quinta-feira, outubro 03, 2024

Tenho um amigo


Tenho um amigo que lê a imprensa toda, que vê (não sei como!) o que se diz pelas televisões, que acompanha os debates na Assembleia (imaginem!), que segue as coisas da política, a vida dos partidos, as trapalhadas da justiça, as crises nas urgências dos hospitais, a saga do orçamento, os crimes do Correio da Manhã (ainda o não consultei sobre o pobre barbeiro da Penha de França). Olha-me sempre como se eu fosse um ET, quando lhe digo que não ouvi o que disse ontem o Pedro Nuno (é ele que o refere assim), que sei lá o que é que comentou o Montenegro, que não ouvi uma declaração do Marcelo (de facto, são tão poucas que eu devia ouvir). Apenas o consigo desafiar na procura obsessiva das pérolas orais da senhora ministra da Administração Interna, que não perco por nada do mundo, porque, como consagrado nas Seleções, rir é o melhor remédio. Ao constatar, com alguma confessada inveja, a ubiquidade informativa desse meu amigo - que, além disso, escreve, publica, lê imenso, refeiçoa com gosto e proveito e aprecia e faz longas viagens de automóvel, coisa que eu abomino cada vez mais -, só me consolo a pensar que ele ainda não chegou à minha idade. É que quando ele aqui chegar, a este sofá do tempo, Darjeeling à ilharga, com a chuva de molha tolos a pingar lá fora, aposto que ele vai ver o mundo com outros óculos.

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