domingo, outubro 06, 2024

Comemorar a República, sempre!


Nessas comemorações, e talvez não por acaso, tem sido dada uma ênfase muito especial às caraterísticas do regime parlamentar que, depois de 1910, foi instalado em Portugal, por cerca de 16 anos.

É natural que a sociedade que emerge do ato revolucionário seja a primeira a ser identificada com esse mesmo ato. Mas o que já acho menos natural é que se procure colar, quase exclusivamente, a imagem da República às dificuldades e peripécias que ela viveu nesses 16 anos, não olhando, com o mesmo cuidado, para o percurso futuro dos ideais republicanos no seio da sociedade portuguesa, nos 84 anos que se seguiram a essa experiência.

Ao deixarmos que as coisas assim se processem, não estamos a fazer nada mais do que aquilo que o Estado Novo, e outros inimigos da República, não tenham teimado em fazer, ao longo dos tempos, com uma pedagogia negativa, de diabolização das ideias republicanas e de ataque às forças partidárias, que teve êxito na mentalidade de algumas gerações.

É um facto que a I República portuguesa criou um regime que veio a revelar-se instável – embora convenha dizer, desde já, que muita dessa mesma instabilidade acabou por ser provocada pelos inimigos da República, pelos derrotados do 5 de Outubro, e que, igualmente, nela se refletiu a caótica herança deixada pelo regime que nesse dia foi derrubado. 

Há ainda que lembrar, porque alguns o procuram deliberadamente esquecer, que Portugal vinha de quase um século de objetivo declínio, enquanto país. A independência do Brasil, em 1822, que foi durante muito tempo a nossa verdadeira grande colónia, consagrou um momento de rutura, sem recuo, para os interesses económicos de Portugal. A morte do dom João VI marcou o fim do Antigo Regime, abrindo caminho a uma guerra civil muito sangrenta – a última que teve lugar em Portugal. 

A vitória do liberalismo, no fim desse combate de alguns anos, representou a tentativa de implantar uma primeira gestão democrática, com escrutínio parlamentar. Esse foi um momento muito importante de colagem do país à modernidade política. Mas o liberalismo acabou por não representar a salvação automática da Pátria.

Todo o resto do século XIX, bem como a primeira década do século XX, correspondeu a um período de forte conflitualidade político-partidária, de grande instabilidade governativa, de emergência de novos atores económicos e sociais, todos com ambições de representação no seio do sistema. Os vícios dessa primeira grande experiência parlamentar foram descritos, de forma insuperável, por Eça de Queirós, que ganharia agora em ser revisitado.

Mas os políticos e os seus partidos não foram os únicos intérpretes da representação e da coreografia prevalecente no regime de então. A benevolência histórica dos portugueses tende, quase sempre, a absolver os monarcas de responsabilidades nos episódios mais negros que ocorreram nesse período.

Mas convém sermos claros, de uma vez por todas: a memória dos reis que alicerçaram a nossa magnífica História, e que ao país prestaram serviços extraordinários desde a nossa existência como nação, foi muito mal servida pelas figuras que o final da dinastia de Bragança proporcionou ao país, enquanto monarcas.

Nestes últimos anos, temos vindo a assistir em Portugal à emergência de uma certa historiografia revisionista e saudosista, que tem procurado branquear as responsabilidades dos últimos monarcas portugueses, atenuando as acusações à sua falta de liderança, explorando um certo “glamour” que, no imaginário popular, se associa às cortes, às princesas e aos reis. Essa escola de fabricação de memória, que tem estado particularmente ativa neste último ano – em livros, jornais e blogues –, esquece deliberadamente o triste alheamento de alguns desses monarcas perante a degradação do país, o seu diletantismo e desinteresse face aos principais problemas que então atravessavam a sociedade, os escândalos dos adiantamentos financeiros feitos pelo erário à família real, a cumplicidade de monarcas com golpes autoritários, bem como a sua anuência com medidas repressivas já pouco comuns na Europa constitucional da época.

Foi nesse ambiente, onde se refletia a crescente incapacidade da nossa Monarquia para representar os interesses coletivos da sociedade e para sustentar soluções políticas capazes de superar as suas divisões, que se foram criando as condições para o florescimento das ideias republicanas.

Antes de ser um sistema político, a República era e é um corpo de princípios. Em Portugal, o republicanismo foi uma linha de pensamento que assentou, originariamente, na afirmação de uma espécie de ética nova de cidadania – numa sublimação, muitas vezes um pouco caricatural e radical, de princípios de organização social e de representação popular que se pretendiam regeneradores da visível situação de declínio que o país atravessava. E essas ideias foram tendo um crescente sucesso na opinião pública porque a Monarquia – aquela Monarquia – se mostrava já claramente incapaz de pilotar uma saída política para a crise portuguesa.

Por isso, é importante que situemos o projeto republicano português no mundo desse tempo, marcado pela prevalência simplista de algumas ideias da Revolução Francesa, pela crescente popularidade dos ideários de libertação social, que faziam caminho fácil num novo operariado e em classes urbanas, que tentavam consagrar a sua emancipação política. O radicalismo, alguma crispação e muita agressividade, levados aos extremos e potenciados pela rigidez do sistema, passaram a fazer parte integrante dessa doutrina, com que se procurava consagrar uma nova legitimidade, que pretendia devolver a sociedade aos seus cidadãos.

Acresceu ainda, no caso português, a revolta pela humilhação provocada pelo imperialismo britânico em África – o “mapa cor-de-rosa” -, que deixara claros os limites da fraternidade que o Tratado de Windsor proclamava.

Por toda a Europa – e Portugal não escapou a isso – uma cultura de violência ligou-se, assim, à ação política. No nosso caso, o regicídio de 1908 foi o tempo mais trágico na expressão concreta dessa conflitualidade.

Quero com isto dizer que o regime que sai do 5 de Outubro é um sistema político marcado por uma matriz radical que havia sido aculturada nas últimas décadas de um modelo decadente e já sem saída. A prova provada de que o problema residia, então, na própria Monarquia portuguesa é o facto da República portuguesa, ao ser implantada, ter acabado por ser apenas o terceiro regime de matriz republicana existente em toda a Europa, depois da França, em 1789, e do caso muito particular da Suíça.

A chefia do Estado, em todo o resto da Europa, permanecia ainda titulada por reis. E esse ponto também é muito importante para se entender a dificuldade da nova administração republicana de conseguir a sua aceitação e reconhecimento internacional. A classe dirigente de uma nova República, surgida num país pobre da Europa, tinha grandes dificuldades em falar, de igual para igual, com Monarquias ligadas por regulares alianças familiares.

Com exceções a confirmar a regra, podemos dizer que os regimes monárquicos sobreviveram em países onde os respetivos titulares, em momentos decisivos da sua história, souberam colocar-se do lado certo, representando os interesses profundos das populações e as opções corretas para a estabilidade das sociedades. Se olharmos bem para a História, verificaremos que cada uma das Monarquias existentes na Europa se justifica pelo facto dos seus titulares conjunturais terem sabido, no momento certo, afirmar com dignidade os interesses do seu país e do seu povo. E, a contrario, verificaremos que a imensidão de países que deixaram de ser Monarquias adquiriram o estatuto de Repúblicas muitas vezes pelo facto do seus monarcas, em épocas decisivas, não terem estado à altura de situações com que foram confrontados. Esse foi, claramente, o caso de Portugal. 

Mas voltemos ao 5 de Outubro.

O novo regime republicano que dele sai identifica-se numa ideologia burguesa e urbana que eleva elementos tido como caraterizadores de emancipação popular – de que o laicismo e a aposta na instrução pública eram os vetores centrais – a uma espécie de dogmas de uma nova cidadania, para além do culto e promoção de valores de solidariedade e de responsabilidade.

