segunda-feira, agosto 05, 2024

Sobrinho Simões


Trazia o livro "A Última Lição de Manuel Sobrinho Simões", de Luís Osório, na "saca dos livros de férias", uma ambiciosa molhada de volumes que sempre me acompanha os agostos. Ia conseguir ter tempo para lê-lo? Quebrei a dúvida começando exatamente por ele. Valeu bem a pena!

Manuel Sobrinho Simões, que conheci pessoalmente em Oslo, há 45 anos, e que tenho vindo a cruzar por aí nos últimos anos, é uma das mais fascinantes personalidades do Portugal dos tempos que vivemos. É um cientista, um médico, mas também um humanista, com uma relação muito forte com o país onde vive e sobre o qual, em permanência, reflete e se interroga. Sempre com um saudável e realista otimismo.

O livro reproduz uma longa conversa entre ele e o jornalista Luís Osório. Um diálogo equilibrado, em que o entrevistador teve o cuidado prévio de se preparar muito bem sobre a substância do mundo do entrevistado, colocando-se os dois no mesmo patamar de exigência, para um resultado à altura do desafio que ambos se impuseram. O pensamento de Manuel Sobrinho Simões é muito elaborado e rico, mas Luís Osório, com imensa inteligência e com a escrita soberba que sabemos ser a sua, consegue, sem facilitismos nem truques de divulgação simples, retirar do diálogo um resultado notável. Dali resulta um texto muito agradável de ler, de onde emerge uma intensa racionalidade crítica, sempre pontuada por dúvidas e incertezas. A força de Manuel Sobrinho Simões, ia a dizer, a sua superioridade, é a sua capacidade de pensar o mundo de uma forma empenhada, ao mesmo tempo complexa e simples. Estamos perante um intelectual que se auto-interroga em permanência, às vezes com assumidas fragilidades que o humanizam e o tornam bem próximo do cidadão comum que todos nós somos.

Sai-se deste livro muito mais rico, acreditem. Recomendo-o vivamente. Deixo um abraço a ambos os autores, pessoas por quem tenho estima pessoal e admiração, que é também de sincero agradecimento pelas boas horas de leitura que agora lhes fico a dever.

2 comentários:

manuel campos disse...


Como se imaginará fácilmente, não andamos (e continuaremos a andar) a caminho da Fundação Champalimaud quase desde a sua abertura só porque achamos o espaço agradável e o pessoal simpático e acolhedor.
Portanto Manuel Sobrinho Simões é uma referência para nós, a maior referência nacional no que a estas questões se refere.
E não é difícil ser a maior referência nacional quando se é considerado “o patologista mais influente do mundo” (ligação com sua licença):

https://portal-chsj.min-saude.pt/media/noticias/noticia/sobrinho-simoes-o-patologista-mais-influente-do-mundo-dois-medicos-do-chsj-nos-100-primeiros

Ninguém como ele explica de forma simples e directa o que, para quase toda a gente, é algo de tão catastrófico que prefere não saber nada.
Ora não é o caso cá por casa, queremos saber e sabemos o suficiente para dialogar com os médicos, saber fazer as perguntas possíveis dentro das nossas naturais limitações científicas e técnicas.
Criámos assim à nossa volta um ambiente menos vulgar, há amigos e conhecidos que, depois de ouvir os médicos de cada um (problemas não necessariamente deste tipo), nos telefone a pedir a opinião, que vale o que vale mas é de quem já viu e acompanhou muita coisa nos últimos 20 anos, no próprio caso, com os filhos, com os irmãos.

Manuel Sobrinho Simões conta-nos de forma simples o que é complexo, só quem percebeu tudo pode explicá-lo de modo que todos percebam.
Com os anos e o que vou vendo é para mim evidente que quando ele afirma “O que vejo mais são casos em que o médico exagerou. Disse que era maligno e não era” (Expresso, 20 de Março de 2024) ou “Não me digam que precisamos de mais médicos para os velhos, precisamos é de enfermeiros, fisioterapeutas e de candura” (Expresso, 24 de Março de 2024).
Grandes verdades, mas para isso é preciso tê-las vivido e saber-se no preciso momento que as estamos a viver, não fugindo cómoda e/ou egoisticamente aos factos que incomodam, meio caminho andado para que cada vez incomodem mais não resolvendo coisa nenhuma.

Luís Osório é também uma referência, o meu “entrevistador” favorito, aquele que está de tal modo ciente daquilo que fala que com 4 ou 5 palavras apenas leva o entrevistado para o caminho que ele quer dar à entrevista.
Há uns 2 meses atrás resolvi reler o livro de entrevistas que ele fez a várias personalidades quando dos 25 anos do 25 de Abril.
Chama-se o livro “25 portugueses”, é de Novembro de 1999 (Editorial Notícias), está agora aqui ao meu lado, na altura houve quem não mostrasse disponibilidade, houve quem recusasse, mas ficaram muitos e bons de que segue a lista por ordem alfabética:

Adriano Moreira, Alberto João Jardim, Álvaro Cunhal, Álvaro Siza Vieira, António Coutinho, Amália Rodrigues, Almeida Santos, António Guterres, António Mega Ferreira, António Ramalho Eanes, Belmiro de Azevedo, Diogo Freitas do Amaral, Eduardo Lourenço, Francisco Costa Gomes, Francisco Pinto Balsemão, Herman José, João Cutileiro, Jorge Sampaio, José Policarpo, José Saramago, Manoel de Oliveira, Mário Soares, Otelo Saraiva de Carvalho, Vasco Gonçalves, Victor Cunha Rego.

Essa releitura foi das leituras mais interessantes e enriquecedoras que eu pudesse imaginar, o que se leu há 25 anos tem pouco a ver com o que se está a ler hoje, tudo é diferente a começar por nós.
Com histórias pessoais e políticas todas aquelas pessoas “abriram a alma”.
Constatar onde estávamos e com quem estávamos nos 25 anos de Abril e comparar com onde estamos e com quem estamos nos 50 anos de Abril.
Sem nostalgias nem lamentações, nem anacronismos que não casam comigo, são tudo puras perdas de tempo.
Apenas constatar.
O mundo mudou tanto que o passado já nem é sequer um país estrangeiro, é mesmo um planeta distante.

Anónimo disse...

vizinhos colegas e amigos desde os 7-8 anos, o mesmo grupo de amigos no Porto ou melhor nas Antas. Apesar do seu percurso é igual ao que era há 60 anos. Sempre foi, e espero que seja por muito tempo, um tipo notável.

Tarde do dia de Consoada