A graça da vida diplomática é a sua incerteza. Para quem, como eu, acabou por ter 21 ministros dos Negócios Estrangeiros na sua carreira, viver em sete cidades estrangeiras, em diversos continentes, não pode assustar. O Brasil, uma das mais complexas - se bem que, aparentemente, simples - relações bilaterais de Portugal, saiu-me depois em rifa. Em boa hora! Aprendi, desde logo, que devia ser “obrigatório” para qualquer diplomata português ter um contacto com a realidade brasileira, para pôr fim a alguns mitos, diluir preconceitos e ajudar-nos a situar melhor no mundo. Quatro anos de Brasil, visitando 23 dos seus 27 Estados, fez-me perceber muitas coisas. A vida correu-me bem por lá, mas eu fiz bastante por isso.
Quando, quatro anos depois, aterrei em Paris, senti-me quase em casa. No final dos anos 60, eu chegara àquela cidade, saído à boleia de Lisboa, como um peregrino que chega a Meca. Depois, viciei-me e passei muitas mais vezes por lá. Regressar como embaixador seria, contudo, muito diferente, muito mais do que eu pensava. Claro que havia os restaurantes e as livrarias, mas as horas foram sempre muito contadas, nos anos em que, até à minha reforma, por ali fiquei. Trabalhei muito, assisti a tempos muito diversos, nem sempre bons, em especial para a imagem de Portugal no mundo. E, como em todo o lado, alimentei-me por ali da serenidades das noites, onde conversei imenso, li muito e, em especial, pensei.
Em 2013, tal como estava planeado desde há muito, regressei, definitivamente, a Portugal. Era a reforma? “Sort of”, como dizem os anglo-saxónicos. Não parei, desde então, um segundo. Houve empresas que quiseram passar a ouvir a minha opinião sobre as áreas internacionais dos seus negócios, universidades que me contrataram para dar aulas ou me convidaram para as aconselhar, jornais que me ofereceram colunas para eu escrever o que pensava. Fora dessa dimensão mais “séria”, que muito me agrada, divirto-me com o usufruto outros prazeres, como os livros, a escrita, a gastronomia e as viagens. Leio, leio muito, escrevo um blogue pela noite dentro, frequento tertúlias muito diversas. E, pelos dias, mas essencialmente pelas noites, estou com os amigos, com a família. Às vezes, perco alguns, dos bons, o que me deixa nostálgico, confesso. Mas tento olhar em frente, aproveitar, ao máximo, este país renovado, magnífico, sereno, que gargalha para as aves agoirentas, para os profissionais da inveja e do mal-dizer, que apetece irritar - e eu faço-o, com algum gosto. Uma terra que agora anda bastante mais feliz do que, ainda há pouco, parecia condenada a ser. Carpe diem!
(Depoimento)
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