Na minha infância, recordo-me de ouvir a minha mãe dizer que uma música chamada “Ramona” dava má sorte. Quando os acordes dessa melodia surgiam na rádio (na minha terra não usamos a palavra telefonia e outros vocábulos análogos, que fazem parte do léxico das lisboetices), havia uma corrida imediata a mudar de estação.
Eu era muito miúdo e impressionava-me que pudesse haver coisas dessa natureza, ou melhor, coisas que ultrapassassem a natureza que tinha à minha frente, que foi sempre o alfa e o ómega da minha maneira de olhar o mundo. Vivi a acreditar no que vejo. E sempre e só nisso.
Nessa eterna e simples perspetiva, sempre vi as sextas-feiras 13, como vai ser o dia de amanhã, como uma crendice com folclórica graça, mas só isso. Não acredito no azar e na má sorte, talvez porque, na vida, sempre tive sorte da boa - ou, quando isso não aconteceu, assobiei para o lado, fiz de conta e passei à frente.
Não passo por baixo de escadas apenas com medo de que me caia algo na cabeça, não gosto de gatos pretos porque não gosto de gatos em geral, abro sem receio guarda-chuvas dentro de casa para testar o estado das varetas e só não deixo tesouras abertas em cima da cama para não correr o risco de me cortar. Sou totalmente imune a toda e qualquer crença, a coisas ditas “sobrenaturais”, a signos e, repito, a tudo aquilo que esteja para além do que o meu olhar alcança. Eu faço parte de quantos não têm a menor curiosidade em saber o que está para além da curva...
Vem isto a propósito da “Ramona” e de amanhã ser sexta-feira 13. Ontem, numa estrada do Brasil, perto de Congonhas do Campo, vi uma placa com o nome de uma localidade chamada Ramona. Contei então para a pessoa que ia ao meu lado a atitude da minha mãe perante a canção mas, curiosamente, não senti vontade de ir ao YouTube para ouvir a malfadada melodia. Seria por respeito à crença da minha mãe ou porque começo a enfraquecer as minhas defesas face ao desconhecido? Fiquei na dúvida.
Ainda a propósito de “azares”, recordo-me de ter um dia falado, no Brasil, numa conversa de amigos, de um episódio ocorrido no dia da implantação da nossa República, em 5 de outubro de 1910. Estava então de visita a Portugal o presidente eleito do Brasil, que tomaria posse no primeiro dia do ano seguinte. Inopinadamente, ele foi apanhado no meio dos combates. Teve de haver uma parlamentação entre os contendores por forma permitir a saída do dignitário (aproveito para pedir que não escrevam “dignatário”, como se vê muito por aí) estrangeiro, que nada tinha a ver com a nossa peleja interna.
Porém, quando, no meio dessa conversa, tentei lembrar-me do nome do homem, um dos amigos pediu-me que o não fizesse: é que, aparentemente, referir esse nome, no Brasil, dá azar!
Fiz-lhe a vontade, mas só então. Amanhã, sexta-feira 13, dia em que por qualquer razão me apetecia estar em Vilar de Perdizes, já posso dizer, para desafiar o azar, que esse político se chamava Hermes da Fonseca (na imagem).
E pronto: aqui fica a minha história para o dia oficial do azar, data em que, por acaso, vou ter a dita de viajar para casa de uns amigos, num local tão aprazível que o crismei do lugar de Nossa Senhora do Folguedo de Cima. É que ainda há dias de sorte e o meu vai ser nesta sexta-feira 13.
6 comentários:
Eu morei no Rio de Janeiro nos anos 50 numa rua que se chamada Marechal Hermes.
Bom exemplo de educação doméstiica bem feita. Pode-se não praticar o que se aprendeu em caasa mas fica-se bem informado sobre muita coisa para se conhecer o mundo.
Hoje já não há nada disso mas sim aquilo que a tv nos mostra na sua difusão massificada. Nas escolas tenta-se instruir os alunos mas é em casa que se devia educar.
vexa ja nao lhe basta querer-nos forçar à sua grafia ainda nos quer forçar ao seu português...
http://www.aulete.com.br/dignatario
um dos dicionarios mais importantes da lingua portuguesa
https://pt.wikipedia.org/wiki/Caldas_Aulete
https://pt.wikipedia.org/wiki/Dicionário_Contemporâneo_da_L%C3%ADngua_Portuguesa
A historia do azar do seu amigo Hermes
http://www.tribunadainternet.com.br/as-ziquiziras-do-urucubaca/
https://books.google.pt/books?id=OBwO1nWnQz8C&pg=PA120&lpg=PA120&dq=Hermes+da+Fonseca+azar&source=bl&ots=-Ea0G_IxM_&sig=8IXnVXtVZrxk2p7a1F-Wc7jzfD4&hl=pt-PT&sa=X&ved=0ahUKEwiq1sqbgJvcAhXHWBQKHboyCpUQ6AEIWDAM#v=onepage&q=Hermes%20da%20Fonseca%20azar&f=false
quanto à ramona e à sua versão brasileira
https://www.youtube.com/watch?v=PEFJwNcu-44
https://www.letras.com/gastao-formenti/ramona/
cumprimentos
Obrigado, Senhor Embaixador. Vou comprar um bilhete da lotaria imediatamente. Nasci às 13:40 minutos, numa Sexta Feira 13. E hoje ,ainda por cima é o meu aniversàrio…
Sexta feira 13
Tambem na minha infancia ouvia falar no azar da "Ramona" como sendo a ultima peca tocada pela orquestra antes do naufragio. Ingenuamente sempre liguei a Ramona ao naufrafio do Titanic.
Fiquei com curiosidade depois de ler o seu blogg e la fui a Dra. internet, naveguei, naveguei e encontrei o seguinte:
Alegadamente quando o Titanic se afundou a orquestra tocava um hino "Nearer my God to Thee" como se pode "confirmar" no filme com Di Caprio e Kate Winslet. No entanto nao ha certezas absolutas porque os sobreviventes contradiziam-se.
Outro naufragio: "Principessa Mafalda" (nome em hora de 1 das filhas de Vitor Emanuel) fez-se ao mar em 1909 de Genova para Buenos Aires para levar emigrantes para a Argentina etc.
Ja bastante gasto, em 25 de Outubro 1027 saiu de Genova e teve problemas ao longo da costa Baiana. Houve uma explosao na casa das maquinas e entao alegadamente a orquestra tocava Gardel - Ramona.
Como o Titanic tinha afundado 13 anos antes (la vem o numero…) toda a gente se lembrou desse naufragio. Nos tempos aureos a "P. Mafalda" tinha transportado celebridades como Marconi, Pavlova, Toscanini e Pirandello.
Dados oficiais : morte de 309 passageiros e 9 membros da tripulacao.
Ha tambem um B movie "Ramona" mas nao tem nada a ver com naufragios. Cowboys, indios mesticas … Saiu em 1936, dirigido por Henry King com Loretta Young e curiosamente John Carradine. Mas ai nao entra tango nem Gardel.
Para fugir ao azar boa sorte com o euromilhoes
Saudades
F. Crabtree
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