Essa marca da República, expressa na tentativa de impor um choque cultural a uma sociedade fechada, predominantemente rural, com grande influência clerical e muito presa a um Portugal tradicional, acabou por ser a fonte de muitos dos erros cometidos pelo novo regime, que atropelou frequentemente, nesse caminho vanguardista, valores como a tolerância e o respeito.

A ele se opuseram, contribuindo também para a sua rigidificação, não só algumas expressões mais reacionárias da sociedade portuguesa – de que o fenómeno proto-fascista de Sidónio Paes é o exemplo mais flagrante – mas, igualmente, os radicalismos esquerdistas, nas suas expressões anarquistas ou tributárias da nova ilusão soviética.

Se a tudo isto somarmos uma entrada mal preparada na I Guerra Mundial, com o louvável objetivo de salvar o que restava do império e da partilha da conferência de Berlim, mas que acabou por potenciar a acrimónia nas Forças Armadas, veremos que estava a ser criado, crescentemente, um ambiente para colocar Portugal pela hora da onda autoritária que então já ia atravessando muito da Europa.

O golpe de 28 de Maio de 1926 é apenas o corolário da mudança na relação de forças interna e na crença da regeneração por via autoritária – é sempre mais simples governar quando se calam violentamente os adversários. E até reduzir o défice!

Mas há uma coisa que devemos ter bem claro: os 100 anos da República portuguesa, ou da República em Portugal, não se esgotam nem se identificam exclusivamente com a experiência parlamentarista iniciada em 1910, esmagada autoritariamente em 1926. A nossa República está muito para além desses seus 16 primeiros anos.

A República está bem presente em todos quantos lutaram nas trincheiras do 3 a 7 de fevereiro de 1927, está nos combatentes exilados da Liga de Paris, está nas revoltas da Madeira, da Marinha Grande, da Mealhada, da Sé, de Beja, no assalto ao Santa Maria, nas audácias de Henrique Galvão ou Palma Inácio.

Está também na coragem dos que assinaram as listas do MUD e que, por isso, sofreram consequências em toda a sua vida futura.

A República está na vontade cívica que lançou as candidaturas de Norton de Matos, de Quintão Meireles e de Ruy Luís Gomes.

Foi a República que trouxe Humberto Delgado ali, à estátua de Carvalho Araújo – ele próprio um homem da República –, no final de uma manhã de 1958, de que fui jovem testemunha, pela mão do meu Pai.

Foi o espírito da República que sobreviveu e alimentou as lutas clandestinas que atravessaram o país durante as décadas da repressão do Estado Novo, nas prisões e nas deportações, de Peniche ao Tarrafal, nos exílios em França, no Brasil ou na Argélia.

Foram os ideais republicanos que mobilizaram jornalistas e escritores contra a censura, que estimularam as lutas estudantis e souberam criar uma espécie de contra-cultura que serviu de magma à mudança das mentalidades que foi fazendo o seu caminho nas novas gerações.

Foram os ideais republicanos que primeiro souberam evoluir, entre nós, na perceção da questão colonial, entendendo que os antigos paradigmas não tinham já espaço histórico e que era necessário respeitar o acesso dos outros aos direitos que para nós reclamávamos.

Aqui, em Vila Real, foram os ideais republicanos que, ciclicamente, mobilizaram, em condições de alguma perseguição e pretendido temor, algumas figuras de notável recorte cívico, aproveitando brechas que o Estado Novo por vezes se via obrigado a conceder. Quero lembrar, nesta ocasião, como símbolos dessa luta, os nomes de Otílio de Figueiredo e de António Cabral, que tive o privilégio de cruzar num desses exaltantes tempos da vida que valeram a pena.

E foram – uma vez mais – os ideais republicanos que animaram quantos, finalmente, se envolveram nessa aventura, magnífica e sem par, que foi o 25 de Abril.

De lá para cá, mais de 36 anos passados, continuam a ser os princípios republicanos a marcarem a nossa Constituição, a servirem de referente às liberdades que usufruímos, as quais estruturam o nosso sistema político, no qual se procuram, e serão encontradas, as soluções para a crises do nosso quotidiano.

A República, com todos os seus sobressaltos e problemas, continua a ser, entre nós, o outro nome da Liberdade.


(Intervenção que proferi em Vila Real, no dia 3 de outubro de 2010, nas comemorações da implantação da República)

sábado, outubro 05, 2024

As respostas de Pilatos

"Já assinámos o despacho e foi remetido ao senhor ministro das Finanças". A frase, no plural majestático do presidente de um partido que tem uma representação apenas singular no governo, foi dita pelo titular da Defesa, como "defesa" perante a não concretização de uma abertura de concurso para polícias. É uma expressão que revela uma imensa falta de solidariedade no seio do executivo, equivalente a dizer: eu já fiz a minha parte, peçam contas às Finanças pelo que falta fazer.

Durante muitos anos, no Ministério dos Negócios Estrangeiros, assisti a um "lavar de mãos" similar. Quando uma embaixada era contactada pelas autoridades do país onde estava acreditada, relativamente a uma determinada medida que se aguardava que fosse tomada pelo governo português, e fazia uma inquirição junto do MNE, a resposta era clássica: "Já transmitimos o assunto ao ministério competente, aguardando-se resposta". Irritava-me solenemente esta fórmula: o que é que a embaixada tinha a ver com a tramitação interna do assunto, no seio do Estado português? Estariam à espera que se fosse dizer ao governo do país: "Fiquem a saber que o nosso ministério, lá em Lisboa, já fez o que podia. A culpa não é nossa!"

sexta-feira, outubro 04, 2024

Antes deste ...

 ... tinha aqui publicado 13 mil posts.

Os touros de um país de anões

O país que (ainda) somos: além de Portugal, autorizam (ainda) touradas os seguintes países: Venezuela, México, Peru, Equador, França (em algumas regiões do sul) e Espanha (exceto algumas regiões). Também por cá já se lançaram anões...

... e o rei ficou sem jantar!


Faz amanhã 114 anos, dia por dia, o rei dom Manuel II devia ter jantado em Vila Real, como se constata pelo menu na imagem. 

Mas o rei não foi a Vila Real. No dia 4 de outubro de 1910, chegou a Mafra, pernoitando no palácio. No dia seguinte, dali seguiu para a Ericeira, onde embarcou para o exílio em Inglaterra.

Mas que diabo ia o rei fazer a Vila Real no dia 5 de outubro? Tratava-se de uma visita inserida na sua deslocação ao Vidago, onde ia inaugurar o Palace Hotel. E quem era o proprietário desse hotel? Nada mais nada menos do que o seu primeiro-ministro, Teixeira de Sousa.

Por essa altura, em Vila Real, os republicanos movimentavam-se. Na noite de 3 de outubro, juntaram-se no nº 44 da rua da Travessa que, com o tempo, viria a chamar-se de Avelino Patena. 

Era uma casa particular onde, com regularidade, ao que hoje se sabe, os conspiradores locais reuniam, em torno de gente da Maçonaria. António José de Almeida tinha ali estado, tempos antes, clandestinamente, numa dessas reuniões.

Em 2010, aquando das comemorações do centenário da República, eu era embaixador em Paris. O presidente da Câmara de Vila Real, Manuel Martins, convidou-me para proferir uma intervenção sobre a implantação da República em Vila Real. A cerimónia teria lugar em frente à casa onde a conspiração republicana local tinha ocorrido, com a inauguração de uma lápide a assinalar o facto, cem anos depois.

A noite, recordo, estava invernosa, mas tivemos muita gente a juntar-se no evento. Eu lá disse o que tinha para dizer (quem quiser saber o que disse, basta clicar aqui).

Revelei uma (para mim) curiosa coincidência, que quem me convidou desconhecia por completo: aquela casa, aquele nº 44 da rua de Avelino Patena, era o local onde eu tinha nascido, algumas décadas depois do 5 de Outubro de 1910.

