Nesses anos 80, fui visitá-lo muito longe de Portugal, numa passagem esporádica, no início da minha carreira, estando eu já a viver no estrangeiro. Não era um amigo íntimo, mas tínhamos construído um muito cordial entendimento pessoal. Tratávamo-nos por "você", talvez fruto da diferença de idades ou daquelas irrecuperáveis casualidades que fazem com que, no primeiro contacto, não tivéssemos desformalizado totalmente o relacionamento.
Era um colega simpático, disponível, embora um pouco "afetado" e - mesmo muito! - preocupado com aquilo que se costuma designar como os "sinais exteriores da carreira".
(Essa é a auto-caricatura em que alguns profissionais da "casa" se deixam cair: uma certa forma de vestir, a rede de conhecimentos "certos", convites a quem mais convém, carro adequado ao estatuto, férias com grupos selecionados, opção por desportos de elites, um discurso sempre cuidadoso, para não criar arestas nem suscitar rejeições, etc.)
Só não casou "bem", porque é dos que não estão para aí virados. E, verdade seja, depois de todo esse esforço, mas também graças a erros próprios, a sorte profissional acabou por lhe não sorrir.
(Essa é a auto-caricatura em que alguns profissionais da "casa" se deixam cair: uma certa forma de vestir, a rede de conhecimentos "certos", convites a quem mais convém, carro adequado ao estatuto, férias com grupos selecionados, opção por desportos de elites, um discurso sempre cuidadoso, para não criar arestas nem suscitar rejeições, etc.)
Só não casou "bem", porque é dos que não estão para aí virados. E, verdade seja, depois de todo esse esforço, mas também graças a erros próprios, a sorte profissional acabou por lhe não sorrir.
A certa altura desse nosso encontro, a conversa derivou, já nem sei bem porquê, para a zona onde tínhamos as nossas casas, em Lisboa. Disse-me que queria trocar urgentemente de casa, estava insatisfeito com o apartamento que então possuía, num certo bairro popular de Lisboa. Perguntou-me rntão onde eu morava. Disse-lhe que vivia em Santo António dos Cavaleiros, num andar barato, alugado desde os meus tempos de tropa. Olhou-me com uma espécie de horror social! "Mas isso é quase em Loures! Não é "bonne adresse"!
Recordo ter então dado uma imensa gargalhada, que espero não tenha levado a mal. O seu delicioso comentário ficou-me para sempre na memória.
Há meses, vi-o sair de carro de uma agradável moradia, numa zona socialmente prestigiada de Lisboa. Agora, já reformado, tem, finalmente, "bonne adresse". Deve estar contente. Ainda bem!
7 comentários:
Ainda bem!
Isabel Seixas
É reconfortante ,nos tempos que correm,ouvir um diplomata falar assim, e mostrar o seu desapego pelos sinais exteriores de riqueza.
Isabel
E qual será agora o próximo "Bonne adress"?
Deito-me advinhar... "bonne adresse" é lá para os lados de Cascais... Fashion entre a diplomacia portuguesa...!!!
Saudações do River Kwai
José Martins
uma história à clef cujos ingredientes principais são: ironia, melancolia, piedade e simpatia. Desenvolvido e com a habitual advertência de que qualquer semelhança com pessoas reais é pura coincidência dava um bom conto de umas 3 pp. Experimente.
Pelo seu comentario, vê-se que o Senhor Embaixador não é pessoa para essas "maladresses" de se preocupar com a "bonne adresse". E de louvar! Bem haja!
O sr. por acaso mora ao lado da renascença?
como sempre esteve bem, sem modéstia muito bem...
Abraço
Isabel
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