O presidente da República decidiu associar à data de hoje uma cerimónia sóbria, com a palavra, sempre interessante, de uma destacada figura da igreja católica. Num tempo em que, por razões fortes, as manifestações públicas têm estado em discussão, a opção do presidente parece sensata. E simbólica.
Os dias que Portugal atravessa não são dias comuns. Vivemos tempos estranhos, nos quais entrámos todos da mesma maneira, com práticas de vida basicamente similares, mas de que estamos a sair de forma muito diferente. Naquilo a que se chama o “desconfinamento”, descobrimos agora vários países: desde aquele que continua a privilegiar o recolhimento em sua casa, até ao que, cansado de máscaras e de distanciamentos, opta pela via do risco. Pelo meio, revelam-se formas diferentes de maior ou menor ousadia. É mesmo interessante observar que, nesta diversidade de “saídas de casa”, se desenham hoje filosofias de atitude, até com ressonâncias políticas associadas.
Neste leque de comportamentos, destapam-se insuspeitados caráteres, mas fica evidente uma realidade: foi-se erodindo a confiança inicial nas recomendações de origem oficial, por estar criada a sensação - certa ou errada, é indiferente - de que alguns desses conselhos têm vindo a contradizer-se e que o que era verdade ontem deixa de ser válido amanhã. Provavelmente, estarei a ser injusto mas, em saúde como em política, o que parece é.
Todos entendemos que, nesta pandemia, o mundo andou numa navegação à vista. Aprende-se num dia o que até então não se sabia, as “lessons learned” são muito importantes. Mas isso nunca é frontalmente assumido. Por mim, gostaria muito de ter ouvido, num certo momento, com humildade: “Fizemos isto desta forma mas, olhadas as coisas em perspetiva, temos que concluir que nos enganámos. Devíamos ter seguido outro caminho, que teria, provavelmente, conduzido a melhores resultados”.
Com os anos, e com alguma prática direta, aprendi que o discurso do poder tem uma tendência a assumir-se como afirmativo, sem dúvidas e, geralmente, sem a humildade do recuo. No desejo de tornar eficaz a mensagem, quem a envia só em raras ocasiões se retifica a si mesmo, como se corrigir-se fosse sinal de fraqueza, como se a verdade acabasse por ser autoflagelatória.
Neste Dia de Portugal, estamos, como é óbvio, um pouco mais divididos do que nos sentíamos no início da pandemia. Olhemos as coisas pelo lado positivo: ser livre e manifestar essa liberdade de forma diversa é apenas a prova provada de que vivemos em democracia.
9 comentários:
os resultados são importantes!
ainda há muitos contágios, pelo que se deve continuar atentos
e não afrouxar as recomendações e obrigações
senão é que tudo piora e aí ficaremos mesmo divididos
e com maior medo uns dos outros
haja saúde e trabalho!
É sintomático que, no Dia de Portugal, Camões e Comunidades Portuguesas, tenha dedicado o seu tempo a falar de COVID em vez de celebrar Portugal.
É igualmente sintomático que não perca com o 10 de Junho, nem uma pequena percentagem do tempo gasto com o 25 de Abril e considere de bom tom que o Presidente da República adote com esta data a discrição que não teve com o aniversário da "Revolução dos Cravos".
Hoje não há festas, nem comícios, nem desfiles, nem senhores com atitudes simbólicas a percorrer solitários a Av. da Liberdade segurando grandes bandeiras nacionais.
Os cervejeiros nacionais (onde pontifica muita gente de esquerda), até resolveram que o 10 de junho seria o "Dia da Cerveja Artesanal Portuguesa", fugindo desta forma à celebração da Nação mas arranjando pretexto para que a malta gaste o feriado a embebedar-se. Melhor do que lixívia, a cerveja desinfeta-nos do "fascismo". (note-se que os bares irlandeses celebram sempre o dia da Irlanda, com grande alegria dos portugueses)
A classe política e os cidadãos politicamente engajados gastam todos os seus foguetes no 25A e, para Portugal, o que sobra? O elogio da discrição...
Por mim, era tirar a esfera armilar e colocar lá um punho segurando um cravo (inclinado para a zona verde, por causa do contraste), o aeroporto do Funchal passava a Almeida Santos, a pista do Porto passava a Mário Soares, o 10 de junho era o dia de Aristides Sousa Mendes e dos Combatentes Antifascistas, as pontes no Porto eram renomeadas com os nomes dos presidentes pós 25A, cada curva da N1 passava a ter o nome de uma vítima da PIDE, os toureiros - a cada bandarilhada -, tinham de gritar "toma lá ó fascista", os forcados gritariam "ó ó ó pide feio!", os padres substituiriam o "ide em paz" por "ide em paz, camaradas de fé" e por aí adiante. Porque, de facto, este Regime só se preocupa em celebrar-se a si mesmo! Só há força, só há vontade para celebrar a política e nada mais!!!
com a palavra, sempre interessante, de uma destacada figura da igreja católica. [...] a opção do presidente parece sensata. E simbólica.