Uma última nota sobre a imagem. O jantar não teve lugar, mas o menu ficou para a História. Alguém ofereceu um exemplar ao meu pai e hoje sou dele proprietário.

"Aqueles que ..."

O momento de indignação semântica que foi protagonizado pelo líder da bancada da extrema-direita parlamentar irá ficar, para sempre, como um dos momentos "cromáticos" da história daquele areópago. Vai rivalizar com "o coito do Morgado', imortalizado no poema de Natália Correia.

... no seu galho!

O senhor cardeal patriarca e o senhor presidente do Supremo Tribunal de Justiça teriam prestado um bom serviço às instituições que titulam se tivessem tido a sensatez de não se imiscuir nas questões políticas. O nosso STJ não é o STF brasileiro e o nosso cardeal não é o papa.

São todos o mesmo!

O governo do Passos tirou-nos o feriado do 5 de outubro. O governo do Montenegro empurra agora a data para um sábado e prepara-se para pôr o 1° de dezembro num domingo.

Esta malta do PSD é toda igual...

Nem no "Inimigo Público"...


Se isto é verdade, é uma vergonha inominável e fica qualificado irremediavelmente quem faz a chantagem. Se não é verdade, que tal seja já esclarecido por quem pode e deve, e que haja um pedido de desculpas ao almirante.

"Um Mundo Dividido"


No "Diário de Notícias" de ontem, a propósito da realização, nos próximos dias 10 e 11 de outubro, da 6ª Confererência de Lisboa, sob o lema 'Um Mundo Dividido", organizada pelo Clube de Lisboa, a cujo conselho diretivo presido, fui entrevistado pela jornalista Helena Tecedeiro, em torno de algumas questões atuais, à escala global. 

Para que estiver interessado, o texto dessa entrevista pode ser lido aqui.

quinta-feira, outubro 03, 2024

A casa dos Espíritos

Prescreveram vários processos que visavam o universo dos crimes do grupo Espírito Santo. Por que será que ninguém toma a iniciativa de criar uma comissão parlamentar de inquérito para analisar este imenso escândalo, verdadeiro insulto a quem foi lesado pelas trafulhices no BES?

Separação de águas

Criticar Israel, quando se entende que esse país merece ser criticado, ou denunciar o projeto político sionista radical defendido pelos seus governantes, não coloca ninguém, apenas por essa atitude, no terreno do anti-semitismo. Trata-se de coisas diferentes. O anti-semitismo - traduzido por atos de ódio e a perseguição a judeus - é, esse sim, um crime de racismo, exatamente como o é a islamofobia, uma atitude similiar face aos muçulmanos ou islâmicos. E o crime de racismo é sempre punível por lei, podendo levar à prisão. Repito, para que se não esqueça: atos contra judeus ou muçulmanos. Está claro?

Outros tempos

Sou do tempo em que os entendimentos políticos em torno dos orçamentos se não procuravam, em altos berros, à borda dos tanques onde se lava a roupa suja. E não desgostei desses tempos.

Irresponsabilidade

Eu não, eu não fico mesmo nada contente com a perspetiva de o país poder ir de novo a eleições. Acho de uma imensa e imperdoável irresponsabilidade, por parte de todos - repito, todos - os agentes políticos envolvidos, se isso vier a acontecer. 

Tenho um amigo


Tenho um amigo que lê a imprensa toda, que está atento (não sei como!) ao que se diz pelas várias televisões, que ali acompanha debates na Assembleia (imaginem!), que segue ao milímetro as coisas da política, a vida dos partidos, as trapalhadas da justiça, as crises nas urgências dos hospitais, a saga do orçamento, os crimes do Correio da Manhã (ainda o não consultei sobre o pobre barbeiro da Penha de França). Olha-me sempre como se eu fosse um ET, quando lhe digo que não atentei no que disse ontem o Pedro Nuno (é ele que o refere assim), que sei lá o que é que comentou o Montenegro, que não ouvi uma declaração do Marcelo (de facto, são tão poucas que eu devia ouvir). Apenas o consigo desafiar na procura obsessiva das pérolas orais da senhora ministra da Administração Interna, que não perco por nada do mundo, porque, como consagrado nas Seleções, rir é o melhor remédio. Ao constatar, com alguma confessada inveja, a ubiquidade informativa desse meu amigo - que, além disso, escreve, publica, lê imenso, refeiçoa com gosto e proveito e aprecia e faz longas viagens de automóvel, coisa que eu abomino cada vez mais -, só me consolo a pensar que ele ainda não chegou à minha idade. É que quando ele aqui chegar, a este sofá do tempo, Darjeeling à ilharga, com a chuva de molha tolos a pingar lá fora, aposto que ele vai ver o mundo com outros óculos.

Guterres (2)

Ficaria muito preocupado se o país que, no mundo, mais incumpre resoluções das Nações Unidas fizesse um elogio ao secretário-geral da organização. Algo de errado se passaria! Que esteja contra ele, que o hostilize, acaba por ser uma bela medalha para António Guterres. 

Guterres

A maioria dos comentários que por aí se leem, depreciativos da ação de António Guterres, derivam de um mero desconhecimento do que são as funções e os limites na atividade de um SG da ONU. Estudando, isso corrige-se. Outra parte, vem da má fé e da pura chicana política.

O outro doutor


"Onde é que trabalha?" A pergunta, feita pela minha ocasional parceira de viagem, naquele Boeing 707 da Pan American, entre Lisboa e Nova Iorque, era, manifestamente, para encher o muito tempo à nossa frente. Respondi: "Trabalho na Caixa Geral de Depósitos". Não sei se acrescentei que aquelas eram as minhas primeiras férias, depois de um também primeiro ano completo de trabalho na Caixa. Mas pode ter acontecido: sou muito dado a alimentar conversas com pormenores. Estávamos em dezembro de 1972.

"Trabalha no departamento médico?", inquiriu a minha vizinha de assento. Respondi que não, achando um pouco estranha a pergunta. "Mas é médico, não é?"

Foi nesse instante que percebi a confusão que se instalara. Dias antes, eu tinha ido a uma agência de viagens comprar um lugar numa escursão a Nova Iorque, que vira anunciada num jornal. Lembro-me bem que o preço era menos de sete mil escudos, viagem e hotel incluídos. Outros tempos! A pessoa que me atendeu disse-me: "Talvez lhe possa arranjar uma viagem mais barata. Temos um pacote especial de grupo, para o Auto-Clube Médico Português, e falta-nos precisamente uma pessoa para o completar. Se aceitar integrar esse grupo, poupa algum dinheiro". A ideia era apelativa e concordei. E lá fui, dias depois, para Nova Iorque, inserido no grupo.

Demorou aí dois ou três dias até que todos viessem a saber que era menos adequado tratarem-me por "colega", como haviam começado por fazer. Mas foram muito simpáticos. Até ao fim da viagem, que no regresso teve um inesperado mas muito agradável e prolongado desvio por Barcelona, com a Portela fechada por nevoeiro, fui sempre tratado como uma espécie de "médico honorário".

Passaram uns bons anos até que um dia, ao entrar num consultório médico, algures em Lisboa, fui saudado pelo especialista que ia consultar com um risonho "Como vai o colega?", logo se identificando como um dos meus companheiros dessa velha e bela viagem aos "States", poucos dias antes do Natal de 1972. Não recordo que, no termo da consulta, entremeada com memórias comuns desses dias em Manhattan, o meu "colega" me fez algum desconto...

Ao passar numa das Avenidas Novas, fotografei agora este letreiro luminoso. E, tal como as cerejas, as coisas vieram, umas atrás das outras.

Médio Oriente em análise


Para quem tiver interesse, aqui fica a "Grande Entrevista" de ontem, na RTP, com Vitor Gonçalves, onde abordei a atual situação no Médio Oriente.

