1. Por definição, a situação interna que se vive em países próximos e aliados deve merecer, da nossa parte, um tratamento muito prudente. E, por maioria de razão, quando se trata do nosso único vizinho terrestre, essa delicadeza aumenta. Mas maior é também, por esse mesmo motivo, a importância de que a Espanha se reveste para nós. Por isso, e ainda a montante do resultado das eleições que hoje têm lugar no País Basco e na Galiza, apenas gostava de deixar aqui expresso que a questão da "pulsão" independentista na Catalunha é um tema que, sendo espanhol, não nos pode ser indiferente. E quero afirmar aqui, como cidadão português e como amigo da Espanha, o meu desejo pessoal de que qualquer futuro do Estado espanhol passe pela preservação da unidade do país. É que julgo ser esse o interesse da Espanha e, muito em especial, tenho a certeza que esse é o interesse de Portugal.
2. Na Grécia, uma deputada do partido neo-nazi (curiosamente anti-alemão), com representação parlamentar, tratou os imigrantes no seu país como "sub-homens". Essa formação partidária defende, entre outras barbaridades, a expulsão dos hospitais gregos dos doentes imigrados estrangeiros, bem como os seus filhos das escolas. Nesta temática da xenofobia e do racismo, Portugal pode apresentar-se ao mundo como detentor de uma representação parlamentar onde, sem a menor exceção, os princípios da tolerância e do respeito pela diferença sempre foram observados com todo rigor. É um orgulho para a nossa diplomacia poder representar um país em que tais fenómenos não têm a menor expressão política organizada, sabendo-se, além do mais, que há um implícito e saudável consenso nacional no sentido de combater qualquer afloramento desse tipo de derivas.
3. O mortífero atentado que ontem teve lugar no Líbano veio demonstrar que o regime sírio, depois de ter conseguido "empatar" o jogo político-militar interno até às eleições americanas, demonstra que tem ainda força para poder ativar a influência de que sempre dispôs no xadrez político libanês, tentando assim aumentar a sua moeda de troca para o processo político que se vai seguir. Diretamente ou através do Hezbollah, Damasco tenta agora sacudir do seu território a pressão militar de uma oposição interna cuja segmentação não facilita o apoio do mundo ocidental. As bombas de ontem são a prova de que a Síria não vai permitir que as fronteiras libanesas possam servir de apoio aos insurgentes. E é bom que o mundo comece a preparar-se para enfrentar a possibilidade de que uma nova guerra civil no Líbano esteja aí de novo, ao voltar da esquina.
4. Por razões óbvias, sobre temáticas europeias, tenho vindo a ser muito parco nas palavras que por aqui escrevo. Apenas gostava de notar que o último Conselho europeu, que sempre foi considerado como de natureza transitória, teve a virtualidade de acabar por não infirmar as orientações do anterior e, embora com visível entusiasmo diferenciado na vontade expressa pelos "major players" (que se reflete de forma interessante nas respetivas Conclusões), manteve uma linguagem que não fragiliza, no essencial, o calendário previsto para a "união bancária". Há que reconhecer que alguma maior serenidade que a vida europeia começa a mostrar - talvez pelo termo das ridículas cimeiras "históricas" a que uma certa coreografia nos vinha habituando - fica muito a dever à sabedoria do Banco Central Europeu, cuja firmeza e determinação terão sido responsáveis por uma relativa confiança que foi induzida nos mercados, como a evolução dos "spreads" obrigacionistas no mercado secundário bem demonstra. Só pode desejar-se que, ao invés do que vulgarmente tem sucedido, do lado de alguns governos europeus não haja a tentação, num tropismo de expressão mediática para consumo político interno, de "sair-se" com declarações incendiárias, que prejudiquem os delicados consensos já obtidos.