quarta-feira, novembro 07, 2018

Uma vergonha


Tancos é uma vergonha. Começa por sê-lo para as Forças Armadas, cujas chefias não foram capazes de assumir as suas responsabilidades. A hierarquia de turno não soube tomar a decisão óbvia - demitir-se –, face a uma flagrante incompetência de gestão, não percebendo que assim colocou em causa a honra e o prestígio, nos planos interno e externo, das nossas Forças Armadas. Estas já provaram que são bem mais capazes do que a imagem que esta sua chefia conjuntural agora projetou. A coreografia disciplinar evidenciada após a revelação do assalto já tinha mostrado uma aliança entre o pior corporativismo e a inépcia, perante a gargalhada e o sorriso amarelo de um país que tem a sua “tropa” em bem melhor conta. O que depois se veio a saber sobre as moscambilhas da Polícia Judiciária Militar excede tudo quanto, de ridículo, se supunha plausível. Ora se as chefias militares não estavam, como era evidente, à altura da situação, o poder político teria feito melhor em tê-las “ajudado”, a tempo e horas, afastando quantos, ao menos por omissão, se revelaram abaixo dos mínimos exigíveis. O poder político - presidente e governo - deveriam ter sabido medir melhor a fronteira que existe entre o “tratar com pinças” os militares, atitude que faz parte da nossa cultura de gestão política no quadro do compromisso constitucional, e o custo público de uma longa e penosa hesitação, que acabou por ter o preço de um ministro da Defesa e que agora coloca o comandante-supremo numa escusada atitude defensiva. Mas este caso é, essencialmente, uma tragédia para a imagem do nosso sistema de justiça. Passa pela cabeça de alguém que um sistema judicial minimamente eficaz esteja, há bem mais de um ano, sem conseguir deslindar por completo uma historieta com meia dúzia de personagens, devidamente identificadas e cujas responsabilidades na tramóia são hoje bastante claras? Aquilo que temos vindo a assistir é um queimar de tempo, que uma comunicação social ávida de lama aproveita para esgravatar com ardor, que começa mesmo a adubar algumas ridículas teorias da conspiração, passe o pleonasmo, dando do funcionamento das instituições uma imagem de opereta. Será preciso ir buscar a “Fox Crime” para pôr tudo isto – mas rapidamente! – em pratos limpos, chamando os bois pelos nomes e atribuindo responsabilidades, doa a quem doer? Ou será que alguém está a apostar em que a comissão parlamentar se prolongue, com desgaste, pelo ano eleitoral - sendo esta agora a quota de “conspiração”a que também tenho direito?

7 comentários:

Anónimo disse...

Muito bem! Mas olhe que a maior parte da população não tem a tropa em boa conta - com ou seu Tancos. Há demasiados oficiais barrigudos (literalmente) a estragar o "quadro". Vivemos num tempo de imagem, as pessoas habituaram-se a ver, na TV e no cinema, o militarismo americano e esperam ver guerreiros aprumados. Quando são confrontadas com tipos passeando barrigas ou tacos de pia que pouco maiores são do que as espingardas, a imagem vai por água abaixo.

No seu contundente texto, só faltou chamar a atenção para o óbvio: a responsabilidade dos militares responsáveis pela área onde estavam os paióis. Então esses, os que mandam fazer as rondas, os que mandam arranjar as estruturas, esses, passam entre os pingos da chuva?!

Anónimo disse...

Concordo em absoluto com o seu texto !

Joaquim de Freitas disse...

“Numa sociedade, existem interesses e posições inconciliáveis, e o objectivo de uma democracia pluralista não é a busca do consenso, mas permitir que a dissensão se expresse, sabendo que existem posições sobre as quais não haverá acordo.”

Assim falava Maquiavel.

Leio assiduamente jornais portugueses e constato nestes últimos tempos uma conspiração surda, mas pouco a pouco bastante audível, contra o actual Presidente da Republica, Marcelo Ribeiro de Sousa, o homem sem partido, como se os partidos políticos da oposição, PSD e CDS, fartos de procurar brechas no actual governo de António Costa, e crendo tê-los encontrado e explorado a fundo, mas sem resultado aparente, pois que António Costa continua sólido no comando, resolvessem agora minar a posição do Presidente, que é um dos seus, pois que oriundo do PSD.

Esta manobra pode ser a prazo extremamente delicada e mesmo perigosa, na medida em que uma deriva populista pode desenhar-se a termo, como aconteceu nos outros países europeus, governados pelos sociais-democratas.

Claro que é um bico-de-obra para um partido social-democrata fazer oposição a um governo de esquerda, com duas componentes de esquerda radicais, quando na cabeça se encontra um Presidente saído das fileiras...da oposição.

Anónimo disse...

Lido com gosto.

Despacho:

Lá diz o ditado: Vergonha é matar e roubar.

O resto é só especulação desta politarrite que se apoderou desta nossa sociedade das grandes cidades. O que se pensará sobre tudo isto por Portugal fora. Pois... enquanto lhes derem circo e pão......
E assim se desacredita esta democracia que parece ainda uma república democrática das bananas.
Deferido com desgosto do assunto a observar.

[Dava muito para ler as informações dos Embaixadore acreditados em Portugal sobre este assusnto.]

Anónimo disse...

@ Sr. de Freitas.

Cuidado com as citações de Maquiavel pois para instituir as suas ideias teria de haver ditadura por todo o lado sem haver repúblicas democráticas no poder.
Se quiser saber sobre Maquiavel diplomata recomendo-lhe sobre as suas missões diplomáticas na Alemanha França:

L’ART DE LA DIPLOMATIE

Par Franck ABED le 3 août 2018 Chez Perrin

Anónimo disse...

Sito: “Passa pela cabeça de alguém que um sistema judicial minimamente eficaz esteja, há bem mais de um ano, sem conseguir deslindar por completo uma historieta com meia dúzia de personagens, devidamente identificadas e cujas responsabilidades na tramóia são hoje bastante claras?”, fim de sitação.

E se não for uma historieta?
E se não forem meia dúzia de personagens?
E se não tivesse havido roubo?
E se foi devolvido mais material que o roubado porque no depósito de destino havia material de outros “roubos”?
E se todos já souberem como aconteceu e ninguém souber como “descalçar a bota” devido à sua dimensão?
E se...
E se...

Anónimo disse...

@ Anónimo de 7 Nov 19:30.

Concordo.
Mas todos esses "ses" estão a demonstrar que finalmente esta democracia não passa, ainda, de uma república democrática, o que me dana e é grave.

Agostinho Jardim Gonçalves

Recordo-o muitas vezes a sorrir. Conheci-o no final dos anos 80, quando era a alma da Oikos, a organização não-governamental que tinha uma e...