quinta-feira, julho 11, 2019

Tribunal da opinião

É uma imensa asneira a ideia que por aí anda de levar à justiça a historiadora Fátima Bonifácio, por virtude das inanindades preconceituosas que escreveu no “Público”.

O único tribunal adequado para estas questões é o da opinião pública, onde deve ser posto a nu o preconceito primário que ficou exibido no texto.

Não transformem a senhora numa mártir do reacionarismo da paróquia!

O racismo e a direita

Não vejo qualquer problema moral, bem pelo contrário, na aproximação entre a direita moderada e ideias e movimentos que uns apressados rotulam de extrema-direita. Antes vejo um problema moral profundo na aproximação entre a direita moderada e a esquerda moderada e qualquer outra esquerda, as últimas moral e intelectualmente falidas e, por isso, nociva para as sociedades.

Quem escreveu isto, completamente a despropósito, num artigo louvaminheiro das ideias propagadas no já aqui referido texto de Fátima Bonifácio, é o opinador do “Observador” Gabriel Mithá Ribeiro. Que, por acaso, é negro.

A liberdade de um embaixador


Num relatório interno para o seu governo, o embaixador britânico em Washington escreveu alguns comentários pouco abonatórios sobre Trump e a sua administração. 

A um embaixador é pedido que dê a sua franca opinião, qualquer que ela seja, sobre a realidade do país em que está acreditado. É pago precisamente para isso. A sua visão, fruto da experiência e abalizada pelos contactos que tem, destina-se a influenciar a atitude do seu governo perante o do país que o acolhe. Pode ter razão ou pode estar errado, mas isso é uma questão apenas entre ele e o seu governo. Acresce que, no caso britânico, o cargo de embaixador em Washington é um dos mais elevados da respetiva carreira diplomática, pelo que o diplomata que ocupa o posto é sempre um profissional de “primeiríssima água”.

A liberdade de opinião de um embaixador é, em princípio, garantida pela estrita confidencialidade daquilo que reporta. É a segurança de que o que escreve é lido apenas por quem “need to know” (como se diz na “intelligence”) que lhe confere a liberdade necessária para se exprimir.

Porém, o tal relatório do embaixador britânico veio a público, numa daquelas canalhices de quebra de confidencialidade que mostra o estado em que anda o “civil service” do país de sua majestade. Trump, como é óbvio, não gostou do retrato que o embaixador fez de si e dos seus e afirmou, publicamente, que o diplomata deixaria de ter o acesso facilitado junto da sua administração, embora não tivesse ido ao ponto de o considerar “persona non grata”. Os britânicos, no caos funcional em que vive a sua administração, e muito cobardemente, não cuidaram em fazer o que seria decente: proteger o seu homem em Washington. O qual, “sozinho no meio da praça”, se viu obrigado a demitir-se.

Imagino que o futuro embaixador britânico nos Estados Unidos venha agora a ser tentado (e forçado) a entrar em Washington com “pezinhos de lã”, para que lhe não lhe venha a acontecer algo similiar ao seu antecessor . 

Ser obrigado a fazer auto-censura sobre o que reporta às suas autoridades é o pior que pode acontecer a um embaixador. A menos que seja corajoso e, no fim dos seus textos, cuide em inserir o “motto” (em francês, claro!) do escudo britânico: “honi soit qui mal y pense” (que se envergonhe quem pensar mal disto).

quarta-feira, julho 10, 2019

Os vencidos da dívida


As recentes eleições na Grécia tiveram, entre nós, nos últimos dias, um tratamento mediático banal. O regresso ao poder dos conservadores, com maioria absoluta, foi assinalado quase com parcimónia. Mudam-se os tempos...

Há uns anos, o nosso país emocionava-se fortemente em face da crise grega, de um país mergulhado em dívida, com uma situação social gravíssima, com uma conflitualidade quase levada ao extremo nas ruas. A Grécia era, então, o nosso espetro: "não somos a Grécia", diziam alguns, a exorcizar o pior.

