Sempre houve quem alimentasse teorias conspirativas sobre o caráter “predatório“ da ação dos EUA pelo mundo. A gestão Donald Trump “desmascarou” isso: é isso mesmo, é “America first” por todo o lado e em tudo. Esse é o corpo de “princípios” que hoje por lá vigora. Claro como água.
sexta-feira, março 27, 2020
quinta-feira, março 26, 2020
EUA - China, os efeitos da crise
Leonídio Paulo Ferreira, jornalista do “Diário de Notícias” especializado em temas internacionais, ouviu diversas pessoas, numa reflexão prospetiva sobre os efeitos geopolíticos desta crise no equilíbrio entre os EUA e a China. Tive o gosto de ser uma delas, no capítulo “É a economia que, no final de contas, vai contar”. Pode ler aqui.
À espera da Itália
Nesta crise, há algo que tenho por claro: a Itália é a nossa grande defesa. Se o seu peso económico no contexto europeu não conseguir funcionar como argumento “ad terrorem” para forçar uma solução criativa, não será o nosso caso, nem sequer o espanhol, que “comoverá” ninguém.
Ramos-Horta
Bela e nobre atitude de José Ramos-Horta, a condenar a hostilização de que estão a ser vitimas os cidadãos portugueses que estão a trabalhar em Timor, acusados injustamente pela “vox populi” de serem os propagadores do vírus.
Um abraço amigo de agradecimento, José Ramos-Horta.
Perguntadores
Eu sei que muitos não vão gostar, mas aí vai: quem interroga os especialistas nas conferências de imprensa não deveriam ser jornalistas com um mínimo de formação em questões de saúde?
Dá ideia, algumas vezes, que tanto podiam fazer isso como entrevistar um cantor pimba...
Quando se trata de entrevistar alguém sobre assuntos europeus ou temas culturais, os jornalistas são, em geral, gente que domina razoavelmente a matéria.
Se o assunto é saúde, não devia ser da mesma forma?
Dá ideia, algumas vezes, que tanto podiam fazer isso como entrevistar um cantor pimba...
Quando se trata de entrevistar alguém sobre assuntos europeus ou temas culturais, os jornalistas são, em geral, gente que domina razoavelmente a matéria.
Se o assunto é saúde, não devia ser da mesma forma?
Os poetas contra o vírus (2)
O AMOR NA BICHA DO SUPERMERCADO EM TEMPOS DE QUARENTENA
Não me aproximei de ti,
guardei devida distância,
mas na hora que te vi
nasceu em mim esta ânsia.
O teu corpinho de licra
vestido e teu olhar manso
é imagem que em mim fica
e me deixa sem descanso.
vestido e teu olhar manso
é imagem que em mim fica
e me deixa sem descanso.
Amanhã irei de novo
ao mesmo supermercado,
guardando no meio do povo
o recato aconselhado.
ao mesmo supermercado,
guardando no meio do povo
o recato aconselhado.
Esperarei que tu venhas,
por isso fico na caixa
atrapalhando nas vendas;
olho pela esquerda baixa
por isso fico na caixa
atrapalhando nas vendas;
olho pela esquerda baixa
e não vejo teu sorriso
nem teu corpo iluminado.
Resmungam todos comigo,
que atrapalho ali parado.
nem teu corpo iluminado.
Resmungam todos comigo,
que atrapalho ali parado.
Mas eu espero que venhas
com teu corpinho na licra
e em arco-íris acendas
o fogo na minha vida.
com teu corpinho na licra
e em arco-íris acendas
o fogo na minha vida.
Assim volto cada dia
a este supermercado
à espera que sorrias
um dia a este meu fado.
Luís Filipe Castro Mendes
a este supermercado
à espera que sorrias
um dia a este meu fado.
Luís Filipe Castro Mendes
Os poetas contra o vírus
O meu amigo Manuel Alberto Valente publicou no Facebook, numa “desgarrada” de poetas que por aí anda (que pena tenho que o António Russo Dias não ande a versejar os nossos dias), esta letra magnífica de fado. Não resisti a reproduzi-la, como farei a outras a que ache graça, para benefício dos utentes deste blogue que, nos últimos dias (alguma vantagem colateral terá o vírus!) ronda os 2000 leitores diários:
SEMPRE FADO
Já houve um fado operário,
anarquista, lutador,
que tinha como ideário
fustigar o opressor.