A mim parece-me totalmente insensato, e de um simbolismo profundamente errado, que figuras da igreja católica tomem parte, e ainda mais que usem da palavra, em cerimónias de Estado.
Sr. Lavoura. O cidadão Tolentino é Teólogo, Poeta e também Cardeal. Não foi certamente, por ser Bispo católico que fora convidado, digo eu, mas por ser quem é, culturalmente e madeirense, já, como saberá, era para ser na Madeira esta cerimónia. Gostei muito do que ouvi, do discurso do Poeta e erudito Tolentino, ao contrário do do ano passado, natural de Portalegre.Pronto já dei a minha opinião. Neste aberto e magnífico Blog, de que sou fan!.
Luísa Santos disse...
Pouca sorte, a deste blog. A desdita de apenas ter comentadores anónimos, com poucas excepções, é obra !
E de um jaez que não desmerece dessa cobardia! O das 9:08, por exemplo. Tanta falta de cultura. Que visão distorcida!
Um homem da igreja católica a fazer um discurso do 10 de Junho... Querem mais universal, mais visionário, mais humanista que um poeta? Belíssimo discurso, o dele!
Quem é "Luísa Santos"?
A desdita de ter de levar com esta gente com a mania de que é mais do os outros por usar um nome que qualquer um pode colocar nos comentários...
Ass: Elvis Presley
Tem toda a razão senhor embaixador! Deviam ter sido tomadas medidas de outra forma, com moderação desde início, dado o conhecimento que já tínhamos de outros países. Podíamos e devíamos ter feito melhor e sobretudo menos penalizador para todos nós e, efetivamente a arrogância e falta de humildade da classe política cria em nós, sobretudo agora a insegurança face ao que se avizinha...! Bem haja
Acho injusto. Na minha opinião governo, oposição e Administração foram exemplares na resposta à crise, com humildade e liderança. Houve naturalmente erros de informação , hesitações, correções, mas mesmo sssim menos e mais reconhecidos do que em muitos outros países europeus.
Fernando Neves
Nos comentários, uma diversidade de temas abordados. O comentador, das 09:08 tem a arte, que não tenho, da síntese: disse tudo em três palavras! “haja saúde e trabalho! “
E tem razão: quando penso no desafio dos próximos meses, no âmbito económico, que se traduzirá em massas de desemprego, em miséria, em toda a Europa, creio que esta celebração deveria ter sido utilizada para preparar as mentes ao combate e aos sacrifícios inerentes, que nos esperam. Receio que os dirigentes tenham optado por os pôr de lado, para o momento. A hora era a da Historia.
Se fechamos os olhos ao que se aproxima, nestes comentarios encontramos de tudo. Todos os sentimentos humanos, os bons como os mais rascas, estes vindos da direita inconformada, desaguaram nos comentários que podiam ser tão patrióticos…num texto cujo título é tão convidativo: “Os Dias de Portugal”.
Um bom sentimento humano de Luísa Santos: “Um homem da igreja católica a fazer um discurso do 10 de Junho... Querem mais universal, mais visionário, mais humanista que um poeta? Belíssimo discurso, o dele! » Mas seria o momento de declamar poesia ?
Também Luís Lavoura tem razão quando escreve: A mim parece-me totalmente insensato, e de um simbolismo profundamente errado, que figuras da igreja católica tomem parte, e ainda mais que usem da palavra, em cerimónias de Estado.
E quando o comentador das 09:57 o leva a escrever, com ironia depreciativa, no seu delírio, o 10 de Junho era o dia de Aristides Sousa Mendes e dos Combatentes Antifascistas”, devia ter lido as palavras do Senhor Embaixador:” Fosse eu de direita, Aristides Sousa Mendes seria o meu herói”, E também seria o meu.
Este Regime só se preocupa em celebrar-se a si mesmo! Escreve ele…
Este comentador prefereria , talvez, um discurso do cardeal Cerejeira:
«Batem à porta das nações cristãs hordas de bárbaros para as destruir. A Igreja convoca os cristãos para a defesa da Pátria, das famílias, das sociedades, dos indivíduos.» (Discurso na Sé de Lisboa em 27-10-1946.)
«Não nos envergonhamos de dizer — afirma o jornal católico O Mensageiro Paroquial de Viseu (3-11-1946) — que FOMOS, SOMOS e SEREMOS SEMPRE GERMANÓFILOS.»
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