

João Cabral disse...

É melhor morrerem na travessia? E os do outro lado continuarem a encher os bolsos com viagens em direcção à morte? E as ONG penduradas nesta tragédia? Vejam-se as coisas com olhos de ver. É muito fácil lançar o anátema da xenofobia e da discriminação, o difícil é o resto.

manuel campos disse...


A despropósito - ou talvez não - relembro que:

Brexit votes in the United Kingdom by age 2016
In the Brexit referendum of 2016, 73 percent of people aged between 18 and 24 voted to Remain in the European Union, compared with just 40 percent of people aged over 65. In fact, the propensity to have voted Leave increases with age, with the three oldest age groups here voting leave and the three youngest voting to Remain. Overall, 17.4 million people voted to Leave the European Union in 2016, compared with 16.1 million who voted Remain, or 51.9 percent of the vote to 48.1 percent.
(Published by Statista Research Department, Jun 24, 2016)

Entretanto as sondagens locais (estive a ver as da BBC) vêm mostrando que cada vez mais se acentuam estas tendências e que, as percentagens de jovens no "remain" e de idosos no "leave" aumentaram, polarizando ainda mais a situação.

Eu sempre ouvi dizer que o futuro é dos jovens, mas tenho andado certamente enganado, os idosos continuam a achar que é deles, um pouco por toda a parte.

Uma nota off-topic:
A CEO da TAP foi demitida em directo e com justa causa?
Em directo?
Com justa causa?
Aguardemos as cenas dos próximos capítulos.

Anónimo disse...

Pois claro! Emigração sem critério e sem
Controlo, não! Para que exista efetiva integração e vida digna,, dos que chegam, é exigível organização e controlo!

Anónimo disse...

A seguir é o Macron que embarca os tugas para o Chade ou o Mali!

Francisco de Sousa Rodrigues disse...

Lembro-me bem de ler este episódio.
Seria surpreendente se a Psicologia não explicasse estas coisas.

Luís Lavoura disse...

uma das medidas mais discriminatórias, face a imigrantes, de que há memória na história democrática da Europa

A União Europeia faz exatamente o mesmo que o Reino Unido pretende fazer: aprisiona em campos de concentração os imigrantes que chegam em barcos.

O Reino Unido diz que vai mandá-los depois para o Ruanda, mas é evidente que não vai, porque isso será muito complicado e caro de fazer.

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