Já houve um fado calado
pela mordaça e pelo medo,
um fado no chão deitado,
de lamechice e putedo.
Com Marceneiro gritou,
com Maurício foi genica,
e até a Bica inventou
o tal Miúdo da Bica.
Mas veio Amália e depois
o fado foi outro fado,
passou a valer por dois,
já estava livre e curado.
Por isso já pôde rir
esse Homem na Cidade
que nunca deixou cair
a palavra liberdade.
E o fado do Camané,
da Aldina, de tantos, tantos?
O fado fica de pé
por mais que chorem os santos.
E mesmo nos tempos duros,
com quarentena e temor,
o fado ultrapassa muros
e ajuda a vencer a dor.
Por isso, gente, de pé!
Cantem alto, corações!
O Chico do Cachené
e a Rosinha dos Limões.
Manuel Alberto Valente
O Carlos Eurico e a pesca
Carlos Eurico da Costa, sucessiva ou simultaneamente, jornalista, poeta surrealista, publicitário
e gestor empresarial, morreu em 1998. Já por aqui falei dele, no passado.
O Carlos, que tinha a “qualidade” de ser meu primo direito, que acumulava com o privilégio que eu tinha de ser um seu grande amigo, era um caçador e um pescador de eleição.
À primeira das práticas, nunca teve coragem de sugerir que aderisse. No tocante à segunda, recordo uma jornada à beira-Tejo, algures a montante do Barreiro, nos anos 70, cujo insucesso, no que pessoalmente me toca, me permitiu ter um alibi para escapar a um vício que não tinha, assim podendo usufruir de uma imensidão de manhãs domingueiras na cama, nos anos desde então.
Sobre a primeira dessas artes, Carlos Eurico da Costa escreveu “A Caça em Portugal”, que quem disso sabe diz ser uma obra de referência. Sobre a pesca, não lhe conhecia nada escrito.
Até ontem, quando o seu filho Paulo me revelou um curto manuscrito em que o pai lhe dava dicas para pescar. É do tempo em que o Carlos tinha uma casa de fim de semana na Herdade do Pinheiro, a sul de Setúbal, por onde apareciam José Saramago, Cardoso Pires e “tutti quanti” de um mundo literário lisboeta onde se moveu desde sempre. É um texto quase poético, como o leitor avaliará:
“Paulo
É aquela ágil e também mental forma de pressentir onde está o peixe: o vento, a cor da água, o seu revoltear, a sensibilidade para pressentir onde está a presa. “Cheira-se” o vento, regarda-se a espuma das águas nas rochas, a sua transparência. E depois - é pelo instinto. Olhar sempre as núvens e nunca estar de costas para o mar, para a onda.
Agosto 89”
quarta-feira, março 25, 2020
Helpline
No início de abril, por várias razões, muitas famílias podem ver-se desmunidas de recursos para o básico do seu dia-a-dia, para alimentação e outras despesas básicas.
Não seria de criar uma “helpline” que permitisse às autoridades e às IPSS darem ajuda pontual de emergência?
Não seria de criar uma “helpline” que permitisse às autoridades e às IPSS darem ajuda pontual de emergência?
A certificação dessa necessidade poderia, com alguma facilidade, ser feita pelas Juntas de Freguesia. Uma ajuda em “cash” ou em espécie poderia ser dada a essas pessoas.
O excedente de ontem
É de saudar o excedente orçamental de 2019. Foi produto de um trabalho magnífico, de uma sábia gestão política e todos nos devemos congratular com o conseguido.
Mas permitam-me que, nestes dias que correm, me não apeteça comemorar muito. É que o que aí vem...
Dias difíceis
Penso no que deve ser a dificuldade da vida de pessoas que vivem em casas minúsculas, com a agitação dos filhos a perturbar o teletrabalho de alguns, o inevitável stress familiar provocado pelo confinamento e, muitas vezes, a angústia do seu futuro económico.
Escrever na água
Com o mundo a mudar de forma tão rápida, sem que ainda saibamos quanto e para onde, alinhar ideias sobre o quotidiano é um exercício arriscado. Sinto-me a escrever na água. Mas é necessário ir refletindo sobre esta mudança.