Com a derrota histórica da social-democracia, a "esquerda da esquerda" subiu ao poder em Atenas. Subitamente, a cara sorridente de Alexis Tsipras, o líder do Syriza, passou a fazer parte do nosso quotidiano informativo, acolitado por Varoufakis, um ministro das Finanças que, de um dia para o outro, passou quase a "sex symbol".

Aqueles que, por cá, defendiam que se devia mandar às urtigas os compromissos subscritos com Bruxelas viam no desengravatado estilo dos novos gregos um farol de esperança. Bater o pé a e em Bruxelas era a moda do tempo.

Reféns da dívida, os governantes gregos iniciaram o seu percurso com o óbvio "não pagamos!". Todos acompanhámos então a coreografia dos seus dirigentes pelos corredores de Bruxelas. Não foram poucos os que duvidaram de que aquele método abrupto de negociar viesse a ter o mínimo de sucesso, mas, por cá, em certos meios, ironizar com o estilo de Varoufakis chegou a ser equiparado a uma traição. É certo que vivíamos num país onde uma coligação troika/PSD/CDS parecia justificar o maniqueísmo, tanto mais que ela se portava, face ao caso grego, com um cinismo egoísta, tentando arrancar um esgar de simpatia a Berlim.

Um dia, Tsipras, ciente de que o método Varoufakis afinal nada mais era do que a irresponsabilidade feita política, percebendo que Angela Merkel não queria uma crise na Zona Euro, cedeu e comprou o regresso a uma certa normalidade. A acalmia dos tempos europeus pós-crise fez o resto. Havia outro caminho? Talvez, mas esse passava pelo completo isolamento internacional da Grécia e, com toda a certeza, por um sofrimento ainda maior do seu povo. Tsipras foi apenas realista.

Em política, a gratidão não é a regra. O modo como o Governo grego conseguiu resolver o velho conflito toponímico com os vizinhos da nova Macedónia do Norte acabou por ser inscrito a débito na contabilidade da governação do Syrisa. A coragem de Tsipras não foi premiada. Agora, regressa à oposição. É assim a democracia, também no país onde ela nasceu.

terça-feira, julho 09, 2019

A Quinta Vigia


Aquela cara dizia-me alguma coisa. Olhámos um para o outro, quando nos cruzámos, a dois passos do velho Café Apolo, no centro do Funchal, há dois dias. Ele também me conheceu. 

Todos cultivamos imensos “déjà vu”, fruto de memórias incompletas. Não sou exceção. Andei as horas seguintes a maturar de onde conhecia aquele tipo. À noite, “caiu a ficha”: não sei quem ele é ou o que faz na vida, mas sei bem como o conheci.

Foi há duas décadas. Tinha ido à Madeira para uma qualquer função oficial, nesses tempos em que andava pelo governo. Chegado de manhã, era minha intenção sair da ilha ao final da tarde. Mas, ainda no aeroporto, fui confrontado com uma situação inesperada: o então presidente do governo regional, Alberto João Jardim, tinha organizado um jantar para mim na Quinta Vigia, para o qual tinha convidado diversas pessoas. Garantiam-me que podia regressar a Lisboa, no último avião, depois do jantar. Aceitei o gesto de simpatia, claro.

O jantar, que iria ser muito agradável, tinha aí uma dúzia de convivas. Jardim, no que recordo ser uma espécie de terraço, ia-me apresentando os convidados que eu não conhecia. Foi o caso de um cavalheiro, cujo nome nunca fixei (palavra!), que teria uma função local qualquer, oficial ou não, que também não anotei.

Estávamos os três numa breve conversa quando Jardim se saiu com esta, voltando-se para mim: “Aqui este nosso amigo anda aí numas brincadeiras... com uma pequena! Ele julga que eu não sei!”. O homem pareceu mudar de cor e reagiu, surpreso: “Ó Alberto João, deixa-te disso! O senhor secretário de Estado pode julgar que estás a falar a sério!”. O presidente não lhe poupou o embaraço, que se viu crescente: “E então não estou? Mas eu sou teu amigo e da tua família, não conto mais nada, está descansado!”. E passou à frente, como se nada tivesse dito.

