quarta-feira, maio 04, 2022

Quase NATO

Em termos formais, a Rússia acha que adesão da Finlândia e da Suécia à NATO agrava a contabilidade em seu desfavor. Porém, na realidade, ambos os países há muito que são “like-minded” com a filosofia NATO. Ou melhor: serão mesmo mais do que alguns dos atuais membros…

Mélenchon

Jean-Luc Mélenchon não pode, em rigor, ser qualificado como um político de extrema-esquerda, não obstante parte desta nele se rever. Contudo, ao ler o que propõe sobre a Europa, percebe-se que os socialistas moderados franceses possam ter uma forte razão para o não apoiarem.

Regredir

Não se sabe se o “leak” saído dos bastidores Supremo Tribunal dos EUA, que indicia uma possível reversão da lei do aborto, irá corresponder ao sentido da decisão final. A assim acontecer, vamos ter na rua as “duas Américas”. Vai ser interessante de ver.

Elogio do silêncio

Há muito que a Rússia dizia que o ocidente a queria enfraquecer e evitar o seu ressurgimento como potência. Os EUA sempre desmentiram essa intenção. Por voz oficial, agora justificado pelo ataque à Ucrânia, esse objetivo foi confirmado. Não sei se é uma boa ideia dizê-lo.

“For the record”

 

terça-feira, maio 03, 2022

Nome de Guerra


A ideia é genial! Com data de 16 de abril, nos 80 anos do João Paulo Guerra, a Clara assumiu a direção do “Tributo”, lançando um belo jornal, com um número único, com 20 páginas, recheado de fotografias e textos, de familiares e amigos, entre os quais me conto. Trata-se de uma edição com uma tiragem limitada a … 80 exemplares! De um dos quais sou, a partir de hoje, o feliz possuidor. Ser amigo do João é não só um privilégio com nos oferece estes privilégios.

Parabéns, uma vez mais, João Paulo Guerra - John Paul War quando calha. E que bela ideia, Clara!

Isabel Mota

Há precisamente cinco anos, no dia 3 de maio de 2017, escrevi isto por aqui:

“Isabel Mota assume hoje as funções de presidente da Fundação Calouste Gulbenkian. É a primeira mulher à frente dos destinos da Gulbenkian e isso não pode deixar de ser especialmente assinalado. 

Conheço Isabel Mota há muitos anos, desde que foi trabalhar para a Representação Permanente em Bruxelas, pouco após a nossa entrada para as então Comunidades Europeias, em 1986, ao tempo em que eu próprio integrava a estrutura central de coordenação da nossa integração europeia, em Lisboa. Depois, Isabel Mota foi secretária de Estado do Planeamento durante vários anos, durante os quais adquiriu uma vasta experiência nos dossiês comunitários.

Com o fim do "cavaquismo" (a Isabel não gosta muito da expressão...), Isabel Mota passou a assessorar o então líder do PSD, Marcelo Rebelo de Sousa, nas questões europeias. Eu era então o secretário de Estado dessa área. Um dia, no gabinete do então primeiro-ministro António Guterres, este combinou com Marcelo Rebelo de Sousa, na nossa presença, que seria criada uma "miniestrutura de relação permanente" entre o governo e o PSD, que "monitorizava o acompanhamento da política europeia passo-a-passo" (para utilizar as expressões usadas pelo agora presidente numa entrevista ao "Expresso", em dezembro de 2015). Essa "miniestrutura" era a Isabel e eu, que passámos a almoçar e a encontrarmo-nos com alguma regularidade. 

Embora com algumas "nuances", as posições dos dois principais partidos tinham largas similitudes no plano europeu e, muito em especial, ambas eram bem distintas, à direita, das do então muito eurocético CDS e, à esquerda, das do PCP (o Bloco estava ainda para nascer). Ficou claro que o PSD não teria um "droit de regard" sobre as posições do governo socialista mas, nas principais questões, este procuraria consensualizar com ele, na medida do possível, aquilo que viesse a apresentar em Bruxelas. E assim se fez, creio que com proveito para o país. Com a "oposicionista" Isabel Mota, que me recorde, só tive uma troca pública de argumentos, aliás bem civilizada, no "Expresso", em torno da questão da regionalização, tema que ela combatia e em que eu defendia a posição governamental, com toda a convicção pessoal que consegui mobilizar na altura para o assunto - e que, confesso, não era imensa... Às vezes, ainda nos rimos com essa polémica.

Os nossos encontros eram sempre com muito "boa onda", porque Isabel Mota é uma pessoa extremamente agradável e divertida. Julgo que conseguimos levar a bom porto aquilo de que os dois líderes políticos nos encarregaram. Anos mais tarde, em 2003, quando eu estava como embaixador na OSCE em Viena, viria a encontrar de novo Isabel Mota numa "task force" que o governo de Durão Barroso criou para acompanhar as negociações do malogrado Tratado Constitucional europeu.

Nos últimos anos, tendo eu passado a exercer as funções de presidente do Conselho Consultivo para a Delegação de Paris da Fundação, regressámos a um contacto mais regular. Sendo Isabel Mota a administradora responsável por aquela área, revelo aqui que passei a tratá-la por "chefe". Agora com a sua ascensão à presidência, vou ter de descobrir um qualificativo que possa representar um "upgrade" a esse título!

Só posso desejar à minha querida amiga Isabel Mota os maiores sucessos na presidência dessa notável instituição "do bem" que tem o nome de Fundação Calouste Gulbenkian.”

Isabel Mota abandona hoje a presidência da Gulbenkian. Foi um período muito exigente - quem sabe do que falo sabe por que o digo - na vida da instituição, com decisões complexas, que se traduziram em importantes mudanças para o futuro da fundação. Foi com imensa coragem e determinação que Isabel Mota conduziu a equipa que enfrentou esse tempo, levando a sua missão a muito bom porto. Deixo-lhe aqui a minha admiração pelo trabalho executado e o meu muito obrigado pela simpatia com que, na minha modesta contribuição para a Gulbenkian, sempre pude contar da sua parte.

A partir de hoje, a Fundação Calouste Gulbenkian passa a ser chefiada por António Feijó, que já fazia parte da administração presidida por Isabel Mota. Trabalhámos juntos, durante três anos, no Conselho Geral Independente da RTP. É uma sólida garantia de que a Gulbenkian, que é um dos ativos culturais mais importantes do país, fica em excelentes mãos.

Ucrânia - e a negociação?

 


Pode ver aqui.

segunda-feira, maio 02, 2022

A Mesa Dois do Procópio


"Nos anos 90, que a Alice me pediu para recordar, o Procópio transpirou o Portugal que então mudava.

A sua Mesa Dois começou por ser a janela nocturna para o “phasing-out” político que se ia adivinhando pelo país, sublinhado nas crónicas do Nuno Brederode, posto a cores nos desenhos do António. Foi a sede constante de uma crítica irónica, arquivo oral do anedotário cáustico que sempre acompanha os tempos moribundos. Para alguns, foi uma trincheira de um exílio político sem sair de casa, sofrido entre dois JB’s, de conspirações mornas com a imprensa e do alimentar de amanhãs que, afinal, se iram cantaram mansamente, de gravata e fato escuro, numa tarde cálida na Ajuda.

Chegada essa hora do socialismo vangélico, parte da Dois foi cooptada, com naturalidade geracional, para o novo poder e suas adjacências. Outra parte, não despicienda, seguiu, com idêntica naturalidade, o sampaísmo até Belém, na dobradinha que a esquerda conseguiu ao virar do quinquénio, dando corpo a um sonho antigo.

