sábado, agosto 31, 2024

"O Forno de Jales" (Vreia de Jales)



Já estou a imaginar o sobrolho carregado daqueles lisboetas que têm a mania que o Prior Velho, ou mesmo Vila Franca, já é no Norte do país. São os mesmos que calhou um dia irem ao Porto, ao casamento de uma prima, e que juraram para nunca mais, por se terem perdido no Nó de Francos, quando acharam que o Waze tinha pifado ao mandá-los sair por um lugar chamado Bessa Leite. Essa malta, ao ler aqui escrito "Vreia de Jales", deve ter tido um sobressalto de estranheza e concluído: este tipo anda por lugares étnicos bizarros e trá-los para aqui para armar à diversidade regional de quem se quer dar ares.

Pronto, eu explico! A Vreia de Jales é uma aldeia que fica numa pequena estrada a leste da A24. Essa estrada é a maneira mais "difícil" de ir de Vila Pouca de Aguiar para Vila Real. Mas vale muito a pena: a paisagem é magnífica, além de que lhes permite passar por Sanguinhedo (por que diabo quero eu passar por Sanguinhedo?, pensará alguém a quem nunca sequer passou pela cabeça ir tomar um café a Tourencinho) e chegar à capital transmontana por um caminho menos óbvio. Por isso, caro leitor, se faz parte da fauna dos que recusam caminhos menos óbvios, abstenha-se de continuar a ler e faça "zapping" para a telenovela ou para os crimes da CMTV.

Há vários anos que me tinham falado de existir um restaurante "para grupos" na Vreia de Jales. Por regra, desconfio imenso de restaurantes "para grupos". Nunca fui fã de manadas almoçantes, onde raramente se come bem e pode ter-se por horas o azar, nas longas mesas, de uma companhia insuportável. Há meses, disseram-me: o antigo restaurante, onde a prudência me levou a nunca ir, tinha fechado e foi agora criado outro, dirigido por um casal de excelentes cozinheiros (eu acho pedante escrever "chef") que vieram da estranja (muita Espanha e alguma Suíça), e que teria implantado por ali um novo "conceito". Ora eu também embirro com o conceito de "conceito". E, por semanas, fiquei de pé atrás.

Enfim, ontem, porque a curiosidade era muita, e para pôr a coisa em pratos e talheres limpos, decidi ir lá jantar. E, antecipo desde já o sentido deste texto, gostei bastante.

O João Pires e a Rita Gomes estão por ali, naquela aldeia, desde o final do ano passado. A sala, sem ser um deslumbre de decoração, é muito agradável e espaçosa, boa herança do anterior restaurante. O casal faz uma cozinha que alia alguma sofisticação das propostas à utilização inteligente e criativa dos produtos regionais, com preocupação do que é sazonal. A refeição é ritmada em seis momentos, que conseguem criar um menu degustação que assinalei não ter tido quebras de nível. Não vou aqui falar dos croquetes, da bola de sardinha, do interessante bacalhau, da fralda de vitela, com um molho magnífico, da maronesa no ponto certo. E de outras coisas boas, explicadas bem pelo João. Ou mesmo da estranha, no bom sentido, rabanada que veio como sobremesa (e que, a meu ver, poderia sobreviver bem sem o gelado), feita num pão pouco usual. Tudo vinha embrulhado em moldes criativos de apresentação que, em alguns casos, me atrevo a dizer que podem evoluir esteticamente. Mas o que é importante destacar, porque o saldo de uma refeição é isso mesmo, é que tudo o que nos chegou à mesa, sem exceção, estava muito bom - e eu sou um conhecido chato nesta coisa de restaurantes, como gastrófilo mas não gastrónomo que sou. A lista de vinhos, muito transmontana e curiosamente menos duriense, tinha, a preços honestíssimos, coisas muito boas e pouco conhecidas, como, por exemplo, vários vinhos de Arcossó (Ah! Pois é! Também não sabem onde é Arcossó, terra da minha bisavó, de onde estão a sair vinhos magníficos?). 