"Um Mundo Dividido"


O "Diário de Notícias" insere na edição de hoje uma entrevista que dei à jornalista Helena Tecedeiro. 

São considerações pessoais, tendo como pretexto a 6ª Conferência de Lisboa, sob o tema " Um Mundo Dividido", que o Clube de Lisboa, a cujo conselho diretivo presido, organizadora nos dias 11 e 12 de outubro, na Fundação Calouste Gulbenkian. 

Para assistir presencialmente à Conferência, com muitos e variados intervenientes internacionais, basta inscrever-se no site do Clube de Lisboa.

quarta-feira, outubro 02, 2024

Jorge Rebelo de Almeida


Ouvi hoje uma intervenção de Jorge Rebelo de Almeida, líder do grupo hoteleiro Vila Galé. Foi curioso vê-lo sublinhar a contribuição positiva dada pelo surto de Alojamento Local e o modo favorável como observa a vinda para Portugal de grandes cadeias hoteleiras internacionais.

"Grande Entrevista"


Vou estar hoje, a partir das 23 horas, na RTP 3, na "Grande Entrevista", conduzida por Vitor Gonçalves.

Acontece uma vez na vida


Foi na noite de ontem, num cruzamento, algures em Lisboa. Ao contrário do autocarro que se vê na imagem, aquele ia vazio, e apenas com o condutor, como vim a constatar. Não era um veículo fora de serviço, tinha o número de uma linha bem conhecida. Estranhamente, vi que estava a fazer marcha atrás, recuando de uma das ruas do cruzamento. Algum obstáculo inesperado? A operação, com um veículo daquela dimensão, não estava a ser fácil. Eu e os carros que me seguiam parámos. Como é de regra de civismo básico, tratando-se de um transporte público, aguardámos o fim da operação, com natural paciência. O autocarro, creio que ao fim de pouco mais de um minuto, completou a manobra. Ficou de frente para nós, ocupando toda a rua, impedindo a nossa passagem. Esperámos que o veículo arrancasse, para uma das duas direções possíveis. Mas não. Vimos a porta dianteira do autocarro abrir-se e a luzes interiores acenderem-se. O motorista, para minha surpresa, saiu pela porta por onde entram os passageiros e aproximou-se do meu carro. Pensei: deve ter uma avaria e vai informar-nos de que temos de tomar um percurso alternativo. Com ar calmo, o homem disse-me: "O senhor pode dar-me uma ajuda? Conhece bem esta zona?". Eu conhecia, muito bem. Ele perguntou então: "Como é que eu chego daqui a ...?". Abismado com o insólito da situação mas, confesso, também com a calma sorridente do homem (que devia ter consciência de que o seu interlocutor estava confrontado com uma circunstância em absoluto inédita), retorqui, apontando numa das direções: "Se continuar por ali, sempre em frente, vai dar lá". O motorista agradeceu, regressou calmamente ao autocarro "perdido" e avançou pelo caminho que lhe indiquei. No carro, eu e a minha mulher demos umas boas gargalhadas. Caramba! Foi a primeira (e seguramente será a última vez) na vida que ajudámos um motorista da Carris a encontrar o seu caminho pelas ruas de Lisboa. Que mais nos estará para acontecer? O mundo anda esquisito, não anda?

"Adega do Costa" (Lisboa)


Juro que não sou acionista da casa e que o restaurante não pertence à minha família. Fui à "Adega do Costa", na Marquês de Tomar (com estacionamento fácil, num parque bem próximo), pela primeira fez, há cerca de dois anos. Fiz a visita com um consagrado crítico gastronómico, em cujo conselho confio cegamente. Gostei, sem ficar deslumbrado. Na memória, tinha guardado a lista de vinhos, a bom preço. Ontem, testei-a. Falhavam algumas das marcas da carta, que sucessivamente pedi, mas a recomendação final que me foi feita pela gente da casa foi correta. Perdoei. Éramos quatro comensais, experimentámos três pratos e tudo estava a preceito. Devo dizer, contudo, em abono da verdade, que o meu bacalhau, sem que estivesse mal, ficou um pouco aquém das minhas expetativas. Mas eu sou um conhecido chato na matéria, porque trago arquivado na memória gustativa um exigente mapa dos "benchmarks" do bacalhau, do norte a sul do país. A senhora que cozinha passou duas vezes pela nossa mesa e a alegria que projetava no trabalho é digna de uma especial nota. Também o serviço de mesa deve ter destaque, pela grande simpatia e profissionalismo. Assim, deixo um conselho: visitem a "Adega do Costa" e digam que foi um "primo" que recomendou que por lá fossem. Eu vou voltar em breve.

terça-feira, outubro 01, 2024

Um cretino é um cretino é um cretino

Não me escandaliza ver estrangeiros, lado a lado com racistas e xenófobos portugueses, numa manifestação racista e xenófoba que tem por alvo último ... os estrangeiros. Defendo o pleno direito dessa gente a ser tão cretina como os portugueses que se manifestam por esse motivo.

Notícias da humildade

Já poucos se recordam, mas quando o atual governo assumiu funções o presidente da República aconselhou, no ato de posse, humildade e sentido de compromisso a quem tinha ficado muito longe da maioria absoluta. Será essa a imagem que o país guarda do atual governo?

Adeus

Sei que isto irritará alguma gente, mas entendo que a saída de Stoltenberg de secretário-geral da NATO constitui um momento feliz para o mundo. O tom não é indiferente para o conteúdo e Stoltenberg assumiu sempre uma lamentável postura jingoísta.

Amigos do cedro

A França alimenta sempre uma atitude paternalista face ao Líbano. Contudo, travada por uma deriva pró-Israel motivada por equilíbrios internos, Paris é incapaz de assumir uma posição clara em face de atitudes israelitas que afetem o seu "protegido". Com amigos assim...

Incompetência

É extraordinário como, num país moderno, as entidades encarregadas da proteção das figuras de Estado cometem o erro - crasso e primário - de permitir que o chefe do Estado e do governo façam uma viagem conjunta num helicóptero. Nem no Terceiro Mundo, se isto ainda se pode dizer!

O truque de Macron

Macron, que tinha afastado do poder a direita clássica, entrega-lhe agora a chefia e parte do governo, não obstante ela ter só 6% do eleitorado. Para quê? Para ser ela a travar Le Pen, assumindo com gosto aquilo que alguma direita adora, em segredo: as causas da extrema-direita.

América

 


Ser norueguês

Tenho pena que a Constituição portuguesa não seja como a norueguesa. Por lá, o parlamento nunca pode ser dissolvido, qualquer que seja o pretexto. Compete aos partidos conseguir encontrar entre si a forma de governar o país - em minoria ou coligação. É assim, sabiam?

A hierarquia

A narrativa pró-Israel sublinha a importância de os israelitas poderem viver na sua terra, em paz e segurança. Mas nem uma palavra sobre o dever da comunidade internacional, criadora de Israel, de dar paz e segurança, na sua terra, ao povo palestino. Há uma hierarquia entre os povos? Chama-se a isto racismo.

Soares


Estou certo que Mário Soares teria ficado muito satisfeito se acaso, ultrapassada que fosse a impossibilidade prática das coisas, tivesse podido ouvir aquilo que sobre ele foi ontem dito na Fundação Calouste Gulbenkian, por ocasião da reedição dos volumes da excelente longa entrevista que Maria João Avillez lhe fez, nos anos 90. 

Foi uma sessão alegre, de saudação de uma vida que valeu a pena, simbolizada através do testemunho de diversas pessoas que, no fundo, tinham em comum o apreço por essa figura que, mais do que qualquer outra, simboliza a nossa democracia - na luta para que ela tivesse sido possível, na titularidade das funções que nela desempenhou, nas vitórias e nas derrotas que, dentro dela, foram as suas.