Na segunda metade da década, a Dois continuou um fervilhar de ironia e de heterodoxia. Se o novo poder contava ter nela uma complacente cumplicidade, enganou-se redondamente. A Dois confirmou o seu tropismo anarca: “Hay gobierno ? Soy contra!”. As orelhas do guterrismo saíam bem vermelhas das noites procopianas, com alguns dos presentes a terem de aguentar a crítica sonora, a assistirem, impotentes, à enxurrada de pancadaria num governo que tinham como seu. Nada que o “fair-play” não tenha ajudado a suportar, com grande garbo, diga-se desde já.

A história da Mesa Dois não esgotou, nesse tempo, a vida no Procópio. Aliás, parte da Mesa esteve-se sempre muito nas tintas para a política, mandava uns bitaites, contava umas historietas e limitava-se a beber copos, intervalados por aquela espécie de esferovite que a Alice sempre fez passar por pipocas. Foi um tempo em que, por selecção natural, foram abandonando o Procópio alguns espécimens mais chatos, quase sempre por motivação etílica. O bar tornou-se sereno, talvez até sereno demais.

Ao final das tardes, canastrões com ar clandestino e empresarial faziam a folha a secretárias à cata de promoção, sempre recolhidos na mesa à esquerda de quem entra. Em algumas noites, grupos heteróclitos de duvidosa extracção chegavam em bandos, sem pés de veludo, e pediam duas Cocas para oito. Ao bar e à maldita televisão colavam-se alguns pretensos machões, que se entretinham a rodar a sala com o olhar concupiscente, consumindo uma mísera imperial. Nas mesas dos cantos, arrulhavam casais, por horas perdidas, à volta de duas garrafas de Pedras. Os tempos não eram fáceis para a máquina registadora.

No balcão e no apoio gentil às mesas, perdeu-se nesse período o estimável Juvenal, para cujo Pedro V se continua a rumar nos Agostos, quando a Alice empurra os fiéis para a vilegiatura forçada. Passou-se depois por aquela que ficou conhecida como a fase Manpower de recrutamento, com o “Bósnio” e o “Croata” como expoentes desse auge de flexibilidade do mercado de trabalho. Até que, em boa hora, chegou o Luís, emigrado do Ertilas, sossegando para sempre a sala e as hostes com o seu sorriso, simpatia e grande profissionalismo.

Mas, afinal, perguntar-se-á, o que vem a ser essa Mesa Dois de que tanto se fala? A Dois, leitor amigo, é o lugar geométrico do Procópio, identificada por um papelinho que diz “Reservado”, para onde ciclicamente conflui uma fauna de mescla pouco provável, que junta juristas com publicitários, artistas com diplomatas, gestores com cineastas, médicos com doentes da bola, jornalistas com académicos, para além doutras actividades que a prudência aconselharia a não citar, como é o caso dos políticos e dos engenheiros.

A Dois tem uma centralidade lateral (não há contradição nenhuma) que lhe confere a vantagem de uma confortável visão estratégica, que se alarga da porta de entrada ao “primeiro andar” vizinho, passando por todo o bar, dando a melhor possibilidade teórica de “catch the eye” do Luís, para o “refill” dos copos. Os seus bancos têm protuberâncias que seguem estritos critérios ortopédicos, internacionalmente recomendados para a zona sublombar. Sem falha, são mandados reformar pela Alice num ano bissexto sorteado cada vinténio, e acomodam, sobre aquele veludo acetinado, escolhido com esmero nos saldos da Feira de Carcavelos, não mais que cinco clientes. Para além deste número, o convívio cumulativo dos supranumerários obriga a um inevitável empernanço, que a prática demonstra ter já hoje escasso valor como estímulo lúbrico na comunidade de frequentadores.

A partir das noites de glória dos fins-de-semana desse tempo dos anos 90, o espaço vital da Dois foi-se alargando, os banquinhos amontoavam-se, o “primeiro andar” adjacente era às vezes tomado, a mesa do “tête-à-tête” do piano frequentemente anexada. Foi o tempo em que apareceram pela Dois belezas tropicais a alegrar o ambiente e o Jójó, por aí estiveram belas amigas de conhecidos que, tragicamente, desapareceram com a rapidez com que arribaram. Ah! e havia ainda cinema mudo, de que hoje resta o écran, não se sabe bem para quê.

Também por essa época, eram distribuídos com regularidade, na festa estival, os famosos Prémios Procópio, sob critérios de justiça que, pelo menos num caso, o autor destas linhas não tem razões para pôr em causa. Sabe-se hoje que malévolas reticências à democraticidade do júri que atribuía tais galardões eram completamente infundadas, dado que a Alice cuidava em seguir à risca um modelo há muito consagrado nas instituições do Burundi, recomendado por uma embaixadora que com ela toma chá.

Com a década no fim, a Mesa Dois, e nós com ela, ficou mais velha, talvez um pouco mais sábia e mais serena. Mas ficou-lhe, para sempre, o culto da ironia, da amizade, da solidariedade. Hoje, a Dois é uma ilha grisalha num Procópio que parece estar recuperado para a juventude, para a conversa alta, para a alegria saudável das noites. Até a Sedonalice anda mais contente, não é?"

(O bar Procópio faz agora 50 anos. Em 2007, foi editado um livro em que, com textos e imagens, se tentou fazer a história do Procópio. Para ele, houve colaborações da Alice Pinto Coelho, do André Jordan, do António Antunes, do Aventino Teixeira, do Chico Caruso, do José Fonseca e Costa, do Raul Solnado e um texto meu, que a Alice então me pediu que escrevesse, em especial sobre aquilo que a Mesa Dois representou na vida do Procópio na década de 90. Reproduzi aqui esse texto, que já tem mais de quinze anos. Se quiserem comprar o livro, acho que ainda há lá pelo Procópio alguns exemplares à venda.)

domingo, maio 01, 2022

Schröder e Portugal


Gerhard Schröder é, nos dias que correm, uma das figuras mais controversas da Alemanha. Administrador da Nord Stream AG, da Rosneft e da Gazprom, é visto como um “homem de Putin”, o que, no atual contexto, é, porventura, a “recomendação” menos recomendável.

Schröder foi líder dos social-democratas alemães e primeiro-ministro entre 1998 e 2005, numa coligação entre o SPD e os Verdes, então dirigidos por Joschka Fischer, que derrotou a CDU de Helmuth Köhl.

Na memória económica europeia mais liberal, Schröder é creditado como tendo sido responsável pela introdução de importantes reformas, que, para muitos, terão contribuído para um ciclo de prosperidade económica do seu país. Para a esquerda dos social-democratas alemães, porém, o tempo de Schröder é visto como o de uma forte descaraterização ideológica do SPD, um pouco ao jeito daquilo que Tony Blair fez com o “Labour” britânico.

As eleições legislativas de setembro de 1998 deram a maioria absoluta à coligação SPD-Verdes. O novo governo tomou posse em outubro e Schröder, como novo primeiro-ministro, veio a Lisboa, logo no início de novembro, visitar o seu homólogo, António Guterres, num périplo por todos os parceiros.

O principal dossiê europeu de Portugal era, à época, a negociação da programação financeira plurianual da União, a chamada “Agenda 2000”, que deveria passar a vigorar entre 2000 e 2006.

Desde há meses que me competia andar num incessante “shuttle” pelos vários Estados europeus, tentando “vender” a nossa perspetiva sobre a repartição de fundos. Como a Alemanha iria ter a presidência da União no primeiro-semestre de 1999, competindo-lhe então fechar a “Agenda 2000”, ela era, naturalmente, um dos nossos principais interlocutores.

