sexta-feira, janeiro 31, 2020

Adeus, Caixa!


A minha primeira conta na Caixa Geral de Depósitos foi criada quando eu tinha creio que 13 anos. O meu pai era gerente de uma filial da Caixa, em Vila Real. Foi funcionário 47 anos. A Caixa era a sua vida e o seu orgulho. Morávamos no edifício da Caixa.

Era um tempo em que a Caixa era vista pelos seus depositantes como o banco mais seguro do país, onde os mais humildes depositavam, não apenas os seus bens mas, igualmente, a sua confiança. A Caixa era uma imensa pessoa de bem.

Em 1971, fazendo uma surpresa ao meu pai, fiz um concurso público e, a meio do meu curso universitário, entrei para funcionário da Caixa. Foi o meu primeiro emprego no serviço público, onde fiquei, com imenso gosto, 42 anos da minha vida. Creio que data dessa altura uma nova conta que por lá ainda tenho, onde, desde então, os meus salários e a minha reforma sempre foram depositados. Até ao final deste mês.

Durante anos, a Caixa Geral de Depósitos (que então se chamava também “Crédito e Previdência“) foi, para mim, o sinónimo de banco. A minha afetividade pela Caixa era imensa.

Até um dia, até ter começado a ser “agredido” pela Caixa.

Há uns anos, assisti ao espetáculo degradante de ver uma pobre senhora de aldeia gritar, numa dependência da Caixa, em Vila Real. Queria levantar um dinheiro que tinha depositado mas, afinal, tinha-lhe sido impingido, anos antes, um “produto” e, para o movimentar no final da maturidade, tinha de perder parte do capital. A senhora não tinha lido o “small print”. Desmaiou e foi necessário chamar o 112, perante a revolta de quem por ali estava. Fiquei escandalizado, saí dali e queixei-me a pessoas que conhecia na administração da Caixa. Nada aconteceu! Meses mais tarde, um funcionário, a quem contei o episódio, comentou: “Se soubesse o que somos obrigados a induzir os clientes a comprar. Às vezes, até tenho vergonha...”

A Caixa, nos últimos anos, tornou-se, a meu ver, nos dias que correm num dos piores bancos portugueses. Se não mesmo o pior. As suas comissões são obscenas e a qualidade dos serviços bateu no fundo. Há muito tempo que não tenho uma experiência medíocre sempre que recorro aos serviços da Caixa: são todas más!

A Caixa foi recapitalizada pelo Estado (isto é, também por mim e por si, que me lê). Em troca, a Caixa comprometeu-se a comportar-se exatamente como qualquer outro banco. Logo, a Caixa não pode financiar, com quaisquer vantagens, as políticas públicas, nem se sente na obrigação de manter uma rede de âmbito nacional, nomeadamente em locais de onde não extrai lucros, mas onde se pensava que pudesse exercer uma presença de serviço público. Tem de reduzir balcões e pessoal. Mas então, se a lógica é a Caixa funcionar como qualquer outro banco, por que diabo o erário público tem de colocar lá dinheiro? Eu, como contribuinte, não quero ser banqueiro. Mas, dizem alguns, é importante ter um banco do Estado! A mim, confesso, não me apetece ver a Caixa privatizada, apenas por um reflexo ideológico. Mas, intimamente, por muito que puxe pela cabeça, não consigo vislumbrar, com o atual modelo de funcionamento da Caixa, qualquer vantagem em tê-la pública. Para me explorarem nas comissões e depois darem parte dos lucros ao Estado? Talvez preferisse que me baixassem as comissões e os impostos. Mas estou aberto a ser convencido.

Nos dias de hoje, chega-se a uma dependência da Caixa e as filas desestimulam-nos logo dessa triste ideia que tivemos. Ligar pelo telefone para lá é uma missão impossível. Há semanas, estive numa dependência e os telefones tocavam, sob a olímpica desatenção geral. Dizem-me que é a regra. Uma das chamadas desse dia era minha, ali ao lado. Nunca foi atendida. Alguma rapaziada, entretanto, conversava jovialmente e uma parte saía para almoçar...

Há meses, cansado de mudar de “meninas“ que me vinham a impor, sucessivamente, como “gestoras de conta”, tentei mudar de local de agência. Fui ignorado, mesmo depois de vários pedidos. Ando nisto há quase um ano! A Caixa anda a gozar comigo...

Hoje, dia em que a Caixa anuncia que teve lucros de 776 milhões de euros, estive aí uns 45 minutos à espera, numa linha telefónica 707. No final, ninguém me atendeu. Paguei quase seis euros. A Caixa não tem vergonha de sujeitar os seus clientes à exploração das chamadas de valor acrescentado? Vale tudo para ganhar dinheiro, é?

Tenho imensa consideração pessoal pelo Dr. Paulo Macedo, um qualificado gestor graças a quem, noutras funções que exerceu, o fisco é hoje mais eficiente e todos pagamos os medicamentos mais baratos. Mas tenho que confessar que perdi, por completo, a confiança na instituição que hoje dirige.

Depois de quase seis décadas de cliente da Caixa, daqui a dias vou encerrar a minha conta, vou pedir à Caixa Geral de Aposentações para alterar o destino da minha reforma e vou mudar de banco. E levo a família comigo. E alertarei os meus amigos.

Pelos vistos, a Caixa acha que lhe não faço falta, como cliente. Eu, como cliente, também acho que a Caixa, a ”minha” Caixa de sempre, deixou de me fazer falta. Estamos quites. Podemos “desquitar-nos”

Deixo assim de ter “dinheiro em Caixa”. Creio que o meu pai, que entrou para a Caixa em 1929 e saiu em 1976, me perceberia. Talvez com alguma tristeza, como é hoje a minha.