Fala-se bastante, nos últimos dias, na possibilidade de uma alteração da relação geopolítica de forças à escala global, por virtude desta crise. Nessa leitura, o mundo ocidental, com os EUA em maior evidência, seria a principal vítima e a China o grande beneficiário.
A equação para análise desta questão tem duas variáveis essenciais: a economia e a política, esta como resultante do choque humano e social.
O primeiro é facilmente comparável. Daqui a uns meses, será mais claro o estado em que ficaram as grandes economias, embora não devamos esquecer que, numa escala global interdependente, a “saúde” de umas dependerá muito do estado das restantes.
A segunda variável é de uma mensurabilidade mais complexa. As ditaduras, como a da China, têm uma capacidade de contenção rápida dos efeitos políticos de uma tragédia. As democracias, porque tributárias da liberdade de opinião, acomodam de forma diversa essas consequências. Se parece evidente que a China não deve sofrer abalos políticos por virtude desta crise, no mundo ocidental tudo está em aberto. Trump será reeleito? A União Europeia continuará a ser digna do nome ou “balcanizar-se-á”, por falta de consenso (relembro, porque é feita de democracias)?
Devo dizer – e aqui entro na especulação – que a História nos mostrou que a natureza da economia americana, na crueldade do seu modelo de capitalismo, muito tributário da teoria da “destruição criativa” de que nos falava Schumpeter, sempre mostrou uma capacidade maior de reinvenção do que qualquer dos seus parceiros de sistema, talvez com exceção dos “tigres asiáticos”. Há uma flexibilidade no modelo americano que os faz sair mais cedo das crises. Mesmo daquelas em que foram os principais protagonistas, como em 1929 e 2008.
Por tudo isso, a menos que o fizessem por deliberada abdicação, na qual não acredito, estou em crer que os EUA, devendo sair enfraquecidos economicamente desta conjuntura, não vão ser afastados do seu papel de potência dominante. Como o caso russo hoje demonstra, numa escala menor, a economia não determina, por si só, a capacidade de expressão de poder de uma entidade internacional. Se isso assim acontecesse, a União Europeia, uma das grandes forças económicas do mundo, seria um formidável poder. E é o que é.
terça-feira, março 24, 2020
Cabelo e amizade
Telefonou-me há pouco o meu barbeiro. Para saber como eu estava. Na realidade, quem me telefonou foi o meu amigo Joaquim Pinto, que, há décadas, é o meu barbeiro, ali no Apolo 70.
(Diz-se cabeleireiro de homens, mas eu habituei-me assim, e ele não se importa).
É muito bom ver a nossa vida pontuada por gestos simples desta natureza, de gente com a qual, de um relacionamento que começou por ser profissional, passou há muito a haver uma amizade.
Quando vou ao meu barbeiro - e que precisado que estou, por estes dias! - sei que vou conversar com um amigo. Nunca falamos de política nem de futebol, falamos da vida e dos amigos comuns. Esta é também a Lisboa que me faz muita falta! Lá virá!
Os olás dos dias
Nos Natais, as saudações aos amigos são mais curtas, mais sintéticas e com um discurso ritualizado. Nestes dias, vamos tendo mais tempo para a conversa. Prouvera (alguns já nem se lembram da palavra) que todos tenhamos saúde.
Parlamento
Alguns estranham que a Assembleia da República continue a reunir, num tempo de confinamento generalizado. É bom perceber-se que, precisamente pelo facto de alguns direitos constitucionais estarem restringidos, é essencial que o parlamento esteja ativo. Ele é a casa da democracia!
Astérix
Um ataque cardíaco matou o desenhador Uderzo, com 92 anos. Era o sobrevivente de uma dupla cujo humor ajudou a educar mais do que uma geração, cujo trabalho funcionava também como uma subliminar lição de História. Há já muito tempo, em 1977, que Uderzo perdera a “outra mão”, Goscinny, e, tal como aconteceu com o “renascimento” da banda desenhada de “Blake & Mortimer”, Astérix e Obélix e Idéfix nunca mais foram a mesma coisa. Hoje, vou ler/olhar para dois ou três álbuns. É o lado positivo da quarentena.