Uma semana antes de Schröder visitar Guterres, eu tinha estado em Bona (é apenas no primeiro semestre de 1999 que a capital alemã se muda definitivamente para Berlim), chefiando uma delegação técnica. Os temas agro-alimentares eram então uma nossa importante prioridade. Já esqueci o que então “sabia” de trigo duro e de quotas de leite…

Schröder jantou com Guterres em S. Bento. Conheciam-se menos bem. Só trazia pessoas do seu gabinete, nenhum ministro ou vice-ministro.

Guterres, ao lado de quem eu estava sentado no jantar, disse-lhe ter sido informado por mim de que havia muito boas perspetivas de as pretensões portuguesas, no quadro das negociações da “Agenda 2000”, estarem a ser bem acolhidas pelo novo governo alemão. Os contactos que eu tinha tido em Bona iam nesse sentido.

Vimos Schröder ficar com um fácies fechado e, voltando-se para mim, inquirou:

- Falou com quem, em Bona?

Disse-lhe que tinha reunido no ministério dos Negócios Estrangeiros, com uma delegação de vários departamentos alemães. 

- E quem é que chefiava a delegação alemã?

A cena estava a ser algo surrealista! Expliquei que tinha sido o vice-ministro dos Negócios Estrangeiros, Hans Von Ploetz.

Schröder voltou-se então para a sua delegação e, em alemão, em voz alta, pergunta: “Quem é esse Von Ploetz?”. De um extremo do seu lado da mesa saltou alguém para explicar, já em voz um pouco mais baixa, ao recém-empossado chanceler, que se tratava de um dos seus dois vice-ministros dos Negócios Estrangeiros, um diplomata de carreira. 

Guterres olhou-me com um discreto sorriso. Eu também estava divertido, mas mantinha-me impassível, a observar a cena.

O chanceler olhou para mim, através da mesa, e disse: “Quando é que pode voltar a Bonn? Este assunto tem de ser visto na chancelaria federal, não no AA” (abreviatura de Auswärtiges Amt, nome do MNE alemão).

(Note-se que a diplomacia alemã era dirigida pelo líder do seu parceiro de coligação, os Verdes, Joschka Fischer. Schröder tinha colocado “ao lado” de Fischer, como outro vice-ministro, um seu homem de confiança, Günter Verheugen. Semanas depois de entrar em funções, Verheugen, que eu conhecia de outras circunstâncias, tinha-me confidenciado que as suas relações com Fischer não eram as melhores. Dois anos mais tarde, Schröder nomeá-lo-ia comissário europeu.)

Olhei de viés para Guterres, que continuava a sorrir beatificamente, e respondi a Schröder, arriscando uma graça: “Até posso ir hoje à noite no seu avião, se tiver lugar para mim…”

Schröder deu uma risada e disse: “Não! Não é preciso! Marque depois uma data com o meu conselheiro europeu”, apontando para um tipo gordo e pesado, que viria a ser uma das “chaves” do nosso (por todos reconhecido) sucesso no compromisso final em Berlim, em março de 1999. Infelizmente, não me recordo agora do seu nome.

Dias depois, lá fui de novo a Bona. Com o meu novo interlocutor, fizemos uma revisão criteriosa de tudo o que havia sido acordado na reunião anterior. Ele disse-me que Schröder lhe havia recomendado que devia “ser tão simpático quanto possível, para tentar resolver o ‘problema português’ “. E foi-o.

No caminho de carro entre a chancelaria federal e a nossa embaixada, onde eu iria depois ter de explicar a um grupo de jornalistas portugueses a razão de duas idas a Bona em tão curto prazo, o meu telemóvel tocou. Era Von Ploetz: “Já sei que estiveste na chancelaria. Houve alguma novidade?”

Disse-lhe que não, mas percebi que ele estava “no escuro”. Naturalmente, evitei dizer-lhe que Schröder, em Lisboa, não sabia bem quem ele era. Para seu percetível contentamento, disse-lhe que ficara com a sensação de que o gabinete do primeiro-ministro me havia confirmado, no essencial, aquilo que, dias antes, ele combinara comigo.

Devo dizer que, nesse momento, senti uma satisfação interior: afinal, os alemães, com toda a sua fama de eficácia, ainda eram mais descoordenados do que nós.

Anos mais tarde, vim a cruzar Hans Von Ploetz, que entretanto fez uma bela carreira como diplomata, julgo que numa conferência em Baku, no Azerbaijão. Não resisti a relembrar-lhe esse episódio, de que ele se lembrava.

Schröder acaba de sofrer, há horas, pela boca do novo ministro alemão das Finanças, a ameaça de lhe cortarem os privilégios que ainda terá como antigo chanceler, tal a fúria oficial que está a cair sobre a sua cabeça, em especial depois de uma entrevista, um tanto arrogante, que deu ao “The New York Times”. Fala-se também de poder ser expulso do SPD.

Para o que aqui me importa, apenas recordo que Schröder se portou impecavelmente com Portugal, durante todo o tempo que pude testemunhar - da “Agenda 2000” às negociações institucionais europeias. O resto é lá com os alemães.

sábado, abril 30, 2022

Sunitas

O mundo sunita vive, de há muito, com duas linhas conflituais, tituladas pela Turquia e pela Arábia Saudita, com o caso Khashoggi de permeio. Erdogan, ao ir hoje a Riade, abre uma porta de diálogo. Lembramos que há ainda um “terceiro homem” interessado neste encontro: Israel.

“Procópio” - 50 anos


No dia 5 de maio, o bar “Procópio” faz 50 anos. (Já agora: Marx também fazia anos a 5 de maio.) Lá estaremos a comemorar. Um beijo muito amigo à “Sedonalice” (Pinto Coelho), alma da casa, agora com a Maria João e a Sofia ao leme da nau. E também, porque é de justiça mínima fazê-lo, um abraço ao Juvenal e ao Luís, grandes pilares destas cinco décadas. E um imenso “salut” à memória do Nuno (Brederode Santos), glória eterna da Mesa Dois, lugar onde mudámos o mundo - ou, se não mudámos, alguma coisa fizemos por isso, entre copos, gargalhadas e amizade.

Leiam aqui, para saber mais dessa catedral da conversa.

O tempo e a guerra

Quer a Rússia quer a Ucrânia, na sua relutância recente em avançar para um compromisso, estão a avaliar que o tempo corre em seu favor. Uma das partes está enganada (e, por ora, é difícil saber qual delas é), mas só o saberá no fim e, em qualquer caso, com um custo forte.

quinta-feira, abril 28, 2022

“A Arte da Guerra”


Ucrânia, França e Afeganistão - os três temas deste podcast semanal do “Jornal Económico”, uma conversa com o jornalista António Freitas de Sousa.

Pode ver clicando aqui.

Segurança

 


quarta-feira, abril 27, 2022

Pois é!

Em dias de muito trabalho, nem tempo há para atualizar este blogue. É a vida!

terça-feira, abril 26, 2022

Ucrânia


Por incompatibilidade de agenda, não vou poder participar neste debate. Aconselho-o vivamente a todos, dado o nível dos oradores.

segunda-feira, abril 25, 2022

Eurocensura


O 25 de Abril, que hoje e sempre comemorarei com júbilo, fez-se para que nunca ninguém mais nos dissesse o que podíamos ou não dizer, ver ou ler - sejam elas verdades, mentiras ou histórias da Carochinha. Só nos faltava agora ter a Censura europeia! Esta decisão é uma vergonha!