Durante o jantar, o homem olhou para mim de viés, várias vezes, com ar preocupado. Eu retribuía-lhe a mirada com uma expressão neutra, não fosse o homem pensar que eu pudesse vir a explorar a “boca” do presidente. 

A pessoa com quem, há dois dias, me cruzei no centro do Funchal era precisamente a mesma a quem eu fora apresentado por Alberto João Jardim. Quem será? Que faria, à época? Ainda terá o “affaire” ou tudo não passava de uma “blague” de Alberto João Jardim?

Neste blogue, faz hoje 10 anos

”A história foi-me contada ontem em Paris, no intervalo de uma função oficial.

Estava-se nos anos 60 ou 70. Três "terroristas" tinham sido presos, no Norte de Angola, e mantinham-se alinhados, na parada de uma unidade militar portuguesa. Eram homens que combatiam pela independência da sua terra, contra o "nosso ultramar". O exército tinha-os neutralizado e aguardavam transporte para Luanda.

Num determinado instante, um dos "turras" (era assim que os "terroristas" independentistas eram chamados nesses tempos) deu um salto em frente e voou para apanhar um papel que o vento havia feito deslocar na parada do quartel. A rapidez do seu movimento corporal apanhou de surpresa os militares à guarda de quem estavam, que puxaram logo de arma, numa reacção que, por pouco, não foi violenta. Mas o "turra" rapidamente regressou à formação alinhada com os seus camaradas, recolhendo logo o papel no bolso.

Os militares portugueses não "brincavam em serviço" e, de imediato, exigiram a entrega do papel. Quem sabe, podia tratar-se de um documento estratégico, a revelação de planos militares. Se o "turra" tinha corrido o risco de avançar para agarrar o papel, numa ousadia que podia ter-lhe custado a vida, alguma valia ele teria. O detido ainda hesitou mas, face ao óbvio imperativo, acabou por entregar o papel.

O resultado foi mais simples do que se esperava: tratava-se de uma página do jornal "A Bola", esse federador "avant la lettre" do grande e imparável mundo que é a lusofonia desportiva.”

segunda-feira, julho 08, 2019

Mitsotakis


Foi um jantar bem agradável, em Atenas, num restaurante com vista para a Acrópole, há já muitos anos. O meu colega na Grécia, a pretexto da minha passagem, tivera a simpatia de convidar alguns amigos.

A meu lado ficou um deles, embaixador em Atenas de um país cujo nome agora me escapa, o qual, durante todo o jantar, me falou imenso das ilhas e das praias, dos armadores milionários que conhecia, dos cruzeiros para que era convidado e outros temas com idêntica intensidade lúdica. Estava na Grécia há mais de dois anos, mas a sua vocação para assuntos mais profundos parecia limitada, a julgar pela escassa sequência que dava às questões políticas que eu lhe colocava - como as "guerras" entre o PASOK e a Nova Democracia, a questão da Macedónia, o problema negocial em Chipre ou a dimensão orçamental do esforço militar grego, fruto das tensões com a Turquia. 

A certa altura do jantar, levantei-me e, ao passar por uma mesa, pareceu-me vislumbrar nela a figura de Konstatinos Mitsotakis, que havia sido primeiro ministro por mais de três anos, depois de ter assumido vários cargos governamentais. Só o conhecia de fotografia, mas tinha quase a certeza de ser ele. Regressado à mesa, referi o facto ao tal embaixador que tinha a meu lado, que logo retorquiu:

- Mitsotakis? Quem é?

- Não se lembra? Foi primeiro ministro, ainda antes de Andreas Papandreou...

- Não, não tenho ideia... já não é do meu tempo.

Tive a tentação de lhe responder: "Ora essa! Também a Acrópole não é do meu!” Há gente que devia ter escolhido outra profissão...

Há poucas horas, Kyriacos Mitsotakis, filho de Konstatinos (que morreu há dois anos), ganhou as eleições gerais na Grécia, passando a ser o próximo primeiro-ministro.