Costa
Será porque me sinto politicamente próximo dele, tornando-me por isso suspeito aos olhos de quem dele não gosta, que acho que António Costa está a fazer um excelente trabalho nesta crise, mostrando um grande sentido de responsabilidade e transmitindo confiança aos portugueses?
DGS
Sei que isto não é apenas geracional, é também “de grupo”, mas a mim, quando estou distraído e oiço “segundo a DGS”, toca-me ainda uma certa “campaínha” histórica.
Distância oficial
Ainda não tenho os reflexos do vírus interiorizados. Demorei alguns segundos até achar justificável a distância entre Marcelo e Centeno.
O meu fuso
É-me cada vez mais difícil falar com alguns amigos sobre a crise do vírus. Eles citam e pedem-me para comentar o que viram ou ouviram, “ainda há pouco”. Ora eu não vejo mais do que meia hora de televisão sobre o assunto, e sempre ao final do dia. Optei por viver noutro “fuso”.
Dois choques
No 11 de setembro, vivia em Nova Iorque. O choque foi imenso, mas foi súbito e as pessoas foram-se adaptando. Este é crescente e a angústia sobe dia após dia.
segunda-feira, março 23, 2020
Higiene
A melhor dia foi a daquele cidadão que limpou a sua televisão com um desinfetante e, em seguida, deu-se conta que a CMTV tinha desaparecido dos canais.
Olímpica ilusão
Só pela cabeça teimosa dos japoneses passava pela cabeça ainda poder realizar as olimpíadas. Mas compreende-se que deve ser terrivelmente frustrante para quem andou anos a treinar ver cancelados os Jogos.
O que aí virá
A euforia dos anos de normalidade que tivemos faz-nos esquecer a tragédia que vai ser o inevitável aumento do desemprego: pobreza das famílias, custos sociais, aumento da criminalidade, rejeição xenófoba dos (“ameaçadores”) estrangeiros. E vai ser preciso apoiar muito as IPSS!
Beijos e abraços
Há já por aí uma escola higienista radical que acha que, passada esta crise, vai-se manter a prática de “distanciação social”. Era só o que faltava! Em tempos normais, sem pandemias e com risco normais, continuarão os beijos e abraços.
Mudar?
É talvez cedo para falar disto, mas creio haver uma grande inocência por parte de quantos pensam que, passada a crise do vírus, o mundo vai “tomar consciência” e mudar radicalmente de hábitos. Alguns o farão, a esmagadora maioria voltará ao “business as usual”. Só que mais pobres.
Só sábios éramos muitos
O que mais cómico é que num tempo em que ninguém tem certezas de nada, nos surjam comentadores que têm ideias definitivas sobre tudo.
Ai, Europa!
O Eurogrupo flexibilizou as regras do Pacto de Estabilidade e Crescimento (PEC). (Para quem não saiba, o PEC são as regras de “comportamento” para quem quer estar no euro). A linguagem (confiram) foi ligeiramente menos aberta do que a da Comissão Europeia, pela voz da sua presidente, como se previa. Aí pesou, seguramente, o rigor da Europa do norte. Mas, pelo lado do Eurogrupo, está feito, por agora, o que era indispensável.
Da parte do Banco Central Europeu já havia sido anunciado o reforço do “quantitative easing”, isto é, a aquisição “voluntarista” de dívida aos bancos dos Estados, o que, sendo indispensável, também não deixa os “rigoristas” muito cómodos. E está longe de ser suficiente para suportar a situação que se vive.
Resta agora a cobertura da dívida suplementar que tem de ser feita, por virtude das consequências da atual crise. Se não houver uma mutualização dessa nova dívida (e há que ter consciência que não existe ainda um instrumento institucional para a gerir, nem é claro como, a haver um acordo, as ratificações nacionais se farão - em muitos países têm de passar pelos parlamentos), o uso individualizado da ”liberdade” ora obtida cairá, de imediato, sobre cada dívida soberana de “per si”. Lembremo-nos que foi esse o resultado do acordo Merkel-Sarkozy em outubro de 2010, em Deauville.