Acordar do 25 de Abril

 


domingo, abril 24, 2022

Democracias maduras

Ainda por aí o pessoal a contar as décimas de Macron e Le Pen e não vejo ninguém falar da reeleição de Nicolás Maduro, por serena unanimidade dos mais de dois mil delegados, na Venezuela. É o falas!

Isso é que era!

Nunca ninguém se lembrou de criar o Movimento das Forças Amadas…

E o 25 de Abril? Viva!


A propósito! Ontem foram as eleições presidenciais francesas, mas hoje, caramba!, é o 25 de Abril. Que viva!

Um nome

Costuma dizer-se que na primeira volta das eleições presidenciais francesas se escolhe e, na segunda volta, é eliminado um candidato. Marine Le Pen foi afastada, é verdade, e quase só se fala disso. Mas, já agora, vale a pena lembrar o nome da pessoa que ganhou: Emmanuel Macron.

2027


No final de 1999, um rumor correu nos corredores de Bruxelas: os conservadores austríacos preparavam-se para constituir governo com um partido de extrema-direita.

Por cá, pela península ibérica, o tema parecia bizarro. Havia a ideia de que, talvez por terem tido ditaduras recentes, Portugal e Espanha estavam imunes a essas influências radicais. Olhava-se o assunto como um problema dos outros, embora não deixando de questionar o seu impacto futuro sobre o destino do projeto europeu. Mas não, “nós estamos livres disso!”. Viu-se! Com o Chega e com Vox, uns anos mais tarde, constatou-se como estávamos a ser ingénuos.

Como alguns se recordarão, o “caso austríaco” acabou por se acontecer, no início de 2000, durante a nossa presidência da União Europeia, condicionando fortemente o desenrolar do nosso semestre de forte exposição internacional.

Das várias lideranças europeias que então se iam pronunciando sobre o assunto, o presidente francês, Jacques Chirac, era, a grande distância, a mais vocal. Por que seria?

A direita francesa mantinha, em tese, uma saudável rejeição do ideário clássico da extrema-direita. O general De Gaulle tinha-se rebelado contra Pétain, contra o regime de Vichy e o vergonhoso colaboracionismo, cúmplice das barbáries nazis. Mais tarde, a V República tinha criado uma espécie de cordão sanitário, até no sistema eleitoral, face ao vírus fascista.

Este, contudo, não desaparecera: na OAS e nos militares de Argel, bem como numa área política em que o nome de Tixier-Vignancour era o mais proeminente, a extrema-direita continuava a fazer o seu caminho. O nome de Jean-Marie Le Pen, com o seu Front National, surgiu em seguida, persistindo em ideias similares, cavalgando medos e preconceitos.

Chirac tinha assim razão em preocupar-se. Em 2002, dois anos depois do “caso austríaco”, um escândalo político acabou por produzir-se em França: contrariando todas as expetativas, o socialista Lionel Jospin foi afastado do segundo turno das eleições presidenciais e Chirac viu-se sozinho perante a extrema-direita, titulada por Le Pen. A onda de indignação rendeu-lhe um resultado histórico, quiçá ilusório. Le Pen ficou isolado. Mas a extrema-direita não desapareceu e ficou por ali.

Nesse ano de 2002, contra Chirac, Jean-Marie Le Pen só obteve 17,69 %. Cinco anos depois, em 2007, baixou mesmo para 10,44%. A extrema-direita estava em inapelável recuo? Se se reler o programa do vencedor dessa eleição, Nicolas Sarkozy, da direita clássica, constatar-se-á que ele surge já muito “colonizado” por aquilo que era a agenda da direita bem mais radical, o que o terá convertido no usufrutuário do voto útil dos eleitores de Le Pen. Seria essa, aliás, e talvez não por acaso, a última vez que a direita clássica ocupou o Eliseu.

Passaram, entretanto, mais cinco anos: em 2012, a filha de Jean-Marie, Marine Le Pen, surge sob a mesma bandeira política do seu pai. Obtém 17,9% dos votos, superando, logo na primeira volta, o resultado que o seu pai, em 2002, tivera na segunda volta contra Chirac. E chegamos a 2017. Marine de Le Pen obtém 21,3 % na primeira volta e 33,9% na segunda. Não ganhou, claro, mas o “trend” confirmou-se.

Serão os dias tensos que correm na Europa que nos levam a dramatizar o que se passa em França? Mas é inevitável que olhemos para as eleições presidenciais francesas com um sentimento de alguma angústia. Ver a extrema-direita a crescer, desde há vários anos, naquele que é um país axial do projeto europeu, colocando em potencial risco o modelo institucional, ético e político, a que, a partir de 1986, nós, os portugueses, ancorámos o nosso futuro, induz-nos uma ideia da fragilidade daquilo que tínhamos por seguro.

Hoje, 24 de abril de 2022, o dia acabará connosco a refletir sobre os novos números. E a perguntarmo-nos: daqui a cinco anos, quem presidirá à França?

Lembrando

Extrema-direita em França: 17,69 (2002),17,9 (2012), 33,9 (2017), 42 (2022). Como será em 2027?

A sorte…

 


… do terceiro homem.

Viva a máscara!

Ontem, sem máscara, entrei numa estação de serviço, numa auto-estrada. Sabia que já não era obrigatório. O pessoal, ao balcão, estava com máscara. Senti-me, por instantes, um pouco “culpado”. Caramba: foram mais de dois anos! “Dia da libertação”? As máscaras acabaram. Ainda bem. Mas protegeram-nos, seu bando de palermas!

“Disclaimer”

Nunca fui maoísta. No dia de hoje, tal como nos últimos dias, ao ler o estimável “Público”, dou graças a deus (em cuja existência, aliás, nunca acreditei) por nunca ter caído nessa tentação, de que alguns bons amigos não escaparam. Pronto! Tinha de dizer isto!

“Chapeau”

Há momentos geniais na criação de um título para a primeira página de um jornal. O grande e inigualável “Canard Enchainé” teve ontem o “prémio Nobel” desse jornalismo: “Nem Marine, nem Le Pen”. “Chapeau!”

sábado, abril 23, 2022

“For the record”

 


Dia mundial do livro…


 … “comemorado” numa livraria de Huelva.

Homónimas


Lá para o Norte, há outra, que conheço um pouco melhor.

O Lopes e a neve


O Lopes tinha vindo de Moçambique. O pai parece que tinha propriedades por lá. Dispunha de um quarto individual, embora interior, o que era então um invejado luxo, no lar universitário da rua da Torrinha, no Porto, onde eu também vivia, nessa metade dos anos sessenta do século passado.

Talvez saudoso dos ares do Índico, muitas vezes, o Lopes trazia uma cadeira e vinha conversar connosco para a varanda traseira. Por ali, com o Lopes Feio, o Nelson Pacheco e o Matias, restantes ocupantes do andar, ficávamos à cavaqueira, pela noite dentro. Eu era caloiro, eles andavam pelo menos um ano adiantados.

Recordo que estávamos no tempo da Guerra dos Seis Dias e que o Lopes era fanaticamente pró-árabe, não por uma simpatia particular pelos adversários de Israel, mas porque tinha os judeus em muito má conta. Ouvia-lhe comentários sobre os “exageros numéricos” do Holocausto e sobre a oportunidade perdida pelo Hitler, de que o Lopes era admirador confesso, na luta contra a União Soviética.

Um dia, nessas conversas, veio à baila a neve. Eu era o único, dos cinco, que vinha de uma terra com regulares nevões. E “pintava” os invernos de Vila Real a neve e branco, os feriados no liceu que a neve oferecia, o isolamento que provocava na cidade e coisas assim. Ao que me lembro, nesse tempo, pelo menos de três em três anos, Vila Real acordava “sob um alvo manto de neve”, como reiteradamente escrevia, sem originalidade, a imprensa local.