16 comentários:

Anónimo disse...

Já fiz isso há muito tempo, e a minha conta tinha sido aberta em 1987, por ser obrigatório que o pessoal docente do ensino superior recebesse o salário através da CGD.

Paulo Guerra disse...

O Sr. Paulo Macedo mandou dizer que está mais preocupado com os funcionários. Mas infelizmente nem isso é verdade. Como aliás a história dos medicamentos mais baratos. Uma andorinha nunca fez a Primavera. A passagem do Sr. Paulo Macedo pela pasta da saúde também foi sobretudo desastrosa para o SNS. E digo também porque é a norma no relacionamento do Sr. Paulo Macedo com o bem público.

Reaça disse...

A caixa do tempo da outra senhora, o Aforro do tempo da outra senhora, os CTT e TLP daqueles tempos, e até a pouca luz elétrica...era como que fosse tudo da familia, tudo nosso, e agora é tudo tão estranho, até parece que está tudo feito para nos enganar.

Ésse Gê (sectário-geral) disse...

E quanto ao fisco ser hoje mais eficiente "graças" ao dr. Macedo, talvez o dr. Nunes dos Reis, seu antecessor, tenha muitas coisas para contar.

Anónimo disse...

SE não serve como banco público é vendê-la...

Anónimo disse...

Também já deixei de ter conta na “minha caixa”. Era cliente desde 1975 e tive uma experiência igual a sua. Mudei-me para um banco privado onde sou tratado com educação e as comissões são muito menores. E atendem sempre o telefone sem ser em linhas de valor acrescentado!

Patrick disse...

É exatamente assim que se faz no Brasil quando se quer convencer a opinião pública a ser favorável à privatização de alguma empresa pública.

Anónimo disse...

Sou cliente da Caixa Geral de Depósitos e tenciono continuar.

Funcionários bancários a impingirem produtos é normal, foi sempre assim. Alguns, até se "serviam" das contas dos clientes amigos, que, adoravam a simpatia do funcionário!
Já sabemos, que, está tudo feito para nos enganar, em todo o lado.
A "sua" velhinha desmaiada, provavelmente só lhe interessou o lucro.
Os velhinhos não podem ir aos bancos, ou outros, sózinhos, contratar serviços, que, não entendem. Os mais novos também não...

Anónimo disse...

Caro Francisco,

Eu saí da Caixa no dia em que foi permitido aos funcionários públicos terem os seus vencimentos depositados noutros bancos. Aquelas filas na rua Prior do Crato já eram uma vergonha há várias décadas... Pelos vistos, as coisas não melhoraram entretanto.

Um abraço

JPGarcia

Anónimo disse...

O Paulo Macedo implementou uma estratégia de saque permanente aos clientes, um clima interno insuportável que culminou num terror em alertar para o que está mal e um baixar de braços dos empregados que são espezinhados diariamente. No fim os clientes é que pagam e o Sr Macedo vai sair com os bolsos bem forradinhos de prémios acumulados. Quem vier a seguir que feche a porta. Infelizmente eu estou lá dentro como empregado.

Anónimo disse...

Anónimo das 16.48,

Pode sempre fazer como o autor do blogue.
Aposto não trata os seus clientes de igual forma, porque alguns não deixam.
"No fim os clientes é que pagam", claro, na CGD e noutro qualquer.
Se por acaso, alguma vez me atendeu, deixe lhe diga, que, foi muito eficiente.

João Cabral disse...

Isto é que é gosto pelo banco público, hem?

Anónimo disse...

Obrigada pela publicação deste artigo que acho muito bom e sem dúvida necessário! A CGD tem atuado para com alguns clientes de uma forma mais que imperdoável, diria mesmo criminosa, não irei aqui dar detalhes, mas a verdade é que a minha experiência com essa instituição bancária é inconcebível e surreal...por tal o fecho da minha conta!

Maria Isabel disse...

Estou completamente de acordo. Tenho conta na CGD desde sempre e já pensei em mudar, mas não sei para onde. Já fui saber condições noutros bancos e uma senhora que me atendeu disse, uma vez que eu tenho pouco dinheiro, ainda o mais barato era a caixa.
Uma vez na Caixa disseram-me as coisas ficam caras mas se depositar mais dinheiro já pode haver mais vantagens.
Ora, eu sou Isabel, mas não sou "dos Santos". Se fosse até no Panamá tinha melhores condições, Olha a novidade .
Bom domingo

Anónimo disse...

Sou mais um que também está farto de todas as comissões, a falta de tempo tem sido a sorte da Caixa, entretanto já abri conta noutro banco e já passei para lá os débitos.. A seguir será o resto.. Pelo que percebi a caixa não precisa de dinheiro e tem custos elevados para guardar o que já têm.

Cumprimentos,
SS

Luís Lavoura disse...

Se o Francisco vai mudar, aconselho-lhe o Banco Montepio. É um banco muito transparente nas comissões que cobra, muito exato. Se optar por uma "Solução Valor" ficará muito bem servido.
Desaconselho-lhe qualquer banco espanhol, que são pouco transparentes. A menos que o Franscico detenha muitos títulos (ações, obrigações, etc), e nesse caso deve optar pelo Abanca, que cobra comissões muito baixas sobre juros e dividendos.
Se optar pelo Montepio, e como não gosta de "meninas" como gestoras de conta, vá à agência do Arco do Cego, onde pode pedir para ter como gestor o Pedro ou o João, ou então à da Rua do Ouro, onde terá como gestor o Mário. São todos gestores experimentados, maduros, discretos, que o tratarão como deve ser.

25 de novembro