Que será feito daquele antigo embaixador? Se ainda for vivo, e se acaso tiver a curiosidade de ver notícias, o nome de Mitsotakis dir-lhe-á, finalmente, alguma coisa?

domingo, julho 07, 2019

O mundo de Bonifácio


Entrei ontem num avião, ainda não eram sete da manhã. Levava um montão de jornais e revistas. Foi folheando tudo para uma “primeira leitura” (quantas vezes, a única!), na sonolência matinal. Até que, a certo ponto, acordei: um artigo de Fátima Bonifácio, no “Público”, tirou-me o sono. Pelas piores razões.

Devo dizer que raramente vi surgir na imprensa portuguesa um texto tão racista e xenófobo como o que a historiadora (que o é, com mérito, sobre o século XIX) ontem escreveu. Fiquei indignado, mas talvez só um pouco mais do que costumo ficar ao lê-la regularmente, ali ou no “Observador”.

A gravidade desta publicação prende-se, essencialmente, com o seu caráter exemplar. Há bastante quem pense como (ou pior do que) Fátima Bonifácio, mas muitos, quiçá cientes da baixeza daquilo que pensam, temem em dizê-lo alto. Agora, ao verem aquela que é tida como uma figura da intelectualidade a proferir aquelas barbaridades, podem sentir-te confortados para poderem vir a terreiro expressar esses mesmos sentimentos. Esse é o principal risco.

Aquilo a que iremos seguramente assistir, nas próximas horas ou dias, por parte de alguma extrema-direita que, pela nossa imprensa, se faz passar apenas por conservadora, vai ser o reclamar do direito à liberdade de expressão. Como se esse direito pudesse alguma vez ser invocado para a propagação de ideias que promovem o desprezo pela diferença, a discriminação e o ódio.

O texto de Bonifácio tem o mérito de poder servir como um bom separador de águas. Veremos quantos, oriundos do seu lado do espetro das ideias, têm a coragem (e, essencialmente, a decência) de dela se afastarem de forma clara. E o “clara” é muito claro: é não utilizarem um “não, mas”, relativizante, subtilmente cobarde, com medo de, ao criticarem demasiado Bonifácio, correrem o risco de poderem ser vistos a atravessar a trincheira.

Há hoje por aí a emergir um Portugal miserável nos princípios, bilioso no caráter, arrogante na atitude, onde alguma argumentação soez surge revestida com ares intelectuais. Vamos chamar os bois pelos nomes: está aí a surgir um proto-fascismo. Nos últimos tempos, a luta desesperada contra as esquerdas adubou-lhes a raiva e revelou-lhes o íntimo. Ora esse é um país que é imperioso combater, sem tibiezas, denunciando profilaticamente uma deriva que pode colocar em causa o equiíbrio do nosso futuro coletivo, o qual, para ser decente e pacífico, deve ser de tolerância e de compreensão. Tudo o contrário do mundo de Fátima Bonifácio.

sábado, julho 06, 2019

João Gilberto


Com a morte de João Gilberto, morre também um certo Brasil. Não é uma flor de retórica dizer-se que o mundo da música está de luto. É que não chega de saudade!

Funchal


Às vezes, esquecemo-nos de que esta é uma das mais belas cidades de Portugal.

Humor comum


Quando a propaganda do Estado Novo se referia a “do Minho a Timor” estaria a pensar no humor?

Neste blogue, faz hoje dez anos



“Há dias, dei por mim a perguntar-me de onde viria aquele fácies grave que quase todas as modelos assumem na "passerelle", aquele ar de zangadas com o mundo que parece ser estilo obrigatório da profissão. Porque não sorriem, quando muitas delas (e nós, por tabela) só ganhariam com isso?