De há uns anos para cá - posso confessar isto? - sou cada vez menos voluntário para frequentar cerimónias e homenagens. Ontem, aleluia!, senti um imenso gosto em ter ali estado. Na vida, fui um soarista tardio, mas sou hoje, e desde há bastante tempo, um soarista convicto.

O direito do mais forte

Deram conta de que estamos a entrar num tempo de "lei da selva" no campo do Direito Internacional Público? Não é condenada a retaliação na lógica do "olho por olho", bem como a violação de fronteiras por alguns atores (não por outros), desde que sejam os do "nosso" lado.

segunda-feira, setembro 30, 2024

Cobardia?


Que temor ou cobardia trava o Ministério Público de acusar de xenofobia e de óbvia incitação ao ódio e à discriminação os responsáveis por este cartaz?

Há falso e falso?

Perante a história da "professora" que deu décadas de aulas e publicou manuais, tendo falsificado habilitações académicas, gerou-se por aí um ambiente de absolvição, quiçá de carinho pela ousadia. Como reagiriam essas pessoas se tivessem sido operadas por um falso cirurgião?

Extrema-direita

O comportamento da polícia na proteção da manifestação da extrema-direita deve ser lido à luz da mais do que conhecida infiltração dessa mesma extrema-direita nas fileiras da polícia.

Terceira história do 28 de Setembro de 1974


Pelos corredores de Caxias, nesses dias posteriores ao golpe do 28 de Setembro, cruzavam-se os barbudos da época, a maioria à paisana, alguns fardados com um porte que fazia a angústia dos puristas. 

Algumas salas estavam atulhadas de papelada da PIDE, a cujo escrutínio sabia-se que tinham acesso figuras com ligações partidárias, com caras sempre graves. 

Eu e o Casimiro Talhinhas, então capitão da Força Aérea, tínhamos sido escolhidos pelo brigadeiro Pedro Cardoso, que chefiava a divisão de informações do EMGFA, onde trabalhávamos, para ir a Caxias consultar alguma documentação que poderia ser relevante para dossiês que estávamos a seguir.

Por vaga indicação de um tenente da Marinha – os marinheiros pareciam dominar Caxias –, fui parar a uma determinada sala e iniciei o vasculhar de uns caixotes com documentos. 

De súbito, uma voz masculina interrompeu-me: 

“O que é que está aqui a fazer? Quem é você?”. 

Voltei-me e vi-me confrontado com uma figura à civil, especada na soleira da porta, claramente in charge da situação e do lugar. Eu também estava sem farda, mas socorri-me de uma vaga autoridade militar: 

“Eu sou oficial do Exército”. E contra-ataquei, ainda amável: “E o meu amigo quem é?”. 

A resposta veio seca, definitiva: 

“Chamo-me Jean-Jacques Valente e você não pode estar aqui!”. 

Nesse segundo, rebobinei década e meia de história contemporânea e dei-me conta de estar perante alguém que tivera um papel central na saga da morte do capitão Almeida Santos, revolucionário do “golpe da Sé”, nessa tragédia político-romântica que o José Cardoso Pires viria a consagrar, anos mais tarde, na «Balada da Praia dos Cães».

Tentei recuperar a iniciativa: 

“Essa agora! por que é que não posso estar aqui a trabalhar?”. 

“Porque eu não deixo e, se quiser, vá perguntar porquê lá acima”, lançando-me um nome de um conhecido graduado da Marinha. 

Saí furioso, fui inquirir da autoridade do meu histórico interlocutor e logo fui confrontado com a inevitabilidade de ter de me acomodar. O setor político a que Valente pertencia dominava essa área do arquivo da PIDE e nem os militares, pelos menos aqueles a quem eu tinha acesso, podiam contrariar a liberdade com que a sua gente se movimentava por ali. 

Regressei de mãos a abanar à 2ª Divisão.

Mas, vá lá!, ao menos eu tinha tido um inesperado encontro com a História.

domingo, setembro 29, 2024

Há quatro anos,


... nesta data, coordenei um debate que se fazia assim. Lembram-se desses dias?

sábado, setembro 28, 2024

O fracasso de Biden


Ver aqui

Segunda história do 28 de setembro de 1974


Depois da derrota política sofrida no dia 28 de setembro de 1974, o general António de Spínola, presidente da República, na ressaca dos acontecimentos e das manifestações desse dia que ficou histórico, tinha convocado o Conselho de Estado para 30 de setembro. Foi anunciado que, nessa ocasião, faria uma comunicação ao país pela televisão e rádios, diretamente de Belém.

Eu andava pelo palácio da Cova da Moura, onde até dois dias antes tinha sido adjunto da Junta de Salvação Nacional, instituição a que Spínola ainda presidia, mas que a curto prazo se alteraria. O meu chefe, Galvão de Melo, tinha-se demitido da Junta e, dentro de dias, eu ia ser transferido para a divisão de informações do EMGFA. 

Contudo, o 28 de Setembro, para mim, não terminaria ainda: duas semanas depois, por indicação do general Pedro Cardoso, fui representar a 2ª Divisão do EMFGA numa investigação nos arquivos da prisão de Caxias, precisamente no quadro da Comissão de Inquérito ao 28 de Setembro. 

Por conflitos políticos travestidos de conflitos de competências, o EMGFA foi rapidamente afastado dessa tarefa e, tanto eu como o hoje general Pacheco Talhinhas, regressámos ao nosso comum gabinete de trabalho no Palácio da Ajuda. Onde ficaríamos até ao 11 de Março... mas isso são outras histórias!

Voltemos ao dia do discurso de Spínola. Juntámo-nos uns tantos, de tendências político-militares bastante diversas e até antagónicas, em torno de um televisor, para ouvir a intervenção do chefe de Estado.

Os tempos eram muito tensos, o ambiente político era de cortar à faca. Naquela sala estava gente cujo futuro iria ser, a partir desse dia, muito díspar. Lembro-me de que havia por lá um general do Exército, cujo nome não consigo recordar, recém-regressado de uma Angola em convulsão, que sabíamos ser um "spinolista" ferrenho. Estava acolitado por figuras que não conhecia, com cara patibular, de quem tinha ficado do lado dos derrotados nas “batalhas” das vésperas.

Todos antecipávamos as palavras do "velho" (como os "spinolistas" gostavam de chamar à sua figura tutelar). A ideia mais comum era a de que se demitiria em direto das funções, mas outros cenários, nomeadamente de alguma resistência à recente derrota nas ruas dos seus apaniguados, ainda eram plausíveis.

O discurso começou, com a voz rouca de Spínola, naquele registo épico e um pouco teatral que era o seu, a dramatizar, como era de esperar, a situação política, na exata linha das suas anteriores frustradas tentativas de fazer levantar a suposta "maioria silenciosa" do país.

O diagonóstico que saía da sua boca era ácido e impiedoso para os vencedores dessas horas. Todos olhávamos o aparelho de televisão mas, verdadeiramente, policiávamo-nos pelo canto do olho, sabendo que cada um lia as palavras de Spínola de forma diferente. Para mim, como jovem militar "a prazo", que me via do lado vencedor da contenda, o momento era excitante.

A certo passo da intervenção, mas ainda antes do anúncio da demissão do "caco" (como Spínola também era conhecido, por virtude do seu monóculo), um homem da Marinha, cujo nome não interessa para o caso, não se conteve e fez ecoar pela sala alguns adjetivos qualificativos, muito pouco abonatórios para o presidente da República e presidente da Junta de Salvação Nacional, a cujos quadros pertencíamos e em cuja sede estávamos.

Praticamente, ninguém o acompanhou na expressão vocal dos sentimentos que o motivavam, os quais, no fundo mas apenas no íntimo, creio que eram partilhados pela maior parte dos presentes. Mas, com os diabos!, Spínola era um derrotado daqueles dias e havia outras maneiras de, como dizem os militares, "explorar o sucesso", tanto mais que "não se dispara sobre ambulâncias". 

