Sei que é muito impopular, em certos meios, ouvir isto, mas eu digo: o Tribunal Constitucional tem toda a razão. Uma lei desta natureza não pode assentar na menor ambiguidade. E a Assembleia da República sabe muito bem o que há que fazer.
Concordo com o juízo do Francisco sobre o Tribunal Constitucional. Discordo com o seu juízo sobre a Assembleia da República: esta última vai ficar à nora sobre o que há de fazer.
Eutanásia - SÉNECA e o Tribunal Constitucional Lucius Annaeus Seneca (Corduba, 4a.C.-Roma, 65) foi um dos mais reputados escritores, filósofos e intelectuais do Império Romano, que condenado à morte por Nero, foi obrigado a cometer o suicídio. Impressionante é conhecer como são actuais alguns dos seus pensamentos sobre a morte, explicando que “morrer antes de tempo não tem nada que ver com a dor mas, justamente, com poder morrer de forma digna”, aquilo que hoje, e passados séculos, nos defrontamos no debate sobre a eutanásia: “A questão não é morrer mais cedo ou mais tarde”, escreve Séneca numa carta ao amigo Lucílio. “O que importa é morrer bem ou morrer mal. E morrer bem é escapar ao perigo de viver mal.” “Não usarei a morte para escapar à doença, desde que a doença seja curável. Morrer apenas por causa da dor é admitir a derrota. Mas se sei que a minha condição vai durar para sempre, abandono a vida. Não por causa da dor propriamente dita, mas porque isso me vai tirar as razões para viver. É o homem fraco que morre por causa da dor, mas é o homem tolo que vive em nome da dor”, escreve ao amigo. Noutra carta diz: “Viver não é uma coisa boa em si mesma, mas sim viver bem.” E, por isso, “sábio é aquele que vive até onde deve, não até onde pode”. “Uma vida mais longa não é necessariamente melhor e uma morte mais longa é necessariamente pior”, afirma Séneca, tentando persuadir o amigo de que a vida deve ser medida pela qualidade e não pela quantidade, e que o seu prolongamento não deve ser um fim em si mesmo. “Só há uma forma de dizer que a vida que vivemos foi longa: se foi suficiente.” A vida, diz, “é longa se for cheia” e fica cheia se se for “bom cidadão, bom amigo e bom filho”. “Antes de ser velho, fiz por viver bem; agora que sou velho, faço por morrer bem. E morrer bem significa morrer com vontade.” “A vida é como uma história: o importante é como é feita, não se é comprida. Mas dá-lhe um bom fim.” “Se o nosso corpo se torna incapaz de desempenhar as suas funções, não será correcto retirar dele a nossa alma torturada? Talvez isso deva ser feito ligeiramente antes do momento em que tem de ser feito, porque quando tem de ser feito já não somos capazes de o fazer”, diz Séneca. E logo a seguir pergunta ao amigo: “Achas que há alguma coisa mais cruel a perder na vida do que o direito de acabar com ela?” Fico naturalmente incrédulo como Séneca, há tantos séculos atrás, conseguiu antecipar filosoficamente a questão da eutanásia (ou seja, “como dar dignidade aos vivos na hora da morte”) ao arrepio daqueles que ainda hoje em pleno séc. XXI - inclusivamente os doutos juízes do TC, que consideram uma lei inconstitucional simplesmente porque no conceito de «Sofrimento de grande intensidade», as noções de «sofrimento físico, psicológico e espiritual» são alternativas e não cumulativas - a continuam a contestar!
Gostava de entender o argumento da ambiguidade, mas não sou capaz. É inevitável que a legislação penal contenha conceitos indeterminados. Está pejada deles, principalmente quando se trata de punir. O que nem é o caso, antes pelo contrário, estamos perante uma despenalização. Se é a história do "e" ou do "ou", então nem se fala. Volta tudo para os bancos da escola. Já agora, porque não obrigar, também como requisito da morte médicamente assistida, a extrema unção?
6 comentários:
Ufa! Deixar nas mãos de extremistas ideológicos a feitura deste tipo de leis dá este tipo de resultados. Abençoado TC!