O Neves era um madrugador. Eu era, como sou sempre que posso, um contumaz “late riser”. Um dia, ouvi um restolho no quarto. Alguém afastava o estore de palhinha em que eu e o Lopes Feio investíramos para dividir a nossa assoalhada. Abri os olhos e vi a sombra esguia do Lopes, debruçado sobre a minha cama, a acordar-me: “Ó Seixas, anda ali à janela!” O dia estava ainda a começar. Posso imaginar a imprecação que devo ter emitido, o lugar onde lhe devo ter recomendado que fosse, mas o Lopes foi insistente e eu, zonzo de sono e em pijama, pelo gelo da manhã, lá acedi em ir à varanda. Lá chegado, ouvi do Neves: “Ó Seixas! Isto é neve?”

Olhei para aquelas traseiras da Torrinha, com um pouco dos Clérigos a ver-se ao fundo, o casario do Breyner e do Rosário no amanhecer cinzento, e, sem o menor entusiasmo, confirmei: “Sim, é neve. Porquê?”. Aquilo, na verdade, nem era neve que se visse, eram uns míseros fiapos a fingir de neve, sem condições de “pegar”, que é o único estatuto digno de uma nevada que se preze.

“Eh pá! É que eu nunca tinha visto neve!” O “moçambicano” Lopes ali ficou extasiado, debruçado no frio da varanda, a admirar o que era apenas um genérico pobre de um nevão a sério. E eu lá me fui deitar, que a noite da Candeia ainda me pesava.

Há horas, de Vila Real, disseram-me que se vê neve no Marão. E, por qualquer razão, mas também porque, nos últimos tempos, se tem falado de nazis, lembrei-me do Lopes. 

sexta-feira, abril 22, 2022

... e a Rússia aqui tão perto!


Enquanto Sergey Lavrov não escreve as suas, lembrei-me das memórias deste seu antecessor. Comprei isto há trinta anos e, dou conta agora, nunca tinha lido...

Lembrei-me do Raul


Estou a caminho de Évora. Lembrei-me do Raul Solnado, no tempo em que o humor ingénuo nos fazia rir. Numa das suas rábulas, o Raul explicava que tinha nascido em Lisboa. O seu paí era “escafandrista” em Évora - profissão ali improvável e que criava o primeiro sorriso na assistência. E, quando ele nasceu, o paí já não vinha a Lisboa … há dois anos. A sala caía então em gargalhadas. O Raul fazia uma pausa e esclarecia: “Mas a minha mãe foi a Évora!”. Novas gargalhadas. E ele acrescentava: “Malandrice!”. Coisas simples, desse tempo, em que a vida de quase todos, por muito que alguns não o queiram admitir, era mesmo muito complicada. Sim, o 25 de Abril é já na 2ª feira. Comemorêmo-lo!

Bom dia, Tiraspol!

A vontade da Rússia de controlar a ligação do Donbass à Transnístria (zona separatista da Moldova) era um segredo de Polichinelo, há muitos anos. Achava-se que a Rússia não teria “lata” para dizer isso alto. Disse-o agora, ironicamente quando não parece ter meios para o fazer.

Uma coisa é uma coisa

Uma distinção que deve ficar muito clara: o inequívoco repúdio português perante a bárbara agressão da Federação Russa à Ucrânia não deve ser entendido como um qualquer juízo de valor sobre a natureza política do regime de Kiev. Uma coisa nada tem a ver com a outra.

Claro

O “Expresso” diz que o PR não pediu parecer ao Conselho das Ordens, sobre a decisão de condecorar militares de Abril.  Essa agora! A lei diz: “A concessão de qualquer grau das Ordens Honoríficas Portuguesas é da exclusiva competência do PR como Grão-Mestre das Ordens”. Está claro? 

Democracia é isto

A esmagadora maioria dos deputados ao parlamento português aplaudiu o presidente ucraniano, prestando assim homenagem à luta do povo da Ucrânia, vítima da agressão da Federação Russa. Os deputados do PCP decidiram faltar à sessão. Viver em democracia é aceitar isto como normal.

quinta-feira, abril 21, 2022

Debates no écran


A V República francesa é um regime semi-presidencialista, em que a figura do chefe de Estado é de tal modo preponderante que leva a que muitos observadores o olhem como sendo presidencialista.

O general De Gaulle foi “entronizado”, em 1958, por um verdadeiro “pronunciamento”, para utilizar uma figura da ciência política mais comum em outras latitudes. Dado o caráter estabilizador do novo regime, que veio a pôr cobro a um tempo parlamentar que se estava a revelar pouco funcional e sem soluções estáveis, e que viria a ser titulado por uma figura que trazia atrás de si uma inigualável popularidade, pode dizer-se que a maioria dos franceses “absolveu”, com o tempo, esse pecadilho histórico. 

1965

De Gaulle foi a votos, em 1965, já sob uma nova Constituição. Ficou à frente na primeira volta, mas, não tendo obtido mais de metade dos votos expressos, foi obrigado a um segundo turno, por um jovem mas já “vieux routier” da anterior política parlamentar, o socialista François Mitterrand. 

1969

Abalado pelos acontecimentos do Maio 68, o general decidiu sair de cena, no ano seguinte. O seu antigo primeiro-ministro, Georges Pompidou, que verdadeiramente iniciou o “gaullismo sem De Gaulle”, uma direita democrática com forte sentido estatista e, inicialmente, com forte agenda social, veio a disputar a segunda volta da eleição presidencial contra o líder do Senado, Alain Poher, um centrista sem grande expressão política. 

A esquerda democrática, que havia feito uma má gestão da sua posição no terreno político, no rescaldo do Maio 68, ficou fora do podium.

A televisão de então, do Estado, era muito cerimoniosa para com o poder de turno. Nem a De Gaulle nem a Georges Pompidou passou pela cabeça fazer um debate televisivo com o seu opositor, entre os dois turnos das eleições presidenciais que venceram.

1974

Georges Pompidou viria a morrer no cargo, em 1974, sem completar o que era então o septanato presidencial. Mitterrand regressou à luta e perdeu por uma unha negra (49,19 % para 50,81%) para o “kennediano” ministro das Finanças de Pompidou, Giscard d’Estaing, de centro-direita. 

Pela primeira vez em França, seguindo o modelo americano, teve lugar um debate televisivo entre as duas voltas. Nele ficou famosa a certeira frase de Giscard, dirigida ao seu contendor da esquerda: “Você não tem o monopólio do coração”.

1981

Sete anos depois, Mitterrand teve a sua desforra. Impediu a reeleição de Giscard e inaugurou o primeiro dos seus dois períodos de sete anos como presidente - o mais longo tempo de estada no Eliseu de um presidente. 

No debate entre os dois, ao ser chamado de “homem do passado”, por Giscard d’Estaing, Mitterrand respondeu-lhe à letra, qualificando-o de “homem do passivo”, referindo-se ao estado das contas públicas. 

A esquerda francesa chegava finalmente ao Eliseu pela mão de alguém que conseguira reconstruir uma alternativa ao gaullismo, o Partido Socialista.

1988

Mitterrand conseguiu reeleger-se em 1988. Tendo perdido entretanto a maioria parlamentar, vira-se já obrigado a partilhar o exercício do poder com a direita gaullista. Esta era então titulada por Jacques Chirac, um antigo discípulo de Pompidou, que, antes de ser primeiro-ministro com Mitterrand, já o havia sido no mandato de Giscard d’Estaing. 

