segunda-feira, novembro 02, 2020

Os dias loucos da América

Os ataques públicos de Donald Trump ao Supremo Tribunal, por este ter mostrado abertura (embora ainda sem a nova juíza conservadora na sua composição, o que pode alterar o sentido do voto coletivo) para admitir uma contagem dos votos por correspondência durante mais alguns dias, subsequentes ao dia 3 de novembro (no passado, foi sempre impossível escrutinar esses votos no próprio dia, sendo que este ano a situação será, com certeza, muito pior, pelo facto desse tipo de voto se ter popularizado, em especial no campo democrático, com vista a evitar o voto presencial, devido à pandemia), parecem revelar que algum desespero começa a afetar a confiança no seu campo político. 

Nas últimas horas, Trump atacou também bem o FBI, por ter iniciado uma investigação sobre ameaças físicas organizadas contra a campanha de Biden. Trump apoiou essas ações, que considerou levadas a cabo por “patriotas”, segundo referiu num “tweet”. 

A mais recente “novidade” é a afirmação de Trump de que se considerará eleito se os resultados apurados até ao final do dia 3 de novembro lhe forem favoráveis, sem levar em consideração as dezenas de milhões de votos por correspondência por contar, parece ser um expediente para vir a criar um “fait accompli”, o qual, após consagrado, teria de ser contrariado por via judicial, o que implicaria uma longa batalha legal. 

Há, entretanto, sinais de que milícias armadas estão organizadas um pouco por todo o país para contestar uma possível vitória de Biden. Mas há também indicações de que, em caso de uma eventual declaração unilateral de vitória por parte de Trump, isso poderia suscitar reações violentas simétricas no outro campo. Biden, porém, já reiterou que aceitará qualquer resultado que resulte das urnas e que seja validado pela justiça. Resta, porém, saber o que farão os seus apoiantes.

O que irá passar-se? Se não houver aquilo a que os americanos chamam um “landslide”, isto é, uma vitória alargada e muito expressiva para qualquer dos lados, o que parece altamente improvável (em especial favorecendo Trump), a acreditar em muitas sondagens, a hipótese de haver fortes distúrbios nas ruas dos Estados Unidos é muito elevada. Mas há mesmo quem pense que, qualquer que seja o cenário político pós-eleitoral, os confrontos violentos são já inevitáveis. 

Neste quadro de potencial conflito público, que há poucos anos ninguém pensaria poder vir a ocorrer numa democracia como a americana, o que farão as forças armadas, que ali são vistas como uma espécie de “reserva moral” do país? Manter-se-ão neutras, perante o caos nas ruas? Ajudarão a um “golpe” institucional de Trump? Ou farão um sinal de advertência ao presidente, apontando-lhe a porta de saída, se a situação chegar aos limites do escândalo político e de confrontos públicos muito graves? Estamos no terreno de cenários-limite, é certo, mas vale a pena pensá-los, porque parece que tudo já pode acontecer nesta América.

8 comentários:

Joaquim de Freitas disse...

A decadência física e moral dos Estados Unidos e o mal-estar que criou têm resultados previsíveis. Vimos sob várias formas as consequências do colapso social e político no crepúsculo dos antigos impérios.

Os Estados Unidos são uma sombra de si mesmos. Desperdiçam recursos numa fútil loucura militar, um sintoma de todos os impérios em declínio que tentam restaurar à força uma hegemonia perdida. O Vietname. Afeganistão. Iraque. Síria. Líbia. Dezenas de milhões de vidas destruídas. Estados falidos. Fanáticos islamistas enfurecidos pelas guerras, prisões abarrotadas no seu próprio país e não somente em Guantanamo.

Acumulam enormes défices e negligenciam as infra-estruturas básicas, incluindo redes de energia, estradas, pontes e transportes públicos, para gastar mais no exército do que todas as outras grandes potências da Terra juntas.
O maior produtor e exportador de armas e munições do mundo. Business is business…

As virtudes que afirmam ter o direito de impor à força sobre os outros - direitos humanos, democracia, mercado livre, Estado de direito e liberdades individuais - são ignoradas lá, onde níveis grotescos de desigualdade social e de programas de austeridade empobreceram a maioria dos cidadãos, destruíram instituições democráticas, incluindo o Congresso, os tribunais e a imprensa, e criaram forças militarizadas de ocupação interna que exercem a vigilância geral do público. , Gerir o maior sistema prisional do mundo e atirar à queima-roupa em cidadãos desarmados nas ruas impunemente.

