Um dia de 1986, com Portugal recém-ingressado nas Comunidades Europeias, fui ao gabinete do secretário de Estado da Cooperação receber instruções para uma reunião no Luxemburgo. O ambiente na delegação portuguesa que ia a essa reunião era algo tenso, por virtude de uma disputa de competências, cuja substância não vem aqui para o caso. Por essa razão, eu ia "de pé atrás" e mais fiquei quando me foi dito, para além de uma orientação sobre o sentido de intervenção em dois ou três pontos da agenda, que, nos restantes, deveríamos "seguir os ingleses". Devo dizer que fiquei chocado, pelo que isso traduzia de abdicação de pensarmos pela nossa cabeça e de entregarmos a defesa dos nossos interesses, que os havia nesses pontos, aos humores de voto de outrem.
Um mimetismo teimoso com as posições de Londres foi, durante muito tempo, uma orientação que a linha política dominante nas Necessidades prosseguiu, no início da nossa experiência comunitária. Portugal parecia ter assumido que alguma identidade de pontos de vista com o Reino Unido, que tradicionalmente se verificava em matéria de segurança e defesa no quadro da NATO, era extrapolável para as áreas da vida comunitária. O tempo veio a provar que essa orientação estava totalmente errada e que, cada vez mais, a postura europeia de Portugal devia afastar-se da linha britânica, a qual, além de ter uma agenda de interesses muito própria e diversa da nossa, contribuía frequentemente para o nosso isolamento.
A imagem de uma diplomacia portuguesa "tutelada" pelos britânicos continuou, contudo, por algum tempo, nas instituições comunitárias. Cerca de uma década depois da cena que abriu este texto, um jornalista europeu, em Bruxelas, depois de eu ter anunciado a apresentação de uma qualquer proposta, perguntou-me, durante uma conferência de imprensa, se "tinha coordenado isso com os britânicos". Perante a minha questão "porquê com os britânicos?", o jornalista inquiriu: "então Portugal não coordena sempre previamente as suas posições com Londres?". E ficou surpreendido quando eu lhe garanti que não.
Nesta questão de sentido de voto, é muito divertida a história que Margarida Ponte Ferreira contou ontem na minha página de Facebook. Numa determinada negociação técnica, o delegado grego disse ter tido instruções da sua capital para acompanhar o sentido de voto de Portugal. A delegada portuguesa confessou que, provavelmente pelo facto do assunto não ser relevante para nós, Lisboa tinha indicado que deveríamos apoiar a posição que a França viesse a tomar. A resposta do delegado francês foi lapidar: ele tinha instruções para votar em sentido contrário aos britânicos...
A imagem de uma diplomacia portuguesa "tutelada" pelos britânicos continuou, contudo, por algum tempo, nas instituições comunitárias. Cerca de uma década depois da cena que abriu este texto, um jornalista europeu, em Bruxelas, depois de eu ter anunciado a apresentação de uma qualquer proposta, perguntou-me, durante uma conferência de imprensa, se "tinha coordenado isso com os britânicos". Perante a minha questão "porquê com os britânicos?", o jornalista inquiriu: "então Portugal não coordena sempre previamente as suas posições com Londres?". E ficou surpreendido quando eu lhe garanti que não.
Nesta questão de sentido de voto, é muito divertida a história que Margarida Ponte Ferreira contou ontem na minha página de Facebook. Numa determinada negociação técnica, o delegado grego disse ter tido instruções da sua capital para acompanhar o sentido de voto de Portugal. A delegada portuguesa confessou que, provavelmente pelo facto do assunto não ser relevante para nós, Lisboa tinha indicado que deveríamos apoiar a posição que a França viesse a tomar. A resposta do delegado francês foi lapidar: ele tinha instruções para votar em sentido contrário aos britânicos...