Formam uma raça à parte, uma espécie de casta, embora pálida e sem turbante. Representam-se como o genérico lusitano de uma elite. Não se juntam muito entre si, porque são de tempos diferentes ou porque os feitios e os afetos os fizeram conflituar e, vá lá!, porque todos têm o individualismo como o único modo filosófico de vida que é “bem” adotar. Alguns já não vão para novos, outros assumem uma postura eterna de maduros, outros são velhos há muito, embora sem disso se terem dado conta. Todos, um dia, por qualquer razão, atravessaram a Mancha, graças aos cabedais da família ou à ajuda da Gulbenkian. Tal como Baptista Pereira chegava a nado às praias de Dover, as braçadas burocráticas deles levaram-nos até às ruas de Oxbridge. Nas bibliotecas da sabedoria, nos claustros dos “colleges” ou sob o fumo dos pubs cruzaram por ali nomes famosos. Que hoje citam, claro. Passarinharam por cursos que, por cá, nem se imaginavam, fizeram teses definitivas, que lhes adubam o currículo com que arrasam a concorrência. Começaram todos - mas todos! - na esquerda, a maioria vive hoje na esperança de que a direita os perdoe desse pecadilho pouco original, afadigando-se em contribuir para a sua instrução - com artigos, com livros ou apenas com dichotes, mais ou menos espirituosos. Ainda não se percebeu bem o que lhes irá acontecer com o Brexit. Às tantas, ficam apátridas. Nasceram em Portugal (ninguém é perfeito!), mas mantêm o coração nessa grã-ilha a que pertencem, por direito natural. Idealmente, a maternidade do St Antony's College seria o seu berço óbvio, mas têm de contentar-se com o facto de S. Sebastião da Pedreira figurar no seu Cartão de Cidadão. Alguns falam e vestem como acham que os ingleses devem falar e vestir. Quando atingidos pelos "blues" da vivência nesta "piolheira" que lhes caiu em rifa natal, à falta dos couros de Pall Mall, vão tomar chá à York House, pelas tardes pardacentas. Adoram Churchill e os Church's. Escrevem (às vezes, bem), bebem (alguns já tiveram melhores fígados) e todos resmungam (de preferência, por escrito) contra este país onde não há um "Spectator" capaz, este lugar que verdadeiramente os não merece - no que têm toda a razão: Portugal nada fez de mal ao mundo para ter de os aturar. São os inglusos. Não são nem ingleses nem lusos. São uma espécie de náufragos do autocarro, mas do tempo em que a Carris era britânica. Não passam de uns expatriados, não de cá, mas de lá. Era justo que Boris Johnson se preocupasse com eles.
7 comentários:
Cuidado que ainda o acusam de mandar alguém para a sua terra, Sr. Embaixador...
Eu, pela minha parte, que lamento o Brexit, penso que poderá haver ainda assim vantagens de não sermos obrigados a aturar certos hooligans que pululam pelas nossas esplanadas em ocasiões de jogos internacionais ou durante o período de férias. Que vão antes para Brighton ou Blackpool ajudar a Economia nacional deles que bem precisa...
Quanto aos nossos inglusos, a sua presença é-me um pouco indiferente, não frequentamos os mesmos lugares, e quanto aos seus queixumes, deixei de lhes ligar (e de os ler) há muito...
Brilhante « tableau » desses naufragados do Brexit. Bem observado. E que bela escrita! Nunca compreendi que Portugueses de gema possam ter uma tal admiração por um país, o RU, que foi capaz de enviar um ultimato ao rei de Portugal, acompanhado dum Mapa Cor de Rosa, para lhe roubar territórios, e tenha enforcado um dos seus patriotas no Forte de São Julião da Barra, que sacudia o jugo do ocupante …
Não sei se essa “gentry” nasceu antes ou depois do exílio do rei D.Manuel II para o RU após o regicídio do Terreiro do Paço.
E sabe, Senhor Embaixador, que conheço alguém, nascido em Cascais, que até tem no seu CV, como lugar de nascimento – Londres - porque fazia mais “british … Eu até gosto dum bom "scotch" e mesmo das caixas de correio inglesas (por causa da cor !) mas de là a mudar o nome de Guimaraes por Londres....never !
Sr Embaixador Há por í muito bafo de uísque!
Não sei a quem mais se refere este post, para além de João Carlos Espada.
Muito mais importante do que criticar os inglusos, que são uma espécie rara, é criticar todos os intelectuais portugueses atuais que de estrangeiro somente conhecem os EUA e o RU, e cuja filosofia é uma mera cópia de filosofias importadas desses países. A maioria da intelectualidade portuguesa atual considera que o estrangeiro começa e acaba nos países anglossaxónicos.
Por este andar, temos de "sanear" todos os estrangeirados que tivémos e hoje veneramos. Também eles se deixaram deslumbrar pelas luzes do exterior e detestaram a nossa "piolheira", que continua aí.
A piolheira continua aí, de facto. Como piolheira ;-) ...
Já não é a primeira vez que demonstra preocupação com estas pessoas.
A mim, sempre me chatearam mais os "afrancesados". Até porque muitas teorias nascidas em França - ou de franceses -, foram verdadeiros cancros para o mundo.
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