quarta-feira, setembro 18, 2019

Jorge Sampaio


Há dias, uma minha familiar que tem quase metade da idade de Jorge Sampaio dizia-se confortada e admirativa por ter encontrado, numa sua entrevista, uma linguagem ao mesmo tempo serena e determinada, uma abordagem bem realista dos problemas, a que, contudo, não faltava um empenhado sentimento de esperança no futuro. Fiquei a pensar nessa apreciação e só pude concluir que, uma vez mais, Jorge Sampaio se mantém igual a si próprio.

Sampaio é uma figura muito rara no cenário político português. Nunca o vi vacilar em matéria ética, nunca lhe notei nenhuma transigência em termos de observância dos princípios que a si próprio se impunha para estar na vida pública. Às vezes, surpreendi-me com a constatação de que convivia, com demasiada naturalidade, com o facto de outros não serem assim. Alguns viam nessa sua atitude uma certa condescendência, a implícita afirmação de uma superioridade moral. Não creio tratar-se disso. Sempre interpretei essa postura de Jorge Sampaio como a manifestação de uma saudável distância face àquilo a que os franceses chamam a “politique politicienne”, que entre nós se traduz lindamente por “política politiqueira”.

Acompanhei com atenção, primeiro a alguma distância, depois mais de perto, a vida cívica de Jorge Sampaio. Não o fiz por mera curiosidade, mas muito mais por, desde há muito, ter sido seduzido pela sua forma única de estar na praça política. Nem sempre estive de acordo com opções que tomou, critiquei escolhas que fez, mas, sem a menor hesitação, posso hoje dizer que me revejo largamente naquilo que soube construir, enquanto figura política. A decência (gosto muito da palavra e acho que se lhe aplica como a poucos) que imprimiu à sua forma de atuar soube granjear-lhe uma genuína admiração por parte de gente de quadrantes muito diversos, às vezes contrastantes. Estou certo que História ser-lhe-á justa, tanto mais que se há uma marca que se lhe cola, desde sempre e para sempre, à imagem essa é a de um apurado sentido de serviço público, feito de uma dedicação permanente à causa da democracia e da solidariedade coletiva. A geração a que pertenço, como já um dia escrevi, fica a dever-lhe um raro legado de ética e integridade política.

Jorge Sampaio faz hoje 80 anos. Há, respetivamente, dez e 20 anos, tive o gosto de estar com ele, neste dia, com muitos dos seus amigos, alguns que o tempo entretanto levou e que sei que muita falta lhe fazem. Não o posso fazer hoje, mas quis deixar-lhe aqui um testemunho público muito sincero de grande amizade e respeito.

6 comentários:

Anónimo disse...

É uma espécie de presidente esquecido (menos pelos santanistas).
Sempre gostei de uma certa impaciência para tangas (que eu também julgava ver no Sócrates), mas detestei aquela cena em Macau.

Anónimo disse...

Jorge Sampaio , um Senhor . Nasceu assim , foi educado assim , e assim será toda a sua vida .
Parabéns Sr . Presidente .

Anónimo disse...

O homem pode ser um poço de virtudes. Agora que era um grande "chato" a falar (aquele discurso não ficava na memória...), isso era, não tenhamos a menor dúvida. Assim que me lembre, a maior obra que fez foi afastar Santana Lopes do poder,embora as consequências tenham sido as que sabemos. DE resto, pertence a uma geração que nada diz às gerações mais novas.

José Figueiredo disse...

Sim, Jorge Sampaio é um homem superior. Também tenho por ele a mais elevada consideração. Foi, nomeadamente, o PR de que mais gostei. Como diz: uma pessoa decente.

José Figueiredo
Braga

Anónimo disse...

Eu que sou de esquisitices, me confesso: foi o único presidente da república em quem votei. Um senhor, como poucos (assim de repente, não me lembro ...nem quero recordar-me, como diria o Cervantes ... de outro que se lhe aproxime) neste país.
MB

Pedro Sousa Ribeiro disse...

Conheço Jorge Sampaio desde 1962 e encontrei sempre nele uma coerência filosófica de serviço público e de intransigente defesa dos superiores interesses nacionais. A sua elevada cultura e postura cívica,fruto de uma educação de matriz britânica, foram fatores determinantes para uma carreira politica de exceção. Se houvesse mais políticos com a estatura de Jorge Sampaio Portugal seria certamente um muito melhor país.
Pedro Sousa Ribeiro

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