Os meus óculos estavam “cansados”. A vista vai-se alterando. O oftalmologista confirmou: tinha de mudar de óculos. E assim fiz. Já agora, mudava também de tipo de óculos. Estava um pouco farto dos que usava, ia para duas décadas. Eu até sabia muito bem o que queria - na cor e no design. E lá fui ao oculista, dos bons, isto é, dos caros. Expliquei tudo. Com o Google à mão, mostrei mesmo uma fotografia do modelo desejado. A senhora “foi ver”. A mesa começou a encher-se de pares de óculos, de todas as cores e feitios. Fui afastando um a um aqueles de que não gostava, os que, dizia ela, me faziam “mais velho”, os que, também segundo ela, não davam com o meu “tipo de cara”, os “pesadões”, os “demasiado desportivos”, os que eram “mais do mesmo”, face ao que já usava, etc. E eu ia concordando. Tenho muito escassa pachorra para perder tempo com compras (salvo livros, queijos, blocos de papel e champôs). E já por ali estava, em frente ao espelho, há uns bons vinte minutos, “morto” por me safar. Mas continuavam a chegar pares de óculos. Que eu ia afastando. Para o fim, ficaram dois ou três a que eu achava graça, que ela achava que me “ficavam lindamente”, que “dizem muito bem consigo”, que “lhe dão um aspeto mais jovem”. Um dos pares, de facto, agradava-me bastante. Preço? “São caros, mas são excelentes”. A senhora era simpática, delicada, profissional, nada “pushy”, tinha todo o tempo do mundo. Eu não. “Pronto! Levo estes!”. Liberto da tarefa, paguei, aliviado. Voltei lá dias depois, levantei os óculos. Gostei, estavam excelentes, via muito bem com eles, gostava do modelo. Depois, a reação foi a esperada: “São uns óculos bonitos, ficam-te bem, mas não têm nada a ver com aqueles que tinhas intenção de comprar!” Era verdade: não havia a mais leve semelhança entre aquilo que eu queria quando cheguei à loja e o que acabara por adquirir. Por que será que sou assim?
2 comentários:
« Os meninos de oiro, para os que vinham cá da Régua à procura de noiva ou namorada, ou os da "televisão" quando algum desconhecido por aqui aparecia sem sabermos ao que vinham.» ...
Ou talvez o conselho de alguém, “profissional, nada pushy, (...) [com] todo o tempo do mundo”. É por isso que os oculistas, “dos bons, isto é dos caros”, são caros. Podem pagar o tempo para alguém nos convencer que, na verdade, precisamos de algo muito diferente do que fomos procurar. E no fim saímos da lá satisfeitos.
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