E impor ao mundo inteiro as suas leis, a famosa extraterritorialidade que protege os assassinos…

O burlesco americano, obscuramente humorístico com os absurdos de Donald Trump, as falsas urnas de voto, os teóricos da conspiração que acreditam que o estado profundo e Hollywood geram uma vasta rede de tráfico sexual de crianças, fascistas cristãos que colocam a sua fé num Jesus mágico e ensinam o criacionismo como ciência nas escolas, filas de dez horas para votar em estados como a Geórgia., porque maioritariamente negro, os milicianos que planeiam raptar os governadores do Michigan e da Virgínia e iniciar uma guerra civil, também é um mau presságio, especialmente porque ignoram a aceleração do ecocídio.

Porque ninguém fala das centenas de milhares de americanos que morrem todos os anos por abuso de opiáceos, alcoolismo e suicídio, o que os sociólogos chamam de mortes de desespero?

Este desespero alimenta altas taxas de obesidade mórbida, cerca de 40% da população, a proliferação de milícias armadas de direita e tiroteios em massa niilistas. À medida que o desespero aumenta, estes actos de auto imolação multiplicam-se.

Os desesperados procuram uma salvação mágica, sejam seitas em crise, como a direita cristã, ou demagogos como Trump, ou milícias raivosas que vêem a violência como um agente de limpeza.
Enquanto estas patologias sombrias forem autorizadas a apodrecer e a desenvolver-se - e o Partido Democrata deixou claro que não irá decretar o tipo de reformas sociais radicais que irão travar estas patologias -, os Estados Unidos continuarão a sua marcha rumo à desintegração e à agitação social. A derrota de Trump não vai parar ou abrandar a queda.

E a gestão da Covid 19… Estima-se que 300.000 americanos morrerão da pandemia em Dezembro, um número que deverá subir para 400.000 em Janeiro.

Haveria tanto a dizer sobre o sujeito…Mas já fui longe demais. Apresento-lhe as minhas desculpas Senhor Embaixador.

Anónimo disse...

A grande felicidade dos EUA é que, sendo uma democracia, podemos pensar no que farão as forças armadas num cenário eventual baseado numa suposição coiso e tal.

Nos países como Cuba, por exemplo, já não temos de cansar a cabecinha com cenários porque a fita é sempre a mesma: não há eleições e os militares mandam!

Anónimo disse...

Credo, Isto está bonito, está!...
Vai assim a democracia Facebook, mais virtual que virtuosa.

C.Falcao

alvaro silva disse...

Sem ser futurólogo fácil é de medianamente entender que o Trump vai ganhar. Os argumentos aqui apresentados não passam de "inventonas" daqueles que já vêm claro a presidência por um canudo. Cada vez mais me soa a "vira o disco e toca a mesma chula" Afinal para nós básicamente qualquer um serve, mas certo é que nestes últimos três anos e tal houve mais paz que nos vinte antecedentes e isso é o que nos importa. Se quem governa é um geronte ou outro, tanto monta, monta tanto!

Anónimo disse...

Há aqui um tipo que não sabe a diferença entre "veem" (do verbo VER) e "vêm" (do verbo VIR).
É assim tão difícil?

Joaquim de Freitas disse...

E como a mediocridade e a estupidez são almas gémeas, vêm sempre com a cobardia e pobreza de espírito que não se veem anonimamente.

Anónimo disse...

Este Joaquim de Freitas é mesmo um pandego.

Anónimo disse...

Que eu saiba os EUA não são o Sporting nem o Trump é o Bruno de Carvalho que levou séculos para de lá sair. Penso que o Trump não se vai prestar às figuras que o BC fez que teve quase a polícia a expulsá-lo. Agora que o Trump vai começar a respirar mal, vai, porque ontem já debitou um discurso para os adeptos sem grande convicção nem entusiasmo. Bastava estar com atenção.

Agostinho Jardim Gonçalves

Recordo-o muitas vezes a sorrir. Conheci-o no final dos anos 80, quando era a alma da Oikos, a organização não-governamental que tinha uma e...