E cheguei à conclusão de que, sendo Paris a capital da moda, talvez (os modelos) tenham apanhado aquele trejeito no "carão" fechado que caracteriza a grande maioria dos empregados de café e restaurantes desta cidade, os quais, em geral, levam esta forma de antipatia snob a um grau de sofisticação que quase se transformou já numa caracterização antropológica da espécie.”

sexta-feira, julho 05, 2019

Maria do Céu Guerra


Parabéns, Céu, milhões de parabéns! Com que então, “a actriz da Europa”?! Uáaau! Num tempo em que tristezas profundas ainda te marcam os dias, como os amigos bem sabem, este reconhecimento internacional, mais do que prestar-te justiça, vai fazer-te bastante bem. A verdade é que tu és tu, com ou sem prémios, tens o teatro dentro ti e é através dele que, em grande parte, te sentes a cumprir a vida, muito para benefício de quem te admira a arte. É também graças a ela que outras vezes te veremos, na “Barraca”, já que, pela mesa “Dois” do Procópio, onde tantas noites chegavas depois do trabalho, para o copo da madrugada, parece que definitivamente te perdemos. Ah! E aproveito para dizer-te, querida Céu, que não haverá mais jantares (quase) anuais da “Dois”! Digo-to com a autoridade de organizador “oficial” das dez edições do repasto. Na última dessas ocasiões, em Xabregas, onde tudo afinal tinha começado, e dessa vez tendo ainda por lá o olhar, divertido mas triste, do Nuno, fizeste-nos uma memorável declamação do poema que o António nos havia mandado, já do hospital, o que também não deixava de ser um outro mau prenúncio. A verdade é que, por muito duro que fosse, e foi, tudo tinha de ter um fim, e teve. Por isso, resta-nos agora fazer um “hurrah!” aos grandes ausentes, na certeza de que sempre os celebraremos. Recebe um beijo muito amigo, “piquena”! “Here’s looking at you, kid!”

Gestão de crises e conflitos


Para memória futura, aqui deixo a foto de família (em Bruxelas, em 28 de junho de 2019) do grupo de 28 peritos de outros tantos Estados membros da UE (o Brexit ainda não se aplica, claro...) que, associados a especialistas das instituições comunitárias, estão a preparar, entre fevereiro e outubro de 2019, a convite da Bertelsmann Foundation e do Center for European Policy Studies, um relatório sobre o tema que se pode ver no quadro ao fundo.

Neste blogue, faz hoje dez anos


“A felicidade faz-se hoje bastante desta adesão aos sucessos que outros protagonizam, de quem nos assumimos próximos, colectivamente juntos na vitória, sempre com a derrota de outros como aparente contraponto indispensável. Para quem, como eu, tem a anti-competição como sólida e permanente doutrina de vida, confesso-me um tanto perdido neste ambiente. Mas será isto a alienação de que falava um clássico fora de moda? Talvez seja, mas esta comemoração das vitórias mais não é, para muitos, do que o complemento natural de existências simples, que seriam ainda menos relevantes se não se juntassem nessa onda gloriosa colectiva. É triste reconhecer isto, mas é a realidade.“

quinta-feira, julho 04, 2019

Paulo Nunes de Almeida


Acabo de saber do falecimento de Paulo Nunes de Almeida, presidente da Associação Empresarial Portuguesa.

Sabia-o gravemente doente mas, nem por isso, deixa de ser para mim um choque a morte de um homem que me habituei a admirar e respeitar. Paulo Nunes de Almeida era um cavalheiro do mundo empresarial, um pessoa com uma delicadeza no trato que se conjugava com uma forte determinação no trabalho, como tive oportunidade de testemunhar nos últimos anos, durante os quais, a seu convite, participei num interessante projeto da AEP de que ele foi a alma e o grande dinamizador.

Deixo os meus sentimentos à sua Família.

“As Décadas da Europa”

Depois das “Memórias da Adesão” e de “A Europa na Encruzilhada”, é hoje lançado o livro “As Décadas da Europa”. Será às 17 horas, na Sociedade de Geografia de Lisboa.

O meu colega embaixador João da Rosã Lã, que aproveito para felicitar vivamente por esta iniciativa, foi a figura comum na organização destes três volumes onde, desde há vários anos, têm vindo a ser recolhidos testemunhos de protagonistas da aventura europeia de Portugal. 

