Dizer que somos um país feliz, nos dias que vivemos, parece sem sentido. Mas somos. Somos um país com uma sólida estrutura democrática, com um sistema político, desde há décadas, sem uma única falha institucional grave, com uma separação de poderes que oferece garantias, com uma lisura exemplar nos processos de escrutínio da vontade dos cidadãos. Estamos integrados numa aliançapolítico-económica europeia marcada pelos melhores valores, temos um excelente quadro de inserção externa, não temos ameaças diretas à nossa soberania.
Vivemos então num oásis, é isso que quero dizer? Não, não é. Somos um país pobre, o mais pobre da Europa ocidental, temos uma dívida monstra para pagar, uma economia dependente do menor abalo em escassos setores, com baixa competitividade, alimentamos uma cultura comportamental com laivos “terceiro-mundistas” (não se usando, é a palavra que quero usar), marcada por inúmeros vícios e um modo de estar na vida que, se facilita o dia de hoje, compromete bastante o de amanhã. Por tudo isso, acrise aí instalada vai atingir-nos em cheio.
Mas, mesmo assim, somos um país feliz? Somos. No quadro de uma pandemia de proporções extremas, operamos em estreita ligação com Estados e fontes de conhecimento técnico do melhor que o mundo pode proporcionar, dentro do mar de incertezas em que todos vivem, dispomos de um sistema público de saúde que, por muitas fragilidades que tenha, tem a humanidade de não exigir cartão de crédito à entrada dos hospitais, que é igualitário e justo – repito, à medida dos recursos que são os nossos e não os de países mais ricos do que nós.
Hoje, o presidente da República pode vir a decidir o estado de exceção, dando ao governo e às forças de segurança, sob a sua tutela, poderes acrescidos. Comocidadão, não me custa aceitar que as autoridades democráticas do país possam, nas presentes circunstâncias, vir a adotar medidas excecionais. Sempre com conta, peso e medida, limitadas no tempo e com a sua eventual renovação sujeita a todo o formalismo usado aquando da sua imposição.
Somos um país feliz por termos um parlamento livre, presidido por um homem que lutou toda a sua vida pela liberdade. Por termos um governo chefiado por um dos mais competentes políticos da nossa História recente. Por termos como líder da oposição um homem de bem, com uma exemplar folha cívica. Por termos na chefia do Estado um cidadão com indiscutíveis credenciais democráticas, um patriota, uma pessoa que gosta do seu país como ninguém. Somos um país feliz.
5 comentários:
"tem a humanidade de não exigir cartão de crédito à entrada dos hospitais, que é igualitário e justo " Creio , Senhor Embaixador, que responde à pergunta que me fez num post precedente. E nao é a unica resposta. Hà ainda outras mais graves ainda, na minha opiniao.
País feliz, sendo o mais pobre da Europa Ocidental?! Só se for para alguns privilegiados..
Dizer que Portugal é um país pobre é de um enorme egoísmo. Só somos pobres em relação aos países mais ricos do mundo. Que são muito ricos. Mas estamos nos 25% mais ricos e ainda relativamente longe do fim deste grupo. E em muitos índices estamos entre os melhores dos melhores, coisa que desde o século XVIII não acontecia. Quanto aos hábitos referidos é o que leva estrangeiros a dizer que somos o único (manifesto exagero) onde as relações entre as pessoas ainda são humanas. Ainda temos uns focos de resistência à ética calvinista que domina o mundo dito desengodo e esmaga a católica, para gáudio da direita católica lusa, bem mais complacente. Em Itália esse aspecto é bem mais agudo e é o mais fantástico país do mundo. Não trocava Roma ou Lisboa por Helsínquia, Oslo Berlim, ou Viena. Temos de facto um grande problema. O nosso maior prazer é lamentamos-nos. É isso que é cansativo
Fernando Neves
Caro Fernando Neves. Lê bem o texto. Eu não digo isso.
É em situações como esta em que nos encontramos que necessitamos de pessoas como o Sr. Embaixador. O que aqui escreveu faz-nos pôr os pés no chão. Realmente somos pouco ricos, mas somos ricos. Achei sublime. Muito obrigado.
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