O oficial marinheiro, porém, estava imparável, indignado com os ataques de Spínola ao MFA, e não se calava, nos insultos que ia proferindo, em crescendo. O general chegado de Angola, a alguns metros dele, fervia de raiva, marcada pela impotência que Spínola confessava no seu discurso. Os seus escassos acompanhantes remoíam em silêncio.

Quando tudo terminou, depois de Spínola ter anunciado a sua demissão, todos nos levantámos, ainda um pouco aturdidos com o início de uma nova fase da Revolução que o seu gesto prenunciava. O tal general, lívido, passou pelo matinheiro e, num assomo de autoridade, lançou-lhe: "Você devia ter vergonha pelo que disse". A compostura militar impôs-se e o jovem oficial não reagiu. Ou melhor: deixou sair o superior da sala e comentou, para nós: "Estive para o mandar à ....". Mas não mandou. E ainda bem. O general já tinha tido a lição dos factos.

A tragédia de Israel


Ver aqui.

Primeira história do 28 de setembro de 1974


Hoje sabemos melhor o que foi o chamado “28 de Setembro” de 1974 - um primeiro grande momento de confronto público entre setores ultra-conservadores, apoiantes de um movimento para dar plenos poderes ao general Spínola, e forças políticas da esquerda, que habilmente aproveitaram o ensejo para afastar o polémico presidente da República que, no 25 de Abril, haviam sido forçadas a aceitar, para a legitimação da Revolução, e que se estava a tornar progressivamente mais incómodo. É que, à época, assistia-se a um crescente ambiente anti-25 de Abril, alimentado pelo próprio Spínola, que estava a colocar a esquerda e o Movimento das Forças Armadas à beira de um ataque de nervos.

Nessa noite, eu tinha sido destacado para uma determinada missão, juntamente com o António Reis - o líder dos milicianos da Escola Prática de Administração Militar, de onde eu era originário, embora, à época, eu fosse adjunto da Junta de Salvação Nacional, instituição que os acontecimentos desse dia iria transformar radicalmente. Íamos sob o comando de um jovem alferes “do quadro”, o Manuel Geraldes, uma generosa figura do MFA, que não vejo nem contacto há mais de 40 anos. Levávamos connosco uma “praça”, um soldado, o Moura. O Moura tinha na sua mão uma intimidante metralhadora G3. 

Estávamos a entrar para o meu carro pessoal, um Fiat 128, algures nas “Avenidas Novas”, a altas horas da noite. Por razões que não vem ao caso explicar, a tensão do momento então muito grande. Aquela noite do 28 de Setembro acabou por ser muito complexa e longa.

De súbito, uma surpresa: começa a vislumbrar-se, à distância, vinda do alto da rua, uma figura de baixa estatura, estranhamente com as mãos no ar, como se estivesse a render-se. Naquele enquadramento noturno, sem vivalma em roda, a cena era patética e infundia uma súbita insegurança. 

O soldado Moura começou a demonstrar uma perturbação agitada, com jeitos de querer afirmar a capacidade operacional de que a sua condição de barman da messe da EPAM era “sólida” garantia: num instante, põe a patilha da G-3 na posição de disparo, leva a arma ao ombro e, num derradeiro e precioso segundo, é travado pelo Geraldes com um “está quieto!” e o afastar a arma do alvo.

Aparentemente sem se aperceber do nosso nervosismo e do risco de vida que estava a correr, a personagem continuava lentamente a aproximar-se, agora já se lhe ouvindo coisas, numa voz procuradamente surda, para não alertar a vizinhança, tais como “Sou eu! O Manel”. Lentamente, pudemos identificar quem lá vinha.

Era o Manuel Serra, o sempiterno revolucionário dos golpes da Sé e de Beja, figura que, meses depois, titularia uma célebre cisão de esquerda no Partido Socialista, com a criação da Frente Socialista Popular, afastando-se de Mário Soares. 

As vidas políticas dos últimos meses haviam-nos feito, entretanto, cruzar com essa curiosa personalidade, com um brilho quase adolescente nos olhos e um sorriso cúmplice, oriunda do cristianismo radical, que há muito trazia a revolução nas veias. Nos anos 60, ainda antes do fracassado golpe de Beja, em que participou de forma ativa, o Manel havia sido protagonista de uma lendária fuga da embaixada de Cuba em Lisboa, onde estava refugiado, disfarçado de padre... 

Depois do 25 de Abril, por uma escolha que a confusão política proporcionou, Manuel Serra tinha sido nomeado o inesperado chefe de gabinete desse igualmente improvável ministro que foi o jornalista Raul Rego.

“Então, rapazes, há novidade? Vi-vos por aqui e vinha perguntar se necessitam de alguma coisa. Temos ali duas viaturas com pessoal e material, para o que der e vier. Não precisam mesmo de nada? Está tudo em ordem?”

Ficou a ideia que o Manel e os seus amigos andavam nessa noite pela cidade, numa espécie de piquete do ACP, para “avarias” de outra natureza. 

Demos os abraços da praxe e presumo que devemos ter esclarecido que “está tudo sob controlo”. No fundo, sem lho revelarmos, estávamos imensamente aliviados por se ter conseguido travar a precipitação quase trágica do Moura, o qual talvez nunca tenha entendido bem quem era aquela alma penada e meio careca, saída do escuro da rua, afinal amigalhaço dos seus superiores, a quem estivera prestes a dar um tiro. 

E lá foi o Manel de volta, pela noite, à busca da revolução que sempre lhe consumiu os dias. Dias que terminaram em 2010, quando o Manel tinha 78 anos.

Oh! Lacerda


Foi ontem. Tinham sido quase três horas de concerto. Extraordinária, aquela que foi a primeira das muitas noites que, nos próximos meses, vamos passar no auditório principal da Gulbenkian. Desta vez foi "A Danação de Fausto", de Berlioz. Começou às sete, abancámos para o jantar/ceia no "Oh! Lacerda" às dez.

Há quantos anos vou por ali, ao "Cortador Oh! Lacerda"? Imensos! Desde os anos 60! É, pela certa, nos dias de hoje, um dos mais antigos restaurantes de Lisboa. 

Ali por perto, já se comeu bem no "Paco", já se recomendou mais a "Tia Matilde", foi sempre abaixo de assim-assim a Sereia, deixou imensas saudades o fim de "A Gôndola", foi em tempos uma catedral lisboeta "O Polícia", belos jantares se fizeram no desaparecido "De Castro Elias". 

Hoje, tirando uma opção quase sempre razoável que é a "Valbom" (em especial, na esplanada, quando está tempo para isso), o eterno matar de saudades de uma bacalhauzada na "Laurentina", um bom nepalês que por ali há, o "La Finiestra" quando se consegue passar à frente dos "motoboys" da Glovo e um arménio de que me falam bem, a zona em torno da Gulbenkian é um imenso deserto em termos de boa restauração.

O "Oh! Lacerda" não deve vir no Michelin. A casa é muito simples, tem uma velha decoração rústica com um delicioso ar decadente - tem exatamente o mesmo ar, há décadas -, oferece uma comida simpática e, para o meu gosto, um dos melhores bifes do lombo de Lisboa - e eu gabo-me de os conhecer quase todos.

Depois dos acordes da fantástica orquestra e coro da Gulbenkian, uma refeição no " Oh! Lacerda", com alguns músicos a acompanharem-nos por lá em outras mesas, é um programa com bastante graça.

A França e o seu novo governo

 


Veja aqui.

Na morte do João Diogo


Conheci João Diogo Nunes Barata há meio século. No cumprimento do serviço militar, ambos fomos adjuntos da Junta de Salvação Nacional, no palácio da Cova da Moura, logo após o 25 de Abril. 

