sábado, abril 03, 2021

Lula e Maduro

Percebo que Lula sinta uma forte gratidão face à Venezuela, por tê-lo apoiado nos piores momentos que viveu nos últimos anos. Mas faz-me impressão que alguém que soube gerir o Brasil em plena democracia, sob aplauso quase generalizado pelo mundo, sem nunca ter então colocado ou deixado colocar em causa, minimamente, a liberdade e a separação de poderes, tolerando as críticas da imprensa e a agressividade política da oposição, não consiga entender quanto avilta a sua imagem estar a colar-se a uma figura como Nicolás Maduro, protegendo publicamente o atual regime venezuelano. 

O presidente venezuelano não é mais do que um autocrata de segunda classe, um “genérico” medíocre de Chavez, que mostra não ter o mais leve respeito por quem dele discorda. Falar da existência de democracia na Venezuela atual não é apenas alimentar uma ficção, é colaborar numa mentira descarada.

Lula tem razão, contudo, ao desqualificar a figura de Guaidó, que se auto-intitulou presidente e que acabou por ser um títere que os americanos adularam, quando estavam convencidos de que a queda de Maduro estava por dias - uma patética aventura em que a União Europeia, na sua “política externa” de trazer por casa, se deixou embarcar.

Há uma coisa que a União Europeia, em termos internacionais, tem de aprender, de uma vez por todas: quando não sabe o que há-de fazer, deve perceber que a melhor resposta para isso não é necessariamente fazer aquilo que os americanos querem que ela faça.

5 comentários:

Joaquim de Freitas disse...

De acordo, Senhor Embaixador: Maduro não tem nada a ver com Chavez. Mesmo se N. Maduro se comporte en dictateur et s’est maintenu au pouvoir par la force, on ne répond pas à un coup d’Etat par un autre coup d’Etat. Guaido é isso.

Se Chavez ,e Maduro em seguida, não tivessem armado o seu povo, teriam tido o mesmo destino que Morales. E Salvador Allende. E Jacob Arbentz. E, e, e, etc.

Os EUA não estão interessados em eleições democráticas, onde quer que seja. O que querem é pôr no comando os seus lacaios, para servir os seus interesses. América First !

Não ouso fazer a lista das eleições democráticas derrubadas pela CIA, além de Salvador Allende… O Senhor Embaixador conhece-a melhor que eu.

Os EUA, não são um exemplo de democracia para os outros países. Um país onde um antigo presidente apela à insurreição diante do Capitole…para contestar eleições democráticas. Ou não foram?

Lúcio Ferro disse...

A começar por Santos Silva, o nosso homem das necessidades, que tristeza. Esse era o primeiro a ser remodelado, sinceramente, num cargo que costuma ser popular, que saudades de Jaime Gama. O Silva, subserviente para com os poderosos (nunca mais me esqueço a pose de mordomo manga de alpaca a receber Mike Pence no pátio), sobranceiro para com os fracos, armado em chico esperto arrogante sobre a Venezuela, a Rússia e outros (esquecendo que também temos interesses nesses países). Realmente, concordo, certa diplomacia deveria ser dispensada pela UE.

J.Tavares de Moura disse...

No meio de uma situação de catástrofe, provocada pela gestão desastrosa da crise de saúde pública e de uma crise social e económica de proporções gigantescas a desenrolar-se no Brasil, o "Zé Rodrigo" achou que não havia suficientes temas, importantes, para abordar na entrevista e decidiu dedicar parte do tempo à Venezuela.

Surpreende que não tenha feito perguntas sobre Cuba e a Coreia do Norte. Ou foi por falta de tempo?

Joaquim de Freitas disse...

Aqui o Senhor Embaixador diz tudo e bem: "Há uma coisa que a União Europeia, em termos internacionais, tem de aprender, de uma vez por todas: quando não sabe o que há-de fazer, deve perceber que a melhor resposta para isso não é necessariamente fazer aquilo que os americanos querem que ela faça."

Como é possível falar de democracia quando o inimigo, as hostes de mercenários, organizadas e financiadas pela oposição, com o dinheiro roubado ao povo da Venezuela, bloqueado no estrangeiro, se posta na fronteira , que jà violou algumas vezes, sem sucesso, e a 5° esquadra americana cruza nas suas águas ?

Os inimigos do povo venezuelano (não digo a nacionalidade para não o desesperar, Senhor Embaixador!) só esperam que o caos lhes traga o fruto “maduro” , economizando assim uma intervenção directa tantas vezes anunciada…Noutros tempos já o teriam feito, como na Baia dos Porcos ou na Granada, ou no Panamá….ou na Líbia ou noutros lugares, tantos, tantos…

Não posso esquecer o 5 de Outubro de 1971, quando Richard Nixon disse ao seu secretário de Estado, Henry Kissinger: "Decidi despedir Allende, aquele filho da p…." Admiro a elegância da linguagem. Nixon continua: "Não podemos deixar que a América Latina pense que pode seguir outro caminho sem sofrer as consequências." E acrescentou: "Faça-me uivar a economia" (chileno). O Senhor Embaixador recorda-se , de certeza.

A guerra económica contra o regime de Allende foi implacável. Como agora contra Maduro. Mas Maduro tem as forças armadas do seu lado, e armou o povo. Não Allende, que era um democrata. Estas palavras já estiveram em todo o mundo mil vezes, mas a "esquecimento" dos crimes e dos erros do imperialismo continua a ser uma doença generalizada.

Hoje, os Estados Unidos gostariam que Cuba, a fonte, a inspiração, e aqueles que seguem o seu exemplo, como a Venezuela Bolivariana, sofressem o mesmo destino que o Chile de Salvador Allende. Trata-se de contextualizar, situar, estudar, confrontar as classes e os seus actores. Os meios de comunicação tradicionais gostariam de impedir de levantar o manto de mentiras, de manipulação.

Mantenho-me solidário com o chavismo, porque desde a "Baía dos Porcos" (1961), o derrube de Jacobo Arbenz (1954), o Setembro chileno (1973), aqueles que acampam na calçada em frente não mudaram; martirizaram o Chile, a Nicarágua, El Salvador, Guatemala, Argentina, Uruguai, Paraguai, Honduras.

E não é o monte de podridão encabeçado por Guaido que traz alguma credibilidade à oposição, corrupta ,dita democrática na Venezuela.

Unknown disse...


Obrigado, Joaquim de Freitas. O Sr. Embaixador precisa, de quando em vez, que lhe refresquem a memória.

João Pedro

Agostinho Jardim Gonçalves

Recordo-o muitas vezes a sorrir. Conheci-o no final dos anos 80, quando era a alma da Oikos, a organização não-governamental que tinha uma e...