Vou parar por aqui. Não lhes digo os horários do "O Forno de Jales" porque o restaurante não tem "sessões contínuas": não abre todos os dias e a todas as horas. Liguem para lá pelo 916 301 886 e, se não atenderem, deixem recado, porque eles contactam de volta, como aconteceu comigo. Última nota: sem vinhos, o menu degustação custa € 35,00 por pessoa. Isso mesmo!

Pronto! Quem ousar passar a norte do Prior Velho, já sabe. Meta o Waze e vá almoçar ou jantar à Vreia de Jales. É já ali!

12 comentários:

Lúcio Ferro disse...

Bem, eu sou homem para ir além do Prior Velho. Lisboeta de Gema sim, trinta anos de avenidas novas, Alfacinha, e por tal venturoso. Ao Porto fui e já lá habitei, nos antigamentes, moço franzino vindo do Ultramar, bem como em Coimbra, pelos Abrantes e nas redondezas de Viseu. Mas, no Minho é que se comia bem. A Mariana em Afife. O Chico do Bacalhau em Caminha. Isso sim. Barcelos. Eram outros tempos. Rojões à minhota na Albergaria, casa fina em Caminha, ou vitela assada na típica Bagoeira de Barcelos. E em Famalicão? Ai, o esparregado, as batatinhas assadas no forno de lenha, upa, upa. É verdade que, actualmente, gosto disto daqui da Avenida de Roma, tem tudo o que eu preciso e quando estou para aí virado também sei cozinhar um bacalhau à buda ou um arroz de marisco à carlos lopes. Ainda assim, esta sua prosa convenceu-me; como tenho de dar gás ao velho 156 e, de certo modo, será giro agradar à minha patroa, quem sabe não vou a Freia de Jales, já que está tão altamente recomendada o opíparo refeiçoar. Aproveito, ela fica feliz, comemos bem e sigo de visita a Chaves, onde nunca fui, antes do regresso, pelo interior, por Viseu à capital. :)

Anónimo disse...

Também não vou lá com "chef" nem "conceito".
Agora qualquer cozinheiro é chef como qualquer chefe de secção é director, conheci um director que já foi do Pessoal, passou a ser das Relações Humanas e agora deve ser de outra coisa qualquer que chefiava três pessoas, uma administrativa, um contínuo para os recados e ... ele próprio.
Quando se apresentou como tal não foi fácil manter-me impassível.
Por aqui neste "algures", onde toda a gente se conhece desde sempre, nós com mais razão que outros porque almoçamos fora todos os dias que cá estamos (deve dar uns 150 almoços por ano num raio de 50 kms) é cómico ouvir apelidar de "chef" toda a gente que calha, com uns "agora o ... é chef no restaurante tal" onde nós estivemos ontem ou na semana passada.


netus disse...

Bom dia
Obrigado pela informação.
Conheci essa estrada em 2019, por ocasião de uma belíssima e longa "volta", com poisos no Vidago Palace, nas Pedras Salgadas, Vila Real e Chaves.
António R. Cabral

manuel campos disse...

Esta das 3.04 também é minha.
Mas desta tenho desculpa, manhosa mas desculpa, pois fui interrompido várias vezes por mensagens, logo eu que escrevo de rajada, falhou-me outra vez o modo de apresentação ao digno público, há dias infelizes.
Rien n'est simple et tout se complique (Sempé).

Francisco de Sousa Rodrigues disse...

Pode parecer caricatura, mas há malta que só conhece mesmo o caminho para o Alentejo, do Algarve e do Aeroporto.
Ai, chefs, conceitos e exegeses de pratos que parvoeira sem eira nem beira.

Pela categoria da comida desta referência que nos trás até lá chegaria dispensando o Google Maps.

Luís Lavoura disse...

Vreia de Jales é uma terra bem conhecida, pois dantes havia lá umas minas de ouro bastante produtivas.

Luís Lavoura disse...

Numa refeição, o Francisco enfardou "croquetes, bola de sardinha, bacalhau, fralda de vitela, e [vitela] maronesa"? Bolas, como consegue aguentar tanta carne e tanto peixe? Isso não é comer de mais, na sua idade, Francisco?

