domingo, março 08, 2015

O drama presidencial


O senhor presidente da República deve receber em Belém os insofismáveis registos de opinião que dão nota de que a generalidade dos portugueses avalia hoje, de forma amplamente negativa, a sua prestação no lugar que ocupa. Seria interessante, se não fosse impossível, o país conhecer o que infere o chefe do Estado desse facto, a quem atribui as culpas desse estado de alma da nação face ao seu supremo magistrado - num fim de mandato que, por regra, leva à atenuação das arestas da crítica e à cristalização, no imaginário coletivo, de um somatório das qualidades que a benevolência da memória pública foi capaz de decantar nos titulares cessantes do cargo. Mas podemos imaginar, atentando naquilo que conhecemos da personagem, que o senhor Presidente não se deve auto-atribuir grandes responsabilidades nesse estado de coisas, passando as culpas para a conjuntura adversa, para o viés da comunicação social, para a má fé das forças políticas e dos fazedores de opinião. O senhor presidente, lá no fundo, deve achar-se filho daquela senhora que, ao ver um pelotão militar marchar, conclui que só o seu rebento leva o passo certo.

Ontem, o senhor presidente, ao comentar as trapalhadas das contas do primeiro-ministro com o erário, deu uma prova mais de que permanece numa profunda dessintonia com o país, que - com todo o devido respeito - não entende que lhe compete interpretar o sentimento maioritário dos portugueses e que o cargo que ocupa imporia que mantivesse, até ao último dia que o vai exercer, uma neutralidade e uma avaliação elevada da situação política que lhe compete tutelar. Resta a leitura de que, por detrás deste evidente gesto de não adesão à exigência nacional da clarificação, de uma vez por todas, do passado profissional, fiscal e contributivo do dr. Passos Coelho, o senhor presidente da República possa estar a ecoar subliminarmente o seu próprio embaraço, o facto de não ter deliberadamente deixado dilucidada uma questão que o país sabe que continua a ser-lhe incómoda: a sua lamentável relação com o caso BPN. Neste teatro de sombras em que o palácio de Belém se converteu, este parece ser o drama do senhor presidente. Que, para o país, é uma tragédia.

17 comentários:

Anónimo disse...

e para lá do bpn, está por esclarecer a história da sisa, relativamente à qual, oportuno acórdão do STA veio colocar um manto sobre o acesso a documentos que são, ao abrigo da lei, de acesso livre e generalizado...
Anos de chumbo, os da presidência de Cavaco, que somados à década como PM são uma eternidade...

David Caldeira

opjj disse...

Dr.Seixas da Costa esperava de si mais isenção.
Recordo que Cavaco Silva foi a votos e venceu todos os seus pretendidos juntos.Recordo-lhe que uma andorinha não faz a Primavera.
Quanto ás multidões, bastam 50 para fazer barulho.Como exemplo, 1 só guerrilheiro fazia tremer várias das nossas companhias com dezenas de milhares de homens no seu conjunto.Creio que esteve em Angola logo deve saber isso.
Quanto ao BPN tb deve ser justo.
1º a causa principal foi Sócrates ter nacionalizado o banco.Li que a razão era que a Seg Social tinha lá 600 milhões e teve medo deos perder e como tal enderessou-os aos contribuintes.
Quanto ás acções, Cavaco Silva tinha 130000, comprou a 2,30 e vendeu a 2,60, mas as acções chegaram aos 2,90 valor muito superior.Eu próprio comprei e vendi (embora poucas) com um ganho superior a 12 vezes.
Curiosamente, Cavaco perdeu noutras acções de bancos e não se referem a elas.
Dá jeito deitar abaixo o mais alto magistrado da Nação mas acho isso uma baixeza pouco lisonjeira.
A justeza não tem partidos, tem berço.
Cumps

Francisco Seixas da Costa disse...

O que tenho escrito neste blogue sobre o senhor presidente da República é a minha opinião. Anoto a sua mas lamento a forma deselegante como a expressa.

Anónimo disse...

"a culpa do BPN foi do Socrates"
claro, já só faltava tb esta. Depois de ter provocado uma crise financeira mundial, de ter endividado o Pais (que até ele chegar ao Poder não tinha quaisquer dividas), tambem foi o cabrao do Socrates que foi estragar um banco de pessoas honestas como o BPN. Até o pobre do Oliveira e Costa, esse Santo, foi enganado pelo Socrates.
E o Cavaco foi sobretudo esperto, comprou acções do BPN a cerca de um euro quando os outros andavam distraidos. Só não entendo como ele as conseguiu comprar, se nunca as vi à venda na Bolsa.

Anónimo disse...

Alguém devia explicar ao Sr. Presidente da República que o problema do Sr. Primeiro Ministro não é a falta de memória, a falta de dinheiro, o desconhecimento da Lei, a falta de notificação, nem são chicanas político partidárias. O problema do Sr. Primeiro Ministro é um problema de carater.

opjj disse...