Ele trabalhava com o presidente da Junta, o general Spínola, com quem seguiu para Belém quando este assumiu a presidência da República, eu assessorava o general Galvão de Melo, para as questões do desmantelamento da PIDE/DGS. 

No dia 28 de setembro de 1974, faz hoje precisamente 50 anos, Spínola e Galvão de Melo saíram da Junta de Salvação Nacional e o João Diogo e eu fomos ocupar outras funções. 

Voltámos a encontrar-nos no Ministério dos Negócios Estrangeiros, cujos quadros ele já integrava e onde eu ingressei no ano seguinte. Embora alguns anos nos separassem na idade, uma certa proximidade política e um grupo de amigos comuns fez com que criássemos uma excelente relação de amizade, que se prolongou até aos dias de hoje.

O João Diogo foi um dos melhores diplomatas com quem me cruzei, nas minhas quatro décadas nas Necessidades. Digo isto com imensa sinceridade. Inteligente, culto, com grande sentido do interesse do Estado, foi uma voz sempre escutada por Mário Soares, de quem foi colaborador muito próximo. 

Teve uma interessante carreira diplomática, mas sempre considerei que o seu percurso nas Necessidades acabou por não estar à altura que era devida à sua qualidade profissional. Isso pode ter acontecido por opções próprias, somadas a decisões dos poderes políticos de turno que acabaram por condicionar o seu percurso e determinar algumas escolhas. 

Uma noite, no aeroporto de Fiumiccino, em Roma, onde o João Diogo era embaixador, fui testemunha presencial de um convite que lhe foi formulado pelo então ministro dos Negócios Estrangeiros, Jaime Gama, para que ele viesse ocupar um lugar de topo na hierarquia diplomática das Necessidades. O João Diogo recusou o lugar. Jaime Gama, ao seu estilo, não revelou nenhuma reação perante a recusa, mas percebi que não gostou de ver rejeitado aquele honroso convite. A carreira do João Diogo poderia ter tido um "boost", se tivesse aceitado. Antes de entrar para o avião, eu disse-lhe: "Acho que fizeste muito mal". Ele só teve tempo para me responder: "Eu depois explico-te". Nunca houve ocasião para isso.

O João Diogo Nunes Barata, que ontem morreu num hospital em Paris, tinha 83 anos. O Grémio Literário era, nos últimos tempos, o lugar onde mais frequentemente nos íamos encontrando. 

sexta-feira, setembro 27, 2024

CPLP


Ao final da tarde de hoje, no painel de encerramento do 2° Forum de Economistas lusófonos, em que fui convidado a intervir, deixei algumas notas críticas sobre o funcionamento da CPLP (Comunidade dos Países de Língua Portuguesa). 

Com a limitação de ser uma transcrição de um improviso de cerca de seis minutos, aqui fica notícia que a Agência Lusa fez dessas minhas declarações.

A ilusão israelita

É trágico que Israel há muito não tenha líderes à altura daquilo que os seus cidadãos merecem: paz e segurança. Uma paz que só será possível quando também seja garantida a segurança e um futuro político autónomo aos palestinos. Até lá, Israel vai ganhando umas batalhas, algum tempo e cada vez mais inimigos. 

6ª Conferência de Lisboa


Inscreva-se. Vai valer a pena.

"Snob"


Foi-se o "Outro Tempo Bar". Amanhã fecha o "Snob" (um abraço ao senhor Albino). Estão a acabar os locais serenos e a bom preço para cear em Lisboa. Não quero parecer nostálgico, mas isto não me está a agradar nada.

Maggie Smith


O teatro inglês não será o mesmo sem Maggie Smith, que morreu hoje.

Nuclear

O que torna muito perigosa a situação internacional é a natureza do processo decisório de certos atores que são os "donos" da guerra e da paz. Ver Putin assumir, como se se tratasse de uma decisão unipessoal, a questão da nova doutrina nuclear da Rússia é perturbador.

"Solar dos Duques"


"Come-se muito bem aqui", disse-me o amigo com quem ontem fui jantar ao "Solar dos Duques", em Campo de Ourique. É verdade. Vamos tantas vezes a um restaurante, habituamo-nos tanto a um lugar, que já nem valorizamos a constância da qualidade que a casa nos proporciona. 

Vai para oito anos que a Petra e o Robert "agarraram" o "Solar dos Duques" e, com grande dedicação, souberam dar continuidade a uma casa que tinha já um nome firmado no mercado. Tenho visto novos proprietários destruirem, em poucos meses, a fama um restaurante. Aqui, isso não aconteceu. Os novos proprietários souberam deitar mãos à obra e consolidar o prestígio da casa. A melhor prova é o facto de muitos dos velhos clientes terem continuado a frequentar a casa.

Ontem, como quase sempre me acontece, comi por lá muito bem. Que assim continue, é o meu voto, que assumo com o egoísmo de quem é cliente habitual.

quinta-feira, setembro 26, 2024

Companhias (2)


Ontem, mostrei por aqui uma imagem da sala da Assembleia Geral da ONU, no momento em que o presidente da Ucrânia discursava. Foi induzido em erro: era uma fotografia de um ano anterior. Esta é a imagem de 2024. O estado da sala não diverge muito.

quarta-feira, setembro 25, 2024

Companhias


Uma imagem em que importa atentar: a ocupação dos lugares na Assembleia Geral da ONU durante o discurso do presidente da Ucrânia. 

O dédalo


Hoje, vou dar uma aula ao ISCTE. A grande questão vai ser descobrir a sala. Seria a primeira vez em que me não perderia naquele dédalo arquitetónico. 

"The Spectator"


Desde a sua criação, o "The Spectator" já foi dirigido por figuras "tory" bastante exóticas, a menor das quais não terá sido Boris Johnson. Mas a notícia de que Michael Gove passa agora a diretor da revista é mais do que surpreendente, é aterradora! É quase como se Liz Truss passasse a diretora do "The Economist". É mesmo justa causa para suspender uma assinatura! 

Lucros


No novo governo francês, vi surgir uma ministra que tem a seu cargo, entre outras tarefas, "l’intéressement". Nunca tinha ouvido falar. Fui ver o que era. Trata-se, muito simplesmente, da participação nos lucros das empresas. 

Daqui a semanas, fará 53 anos que entrei para a Caixa Geral de Depósitos, o meu primeiro emprego "a sério". Andava com a vida universitária atrapalhada por diversas razões e decidi fazer-me à vida real. Fiz concurso com mais de um milhar de candidatos. As provas tiveram lugar no liceu Passos Manuel. Porque me enganei numa permilagem, no exame de contabilidade, fiquei a meio da tabela, dentre os trezentos e tal admitidos. No dia de admissão, telefonei ao meu pai, a quem não tinha avisado dessa aventura, e disse-lhe: "A partir de hoje, somos colegas!". Com alguma diferença de tempo: ele tinha entrado para a Caixa em 1930! Estávamos em 1971. 

Fui trabalhar para o Calhariz, no "Serviço de Títulos". No final do ano, a Caixa fazia distribuição de lucros pelos funcionários (é verdade!). Não era muito dinheiro, mas era algum dinheiro com o qual as pessoas contavam. Todos os funcionários recebiam? Não. Apenas os que tivessem a classificação de "muito bom". Eu estava descansado: trabalhava muito e bem. Mas enganei-me. Num dia, com o fim do ano a aproximar-se, ouvi do meu chefe, do inefável senhor Marques: "O senhor Costa fez um excelente trabalho ao longo deste ano, mas, infelizmente, não vou poder dar-lhe "muito bom". Temos instruções para não atribuir essa classificação a pessoas recém-admitidas". Não lhes digo o que calei. 

Não sei como são as regras do "l’intéressement" lá por França, mas, com o obsessivo "jeunisme" a ser hoje a regra do jogo um pouco por todo o mundo, estou certo que as coisas não se passarão como naquele meu outro tempo de funcionário bancário.

