Os Campos Elísios, em Paris, estão hoje a ferro-e-fogo. O resto da França vive dias agitados, com centenas de milhares de manifestantes nas ruas. O que é que se passa? Que similitude tem isto com as manifestações de maio de 1968? Naquela altura eram os ”enragés”. Os novos “enraivecidos” são hoje estes “gilets jaunes”? Tal como há meio século, a pergunta coloca-se: o que é que, em concreto, querem os manifestantes?
Não parece haver uma resposta única. Aparentemente, a França é atravessada por um mal-estar generalizado, que não é de esquerda nem de direita. Várias das decisões governamentais, de natureza legislativa e administrativa, confrontaram-se com uma forte reação popular. Como resultado, o poder presidencial, que titulou essas decisões, é hoje contestado por muita gente, levando a figura de Emmanuel Macron a ter uma taxa de popularidade bastante mais baixa do que aquela que Trump tem nos EUA.
Quando foi eleito, a postura do novo presidente alimentou uma espécie de populismo “light”, pela deliberada vontade de criar uma espécie de ligação direta com as pessoas. Esse quase desprezo pelos corpos intermédios, dos partidos aos sindicatos, está agora a ter um elevado preço. Marine Le Pen e Jean-Luc Mélenchon, respetivamente da direita e da esquerda radicais, têm agora as suas tropas na mesma trincheira. É uma surpresa? Nem por isso. A coincidência de agendas estava a tornar-se, a cada dia, mais evidente.
Macron quis ser o interlocutor único dos franceses, “à la De Gaulle”. Isso funcionou bem enquanto aqueles que o elegeram ainda colocavam as suas esperanças no novo presidente - cara jovem, ar enérgico, com todas as soluções (aparentemente) na ponta-da-língua.
Depois, um dia, surgiu a dura realidade: o discurso de “modernização”, a tentativa de ”racionalização” da imensa máquina pública (num país em que a despesa pública representa metade do PIB), começou a ter um preço visível na vida de cada um. A ideia de Macron, de que é preciso fazer alguns sacrifícios no presente para ganhar vantagens no futuro, não rima com um país tradicionalmente imobilista, que vive de direitos adquiridos, pouco sensível à ideia de que a França tem de ganhar competitividade, sem o que não pode continuar a fazer “papel de rico” pelo mundo, no sistema capitalista em que escolheu viver e que a eleição de Macron sufragou.
Depois, um dia, surgiu a dura realidade: o discurso de “modernização”, a tentativa de ”racionalização” da imensa máquina pública (num país em que a despesa pública representa metade do PIB), começou a ter um preço visível na vida de cada um. A ideia de Macron, de que é preciso fazer alguns sacrifícios no presente para ganhar vantagens no futuro, não rima com um país tradicionalmente imobilista, que vive de direitos adquiridos, pouco sensível à ideia de que a França tem de ganhar competitividade, sem o que não pode continuar a fazer “papel de rico” pelo mundo, no sistema capitalista em que escolheu viver e que a eleição de Macron sufragou.
Muitas dessas medidas “de rigueur” (em França, esta expressão é sempre evitada no discurso político), estão a revelar-se, pela sua natureza, fortemente impopulares. Para as “vender”, Macron teria necessitado de as negociar previamente com a tal França intermédia, mas que ele desprezou e ajudou a fragilizar. Agora, ao tentar impô-las, de cima para baixo, soltou os demónios.
Hoje, o presidente que não era nem-de-esquerda-nem-de-direita tem nas ruas uma França que não é nem-de-esquerda-nem-de-direita. “Comment il s’en sortira? À suivre”.