quarta-feira, abril 10, 2024

Lembrei-me da tia Zé


Cheguei esta tarde a Praga. Numa conversa telefónica com um amigo, há minutos, quando lhe disse onde estava, ele retorquiu-me: "O que é que estás a fazer em Braga?". Tinha ouvido mal. Com a idade, a começar nele e a acabar em mim, todos ouvimos pior.

A minha tia Zé, uma das irmãs mais velhas do meu pai, ouvia bastante mal. 

Estávamos em torno da televisão, em agosto de 1968, em Viana do Castelo. 

As imagens eram da entrada das tropas soviéticas em Praga, com a subida dos tanques pela praça Venceslau, um arremedo da Avenida dos Aliados, sob protestos populares.

A tia Zé vivia, desde sempre, num mundo diferente, um pouco alheado, distante daquele que nos mobilizava em frente ao televisor. Não era dada a seguir eventos noticiosos, nem sentia estímulo para participar em quaisquer conversas que excedessem o quadro familiar ou das amizades.

Por uma vez, porém, os nossos comentários e exclamações, bem como a notória brutalidade do que observava, tê-la-ão feito compreender que alguma coisa não ia bem, lá pelo mundo exterior.

A certo ponto, numa pausa do noticiário, ao entrar na sala com o tradicional café de saco, de cuja feitura não prescindia, a velha senhora deixou escapar: "As coisas estão mal lá por Braga, não estão?"

4 comentários:

Luís Lavoura disse...

Dizem que Praga é uma cidade muito bonita mas eu, quando a visitei, já há algumas décadas, não fiquei lá muito impressionado.

As boas impressões que tive de lá foram da cerveja, das carnes frias, do pão e do queijo. Era tudo ótimo, muito melhor do que na Alemanha, à qual eu estava habituado.

Desejo ao Francisco ótimas refeições frias em Praga.

Anónimo disse...

Nunca devemos desesperar...
Haveria de chegar o dia em que iria concordar com o Lavoura!

manuel campos disse...


Ouço estupidamente bem.
E digo estupidamente porque mesmo num restaurante cheio acabo por não conseguir abstrair-me totalmente do que dizem nas mesas vizinhas, isso é muitas vezes péssimo para o prazer da refeição e o desenrolar da digestão tal a asneirada patente (*).

Aqui em casa toda a gente deixa o telemóvel a carregar onde muito bem lhe apetece porque “se tocar o pai/avô ouve”.
Algo de estranho se passa na família porque uma filha minha, quando tinha aí uns 17 anos, ficou completamente surda dos dois ouvidos em 3 ou 4 meses, sem pré-aviso qualquer.
Operada por uma sumidade à época, ficou a ouvir o que nem eu alguma vez
consegui ouvir.

Lá pelos interiores do país onde por vezes estou, quando hoje em dia o telefone fixo toca é sempre para me convidarem a fazer um teste gratuito de audição (de vez em quando é para a Escola Básica lá do sítio, nos algarismos há um diferente).
Aparecem então umas carrinhas no parque de um dos supermercados e lá se forma uma fila de pessoas a quem são descobertas “complicadíssimas complicações complicadas” que as levam a gastar 3 ou 4 meses de reforma para ficarem a ouvir mais uma palavra em cada dez, até que também essa palavra adicional deixam de ouvir também.

(*) Hoje almoçámos no sitio do costume às 5ªs feiras, eu comi um pato assado com arroz de açafrão (se não era o pato todo, parecia).
E como vinho o “Quinta do Sobreiró de Cima” tinto, da região de Vila Real.
Apraz-me registar que no binómio “custo/bem que me sabe” é muito simpático.


João Pedro disse...

Essa praça Vaclav lembra tanto a Avenida dos Aliados...

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