Morreu o príncipe Philip, marido da rainha britânica. Tinha 99 anos. A série televisiva ”The Crown” terá contribuído para mudar, em muita gente, uma certa ideia que existia sobre a sua personalidade. O saldo dessa perceção não é, contudo, consensual.
Há já uns bons anos, na Noruega, tive uma simpática amiga, diplomata equatoriana, de seu nome Marta Dueñas. Era casada com um norueguês "muito norueguês", daqueles que construíam (não sei se ainda constroem) as próprias casas familiares de madeira, ao longo de vários meses ou mesmo anos. Chamava-se Erik e recordo-me que tinha um humor já algo "sulista", por virtude do convívio com os colegas da mulher, como era o nosso caso.
Um dia, o Erik contou-me uma troca de palavras que teve com o príncipe Philip, durante uma visita de Estado da soberana britânica à Noruega. Como era de regra, após o jantar oficial, o protocolo ia convidando os diplomatas, por uma ordem vagamente próxima da respetiva antiguidade, para se aproximarem do rei norueguês - à época Olav V - e da sua convidada. Numa linha mais atrás, o príncipe Philip exibia o seu sorriso e deixava cair alguns comentários.
Quando a diplomata equatoriana e o seu marido foram apresentados aos reis, o duque de Edimburgo acercou-se de Erik e, num aparte só ouvido pelo dois, comentou: "você e eu temos uma coisa em comum: são as nossas mulheres que trabalham!" Erik não sabia o que dizer: ele próprio tinha uma exigente profissão e vir a ser toda a vida "consorte" da mulher era a última coisa que lhe passava pela cabeça. Mas não quis desiludir o príncipe e deixou escapar: "De facto, é um privilégio estar na nossa posição..." Não contava com a reação de Philip: "Privilégio?! Isto às vezes é muito aborrecido, pode crer! Para si não é?". O norueguês, que detestava cocktails e jantares oficiais, a que só assistia por virtude da profissão da mulher, achou que tinha ganho espaço para uma graça: "Ao menos, bebemos uns copos!" Ao que Philip, sorrindo, respondeu: "Pois hoje, a mim, de nada me valeu ainda ser marido da raínha! Ainda não consegui que me servissem um scotch..."
3 comentários:
Tinha um humor seco e auto-depreciativo, bem evidente no episódio que nos conta no seu post, e descrevendo-se como “a discredited Balkan prince, with no particular merit or distinction”.
Teve mais mérito do que muitas vezes lhe é atribuído, trabalhando com grande dedicação ao serviço público, como nos lembra hoje o insuspeito Guardian.
Apesar de viver em Londres, como nao vejo televisao, foi atravez deste blog que me dei conta da morte do prinicipe Filipe.
Stranger things ...
maitemachado59
Por coincidência, também vivo no Reino Unido e apesar de ver os jornais em linha várias vezes ao dia, foi ao ler este blog que soube da notícia (!).
Enviar um comentário