François Mitterrand, presidente em exercício, viria assim a conseguir ser reeleito contra aquele que era o primeiro-ministro que a maioria parlamentar adversária lhe impusera. 

No debate televisivo entre as duas voltas da eleição, Chirac fez questão de deixar claro que ambos estavam ali apenas na qualidade de candidatos, não na de primeiro-ministro e de presidente da República. Mitterrand teve então uma resposta, de “concordância”, que ficou para a história política francesa: “Estou totalmente de acordo consigo, senhor primeiro-ministro”.

1995

Em 1995, Jacques Chirac chegou, finalmente, ao Eliseu. Bateu o novo lider socialista, Lionel Jospin, por uma margem de cerca de 5%. O morno debate televisivo entre os dois não ficou na memória do país. 

2002

Sete anos depois, em 2002, viria a acontecer uma imensa surpresa na eleição presidencial. Quando todos esperavam que Chirac e Jospin reeditassem a disputa, numa segunda volta da eleição presidencial, intrometeu-se entre eles Jean-Marie Le Pen, líder do Front National, um partido de extrema-direita, com um resultado no primeiro turno superior ao de Lionel Jospin. 

A França e a Europa ficaram em estado de choque! Chirac recusou o tradicional debate televisivo com Le Pen, contra quem se levantou uma imensa onda de rejeição “republicana”. Chirac, dos 19,88% que obteve na primeira volta, veio a recolher, no final, uns esmagadores 82,21%. 

O mandato presidencial já fora, entretanto, reduzido a cinco anos.

2007

Em 2007, os socialistas apresentaram, pela primeira vez, uma mulher como candidata, Ségolène Royal, que, na primeira volta, ficou atrás de um antigo ministro de Jacques Chirac, Nicolas Sarkozy. 

O debate entre os dois foi interessante, com Royal a mostrar um tom tenso, que levou Sarkozy a dizer-lhe que “para ser presidente da República, é preciso ser calmo”. Sarkozy ganhou o debate e a eleição.

2012

Cinco anos depois, Sarkozy virá a encontrar, na segunda volta, o antigo marido de Ségolène Royal, o também socialista François Hollande, que emergira de uma eleição primária no seio da sua família política. Hollande explorou o polémico saldo do quinquenato de Sarkozy e, com um discurso bem construído, onde ficou célebre a sua longa anáfora “Eu, como presidente, farei… Eu como presidente, farei…”, reverteu a seu favor o resultado da primeira volta. 

De notar que, em França, os candidatos à reeleição, quer depois tenham saído vencedores ou vencidos, ficaram sempre à frente de todos os seus opositores, na primeira volta.

2017

E chegámos a 2017. O desempenho de Hollande, durante os seus cinco anos no Eliseu, terá convencido o próprio a não se recandidatar. Os socialistas fizeram uma eleição primária de onde emergiu um candidato sem um carisma capaz de elevar as cores do partido. Mais à esquerda, um antigo ministro socialista de Jospin, Jean-Luc Mélenchon, conseguiu, na primeira volta, aproximar-se dos 20% (cinco anos mais tarde, ultrapassaria mesma esta honrosa fasquia). 

O candidato da direita gaullista, o antigo primeiro-ministro de Sarkozy, François Fillon, envolveu-se em escândalos e não chegou à segunda volta. 

Nessa disputa, esteve a sucessora de Jean-Marie Le Pen, a sua filha Marine Le Pen, então com uma agenda de extrema-direita clássica. 

Defrontou Emmanuel Macron, um político jovem e brilhante (que havia sido quadro do banco Rothschild, tal como já o fora Pompidou), por algum tempo ministro de Hollande, que tinha criado um novo movimento (depois partido), qualificado como “nem de direita nem de esquerda”. 

O debate televisivo entre os dois foi, de longe, o mais vivo de todos os momentos similares. Le Pen mostrou grande impreparação e uma agressividade que o eleitorado não apreciou. Ainda tentou cunhar uma frase para a memória política: “Eu sou a candidata do poder de compra, você é o candidato dos que podem comprar a França”, referido-se a aquisições de empresas, assunto com que Macron, afinal, nada tivera a ver. Este revelou serenidade, determinação e conhecimento aprofundado dos dossiês. Ganhou, a grande distância, o debate e tornou-se presidente.

2022

Ontem, no clássico debate televisivo entre as duas voltas, Macron reeditou o seu “derby” com Le Pen. Esta esteve diferente, mais “estadista”, tecnicamente mais capaz, tentando disfarçar a agenda radical que se sabe ser a sua - embora a espaços a denunciasse. Macron, que foi obrigado a defender o seu quinquenato, revelou um manejo hábil do discurso de quem está no poder, com um europeísmo que pretendeu colar ao interesse da França. Aqui ou ali, Macron terá sido algo condescendente, um pouco “patronizing”, mesmo arrogante. Ao dizer que Le Pen estava a “mentir sobre a mercadoria”, uma expressão clássica para o comércio fraudulento, acabou por criar a frase mais sonante do debate. Este correu muito melhor a Marine Le Pen do que o de 2017. Não era, aliás, difícil. Mas, na minha opinião, esteve longe de ser o suficiente para poder reverter a diferença que a separa de Macron, em todas as sondagens. 

“A Arte da Guerra”


A coesão dos aliados da Ucrânia perante o efeito assimétrico das sanções económicas, a última semana das eleições francesas e as “trapalhadas” de Boris Johnson são os três temas de ”A Arte da Guerra”, o podcast que, para o “Jornal Económico”, faço com o jornalista António Freitas de Sousa.

quarta-feira, abril 20, 2022

Belicista?

Sobre o caráter xenófobo do poder ucraniano, alegado pelo PCP, para explicar sua recusa a estar presente no discurso de Zelensky na AR, a discussão é possível. Mas apelidar de “belicista” o regime de um país hoje devastado pela agressão militar estrangeira é muita imaginação.

Iniciativa

A Rússia propôs um acordo à Ucrânia. Além da neutralidade, da aceitação do estatuto diferenciado para o Donbass e do “fait accompli” da Crimeia, que mais propostas trará? Que ideias avançará em matéria de desmilitarização e dimensão futura das forças armadas ucranianas? Kiev vai dizer que não, claro. Com o rearmamento intenso em curso, entende que o tempo joga agora a seu favor.

Uma boa notícia


Desde há uns anos, tinha ouvido falar de que existia, ali pela Borralha, em Vila Real, numa casa isolada, no meio de uma quinta, colada ao quartel do regimento de Infantaria 13, em Vila Real, um turismo de habitação. Olhando à distância, a partir de certa altura, pareceu-me que teria havido obras de melhoramento do edifício. Mas a minha curiosidade não foi mais longe do que isso. 

Constou-me, mais recentemente, que ali eram servidas refeições. E foi então - vício antigo! - que fiz algumas perguntas. Ontem, para me despedir da cidade, no fim da Páscoa, fui lá jantar com familiares.

Descobri então, para minha surpresa, que aquilo é hoje um pequeno hotel - o Borralha Hotel - com instalações modernas, com muito bom aspeto. A avaliar pelo preço dos quartos, é uma excelente opção para quem visite Vila Real, onde existe um imenso défice na hotelaria. 

O jantar? Refeição bastante agradável, com serviço atento e profissional (quiçá um pouco lento), num espaço confortável e arejado. O menu é bem construído, a lista de vinhos é adequada, com o Douro em natural destaque. Ah!, e o que é muito importante, a conta final foi equilibrada. 

Com os dias de sol a virem por aí, o espaço exterior promete ser ideal para um copo ao fim da tarde e um jantar ao ar livre. Está assim criada uma saudável concorrência, na mesma zona de Vila Real, ao “Lameirão” e ao “Chaxoila”! Cada um que puxe pelos seus brios, porque há freguesia para todos! 

