quinta-feira, março 26, 2020

O Carlos Eurico e a pesca


Carlos Eurico da Costa, sucessiva ou simultaneamente, jornalista, poeta surrealista, publicitário

e gestor empresarial, morreu em 1998. Já por aqui falei dele, no passado.

O Carlos, que tinha a “qualidade” de ser meu primo direito, que acumulava com o privilégio que eu tinha de ser um seu grande amigo, era um caçador e um pescador de eleição.

À primeira das práticas, nunca teve coragem de sugerir que aderisse. No tocante à segunda, recordo uma jornada à beira-Tejo, algures a montante do Barreiro, nos anos 70, cujo insucesso, no que pessoalmente me toca, me permitiu ter um alibi para escapar a um vício que não tinha, assim podendo usufruir de uma imensidão de manhãs domingueiras na cama, nos anos desde então.

Sobre a primeira dessas artes, Carlos Eurico da Costa escreveu “A Caça em Portugal”, que quem disso sabe diz ser uma obra de referência. Sobre a pesca, não lhe conhecia nada escrito.

Até ontem, quando o seu filho Paulo me revelou um curto manuscrito em que o pai lhe dava dicas para pescar. É do tempo em que o Carlos tinha uma casa de fim de semana na Herdade do Pinheiro, a sul de Setúbal, por onde apareciam José Saramago, Cardoso Pires e “tutti quanti” de um mundo literário lisboeta onde se moveu desde sempre. É um texto quase poético, como o leitor avaliará:

Paulo

É aquela ágil e também mental forma de pressentir onde está o peixe: o vento, a cor da água, o seu revoltear, a sensibilidade para pressentir onde está a presa. “Cheira-se” o vento, regarda-se a espuma das águas nas rochas, a sua transparência. E depois - é pelo instinto. Olhar sempre as núvens e nunca estar de costas para o mar, para a onda. 

Agosto 89



2 comentários:

Anónimo disse...

Sempre fui um caçarreta, mais que amante da pesca de rio, como o meu pai, mas tenho os dois volumes de A Caça em Portugal do Carlos Eurico da Costa, obra indispensável em qualquer biblioteca de um aficionado das artes de Diana.

AV disse...

Belo texto, o de Carlos Eurico da Costa. E ainda dizem que os peixes não têm sentimentos.

Parabéns, concidadãos !