Tive o gosto de contribuir, para este livro, com um capítulo sobre a Presidência Portuguesa da União Europeia em 2000, que transcreve uma palestra que fiz há alguns meses na Sociedade de Geografia de Lisboa.

quarta-feira, julho 03, 2019

Joana Gomes Cardoso


Uma figura risível da política extremista, a quem o voto deu recentemente a lição democrática devida, lançou agora por aí que Joana Gomes Cardoso, atual presidente da EGEAC, teria ascendido ao cargo em virtude de proteção familiar.

Conheço a Joana há muitos anos e, por isso, sou testemunha das diversas fases de uma carreira pessoal feita a pulso, nas áreas do jornalismo e da cultura, numa cumulação de experiências que apenas deve ao reconhecimento do seu mérito e qualidade profissionais. Por essa razão, acho que insinuações deste jaez, cuja origem também ajuda a auto-desqualificar, merecem apenas ser denunciadas e votadas ao desprezo. E deixo aqui uma abraço amigo à Joana.

A propósito deste caso, lembrei-me de reproduzir um texto que, aqui e no meu blogue, publiquei há uns meses, curiosamente motivada por uma notícia em que Joana Gomes Cardoso era igualmente envolvida. Ele aqui fica, de novo:

Há pouco, numa primeira página de jornal, sob o título “Tudo em família”, deparei com algo que, por muito que possa sugerir-se como jornalismo, não passa de uma mera insídia: a criação da ideia de que a carreira profissional dos filhos de gente conhecida, lá no fundo, tem sempre a ver com a notoriedade conseguida pelos pais. Um pouco adiante, dentro do jornal, a coisa aparece adociada com uma nota de chamada mais normal: “Já diz o provérbio popular: filho de peixe sabe nadar”. Porém, no cômputo geral do que ficou escrito, com o título da capa a marcar tudo, a “suspeitazinha” ficou instilada.

Nesse mundo doentio dos mitómanos das teorias da conspiração, do “não é por acaso que”, do “não há coincidências”, do “toda a gente sabe que”, da ideia recorrente de que a corrupção e o tráfico de influências andam hoje aí por todo o lado, de tanta gente frustrada com o quotidiano de si e dos seus, aberta ao despeito pelo sucesso alheio, o efeito ficou conseguido. E, claro, para um leitor, nada é mais cómodo do que deparar com uma notícia que conforta os seus preconceitos. Depois, no conjunto de casos citados, alguém virá pescar um ou outro tido como suspeito, como argumento generalizador para lançar lama sobre todos os restantes. E a nenhum foi dada a hipótese do contraditório para poderem dizer a sua parte da verdade.

Há sempre, neste tipo de artigos, uma inescapável componente de apelo à inveja, um dos mais medíocres sentimentos comuns da espécie humana. Por detrás da revelação escandalizada das ligações pais-filhos, tenta-se sempre sedimentar, de forma implícita, a sugestão de que, não fora o destaque dos pais, aos respetivos filhos a vida não teria corrido tão bem, que o sucesso destes se deve, essencialmente, à saliência pública dos primeiros. 

É óbvio que não é possível negar que, algumas vezes, isso pode ter ocorrido. Por essa razão, sempre entendi importante que fosse denunciado, alto e bom som, quem usufruiu de “cunhas” ou de empurrões profissionais indevidos. Mas, atenção!, sempre devendo prová-lo, caso contrário ficamos no mero campo da difamação, que hoje tem pasto adubado na “cultura” das redes sociais. O “achismo” e a conversa de café, dos que “ouviram dizer que”, não passam disso. De intriguistas e difamadores.

O tipo de insinuações como o que decorre da notícia de que acima falei é profundamente injusto para filhos ou filhas de gente com algum nome público, mas que subiram na vida exclusivamente por mérito e pelo seu valor pessoal, que têm uma confirmada e reconhecida qualidade própria e que até, algumas vezes, chegaram mesmo a ver a sua afirmação pessoal prejudicada pelo “ruído” criado no seu percurso profissional pelo nome do seu progenitor ou progenitora. 

Escrevi o que acabei de escrever sabendo bem que este texto não vai bem com o “trend” prevalecente nas redes sociais, que os “likes” hoje não abundarão. Mas é isto o que penso e, para mim, isso é o mais importante.”