Ora isso acabará por ser trágico para os Estados que têm mais dívida, como é o nosso caso. Se não houver para isso uma rápida resposta europeia - ou o seu anúncio, com forte solenidade - os mercados, que não são nem europeístas nem solidários, “saltarão” sobre as dívidas soberanas mais expostas, fazendo subir as suas taxas de juros, alargando os “spreads” entre elas, que estavam a encurtar nos últimos anos.
A Europa tem de apressar-se e, nela, quem tem mais pressa somos nós, felizmente acompanhados pela Itália, cujo peso no contexto da economia europeia pode ser um fator importante para convencer os países que estão menos desconfortáveis e, por essa razão, tendem ainda a ser menos solidários e mais reticentes face à “criação” de dívida europeia, os tais Eurobonds. Não há muito tempo,
Europe needs a new scale of stimulus — and cash not credit
Wolfgang Munchau, que ainda há pouco tempo esteve em Portugal, para participar num debate organizado pelo Banco de Portugal, que tive o gosto de moderar, escreveu ontem no Financial Times um artigo que vivamente recomendo, especialmente centrado nas respostas possíveis da Europa perante esta crise. Leia-o aqui:
For the eurozone, this is not the 2010-2012 crisis all over again. It is far worse. The coronavirus will prove to be an economic shock, a corporate solvency crisis and a political crisis all folded in to one.
The good news is that it will probably not become a sovereign debt crisis. The European Central Bank last week did the right thing and has reduced that probability. Its pandemic emergency purchase programme will help governments raise money for healthcare and a first set of economic measures. What it will not, and cannot on its own, address is the wider macroeconomic impact of coronavirus. That will require a different set of tools.
The German government will on Monday agree a supplementary budget for just under 5 per cent of gross domestic product, and will set aside additional funds for equity stakes in companies and loans.
But beware. What is often oversold as a bazooka tends to come with awkward conditions in the small print.
Much of the money is credit, not grants. If a business borrows money while profits fall, solvency deteriorates. This was Italy’s problem after the eurozone crisis. Austerity left the economy in a weaker position to pay down debt.
This crisis could easily end up adding 20 to 50 percentage points to Italy‘s debt-to-GDP ratio over a number of years. If another episode of austerity follows, Italy will be trapped in a vicious cycle. This is why I do not see any merit in a programme of credits by the European Stability Mechanism, the eurozone’s rescue umbrella.
What the eurozone needs is cash, not credit. But credit is what it is good at. Bailouts are frowned upon on the grounds that they constitute moral hazard. So is the economic concept of a helicopter drop, or the US idea of stimulus by mailing cheques to households.
European countries do have well functioning fiscal stabilisers such as unemployment insurance. These economic shock absorbers are designed to deal with normal fluctuations. But they are not big or strong enough for emergencies like this one.
The fiscal framework of the eurozone has some built-in flexibility, but it is not set up for discretionary stimulus. A 10 per cent fall in GDP will require it. If governments cannot do this on their own, it will have to be done at EU level.
We could employ some creative financial wizardry involving one or several EU institutions and the ECB together. This could take the form of a one-off fiscal facility partially bankrolled by the ECB. The key characteristics should be: money, not credit; direct cash payments to citizens, households and companies; and, yes, the liability should be mutualised. It should be backed, without limits, by the ECB.
The biggest economic risk right now is not just the steep decline in output, but also the permanent shock it could suffer afterwards. The primary purpose of a discretionary stimulus should be to ensure that the recovery is V-shaped. But there are a number of reasons to fear that the recovery will peter out. Some of us will be travelling less. Some might seek a different trade-off between work and leisure. European car manufacturers might use Covid-19 as an expedient moment to reduce their structural overcapacity.
As to size, if you expect an economic shock of up to 10 per cent of GDP, a discretionary stimulus to the tune of 5 to 10 per cent of GDP is hardly disproportionate. A payment of €1,000 for each citizen would cost just under 3 per cent of eurozone annual GDP. Alternatively, but with less immediate impact, the funds could be used to generate a huge post-crisis investment programme.
What I have already noticed is that the debate about the future of the eurozone is back. Not everyone will want to be locked in a monetary union with countries like the Netherlands, whose prime minister is ideologically opposed to mutual risk-sharing. This sort of unwilling partnership is not sustainable.