O que quero, muito simplesmente, aqui deixar registado é que a existência do Borralha Hotel é uma boa notícia para a hotelaria e para a restauração da minha terra.

A diplomacia …


 … existe para ajudar a encontrar saída para isto.

terça-feira, abril 19, 2022

Vila Real, agora

 


Cozinhados políticos

Numa noite de 2006, tive o presidente Lula e sua mulher, Marisa, com outros convidados, a jantar na residência da embaixada em Brasília, que eu então chefiava.

A nossa cozinheira, a excelente Delfina, uma moçambicana mãe de trigémeos, de um dos quais tenho orgulho de ser padrinho, raramente era substituída na sua função. Porém, para essa noite, num dos poucos jantares numa embaixada a que o casal presidencial se dignava ir, eu havia decidido convidar uma jovem “chefe” brasileira que, além de ser nossa amiga, estava a fazer, por esse tempo, bastante sucesso em Brasília.

E o jantar esteve, de facto, muito bom. O presidente e a sua mulher fizeram tantos elogios à comida que, à saída, pedi à “chefe” para vir conhecê-los e com eles tirar uma fotografia. Notei que, quando apresentei e disse o nome da já reputada cozinheira, Lula fez um leve esgar, de uma aparente estranheza.

À despedida, junto ao carro, o presidente meteu-me o braço e, ao ouvido, inquiriu: “Ela chama-se mesmo Mara Alckmin?”. Sorri e sosseguei-o: “Não, presidente! É Mara Alcamim, não é Alckmin!”. Lula soltou uma gargalhada e disse: “Ah! Entendi mal! E até me assustei!”

Geraldo Alckmin era o candidato da oposição que, escassos meses depois, Lula viria a defrontar na reeleição. Um sufrágio em que Alckmin foi derrotado estrondosamente.

Ontem, ao ver confirmado que Geraldo Alckmin se prepara agora para ser o vice-presidente na “chapa”, chefiada de novo por Lula, que pretende ser eleita para o Palácio do Planalto, no próximo mês de novembro, dei comigo a pensar que este mundo dá mesmo muitas voltas!

segunda-feira, abril 18, 2022

O diabo veste farda

Hamilton Mourão, o general vice-presidente de Bolsonaro, que com ele se foi incompatibilizando, aparentava ser uma figura sensata e equilibrada. Por estes dias, resolveu pronunciar-se sobre o tempo da ditadura militar (1964/89). E então percebeu-se: não é melhor do que os outros.

Não vale tudo!

Desejar que Marine Le Pen seja derrotada por Macron é uma atitude de mera decência política. Mas é miserável, revelando falta de lisura em procedimentos que deviam ser isentos, ver as instituições europeias a divulgarem acusações contra ela, a poucos dias do sufrágio. Não, não vale tudo!

Tolerância, pois!

Constituem atos reveladores de medíocre xenofobia, indignos do país tolerante que às vezes pretendemos ser, as atitudes, que parece serem cada vez mais frequentes, contra os cidadãos russos que residem em Portugal.

PCP 2

A atitude do PCP, no conflito entre a Rússia e a Ucrânia, é de uma extrema simplicidade. Desde o fim da URSS, o PCP esteve sempre, em todos os cenários geopolíticos, no polo oposto àquele que foi a posição dos EUA. Não há nada de mais previsível do que os comunistas portugueses.

PCP 1

O drama do PCP: já terá percebido que a atitude de complacência com a agressão russa à Ucrânia desgastou a sua imagem a um nível nunca visto no passado, mas mantem a convição de que, afinal, é precisamente por ser “assim” que, há décadas, sobrevive no museu ideológico europeu.

A chuva vem por aí!


 

Um amigo russo

O conceito de amigo, na vida diplomática, tem frequentemente um significado um pouco específico. Começamos por conhecer alguém, cidadão de outro país, numa determinada cidade, onde ambos somos estrangeiros. Ali coincidimos por algum tempo, estabelecendo uma relação conjuntural, marcada por alguma convivência, às vezes mesmo com alguma proximidade. Depois, rodamos pelo mundo. Anos mais tarde, se acaso nos voltamos a cruzar com essa pessoa em qualquer outro lugar, é quase certo que cairemos nos braços um do outro, considerando-nos “velhos amigos”, como se aquele primeiro contacto tivesse necessariamente tido alguma intensidade afetiva. Será talvez a “solidão” da condição diplomática, ao voltarmos a encontrar-nos num terreno igualmente estranho a ambos, que leva a essa expressão automática de reaproximação, às vezes um pouco exagerada, mas que pode, ainda assim, acabar por ter laivos de uma verdadeira amizade. Comigo, isso aconteceu algumas vezes.

Quando, em 2002, fui para Viena, chefiar a nossa missão diplomática durante a presidência portuguesa da OSCE, sabia que, para ter sucesso, tinha de me “dar bem”, com os meus colegas americano e russo. Os EUA e a Federação Russa são os “donos” da OSCE! É claro que há também os chamados “major players” - a França, o Reino Unido, a Alemanha, com a União Europeia, depois do Tratado de Lisboa, a querer mostrar que existe. E, depois, existem os “key players”, um grupo com outros parceiros, onde estão sempre a Itália, os Países Baixos e a Turquia. Mas esse é um conjunto que vai variando muito, em função da qualidade pessoal e poder de influência dos respetivos embaixadores. Nesse meu tempo de Viena, os meus colegas da Suíça, da Bulgária, da Roménia e do Lichtenstein (isso mesmo!), só para mencionar alguns, integravam esse grupo de “influentes”. Mas, volto ao princípio: conseguir ter “a bordo” o americano e o russo era a condição “sine qua non” para que as coisas corressem bem na OSCE. Nos dias de hoje, como isso é impossível, tudo corre mal por ali.

Não esperava ter, como não tive, nessa altura, o menor problema com o meu novo colega americano. Mas, com o russo, o primeiro contacto não foi nada fácil. O meu anterior contraparte russo em Nova Iorque, cidade de onde eu vinha, o agora famoso Sergey Lavrov, com quem tinha uma relação de forte cordialidade, mas neste caso algo distante de um registo de amizade, tinha-me dito, quando dele me fui despedir, que o seu colega na OSCE era “excelente pessoa, mas um pouco desconfiado. Vais acabar por te dar bem com ele”.

No meu segundo dia de Viena, fui visitar Alexander Alekseev, assim se chamava o meu novo colega russo. Recebeu-me na sua residência, ao fim da tarde, num ambiente um pouco frio. Era um homem nervoso, de óculos grossos, que não olhava de frente. Tinha um sorriso que era quase um esgar e martelava as palavras. Disse para mim mesmo: “Vai se difícil eu dar-me bem com este tipo. Mas tenho de conseguir”.

A nossa primeira conversa foi quase brutal. Quase sem me deixar apresentar, lançou-se, de imediato, numa litania contra a atitude do mundo ocidental dentro da OSCE, ameaçando com o veto de Moscovo a propostas que carreassem críticas aos seus “protegidos” - e a Rússia protegia todos os países que o ocidente criticasse, em matéria de direitos humanos, de ataques ao Estado de direito, de infringimento das regras democráticas. A Rússia era, na OSCE, o protetor do mundo a que se chamava “a Leste de Viena”, na realidade, dos “trouble makers”: Bielorrússia, Ásia Central, alguns Balcãs.

