É muito interessante a composição deste novo governo. A meu ver, António Costa deu quatro sinais básicos.
O primeiro, com a promoção de Pedro Siza Vieira a seu nº 2, foi mostrar um governo “business friendly”, trazendo a economia e o crescimento para o centro das suas preocupações. Siza Vieira tem uma boa imagem no mundo empresarial. Se a isto somarmos a recusa frontal em abrir a porta à discussão da legislação laboral, como o Bloco de Esquerda propunha, há aqui um evidente sinal dado à iniciativa privada.
O segundo é o da afirmação de força perante as corporações. Médicos e enfermeiros devem ter ficado tão “contentes” como os professores, ao saberem que voltam a ter à sua frente Marta Temido e Tiago Brandão Rodrigues, dois ministros algo desgastados, mas que Costa insistiu em “proteger”. A continuidade de Eduardo Cabrita vai no mesmo sentido. É, a meu ver, um forte sinal de que Costa “vai à luta”.
Para proteger, mas desta vez o governo, Costa insistiu na manutenção de Francisca Van Dunen na Justiça. A contestação à ministra é escassa, ela própria é oriunda do Ministério Público e a sua margem de interlocução com o setor continua a ser muito importante, em tempos de contestação corporativa mas, igualmente, de processos “quentes” que encherão as capas do Correio da Manhã nos tempos que aí vêm.
O terceiro é a decisão de retirar ao Ministério das Finanças a Administração Pública, lugar onde, ciclicamente, esta temática vai parar. Mas, talvez mais importante do que isso, é a escolha de Alexandra Leitão, a cara vitoriosa da questão dos “contratos de associação”, para chefiar esse novo ministério. Ela é alguém que, com indiscutível competência, aí lutou pelo setor público e que agora terá a seu cargo as relações com os sindicatos desse setor. Mário Nogueira já deve estar a explicar a Ana Avoila com o que pode contar. Esperam-se tempos interessantes, mas nada fáceis, neste setor.
O quarto é uma clara nota de renovação, que seguramente a lista de secretários de Estado acentuará. Neste movimento, Costa perde três excelentes ministros: Vieira da Silva, Ana Paula Vitorino e Capoulas Santos, mas abre caminho ao futuro. É assim que são promovidas “rising stars”, como Mariana Vieira da Silva, que sobe a ministra de Estado, da já referida Alexandra Leitão, bem como da nova ministra do Trabalho Ana Mendes Godinho. A larga distância das outras formações partidárias, o Partido Socialista, pela mão de António Costa, está a abrir a porta a uma nova geração.
Uma nota final. É uma excelente notícia a permanência no governo, agora como ministros de Estado, de Mário Centeno e de Augusto Santos Silva, duas figuras que, cada um no seu setor, tiveram um “percurso limpo” e de imensa qualidade nesta difícil prova de obstáculos que foram estes últimos quatro anos.
Santos Silva prescinde do lugar de nº 2, o que revela o grande sentido de Estado que sempre tem sido o seu, preparando-se para a importante tarefa da presidência portuguesa da União Europeia em 2021. Está por saber se, com a ascensão de Siza Vieira, o MNE virá a perder a tutela da AICEP.
Centeno, como já referido, aceitou ficar sem a Administração Pública, mas vai ficar na memória histórica da anterior legislatura como a principal “estrela” do processo de credibilização do país na ordem internacional.
Era expectável a continuação dos restantes ministros. Desconheço as novas caras, salvo André Caldas, que pode ser uma boa surpresa.
António Costa fez agora um governo de combate. E só se fazem governos desta natureza quando se pressente que a luta vem aí. Acho que Marcelo Rebelo de Sousa, ao não ter mostrado, de forma deliberada, o menor sorriso nas imagens televisivas a anteceder o encontro ao final da tarde de hoje com Costa, ao contrário da cara confiante deste último, revelou que já percebeu tudo.
3 comentários:
Parece-me um governo para cooperar com Rio num regresso ao antes de antes da Geringonça. Obterá naturalmente os mesmos resultados. Ao fim de dois anos entrará em dificuldades e então ou caindo como de costume ou a perícia de Costa consegue eleições antecipadas com vantagens para o PS.
A MT e o TBR 'desgastados'? Como, se eles não têm nem nunca tiveram qualquer espessura? Claro, não sãos os únicos. A tia da Lapa faz-lhes boa companhia.
Boa análise da situação política , no dia de hoje . Porque o futuro é certamente incerto , e poderá resvalar para a direita ou para a esquerda . Mas para o momento actual parece-me a decisão que agradará a muitos .
Enviar um comentário