It is not just the scale that is different between today and the crisis of 2012. The politics have also changed. A recent poll registered a rise in the number of Italians who regard belonging to the EU as disadvantageous, from 47 per cent in November 2018 to 67 per cent now. Italy, at the centre of Europe’s coronavirus outbreak, has more pressing problems to deal with at the moment.
But be prepared for more in-out debates as a direct result of this crisis. And that is another reason why we should think about stimulus, not credit.
Perder cardeais
Como se sabe, Portugal “ganhou” há pouco um cardeal. E que cardeal! Uma figura intelectual muito interessante, que escreve lindamente e para cujo futuro na Cúria se olha com imensa atenção.
Não era sobre esses ganhos & perdas de cardeais, que hoje venho aqui falar, nesta nota leve, para amainar estes tempos terríveis.
Havia - desconheço se ainda há - uma velha tradição na Embaixada de Portugal junto da Santa Sé: sempre que um cardeal vinha jantar à Embaixada, dois empregados, fardados à antiga, deslocavam-se até ao portão de entrada, munidos de duas tochas ardentes, e acompanhavam os "príncipes da Igreja" até à escadaria do edifício. Posso imaginar que outras representações diplomáticas procedam de maneira idêntica.
A história que me chegou, já com bastantes anos, diz respeito a um desses jantares, a que dois cardeais iriam estar presentes, a convite de um nosso embaixador.
Presumo que tal evento constitua um momento especial, pelo que é sempre digno do maior cuidado protocolar. Porém, nessa noite, algo terá corrido menos bem e os arranjos coreográficos de recepção, com vista a garantir o acolhimento dos cardinalícios comensais pelos fâmulos de serviço, acabaram por não se conjugar de forma harmoniosa.
Por uma qualquer razão, quiçá devida a uma informação errada recebida ao portão, os cardeais, logo que entrados no jardim, e porque não tinham os tocheiros à sua espera, decidiram meter-se a caminho, em direcção à residência. Fizeram-no, porém, por um percurso ínvio que os acabaria por fazer entrar na casa por uma porta lateral e aceder a uma sala vazia, onde serena e discretamente se acomodaram, esperando que alguém os viesse receber.
Entretanto, o embaixador foi alertado pela portaria, embora com algum atraso, de que os cardeais tinham entrado no jardim. Logo partiram pelo jardim os fâmulos de libré, com as chamas das suas tochas ao vento, quais portadores de facho olímpico. Porém, chegados ao portão, são informados que as eminentíssimas visitas já teriam dado entrada no jardim.
O pânico criado pela "gaffe" do porteiro acelerou-lhes então o passo e, diz-se, o espectáculo seguinte foi digno de opereta: sob o olhar ansioso dos embaixadores e convidados, o breu do grande jardim da Embaixada passou a ser cruzado, durante minutos, por duas nervosas e lépidas tochas ardentes, que corriam atarantadas de um lado para o outro, espiando todos os escaninhos possíveis, na desesperada e cada vez mais angustiada e vã busca das figuras cardinalícias perdidas.
O resto da história não a conheço, mas podemos imaginar que, descobertos finalmente por alguém no aposento onde esperavam, com a infinita paciência que a sua instituição lhes incutiu, aos nossos cardeais tenha entretanto chegado um reconfortante Porto ou, pelo menos, um vero limoncello...
domingo, março 22, 2020
Saudades da quarentena
Foi um belo tempo, a minha quarentena. Depois, um dia, tudo acabou. Fiz 50 anos.
Conversas
Dizia-me uma amiga há pouco: “Nunca pensei contar e ouvir pelo telefone tantas histórias simples do dia-a-dia, da ida às compras, dos passeios pela vizinhança...”
Expresso
Ontem, neste retiro forçado, alguém me trouxe o “Expresso” a casa. Está na moda dizer mal do “Expresso”. Eu também digo, muitas vezes. Mas compro-o, sempre. Em papel, claro. Alguns não vão acreditar: desde o nº 1! Isso mesmo, leram bem, desde 6 de janeiro de 1973. Quando o aparecimento do “Expresso” mudou a imprensa em Portugal. Há 2473 semanas, sem ter falhado uma única vez. (Acho que já disse isto por aqui, mas repito-me, o que é coisa de velho - qualificação que a minha quarentena prova).
