domingo, setembro 12, 2010

O sangue do nosso verão

Todos os anos, não pela primavera - como no texto de Sttau Monteiro - mas pelo verão, somos brindados com o espetáculo dos touros mortos em Barrancos, em Monsaraz e outros locais, onde há a pretensão de converter uma certa versão de tradição numa forma de afirmação regional. Nas reportagens televisivas, lá vemos os decididos "populares", liderados pelos autarcas à caça dos seus votos, a sublinharem a "especificidade" desse culto local à morte, num triste jogo de "gato e rato" com uns pobres GNR's, condenados à tarefa, tida por menor, de ver a lei cumprida . Mais do que o facto em si - minoritário e localizado -, é óbvio que é a sua mediatização que permite conferir-lhe algum relevo.

Devo confessar, porém, que, muito mais do que este exercício lúdico com que alguns (poucos) se entretêm, me custa ver o canal de serviço público a continuar a dar grande espaço à tauromaquia, nesta estação que, sendo "silly", não necessitaria de ser triste. E ainda um dia gostava de perceber como é possível a alguns pais compatibilizarem a educação que julgo que darão às suas crianças, segundo a qual os animais devem ser bem tratados e protegidos, e que, simultaneamente, as deixam assistir ao ritual gratuito do sangue, por essas praças de morte e abate lento.

Noto, para quem o não tenha percebido, que este post não é, nem pretende ser, minimamente consensual. Mas o objetivo deste blogue é refletir o que pensa quem o escreve, sem nunca temer o contraditório nos comentários dos seus leitores.

11 comentários:

Rui Xisto disse...

Sou português e não me sinto menos português pelo facto de ser contra as touradas como espctaculo, em que as pessoas tenham prazer em estar a fazer sofrer, para seu gaudio, um animal. Tal como sou contra a caça, pelo simples prazer de ir matar animais!

José Martins disse...

Senhor Embaixador,

Cada vez mais me surpreende a sua intervenção em várias matérias quer estas passadas em Portugal ou no estrangeiro.
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Não sou adepto do sacrifício de animais e muito menos de humanos.

Mas os latinos, por raízes, gostam do “mata e esfola” de animais e seres humanos.

Nos coliseus de Roma e da Tunísia os humanos gozavam à fartazana de ver na arena o leão e o condenado e este a livrar-se dos dentes do animal.
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A assistência na bancada batia palmas às mordidelas do leão ao condenado ou este a defender-se do dentes do animal esfomeado.
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O leão entrava, na arena, esfomeado para matar de pronto.

Os latinos são de raízes bárbaras e ainda as conservam na pele.

Há vários anos, pela televisão espanhola, tenho assistido em directo aos encerros de Pamplona (onde Hemingway, quando vivo, não faltava a um) e então regalo-me com a vingança dos bois a levarem à frente dos cornos os bárbaros que antes se regalavam, nas bancadas, o toureiro matar o touro.

Barrancos é território português e não de Espanha e se não é permitidp matar touros noutras praças portuguesas, esta vila não pode obter privilégios de os bárbaros, barranquenhos, assistirem, cobardemente, a matança do boi.
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Saudações de Banguecoque
José Martins

Anónimo disse...

É...
Já para não acrescentar a senescência de alguns fenómenos coletivos que parece terem subjacente
uma assertividade deformada onde os direitos humanos se afogam no pior pecado o mortal...

E quando se condenam pessoas por dar visibilidade ao amor com um veredito moralista imediato ...Será que as pessoas se equacionam sobre a direção do sentir?

Excelente post,tiro de bom grado o meu chapéu.
Isabel Seixas

Santiago Macias disse...

Cá estou eu, senhor embaixador. As situações de Barrancos e de Monsaraz são diferentes. Em Barrancos o touro é morto durante a lide. Barrancos só começou a ser notícia quando o exotismo do facto tornou a vila apetecível para a comunicação social. Aquilo que se passa em Monsaraz é diferente e não me convence.
Sei bem que não é apreciador das corridas de touros. Mas olhe que neste Verão vi coisas bem mais tristes - muitas delas protagonizadas por bípedes nacionais - no nosso serviço público.
Se tiver um dia a oportunidade de o reencontrar poderei dar-lhe a minha opinião sobre a possibilidade de compatibilização entre a educação e as corridas de touros.

Anónimo disse...

La Tortura No Es Cultura

http://www.elmundo.es/elmundo/2010/09/12/castillayleon/1284292505.html

patricio branco disse...

Assunto complexo, não falo da diversão que nem tourada é de R de M, mas do toureio em geral, onde ele se pratica e é uma arte. E tem implicações económicas, ambientais, culturais, etc. Os argumentos dum lado e doutro, a favor ou contra, até acabam por ser igualmente válidos. Mas o verdadeiro toureio é uma arte e a diversão de R de M não entra aqui.
O carnaval/espectáculo duma pequena multidão brincando e divertindo-se esfaqueando o touro, tem qualquer coisa de sadismo ou crueldade aceite, ou será antes uma catarse colectiva o sacrifício do animal.
E depois vem toda a farsa da não autorização, da excepção que é aquela tradição, a cobertura mediática, o autarca à procura de votos, etc.
há tambem uma tradição parecida nos açores com touros.
Uma nota: quando há anos se pôs o problema de barrancos, o então deputado manuel alegre era a favor da legalização da morte do touro, lembro declarações dele.

Julia Macias-Valet disse...

José Martins, so quem conhece Barrancos e os Barranquenhos podera compreender que aquele povo nao pertence, na alma, nem a Portugal nem a Espanha. Um mundo à parte.
Quantas vezes José Martins ja foi a Barrancos ? quantas vezes ja tomou um copo na Sociedade ?quantas vezes ja comeu catalao ? quantas vezes ja assistiu às festas de Barrancos : 28, 29, 30, 31 e às vezes 32 de Agosto como dizem os proprios barranquenhos : )
5 dias onde nao ha noite nem dia.
Sejam contra ou a favor das touradas, da caça, da pesca, das lutas de galos...mas nao chateiem os Barranquenhos que sao um povo do mais acolhedor e delicioso que pode existir.

Paulo Araújo disse...

O que me ocorre dizer é isto: o grau de incivilidade de um povo mede-se pelo grau de importância que dá às suas tradições.

Rita Maria disse...

Também a mim cada vez mais me surpreende este blog. A coragem e a clareza neste caso, mas acima de tudo a elegância e o equilíbrio, sempre. Gosto tanto de lê-lo!

Anónimo disse...

"Povo do mais acolhedor e delicioso que pode existir."JM-V

Que "assertividade" Bonita.

Ó "Júlia"penso o mesmo dos Transmontanos, mesmo assim preferia ver reduzida a impulsividade das"Suas/Nossas" algumas touradas de defesa pessoal primária, aprendida como atavismo.que às vezes embora constituam o 1% do comportamento global Muito Bom consegue dilui-lo...

Se calhar é a vida...
Mas identifico-me na integra com o post.
Isabel Seixas

OCTÁVIO DOS SANTOS disse...

Mais um assunto em que estou inteiramente de acordo consigo. As touradas, e em especial as que implicam a morte do touro na arena, são sempre espeCtáculos degradantes e vergonhosos, indignos de povos civilizados.

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