(Em tempo” lembrei-me que Joana Gomes Cardoso é a atual presidente, eleita por unanimidade dos representantes dos professores, alunos e administrativos, do Conselho de Faculdade da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa. Sucedeu no lugar a Francisco Pinto Balsemão. Está-se “mesmo a ver” que também foi por “cunha”...)

Brok ou a outra Europa


Começou uma nova legislatura do Parlamento Europeu. Da bancada dos conservadores alemães da CDU não faz parte Elmar Brok. Estava lá desde 1980 (não, não leu mal), há 39 anos. O antigo líder alemão, Helmut Kohl, que o adorava, dizia que Brok só tinha tido três tempos na vida: nascer, casar e ser deputado europeu.

Cruzei-me com Brok, pela primeira vez, numa tasca em Taormina, na Sicília, em inícios de 1995. Ambos tínhamos por ali ido ao lançamento do “grupo de reflexão”, criado para rever o tratado de Maastricht: ele pelo parlamento europeu, eu como “alternante” de André Gonçalves Pereira, que representava Portugal. 

Brok era, e é, um alemão grande e gordo, de bigode farfalhudo, à época um viciado do charuto, mesmo nas reuniões. Ah! e um bom copo e melhor garfo. Entre cerveja e grappa, tornámo-nos, nessa noite, bons amigos. Até hoje.

Por dois períodos, Elmar Brok foi presidente da importante Comissão de Negócios Estrangeiros do Parlamento Europeu. Mas o seu conhecimento das questões institucionais era lendário. Começou por fazer par com Elisabette Guigou na negociação dos tratados. Na feroz língua dos corredores europeus, eram conhecidos como “a bela e o monstro”... Portugal foi dos países que favoreceu a associação do Parlamento aos trabalhos de reforma institucional: revisão de Maastricht, que conduziu ao tratado de Amesterdão, e, depois, o tratado de Nice. Brok nunca esqueceu isso e, em 2000, muito nos ajudou a superar algumas dificuldades. 

Em conferências e seminários, para alguns dos quais fui convidado por sua sugestão, não obstante o nosso diferente alinhamento político, tenho encontrado Brok por essa Europa e outros lugares do mundo. Raramente conheci alguém tão sinceramente europeísta, no sentido de ver a Europa como um projeto solidário. É um homem de convicções, mas também de palavra: diz o que pensa e faz o que diz.

Nos últimos anos, a CDU alemã e o PPE europeu a que se ligara mudaram muito de natureza. O primeiro pela declinante força de Angela Merkel, o segundo pela “realpolitik” que permitiu que a obsessão com o poder nas instituições tivesse obrigado ao convívio, na mesma família política, com figuras “sulfurosas” do quilate de Orbán e quejandos. Esta já não é a Europa de Elmar Brok, tributária dos valores originários da democracia-cristã que, com a social-democracia, criou o magnífico projeto que deu prosperidade, paz e esperança ao continente.

Que dirá o meu amigo Elmar Brok das escolhas ontem feitas para as instituições, agora já sem ele por lá?

(Artigo hoje publicado no “Jornal de Notícias”)

Oxygène


Olhei o “Público” de hoje e dei comigo a pensar que, apesar de tudo, ter a Charlotte Rampling à frente da Comissão (vejam-se as fotografias) talvez não fosse mau de todo. Desde que o “Oxygène” do marido francês não substituísse o “Hino à Alegria” do alemão de Bona. Mas, depois, lembrei-me que o Jean-Michel Jarre já saiu da vida da atriz há muito, após uns pecadilhos extra-conjugais. E que a nossa senhora, salvo seja, chama-se Ursula qualquer coisa e foi a confessada feliz aposta dos amigos de Orbán. Se o mundo não está perigoso, não sei bem o que esteja.


O outro 25

Se a manifestação dos 50 anos do 25 de Abril foi o que foi, nem quero pensar o que vai ser a enchente na Avenida da Liberdade no 25 de novem...