domingo, setembro 11, 2022

Meio século


Fui aos Estados Unidos, pela primeira vez, em 1972, há precisamente 50 anos. 

Por essa época, os amigos e conhecidos da minha geração andavam mais pela Europa. Eu também já tinha feito a peregrinação clássica às “Mecas” do tempo, Paris e Amesterdão, com naturais “expedições” complementares à Suécia e Dinamarca. Tinha ido à boleia, de Portugal, por duas vezes. 

Um dia, aproximando-se as primeiras férias do meu primeiro emprego, dei por mim a pensar que era capaz de ser “giro” ir aos “States”. Nova Iorque era um mito como cidade (se eu escrevesse que era um “mito urbano” iria criar uma confusão conceitual, pela certa!). Tinha tantas daquelas avenidas e esquinas dentro da minha cabeça, dos filmes, que achei imperioso colar a realidade ao mito. Na saudosa agência de viagens Mundial de Turismo, na António Augusto de Aguiar, 6.800$00 era o custo de uma viagem de ida-e-volta a Nova Iorque, na Pan American, com alojamento! É verdade! E lá fui eu, por uma semana, com um grupo do Autoclube Médico Português, em que até me dei ao luxo de dar uma saltada a Washington, naqueles famosos autocarros da Greyhound.

O hotel onde fiquei em Nova Iorque, o Edison, tinha sido um dos cenários de “O Padrinho”. Era muito próximo da Times Square, a dois passos do falso fumo a sair da boca do anúncio com um cavalheiro, com ar do americano “nice guy”, de gabardine e chapéu, que víamos nas “Seleções” e que ali fumava cigarros Camel, na altura um “landmark” publicitário da cidade por todo o mundo. 

Recordo-me bem da noite da chegada em que, pela primeira vez na minha vida, tive à disposição, no meu quarto, uma televisão com uma multiplicidade de canais a cores! Nós, em Portugal, por essa altura, tínhamos um único canal a preto-e-branco da RTP “e viva o velho!”, como então se dizia. Não havia por ali, contudo, qualquer comando do aparelho à distância, pelo que, durante horas, até que o “jet lag” ditou a sua lei, fiz um “shuttle” entre a cama e o televisor, para ir apreciando, deslumbrado, aquela inédita diversidade de opções. Tempos ingénuos!

Nesse ano de 1972, só uma das Torres Gémeas estava construida, com a outra ainda a caminho de ser completada. Nesse tempo, nem sonhava que iria estar a viver em Nova Iorque no dia 11 de setembro de 2001, no dia em que o ódio iria deitar abaixo as torres e algumas certezas.

Hoje é dia 11 de setembro. E hoje vou partir, daqui a horas, em trabalho, para os Estados Unidos, para falar numa conferência sobre a América e o modo diferenciado como a Europa (as “ Europas”, para ser mais rigoroso) para ela olha, nos dias de hoje. A curiosidade é a viagem ter lugar meio século depois de lá ter estado pela primeira vez.

5 comentários:

Flor disse...

Depois do 11 de Setembro o Mundo transformou-se a todos os níveis. Fiquei estupefacta quando vi um avião a entrar numa Torre Gêmea e o que veio a seguir.
Sr. Embaixador desejo-lhe uma boa viagem e bom trabalho que espero poder ver.;)

Unknown disse...

Em 1972 andava em Moçambique sem... televisão, mas com muito cinema. Lisboa tinha 17 cinemas à data e Lourenço Marques 15 (contados por mim nos jornais da época). Só no continente, em 72/73, é que vi televisão a preto e branco pela primeira vez. Mas redimi-me: em 1990 (ou seria 89?) fui aos States e vi pela primeira vez um telemóvel objecto que só uns meses depois vi em Portugal!

Nuno Figueiredo disse...

the Pierre.

Figueiredo disse...

O Sr.º Embaixador escolheu uma imagem para figurar na sua publicação, onde a beleza, realidade, genuinidade, bom-gosto, liberdade, e perfeição do Século XX e suas gentes se encontram estampadas na mesma.

Note-se as pessoas bem ataviadas e com roupas bonitas, a publicidade feita por artistas e as letras em néon, com destaque para o monumental cartaz dos cigarros Camel, no tempo em que o tabaco era de qualidade e os fumadores respeitados.

É um contraste enorme com a mediocridade, aberrações, decadência, mau-gosto, tirania, sub-desenvolvimento, e degeneração do Século XXI

Anónimo disse...

A título de curiosidade, 6.800$00, em 1972, correspondem a 1.645€, actualmente...

O futuro