"Raposo"


Não verifiquei se o nome vem (nem viria o menor mal ao mundo se não viesse) no Michelin, no Time-Out ou no Boa Cama - Boa Mesa (um dia falaremos dos mitos existentes a propósito disto e de alguns truques associados). Nunca é fácil estacionar por ali (o restaurante é na Passos Manuel, em Lisboa, perto do Jardim Constantino). Às vezes, o espaço interior torna-se um pouco barulhento. E, se não reservar, arrisca-se a ter de ir comer o sinistro bife da Portugália, ali perto.

Mas por que diabo será - a mim, que me gabo de conhecer imensas mesas por Lisboa e seus arredores, isto é, de Melgaço e Sendim a Sagres e Monte Gordo, da Camacha a Vila Praia da Vitória - que, quando me apetece jantar fora (cada vez me apetece menos, confesso), o nome do "Raposo" me vem logo à ideia? Por alguma razão será!

O ambiente é, por ali, desde que o frequento, o mesmo de sempre. Guardanapos de pano, "linha vermelha" que impus a mim mesmo, sempre que fora das tascas (e, em algumas, já exijo). O serviço é muito atento - mas, honestamente, tenho de fazer o desconto de me conhecerem há muito e de me tratarem sempre bem. A comida tem uma constância admirável. É cuidada, embora sem "efes e erres", honesta, no melhor sentido do termo - e tem outros. Além disso, a casa apresenta ótimos vinhos a preços bem razoáveis. A conta final esteve, como sempre está, na conta certa.

Voltei ontem ao "Raposo", como adivinharão. Se acaso tivesse de regressar por lá amanhã sentir-me-ia feliz. Há melhor elogio que se possa fazer a um restaurante?

terça-feira, setembro 24, 2024

Pior que Obama!

Biden consegue a proeza de ser ainda pior do que Obama, em matéria de política externa. Deixa o mundo num caos. Não corrigiu Guantanamo. Não reverteu Trump no acordo nuclear com o Irão. Saiu humilhado do Afeganistão. Não impediu a agressão de Putin. Cedeu à chantagem de Israel. 

Ela aí está !

 


Livraria Martins


O nome é simples, o conceito também. É uma livraria arrumada, pela mão de quem sabe da poda. É na Guerra Junqueiro, a dois passos da Mexicana (que agora se chama Tasca!). Tem o sereno ambiente de algumas livrarias de Londres ou de Nova Iorque. Pode beber-se um copo (saudades da "Opinião"!) e tem cadeiras no passeio, para por ali ficar um pouco. Passei lá há minutos. Ainda bem que a "Livraria Martins" fica muito longe de minha casa. Ia ser o bom e o bonito...

Pela lógica...

Estou convicto de que aqueles que se extasiam perante a genialidade da ação israelita de armadilhamento dos pagers e walkie-talkies devem manter uma admiração infinda, embora quiçá discreta, pela ainda mais criativa inventividade que esteve subjacente aos atentados do 11 de setembro contra as Torres Gémeas.

Ponto final


Tudo na nossa vida tem um fim, até ao dia em que ela própria terá o seu. Decidi agora colocar um ponto final na colaboração que, desde há quase três anos, mantinha com a CNN Portugal. Foram 33 meses!

Tive um imenso gosto em fazer parte dos colaboradores da estação, desde o seu primeiro dia. Conheci por lá gente fantástica, de um imenso profissionalismo, de uma grande simpatia. Fiz ali muitos amigos e, creio, nenhum inimigo (pelo menos, que eu tenha dado conta). Contudo, depois de algumas semanas de deliberada pausa, concluí que aquele meu ciclo de trabalho, no comentário político na área internacional, estava esgotado.

Fico gratíssimo ao Nuno Santos pelo magnífico acolhimento que me deu naquela casa, que continuarei a ter como "minha", bem como à amável e insistente tentativa que nas últimas semanas fez para que eu não levasse esta minha decisão por diante. Mas cada coisa tem o seu tempo e, depois de alguma ponderação, concluí que este era o tempo certo para deixar a colaboração regular com a CNN Portugal, embora não exclua, no futuro, poder dar uma saltada pontual a Queluz de Baixo, se a ocasião se proporcionar e surgir um convite para tal. 

Não vou nomear, porque são muitas, as pessoas de cujo convívio regular vou sentir alguma falta - da produção à maquilhagem, da redação aos pivots, dos colegas comentadores a tanto do restante pessoal. Elas e eles sabem a quem me refiro. A muitas dessas pessoas fico a dever atenções que não esqueço.

Uma nota especial para o "painel da guerra", às quintas-feiras, que sempre me deu muito prazer fazer: um abraço à Diana Soller e ao Agostinho Costa. Os três ajudámos a provar que o pluralismo opinativo - que é o contrário do unanimismo - é a imagem de marca única do excelente jornalismo internacional da CNN Portugal.

segunda-feira, setembro 23, 2024

Crise

Não gostei das declarações do Senhor Presidente da República sobre o orçamento e a crise. Não gostei do comunicado provocatório do governo, sem o menor sentido de Estado. Não gostei do comunicado do PS, reagindo no mesmo tom de chicana. Chego à conclusão que o problema sou eu.

"Much ado about nothing"

A França já tem governo. A ruidosa barragem política - o "Front Républicain" - construída nas eleições legislativas para travar a extrema-direita acabou por ter, como resultado prático, uma aliança de governo entre o centro-direita e a direita democrática, que só consegue subsistir com a complacência daquela mesma extrema-direita. O inimigo comum, o verdadeiro inimigo, é a esquerda. Nada de novo, mas é bom que isso tenha ficado bem claro.

domingo, setembro 22, 2024

Um belo museu


Do Entroncamento não nos chegam apenas coisas estranhas, como reza a lenda. É também ali que funciona o excelente Museu Nacional Ferroviário, dotado de um pessoal atento, que gosta e tem orgulho no que faz, e com algumas peças notáveis. Passem por lá! Eu fui hoje. 

Ai, Sporting!

A carreira do (meu) Sporting parece tão sólida que até eu, um cético pessimista sempre preparado para viver com o pior, escaldado por tantas desilusões, começo prudentemente a acreditar que, daqui a uns meses, até posso vir a não ter mais uma.

Já chegámos?

Eu até nem gosto muito da ideia preconceituosa de que "não há fumo sem fogo", mas devo confessar que a sucessão de casos que associam o governo regional e outros poderes públicos da Madeira a irregularidades dá que pensar. 

Mau sinal

Acho muito mau sinal: quando os líderes do governo e da oposição desejam obter um acordo encontram-se discretamente, não anunciam a hora da sua reunião. E à saída? Cada um dá uma conferência de imprensa?

No reino de sir Keir


Ver aqui.

Palestina


Ver aqui.

A América a caminho do voto


Ver aqui.

sábado, setembro 21, 2024

Fim da tarde

 


"Um Mundo Dividido"


Estão abertas as inscrições para a 6a Conferência de Lisboa, um encontro internacional organizado a cada dois anos pelo Clube de Lisboa. 

Na Conferência deste ano, que terá lugar em 10 e 11 de outubro, o tema de "Um Mundo Divido" mobilizará os oradores oriundos de vários países.

Clique aqui para saber mais.

Tupperware


Recebo com alguma nostalgia a notícia de que a Tupperware faliu.

Lamento imenso que ao inventor do seu genial saca-rolhas, uma das obras-primas do mundo da vida prática, não tenha ainda sido atribuído o Prémio Nobel, em paralelo com esse génio que foi o criador das rodinhas nas malas e, acima de tudo, dessa imensa figura que nos trouxe o ar condicionado.

Ao três, figuras anónimas a quem muito devo, a minha eterna gratidão.

Belgas

Ontem, um amigo belga queixou-se: "Então você anda a fazer ironias com as diferenças linguísticas do meu país? E já alguma vez foi ao b...