No estrangeiro, por onde andei, chegava-me por mala diplomática - a Oslo, a Luanda, a Londres, a Nova Iorque, a Viena, a Brasília. Em Paris, tinha-o reservado num quiosque perto da Étoile. Quando por Bruxelas, se o não apanhava numa loja na cidade, chegava a ir a Zavantem buscá-lo. Em Genève, numa estada longa por lá, descobri uma tabacaria que o tinha. Um dia, em Vila Real, meti-me no carro para ir à Régua comprá-lo.
O “Expresso” acompanhou-me toda a vida. Às vezes, confesso, mal o leio, dou uma vista de olhos pelos títulos e o jornal jaz durante uns dias por um canto, vou-lhe pegando de quando em vez, até que o fazem desaparecer, sem me perguntarem nada.
Se ainda gosto do “Expresso”? Já gostei muito mais, todos gostámos muito mais. Acho, aliás, que esse sentimento, no íntimo, deve atravessar alguns que por lá estão e quase todos os que de lá saíram. O “Expresso”, desde há bastantes anos, anda diferente, raramente traz “caixas”, novidades, coisas em primeira mão. Sendo um “berliner” no tamanho, às vezes parece um “tablóide” nos títulos e em alguma especulação fácil em que cada vez mais cai. É pena. Ao longo do tempo, foi perdendo alguns excelentes jornalistas, mas tem ainda por lá gente bastante competente, alguma da qual, por essa mesma razão, tinha a obrigação de conseguir fazer, todas as semanas, um jornal melhor.
Mas eu, repito, compro sempre o “Expresso”. Até para poder dizer mal dele, quando me apetece. Não faço parte da escola dos “não li e não gosto”. Eu, se às vezes não gosto do que o “Expresso” publica, é porque li. Acho que, apesar de todos os seus defeitos - muitas vezes até por causa deles! -o “Expresso” deve ser lido.
Mariana Vieira da Silva
Um abraço a Mariana Vieira da Silva, uma pessoa com uma imensa dedicação ao serviço público. A caravana passa, Mariana!
Páginas do diário
Ontem, houve cá por casa uma “dieta” a 100% de televisão. Nem sequer filmes! Alguma (pouca) rádio, muita música, livros (o que se descobre que temos!) e bastante net. Hoje, entra em vigor um novo “protocolo”: reduzir fortemente as horas no laptop e iPad. A sanidade é também isso.
Este estranho silêncio
Hoje, lembrámo-nos de que o silêncio que agora se “ouve” na Lisboa onde vivemos recorda o da residência da nossa embaixada em Brasília (Helena, Delfina, Zé e Romário, como estarão a viver isto?). Recolhida nas “quadras” internas do Lago Sul, naquela casa acordava-se com o cantar das aves e raramente se ouvia um carro. Como panorama sonoro de fundo, nunca ali se tinha o “bruá” tradicional das cidades. Mas Brasília é uma cidade muito atípica, até nisto. E aquele era um silêncio bom.
Por cá, pelo meu jardim, as aves foram sempre poucas, salvo quando o jardineiro levanta a terra e elas, depois, procuram alimento. Mas, por qualquer misteriosa razão, raramente nos dão música. Isso agora nota-se mais, pois este silêncio que temos é diferente, é pesado e lúgubre.
Foram poucos dias, mas já me faz falta o barulho dos elétricos a passarem em frente à janela, o coro da pequenada do infantário aqui ao lado, o ronco dos paquetes no Tejo, até o ruído dos aviões. Faz-me falta a outra Lisboa. E isto só agora começou...
sábado, março 21, 2020
A senhora presidente
Desde Jacques Delors, habituei-me a relativizar a importância das declarações dos presidentes da Comissão Europeia, salvo quando elas já traduziam um prévio acordo franco-alemão.
Por princípio, não gosto de ver uma figura alemã à frente da CE, mas levo muito mais a sério o que a ela diz
E as flores?
Estive a ler a lei e, sem surpresas, as floristas (já viram esta delicadeza? Ninguém se lembra de dizer os floristas!) não fazem parte dos serviços essenciais, neste tempo de vírus (eu já só o trato pelo apelido).
