quarta-feira, novembro 11, 2020

Artur Portela


Morreu Artur Portela. Há minutos, um jornalista pediu-me um comentário sobre a sua figura. Tive de dizer-lhe que, embora conhecendo muito bem a sua obra, só o tinha encontrado uma única vez.

Foi há poucos anos, num almoço com amigos comuns, organizado precisamente com esse objetivo. Recordo-me de lhe ter então dito que julgava ter lido todos os seus livros - e não foram tão poucos como isso. “Também os da fase ‘nouveau roman’?”, estranhou. “Claro! O ‘Avenida de Roma’ e o ‘Rama, verdadeiramente’ “, assegurei, para espanto dele.

Mas julgo não lhe ter referido que, então com bastante menos prazer, porque estava à época no outro lado da “barricada”, também recordava os seus (politicamente ácidos) editoriais no “Jornal Novo”, um órgão de combate político por ele dirigido e criado por quem se opunha ao PREC, o que não era o meu caso.

Artur Portela (assinou, por muito tempo, Artur Portela Filho, para não se confundir com o pai, também um grande nome do jornalismo português de outros tempos) dirá pouco às novas gerações. E, no entanto, essa figura consagrada do mundo da publicidade foi uma personalidade muito original na nossa imprensa, devendo-se-lhe também algumas incursões interessantes na literatura e até na história. 

Entre o muito que fez, relevo que Portela trouxe um novo estilo à crónica de atualidade. A leitura da sua coluna “A Funda” - publicada no “Jornal do Fundão” e, depois, no “República” - tornou-se num vício para muita gente, desde logo para mim. Nunca esquecerei ”Os Árabes da Rua do Século”, um texto antológico a gozar a patranha que um grupo de foliões pregou ao jornal “O Século”, tendo como vítimas Roby Amorim e José Mensurado. 

Mas também recordo a dimensão polémica da sua vida de publicista, porque Portela não fugia a ela - e quem é do meu tempo e estava atento a esses meios tem, com certeza, bem presente uma deliciosa e famosa troca de argumentos com Mário Castrim, no “Diário de Lisboa”.

Na língua portuguesa que Portela usou nos seus textos, de forma imensamente criativa, é clara a influência de Eça de Queiroz - de quem teatralizou “A Capital”, o que motivou um artigo crítico meu, no “Comércio do Funchal” (ou seria no “& etc”?), intitulado “Ora Eça, ó Portela!”, creio que em 1972. 

Julgo ter-lhe referido isto, durante a chanfana que partilhámos, servida pelo João “Espetáculo”, na Imperial de Campo de Ourique, onde agora não tenho ido, por precaução contra a Covid. A mesma Covid que, ao que leio, apanhou Artur Portela, aos 83 anos.

2 comentários:

Anónimo disse...

Eis um caso de alguém que vivia da "liberdade de expressão" mas morreu da COVID.

Isto porque anda por aí (sobretudo no estrangeiro), muita gente a queixar-se de falta de liberdade de expressão quando toca a espalhar tretas sobre a doença.

Flor disse...

Lembro-me de Artur Portela Filho. Não me apercebi da causa da sua morte. Morrer com o Covid aos 83 anos é um desaparecimento sem gloria. Que em paz descanse.

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