Evidentemente. Já para não falar de tentar aprovar uma lei destas nesta altura. Só de loucos. E até sou globalmente a favor da eutanásia.
Concordo com o juízo do Francisco sobre o Tribunal Constitucional. Discordo com o seu juízo sobre a Assembleia da República: esta última vai ficar à nora sobre o que há de fazer.
Tendo mais a concordar com esta posição
https://causa-nossa.blogspot.com/2023/01/nao-concordo-39-sofisma-constitucional.html
Eutanásia - SÉNECA e o Tribunal Constitucional
Lucius Annaeus Seneca (Corduba, 4a.C.-Roma, 65) foi um dos mais reputados escritores, filósofos e intelectuais do Império Romano, que condenado à morte por Nero, foi obrigado a cometer o suicídio.
Impressionante é conhecer como são actuais alguns dos seus pensamentos sobre a morte, explicando que “morrer antes de tempo não tem nada que ver com a dor mas, justamente, com poder morrer de forma digna”, aquilo que hoje, e passados séculos, nos defrontamos no debate sobre a eutanásia:
“A questão não é morrer mais cedo ou mais tarde”, escreve Séneca numa carta ao amigo Lucílio. “O que importa é morrer bem ou morrer mal. E morrer bem é escapar ao perigo de viver mal.”
“Não usarei a morte para escapar à doença, desde que a doença seja curável. Morrer apenas por causa da dor é admitir a derrota. Mas se sei que a minha condição vai durar para sempre, abandono a vida. Não por causa da dor propriamente dita, mas porque isso me vai tirar as razões para viver. É o homem fraco que morre por causa da dor, mas é o homem tolo que vive em nome da dor”, escreve ao amigo.
Noutra carta diz: “Viver não é uma coisa boa em si mesma, mas sim viver bem.” E, por isso, “sábio é aquele que vive até onde deve, não até onde pode”.
“Uma vida mais longa não é necessariamente melhor e uma morte mais longa é necessariamente pior”, afirma Séneca, tentando persuadir o amigo de que a vida deve ser medida pela qualidade e não pela quantidade, e que o seu prolongamento não deve ser um fim em si mesmo.
“Só há uma forma de dizer que a vida que vivemos foi longa: se foi suficiente.” A vida, diz, “é longa se for cheia” e fica cheia se se for “bom cidadão, bom amigo e bom filho”.
“Antes de ser velho, fiz por viver bem; agora que sou velho, faço por morrer bem. E morrer bem significa morrer com vontade.”
“A vida é como uma história: o importante é como é feita, não se é comprida. Mas dá-lhe um bom fim.”
“Se o nosso corpo se torna incapaz de desempenhar as suas funções, não será correcto retirar dele a nossa alma torturada?
Talvez isso deva ser feito ligeiramente antes do momento em que tem de ser feito, porque quando tem de ser feito já não somos capazes de o fazer”, diz Séneca. E logo a seguir pergunta ao amigo: “Achas que há alguma coisa mais cruel a perder na vida do que o direito de acabar com ela?”
Fico naturalmente incrédulo como Séneca, há tantos séculos atrás, conseguiu antecipar filosoficamente a questão da eutanásia (ou seja, “como dar dignidade aos vivos na hora da morte”) ao arrepio daqueles que ainda hoje em pleno séc. XXI - inclusivamente os doutos juízes do TC, que consideram uma lei inconstitucional simplesmente porque no conceito de «Sofrimento de grande intensidade», as noções de «sofrimento físico, psicológico e espiritual» são alternativas e não cumulativas - a continuam a contestar!
Gostava de entender o argumento da ambiguidade, mas não sou capaz. É inevitável que a legislação penal contenha conceitos indeterminados. Está pejada deles, principalmente quando se trata de punir. O que nem é o caso, antes pelo contrário, estamos perante uma despenalização. Se é a história do "e" ou do "ou", então nem se fala. Volta tudo para os bancos da escola. Já agora, porque não obrigar, também como requisito da morte médicamente assistida, a extrema unção?
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