V.Exª a quem eu tiro o chapéu, pq, é uma pessoa culta e vivida, acha-me deselegante e não acha deselegante ao que diz de Cavaco Silva.
Cumps.

Bartolomeu disse...

Olhe, Senhor Embaixador; gostei do post. Está concordante com a opinião que expressou no "quadratura do circulo", evidentemente. Está elegante e objectivo. Define a sua opinião que, faz eco das opiniões de comentadores com tarimba e assento na midia, faz eco também das vozes da oposição e de uma parte cada vez mais significativa de gente do poder. E sobretudo, atesta a sanidade da sua vesícula, o que me deixa satisfeito. Como vê, também sou tipo capaz de dizer umas larachas.

Anónimo disse...

Volto a referir o que aqui já escrevi. O Prof. Cavaco Silva é o político português que tem mais responsabilidades no estado actual do país. É PR desde 2006 ( ainda a crise não tinha começado - nada previu e nada resolveu ) e foi PM durante dez anos ( quando havia dinheiro e optimismo - também nessa altura nada resolveu ). Acha que tem jeito para Pôncio Pilatus numa torre de marfim mas já só engana quem quer ser enganado ou ilude quem quer ser iludido ( riscar o que não interessa). Por um lado, ainda bem que é o Banco de Portugal que lhe paga. Fica claro, de uma vez por todas e sem contestação, a quem obedece e a quem presta contas.
JPGarcia

Anónimo disse...

Caro Francisco Seixas da Costa,

Cavaco foi eleito (com o meu voto e não com o seu) para não fazer ondas e criar estabilidade.

É isso que tem feito. O meu amigo não gosta, tenha paciência e aguente.

Do meu lado acho que lá foi cumprindo a sua parte. Dá para imaginar onde estaríamos com o Manuel Alegre ou o Fernando Nobre...

A minha opinião é que o seu comentário é partidário -- está com o PS lá vai picando o ponto para as eleições que se avizinham.

Mas este é o problema da nossa elite. Deixou de ser sociedade civil independente para mera correia de transmissão partidária. É pena. E escrevo-o porque tenho simpatia por si.

Cumprimentos, Anónimo Séc XXI

Anónimo disse...

Li, gostei e concordei.
A minha questão reside, agora, na atitude do atual PR em meados do próximo ano: será que ele sabe que tem de sair? De dar lugar a outro? Apoiar-se-á ele nas FA, no MP, na CE ou noutro organismo qualquer para invocar um 3º mandato?
Já todos sabemos como o nosso PR reage a derrotas políticas e a dar lugar a outros.
sobre o BPN e as ações: os idos de 80 deixaram, efetivamente, muitas mossas. Não tão grandes como os idos de 20, que esses ganharam raízes profundas.

Anónimo disse...

Cavaco não será apenas o pior pR desde o 25 de Abril, mas o pior desde a República. Mesmo pior do que Thomaz. Cavaco é não só um tipo de extrema direita, direita radical, mas é um tipo mau. Sem sentimmentos. Nada. Inqualificavel criatura. Quando cessar funções deitar-se-ão foguetes! Cavaco é também uma espécie de ministro sem pasta de Passos. Nem posso olhar para a cara dele!

Joaquim de Freitas disse...

“Os fins justificam os meios”.

O que se opõe exactamente à moral que prima em não passar por cima de direitos individuais e orientações consideradas éticas e correctas. Não importa que tenha de roubar, destruir ou desvirtuar para atingir o propósito, algumas vezes considerado positivo, como o de constituir um património considerável.

Não, o reino da política não faz fronteira com o reino da moral.

Maquiavel foi incompreendido durante séculos, apenas por mostrar as coisas como elas realmente são, sem máscaras, a verdade nua e crua.

Para os filósofos gregos, ética e política se complementam, pois para governar bem é preciso ser ético. O bom governante deveria cuidar bem da pólis (cidade-estado). Mas quando o governante se cuida de si mesmo antes de cuidar da polis, quer dizer que ele leu Maquiavel ao contrário.

Joaquim de Freitas disse...

Ao Anonimo do Séc.XXI

Que escreve:

" Dá para imaginar onde estaríamos com o Manuel Alegre ou o Fernando Nobre..." .

Devo desde já dizer que, estando ausente do país desde há 50 anos, só conheço o poeta e menos a segunda alternativa.
Mas parece-me sempre abusivo de dizer dum candidato potencial, desistido ou batido, que tudo seria pior se tivesse sido ele o eleito... Como sabê-lo?
Seriam mais ou menos as mesmas palavras que teriam sido escritas sobre Clinton...se não tivesse sido eleito. Estava frequentemente nos EUA nessa época, e a avalanche de artigos desfavoráveis sobre o "pequeno" governador do Arcansas, cobriam todos os jornais. Era o candidato impossível !

