No aeroporto: relato a um amigo espanhol as palavras certeiras do presidente Cavaco Silva, num discurso em Florença, onde denunciou as derivas institucionais da União Europeia e a "mainmise" intergovernamental. Resposta dele: "Pena é que o teu compatriota Barroso, em lugar de fazer um comício tardio no Parlamento europeu, a tentar absolver-se da clandestinidade da Comissão, não tivesse dito isso mesmo há muito mais tempo". Por mais que tente, não me recordo da expressão exata, em castelhano, com que ele acabou a frase. Mas soou a "É o dizes!".
No jornal: o doentio catastrofismo nacional de António Barreto é objeto de um comentário irónico de Vasco Pulido Valente, a quem, como é sabido, nunca ninguém apanhou uma palavra de dúvida sobre o futuro de Portugal.
Nas ruas: nascem como cogumelos os locais de compra de ouro. E que grande época aguarda as lojas chinesas!
Na universidade: ou foi impressão minha ou o efeito da crise soltou-nos o discurso a todos. Falo por mim. Nunca dirigi um reunião de forma tão caótica. Mas pode ter valido a pena. Toda a gente começa a perceber que já não há tempo para perder tempo.
No quiosque: "Leva quatro jornais e duas revistas?! Caramba! Muito obrigado!"
No restaurante: "O senhor vem lá dos frios de Paris e acha que está calor?! Olhe que por cá tudo sobe: a temperatura, os preços, os impostos... Ah! e também a raiva..."
No restaurante: "O senhor vem lá dos frios de Paris e acha que está calor?! Olhe que por cá tudo sobe: a temperatura, os preços, os impostos... Ah! e também a raiva..."
Um familiar: fez ontem 99 anos! Fui dar-lhe um abraço. Disse-me: "acho que vou chegar aos 100!". Vai, claro! E Portugal está quase a chegar aos 900! Estamos aqui para durar!
Por todo o lado: é impressionante a unanimidade angustiada nas expetativas das pessoas com quem nos cruzamos. Quanto mais não seja por espírito de contradição, vou apostar em como isto ainda vai dar a volta. Não é impunemente que se faz uma vida como sportinguista.
No avião de regresso: conversa longa e proveitosa, entre o Porto e Paris, com Artur Santos Silva. É bom escutar os que ganharam uma sabedoria serena e tolerante.
Um amigo, triste, a comentar, ao telefone, as manifestações: "Começo a estar menos preocupado com a taxa de desemprego e muito mais com a taxa de desespero".