A entrevista ao Jornal Nacional da “Globo”, às primeiras horas de hoje, correu bastante bem a Lula. Ao optarem por não revisitar as acusações de que Lula foi alvo, respeitando assim as decisões da justiça, os jornalistas facilitaram-lhe a vida, embora o próprio Lula tivesse insistido em puxar a terreiro o tema, quiçá demasiado para quem dele só teria interesse em se afastar.
O grande problema de Lula, mas que não deverá ser suficiente para o fazer perder esta eleição, é que há uma parte muito substancial do Brasil que o rejeita, justa ou injustamente. Mais: há largos setores que, no passado, aceitaram colá-lo artificialmente ao pior do Lavajato, com a cumplicidade de Sérgio Moro, apenas para que ele não fosse candidato.
Nesta entrevista, Lula conseguiu iludir, com a maestria retórica que lhe é reconhecida, o tema incómodo do seu persistente silêncio - mesmo de uma aberta cumplicidade ideológica de setores do PT - face à prática de algumas ditaduras, como a cubana ou a venezuelana. Também o elogio que fez ao ”novo” MST, podendo ser agregador das suas tropas, não deve ter caído muito bem no eleitorado moderado que o seu vice, Geraldo Alckmin, procura captar.
O Lula de 2022, embora ele próprio procure iludir(-se com) isso, está muito longe do Lula de 2002. A magia de então passou, a “trouvaille” da “Carta ao Povo Brasileiro” já não teria hoje o mesmo apelo, Lula atravessou anos muito traumáticos, que inevitavelmente terá interiorizado. O “reset” é impossível, houve pontes que ficaram definitivamente queimadas.
Tudo indica que Lula pode ganhar as próximas eleições. Porque está longe de ser um radical e vive muito preocupado em garantir um lugar simpático na História do Brasil, irá fazer um mandato positivo. Mas tudo vai ser muito diferente do passado, e ele sabe-o. Em especial, o Congresso já não é o que era e o “seu” PMDB colaborante (Sarney, Calheiros) já lá vai. Além de que o mundo mudou. Mas, face ao presente, o Brasil e esse mesmo mundo ficarão imensamente melhor com Lula no Planalto.
4 comentários:
Se Lula for eleito, algo que, pessoalmente, me parece ser ainda muito duvidoso, ele e a sua equipa vão ter muitas batalhas pela frente. A pior de todas vai ter de ser com os gigantes dos madeireiros e com os grandes barões do agro-negócio. Porém, essa será a batalha fundamental que o Brasil e o mundo precisam de vencer, até porque, se a perdermos, estaremos no mato sem cachorro. Um bom dia, Senhor Embaixador.
imensamente é pouco...
Pois é, meu caro Francisco, com toda a cordialidade e respeito, quando entramos na substância das coisas, é que o pé nos pode faltar.
Naturalmente (obviamente), que sendo eleitor no Brasil a escolha entre candidatos nunca teria sido para mim tão óbvia: Lula, pois claro. Contudo, a moderação nunca é para todos. Que o digam o milhões que com Lula e sem ele se mantêm na pobreza, na exclusão, na margem da sociedade, correndo como o burrito na eterna perseguição da cenoura capitalista. E, naturalmente, quanto mais dessa moderação excludente, mais bolsonarismo, mais "populismo", mais, muito mais fascismo, como também por aqui, neste lugar de gente moderada, vamos vendo todos os dias. E pur si muove...e por conseguinte, para os que ainda não tinham percebido esse tectónico e perpétuo movimento, aí está a realidade todos os dias e cada vez mais, a dizer-nos, também ao Lula, que os tempos em que se podia estar com um pé de cada lado do muro, vão tendo, cada vez mais, os dias contados. Sobre as tenebrosas ditaduras venezuelana e cubana, nada a dizer. Afinal, trata-se de uma brincadeirinha da sala dos mais pequeninos e nós aqui já somos todos muito crescidos.
Acabado de regressar do Brasil depois de quase 6 anos subscrevo a análise do prezado embaixador. Mas o que ressalta desta agitada campanha eleitoral não é tanto a disputa entre os vários candidatos mas a intolerância que atravessa a sociedade brasileira. Que os sectores mais reaccionarios e ultra-montistas alinhem com o presidente candidato não é tão surpreendente mas que um personagem tão controverso seja a preferência de mais de 30% dos brasileiros quando existem alternativas decentes diz muito sobre a sociedade brasileira
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