É pena, as flores são fundamentais. Para honrar as vítimas e alegrar os vivos.
Há pouco, aqui em casa (“where else?”), entrei numa sala e deu-me vontade de a ver cheia de flores. Mas a vida é o que é. Pronto, lá avançam os jarros do jardim!
E, já que estou “com a mão na massa”, ouçam uma conhecida canção de outros “tempos de chumbo” (que nada indica não reapareçam algures) o “Pra não dizer que não falei das flores”. Aqui
A leitora
Nos jantares diplomáticos, há por vezes que fazer conversa “de chacha”. É que nem sempre quem nos calha ao lado é capaz de manter um diálogo interessante, capaz de sustentar uma hora de convívio ocasional. (Imagino bem que os outros digam isso de nós).
Aquele escritor, intelectual elaborado, até algo macambúzio e pouco dado ao “small talk” típico dessas ocasiões, que já havia aceitado o convite para a embaixada com alguma relutância, acabou por ter o azar de ver sentada a seu lado uma “socialite” que rapidamente veio a revelar-se do mais profundo vazio.
Depois das banalidades do costume, veio à baila a vida de cada um. A senhora lá falou da existência que levava, com as férias “estupendas” em evidência, inquirindo depois sobre o que fazia o seu vizinho de mesa:
“Sou escritor”, disse o nosso homem, em voz discreta.
“Ah! Mas que interessante! E escreve o quê?”, ouviu da voz ao lado.
“Escrevo livros”, disse o outro, sorrindo de obviedade.
“Que giro! E agora anda a escrever alguma coisa?”
“Normalmente escrevo romances, mas, desta vez, estou a escrever uma autobiografia”, adiantou o homem, surpreendido com a sua própria franqueza.
“Ah! Mas isso é fascinante! E o livro é sobre quê?”
O escritor achou este jantar afinal tão divertido que não se cansa de falar dele.
Elogio do medo
Um amigo que andou na guerra a sério, nas bolanhas da Guiné, disse-me um dia uma coisa que nunca esqueci: “O que me valeu foi ter medo. Era o medo que me protegia. Vi morrer colegas que o não tinham, que arriscavam. Que só acontecia aos outros”. Tenho-me lembrado muito dele.
sexta-feira, março 20, 2020
O euro
Estarei a exagerar ou a crise de 2008 é uma história de crianças comparada com o que aí está e o que aí pode vir? É minha impressão ou a solidez do euro está cada vez mais em causa?
O papel do papel
Deve haver poucas pessoas que gostem mais de jornais em papel do que eu. Mas, com sinceridade, acho que esta crise vai ser uma machadada para esse setor. Eu remo contra a maré...
Pimba
Temo cada vez mais que os cantores pimba se ponham para aí a fazer concertos grátis para “ajudar”. E temo muito mais que as televisões os transmitam. Um plano “de contenção” da má música devia fazer parte da legislação de exceção.
E o silêncio dos grunhos?
Ninguém tem uma palavra de conforto para esses grupos de bem que são as claques de futebol, agora recolhidas ao silêncio, sem estações de serviço para assaltar, sem bilhetes para traficar, agora reduzidas ao pó... das casas?
E a China?
Se o comportamento chinês em matéria de ajuda a alguns países, durante esta crise, vier criar-lhe uma nova e positiva imagem perante o mundo, não poderá isso ter consequências na futura atitude de alguns Estados em face dos interesses geopolíticos da China?
Ai Brasil!
O Brasil declarou o Estado de “calamidade pública”. Tendo em atenção que as Forças Armadas são a única estrutura de segurança pública a nível federal, não nos admiremos se vier a assistir-se ao reforço súbito do seu papel de exceção. E, naquele país, a História prova que “o diabo veste farda”...
Setores em carência
Na imprensa francesa, um artigo sobre os estragos que esta situação causa aos “arranjinhos“ e aos “amantes”. Haja quem esteja atento a estes setores em estado de carência!
Injustiças
Por estes dias, recordo-me de que Baptista-Bastos falava de “umas pessoas injustamente acusadas de serem jornalistas”.
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25 de Abril
A Academia Portuguesa de História premiou agora este livro de Irene Pimentel, sobre o 25 de Abril e tempos subsequentes. Talvez porque ande...