Quando deixou a Casa Branca, a sua reputação foi feita, é certo, um pouco debaixo da mesa oval, por uma estagiária hábil, mas sobretudo graças a uma situação económica invejável das contas da Nação.
Surpreendeu toda a gente.

Em contrapartida, ouve um produtor de amendoins, que parecia recolher uma maior aceitação antes do voto, e que deixou aos EUA um saco de graves "problemas" para resolver , que Reagan utilizou habilidosamente para ganhar a corrida à White House.

Vejo a situação política do PR e do PM cá de longe, com uma ponta de tristeza. E isto porque acho que o povo Português, que muito sofreu dos erros das suas elites no passado, (sem falar do desastre da ditadura) , esperava que com a liberdade , mesmo se os problemas económicos não fossem resolvidos inteiramente, como também na Europa não o foram, teria dirigentes nas altas esferas do poder , absolutamente isentos de qualquer nódoa moral ou ética. Não falo dos erros de política estrangeira !

Claro que o PR foi eleito por uma maioria. Quando se fala de moral em politica, e num regime democrático em particular, pensa-se primeiro na integridade dos representantes eleitos do povo aos quais este confiou o cuidado de exercer em se nome o poder de governar. A probidade, a honestidade "escrupulosa", o desinteresse mais total são o mínimo esperado daqueles que detêm o poder em nome do povo.

A moral neste caso não é a dos homens de poder como indivíduos, mas aquela relativa às decisões políticas que tomam. Que Hitler e Estaline tenham sido ou não homens íntegros, direitos, que se enriqueceram ou não pessoalmente, não é o que a história conservará da sua ditadura.
Também já aconteceu que um regime democraticamente eleito tome medidas que chocam profundamente a moral ou mais exactamente esta parte da moral que se considera como "universal".

Muitas medidas tomadas pelo governo actual , no que elas têm de iníquo e imoral, num contexto nacional onde tantas infracções aos tais valores democráticos foram e são cometidos a "todos" os níveis na justiça, na economia, e no respeito dos cidadãos, num oceano de sofrimento do povo Português, demonstram que o Estado de direito, a integridade moral e politica dos dirigentes, a soberania do povo, a democracia, mostram aqui os seus limites.

Sente-se que há acima destes valores, importantes, certo mas insuficientes, um principio superior em nome do qual é legitimo, e é mesmo um dever, de se revoltar se é violado. E que tenha votado por este regime não invalida esta legitimidade de revolta. São os direitos do Homem.

Anónimo disse...

Andamos sempre a aprender!. Soube agora que o problema do BPN foi o tal! Ó Sócrates. Para proteger o grupo, dono do Banco e tome nota: todos amigos do dr. Cavaco e seus vizinhos da coelha.
Mas porque o Sócrates, colocou as mãos por baixo do BPN. È desonesto pensar que não foi por boas razões,(efeito dominó na banca) como na altura, tudo esteve de acordo.
Já agora e para compor o ramalhete lhe digo que por estamos todos a pagar os enormes prejuízos do BPN (dos amigos do dito)eu, no seu lugar, tinha tomado a atitude de devolver, sem mais, todas as mais valias das ações de favor que os amigos lhe resolveram dar de mão beijada, infelizmente isso não aconteceu. Na linha aliás,da escolha da remuneração, não da função, mas a outra que sempre são mais umas croas, não é Maria?

João Marques Petinga Avelar disse...

O Snr. Presidente da República tem mais que fazer e não pode perder tempo com paranóicos alinhados, ajudantes de formação de opinião pública num só sentido.

Anónimo disse...

Naquele tempo em que as mais valias na transação de acções não existiam se entre a compra e a venda passasse mais de um ano, comprar uma acção não cotada, fazer com o vendedor um contrato de recompra passado um ano pelo dobro era a mesma coisa que meter um cheque pré-datado ao bolso.
Agora estão a entender?

Anónimo disse...

Les beaux esprits se rencontrent
O casamento Norte (Vila Real)-Sul (Fonte de Boliqueime/Poço de Boliqueime/S. Bartolomeu de Messines está à vista. Mas de Norte/Sul sabe o sr. Embaixador. Eles entraram em desnorte e o Chefe Supremo não sabe o que é uma bússola e desconhece o que é a equidistância. Já se baralha muito e mete os pés pelas mãos. O ressaibo da noite em que foi eleito ainda não lhe passou. O Dr. João Lobo Antunes, que o acompanhava, podia dar-lhe umas mezinhas, daquelas que também se aconselham para o enjoo e a dor de gamo...

Agostinho Jardim Gonçalves

Recordo-o muitas vezes a sorrir. Conheci-o no final dos anos 80, quando era a alma da Oikos, a organização não-governamental que tinha uma e...