Luís Lavoura disse...

o menu degustação custa € 35,00 por pessoa. Isso mesmo!

Nunca na minha já longa vida, que me recorde, paguei 35 euros por uma refeição. Para mim, 20 euros já é de mais.

manuel campos disse...

Falando de restaurantes.
Desapareceu toda a gente desde ontem para hoje aqui nas redondezas, ou se acabaram as férias ou se acabou o dinheiro.
Não almoçando nunca fora aos sábados e domingos (ainda me sobram muitos dias do ano para o fazer), fui buscar o famoso “arroz de pato” ali a 30 kms, uma dose enorme por um preço simbólico para mim.
Aquilo é giro, tem ao lado um parque de estacionamento próprio ao sol e sempre cheio, tem a rua onde está localizado ao sol e sempre cheia, tem ao virar da esquina uma avenida cheia de árvores frondosas e boas sombras quase vazia.
Como fazer aqueles 100 metros a pé para cada lado (20 ou 30 fariam sempre, que não dá para meter os carros na sala) parece ser extremamente cansativo para muita gente, no Verão é vê-los à saída a bufar com o ar condicionado no máximo e o volante e os bancos a arder, enquanto eu me dirijo descansadamente ao meu carro que está todo à sombra e basta o ar condicionado no mínimo para arejar.
Tenho assim evitado dizer aos que não sabem do “truque” qual é que ele é, pois os que sabem do “truque” e continuam a insistir na asneira que continuem, eu e mais uns poucos agradecemos.

manuel campos disse...

Para se chegar a qualquer sítio que me seja desconhecido costumo utilizar um método muito antigo, o “ajpshq”.
Assim bastará localizar um local próximo e, chegado lá, usar este sistema ainda que, como se verá adiante, tenha os seus riscos mas em última análise todos os têm.
O “ajpshq” não é mais que o velhinho “abre a janela e pergunta se houver a quem”, o risco é exactamente esta 2ª parte, pode não haver a quem ou o único quem que houver não fazer a mais pequena ideia.

Francisco Seixas da Costa disse...

Manuel Campos. Não corra riscos. Há dois critérios quase infalíveis para escolher uma boa mesa, numa localidade portuguesa sobre a qual não há referências: perguntar qual o melhor restaurante local a um tipo gordo (é essencial que seja gordo!) e com ar abastado (tem também de ser pessoa "de posses") e, cumulativamente, inquirir "onde costuma almoçar o senhor presidente da Câmara". A coincidência destas duas informações tem um grau de rigor superior ao Guia Michelin.

manuel campos disse...

Caro Embaixador Seixas da Costa
O saber de experiência feito, vindo de quem sempre nos deu sólidas provas tanto da vasta experiência como do decorrente saber, vale muito pois poucos guias alguma vez nos poderiam garantir essa independência, por mais respeitáveis que sejam não deixam por vezes de andar ali a “empatar” até terem mesmo que “abençoar” o restaurante A ou o restaurante B.
A procura de indicações junto de algumas pessoas pelo caminho vale bem o tempo que se “perder” a fazê-lo, é tempo que se “ganha” na solução encontrada através dessa pesquisa.
Admito que procure gente com ar suficientemente abastado para comer em restaurantes mais vezes que o esporádico festejar dos anos de alguém (com esse alguém a pagar).
Mas o cuidado (fundamental, vejo-o agora) de acumular com o de gordo tinha-me passado ao lado até hoje.
E depois a dica do local preferido do presidente da Câmara é uma mais valia absoluta, é como ter cinto e suspensórios.
Esta última acarreta no entanto a necessidade absoluta de agradecermos e arrancarmos, pois se o interlocutor começar a tecer-lhe elogios, pode ser que nos safemos, mas se começa a resposta por algo como “esse grandessíssimo…” então é melhor pormo-nos a milhas e procurarmos outra pessoa.
Mais uma vez agradeço os seus conselhos.

Já agora

Haverá quem venha responder que "isso agora não interessa nada". Mas seria importante saber: que avaliação faziam as autoridades s...