Encaixei com bonomia o recado, percebia bem a razão de fundo daquele arrazoado e, confesso, não me impressionei minimamente com o tom em que a conversa se processou. Tendo sido antes bem informado, pelo meu antecessor, João Lima Pimentel, sobre o “estado da arte” dentro da organização, estava exatamente à espera daquilo que vim a encontrar. E, até porque vinha da ONU, um terreno bem mais complexo, trazia comigo uma grande autoconfiança. E, por isso, anotei o discurso de Alexander Alekseev, mas dei-lhe o devido “desconto”.

Para o que aqui importa, a minha relação com o meu colega russo, não obstante algumas “escaramuças” de percurso nos tempos seguintes, acabou por ser excelente, fomos criando mesmo, ao longo do tempo, aquilo que pode qualificar-se como uma boa amizade. Ele percebeu que eu era pouco pressionável, que Portugal funcionava como um “honest broker” e que, de mim, não viriam surpresas. Viajámos juntos uma semana na Geórgia, com visitas à Ossétia do Sul e à Abcásia, sempre numa relação franca e divertida. Antes, havíamos passado uns dias no Porto, numa cimeira da OSCE, com uma noite a testar vodkas, no bar do Sheraton. Depois, eu saí de Viena, para embaixador no Brasil. Ele foi para Moscovo, para vice-ministro dos Negócios Estrangeiros. Perdemo-nos de vista.

Passou uma década. Regressei a Portugal, reformei-me do serviço diplomático e, numa outra capacidade de trabalho internacional, no início de 2014, fui a Estrasburgo. Havia-me sido pedido que fizesse uma determinada diligência junto do embaixador russo no Conselho da Europa. (Há semanas, como é sabido, a Rússia abandonou o Conselho da Europa, na iminência de ser suspensa da organização). Quem era o embaixador? Nada mais nada menos que Alexander Alekseev.

O nosso reencontro foi muito agradável. Passámos uma hora à conversa, muito para além da questão que ali me levava. A certo ponto, ele disse-me: “Lembras-te do nosso primeiro encontro, em Viena? Não foi uma conversa fácil…”. Eu “fiz de conta”: “Essa agora! Foi facílima! Tu quiseste assustar-me, ameaçar com o veto russo, mas eu percebi logo que estavas a querer criar uma primeira impressão. E, como viste, tudo acabou por correr muito bem entre nós!” O Alexander deu uma gargalhada, como se o seu anterior “bluff” tivesse sido denunciado e desmontado pelos factos subsequentes. Despedimo-nos com o que interpretei como um sincero abraço.

Que será feito, neste estranhos dias de guerra, do meu amigo Alexander Alekseev, hoje diplomata russo aposentado? Devo dizer que a última coisa que me apetecia seria discutir com ele a invasão russa da Ucrânia. É que imagino que ele talvez pretendesse convencer-me de que aquilo não passa de uma mera “operação militar especial”. Se há coisa que, na vida, há muito aprendi é que não se deve nunca testar uma amizade metendo-lhe a política pelo meio.

domingo, abril 17, 2022

Páscoa


A “operação” já faz parte da tradição, que a pandemia limitou por algum tempo. Pela Páscoa, encomenda-se o cabrito na Dona Rosa, onde a qualidade é garantida, ali ao Arcabuzado, em Vila Real. Depois, à hora do almoço, processa-se um cuidadoso transporte do “material” - batatas, arroz e molho incluídos - até ao local de degustação. Segue-se a função, com líquidos tintos adequados, seguida dos doces da época. A tarde acaba num chá preto, dos de “a sério”, acompanhado dos folares diversos, ali sujeitos a testes de qualidade comparativa. Desta vez, fomos “só” 18…

Ainda vamos a tempo?

 


sábado, abril 16, 2022

Aleluia


No local onde agora estou, só se consegue ouvir os sinos de uma igreja se acaso o vento estiver muito de feição. Verdade seja que, usando sempre, nas férias em Vila Real, o “fuso de Caracas”, em termos daa minhas horas matinais, não consegui esclarecer se, num sábado de Aleluia como este, ainda se manteve o velho ritual dos sinos tocarem em uníssono, logo pela manhã. 

Mas será que isso importa alguma coisa, nestes tempos em que maioria dos sinos que se ouvem são uns “genéricos” em gravação, porque já não deve haver verba para contratar sineiros? (Os muçulmanos também padecem dos males do défice: ainda não há muito tempo, numa capital de tementes a Maomé, ouvi a convocação para orações, o azan, a ser feito pelo muezin da mesma forma). 

Noutras eras desta pátria, em que outros costumes se impunham, na Semana Santa, todas as rádios (televisão não havia) suspendiam as suas emissões à hora de almoço de quinta-feira, entrando em “black out” durante toda a sexta-feira, dias em que não passava pela cabeça de ninguém abrir as portas de qualquer loja comercial e, claro, em que o bacalhau e o peixe eram de regra nas refeições. Mas, mais do que isso: nesses tempos, em que não havia secadoras de roupa, até não era de “bom tom” estender roupa lavada a secar. Imaginem! 

O que Portugal mudou! 

Seramota


Sem o folar da Seramota, de Mirandela, a nossa Páscoa teria sempre muito menos graça. Passei ontem por lá, a abastecer-me de dois exemplares destes. É um dos melhores de Trás-os-Montes, podem crer!

A Dona Inês Seramota convoca, para além do folar, e de outros exemplares de excelente pão, uma dimensão política que, ao que me dizem, em nada diminui a sua popularidade comercial em Mirandela - e também já em outras localidades, onde os seus produtos se vendem. 

É que a simpática senhora, com quem ontem tive o gosto de conversar, é, há muito, uma fervorosa militante do PCP e, por isso uma regular frequentadora (e “alimentadora”) da Festa do Avante. Ontem, na padaria, lá estavam exemplares do “Avante!” e do “O Militante” à venda. No entanto, eu é mais pão…

A Ucrânia

 


Ver aqui.

sexta-feira, abril 15, 2022

A esquina da Gomes

 


Eunice Muñoz (1928 - 2022)

 


“Lameirão”


De todas as vezes que vou a Vila Real, acabo a almoçar ou a jantar, no “Lameirão”. 

Até temo falar muito (mas já falei no passado) daquela que é a minha “cantina” na cidade, não vá o excesso de propaganda, um destes dias, fazer com que eu não conseguir reservar mesa por lá (já aconteceu, já!).

O “Lameirão”, onde oficiam, na sala, o casal Alice e Eleutério, com a cozinha nas mãos da Luísa, irmã deste último, apresenta uma lista que tem a original caraterística de variar a cada dia da semana (às quartas e ao domingo à noite, a casa fecha), com uma constância que permite aos comensais planearem, com rigor, as suas visitas. Mas, além do menu que vai variando, há sempre por ali bola de carne e rissóis, além das rabanadas, uma especialidade da Alice, com uma mão particular para os doces. E o Eleutério tem vindo a melhorar, substancialmente, a oferta de vinhos, com muitos Douros de quintas pouco conhecidas.

Ontem, dei-me conta de que o “Lameirão” tem já menus impressos em francês e inglês - e, que eu notasse, sem uma única gralha na grafia, coisa raríssima na restauração em Portugal. Daqui a tempos, disse-me o Eleutério, passará também a haver uma lista em espanhol (embora alguns gostem mais de dizer castelhano, eu sei).

O “Lameirão” fica junto ao quartel do Regimento de Infantaria 13, na saída pela EN2 para o norte, bem junto a um nó do IP4.

Botão errado

Foi ontem à tarde, na Fundação José Saramago. A homenagem ao Nuno Júdice era no 4° andar. Distraidamente, carreguei no botão do 3° andar. Ia...