quarta-feira, setembro 04, 2019

Ainda Timor


Há 20 anos, os timorenses votaram pela independência do seu território. E pagaram por isso, sofrendo uma onda inusitada de violência que escandalizou o mundo.

Tinha cabido à diplomacia portuguesa, ao longo de anos, sustentar, no plano internacional, a questão da ilegalidade da ocupação indonésia da parte Este da ilha de Timor, em face do direito dos timorenses a autodeterminarem o seu futuro. Às vezes, esquece-se um facto: Portugal não tinha de ter opinião sobre se Timor-Leste devia ser um país independente ou se devia integrar-se na Indonésia, eventualmente como uma região dotada de autonomia. Essa era uma questão que cabia aos timorenses decidir, por livre escolha. Portugal não podia aceitar é que a Indonésia ocupasse o território, reprimisse quem se opunha à nova "colonização" e desse por adquirido que Timor-Leste passava a fazer parte do país.

Portugal esteve longe de ser uma parte inocente no conturbado processo de descolonização de Timor-Leste. Depois de 25 de Abril, muitos erros foram cometidos em seu nome e, por ação e omissão, isso facilitou que a lógica da Guerra Fria tivesse permitido a Jacarta executar o golpe de mão que levou à invasão do território e à imensa chacina que, ao longo de anos, dizimou parte importante da sua população civil.

Com o tempo, Portugal foi-se redimindo desses pecados e, já com outro sentido de responsabilidade, conseguiu montar uma campanha internacional, que teve um custo político não despiciendo, de persistente denúncia da violência indonésia. Isso muito veio a ajudar a dar visibilidade à luta heroica dos guerrilheiros que combatiam pela libertação do território.

Para a diplomacia portuguesa, o caso timorense viria a ter duas consequências.

A primeira foi a criação de uma escola de diplomacia aculturada na defesa dos Direitos Humanos. Todas as dimensões de ação externa do país ficaram marcadas pelo caso timorense, tornando algumas relações bilaterais reféns dessa temática e, naturalmente, sobredeterminando a postura dos nossos diplomatas no mundo multilateral.

A segunda teve a ver com os países de língua portuguesa. O caso de Timor acabou por criar um cimento comum, uma causa que Portugal, Brasil e os cinco Estados africanos passaram a desenvolver em conjunto, nos fóruns multilaterais e nos respetivos quadros bilaterais, decisivamente contribuindo para a densificação daquilo que viria entretanto a constituir-se como CPLP.

A luta por Timor-Leste reforçou, ética e funcionalmente, a diplomacia portuguesa.

5 comentários:

Anónimo disse...

Uns são filhos, outros são enteados: os timorenses tiveram direito a referendo; os da Nova Caledónia tiveram direito a referendo; os escoceses tiveram direito a referendo... Os catalães, não só não tiveram direito a referendo como ainda foram espancados e presos. Portugal, apoia!

Anónimo disse...

Lá está! Portugal devia ter invadido a Espanha e ter imposto o referido referendo, não é, anónimo das 9:09?

Anónimo disse...

Sorte a dos Timorenses de terem o Duque de Bragança ao seu lado que nunca se esqueceu deles, e q foi a sua voz activa enquanto em Portugal os governantes, políticos e os diplomatas assobiavam para o lado.

Anónimo disse...

O que o anónimo nove-e-nove escreve quase me faz querer ser crente, só para o encomendar à paciência divina... Raios! - homem -, há mesmo necessidade de ser tão básico?

Anónimo disse...

Há assuntos que têm a qualidade de despertar as vespas. Tocar nas incongruências dos diversos processos mais ou menos democráticos parece ser uma delas. Um sujeito aparece aqui fazendo um frete e insinuando sarcasticamente que Portugal devia ter invadido a Espanha para impor o referendo na Catalunha. Se calhar devia, da mesma forma que invadiu a Indonésia, arrasou a França e destruiu o Reino Unido para levar essa gente a respeitar uma coisa de que o próprio Portugal se assume como campeão: a autodeterminação dos povos. Outro sujeito, em tom insultuoso (que FSC deve ter apreciado), chama básico a quem denunciou as atrás referidas incongruências - porque sabemos que pensar pela própria cabeça e distinguir a hipocrisia e a demagogia é próprio de gente "básica". Pois eu, sou ainda mais básico porque me lembro de outro povo que teve direito não a um mas dois referendos de autodeterminação: o de Gibraltar! Sintomaticamente, o povo eleito "patrocinado" por estas duas criaturas agressivas também foi contra estes dois referendos ocorridos em território... estrangeiro. Às vezes o vento traz-nos um cheiro a mofo e a tabaco forte...

Agostinho Jardim Gonçalves

Recordo-o muitas vezes a sorrir. Conheci-o no final dos anos 80, quando era a alma da Oikos, a organização não-governamental que tinha uma e...