terça-feira, junho 10, 2014

Desmaios

Cavaco Silva desmaiou durante as cerimónias do 10 de junho, que hoje estão a ter lugar na Guarda. Um presidente é um cidadão como qualquer outro, tem as fragilidades de uma pessoa comum e este tipo de situações deve ser tido como natural. Porém, para a imprensa e para a curiosidade pública, não deixa de ser um "fait divers" que abala a rotina de uma cerimónia. Mas que não é inédito, como um dia testemunhei de perto.

Em 28 de outubro de 1995, eu tomava posse no governo presidido por António Guterres. Por um mero acaso, fazia-o juntamente com os ministros e, como era de regra, com o secretário de Estado da presidência do Conselho de ministros, dias antes dos restantes colegas secretários de Estado. Era uma circunstância excecional, que tinha a ver com a urgência da minha deslocação ao Luxemburgo, para acompanhar Jaime Gama, onde tínhamos para resolver um berbicacho, numa complicada e inadiável negociação europeia sobre pescas que estava em curso.

O ambiente naquele espaço do palácio da Ajuda era abafante. A mudança de ciclo político trouxera à posse do novo governo uma imensa multidão, que se acotovelava e prolongava mesmo pela escadaria de acesso. Tratava-se do fim do "cavaquismo", desse período de uma década em que Cavaco Silva, depois de chefiar um governo minoritário de curta duração, obtivera duas maiorias absolutas, num Portugal favorecido pelo forte fluxo dos ventos financeiros comunitários, que se faziam sentir na paisagem do país e no bolso dos portugueses.

Viviam-se os últimos dias do segundo mandato de Mário Soares como presidente da República. Durante quase dez anos, entre Soares e Cavaco, havia-se travado uma guerra política surda, que se agravara nos últimos tempos. A saída de cena do primeiro-ministro e a vitória dos socialistas nas eleições legislativas do início de outubro devem ter constituído o culminar desejável de mandato para o presidente cessante. Também na presidência se iria assistir a um novo ciclo. Jorge Sampaio era o candidato anunciado às eleições que teriam lugar em janeiro do ano seguinte. Cavaco Silva, primeiro-ministro cessante, seria o seu adversário.

Voltemos à posse. Cavaco Silva estava ao lado de Barbosa de Melo, presidente da Assembleia da República, e de Mário Soares, naquela que seria a consagração de António Guterres, seu sucessor à frente do executivo. Estava pálido e tenso, o que, no meu caso, levei à conta do peso pessoal de uma cerimónia que punha termo a um longo mandato. Segundo as sondagens, as hipóteses de ser eleito para a presidência, contra Jorge Sampaio, não eram muito fortes, pelo que o pressão emocional daquele momento deveria ser muito grande.

Foi então que, de repente, as nossas atenções foram chamadas para um reboliço à volta de Cavaco Silva. Sentira-se mal, desmaiara, foi retirado para trás da cena. A sala ficou em suspenso. Por um instante, temeu-se algo de grave, mas felizmente logo ficou claro que fora uma indisposição passageira, provocada por uma noite mal dormida, na morte de um familiar. Lembro-me de, naqueles escassos minutos, ter trocado olhares perplexos com Jorge Sampaio, que estava num grupo de pessoas à nossa frente. Creio que, sem o dizermos, nos interrogávamos sobre se aquela súbita "humanização" de Cavaco não poderia vir a ter efeitos nas eleições presidenciais, que se realizariam poucas semanas depois. 

Não teve. Sampaio viria a ganhar as eleições à primeira volta. Cavaco Silva saiu de cena, para só regressar uma década mais tarde, para o substituir. O tempo político de Cavaco Silva acabará em 2015. Quase duas décadas medeiam entre os desmaios que protagonizou em cerimónias públicas.

Padre Alberto

"Já vi que você nunca fará parte do meu rebanho", disse-me uma noite o padre Alberto Neto Simões Dias, com uma das gargalhadas sadias com que enchia os jantares a que, de quando em quando, estava presente, na casa de familiares seus e meus, onde eu vivi por cerca de cinco anos, a partir dos últimos meses de 1968. O meu irrecuperável esquerdismo divertia o padre Alberto, a quem me recordo de ter ouvido falar, pela primeira vez e com entusiasmo, de António Guterres. Era também muito próximo de Marcelo Rebelo de Sousa e, creio, de Adelino Amaro da Costa. Movia-se num mundo lisboeta de que eu estava e pretendia manter-me distante, de estudantes católicos, que ele conquistava e organizava com o seu entusiasmo e o seu verbo. Oriundo do Souto da Casa, perto do Fundão, o padre Alberto estudou e viveu desde cedo em Lisboa, onde se foi aproximando do catolicismo "progressista", como à época se dizia, onde preponderava um seu grande amigo, o padre José Felicidade Alves. Garantiu um lugar muito interessante junto da comunidade universitária e em diversos círculos de Lisboa. A famosa vigília na capela do Rato, na noite de 31 de dezembro de 1972, passou-se nesse seu espaço.

O padre Alberto foi uma figura que sempre tive por muito simpática. Cordial, excelente contador de histórias, falava-nos com graça das inúmeras iniciativas em que se envolvia. Os jantares com ele eram sempre momentos divertidos e, naqueles "anos do fim" do marcelismo, também muito instrutivos quanto à inquietação que então atravessava os meios católicos. Notava-se que pressentia que o mundo estava a mudar, que ele tentava ajudar a essa mudança, mas sem laivos radicais, apenas com a energia da palavra e uma forte vontade congregadora. Apesar das nossas diferenças, mantínhamos uma espécie de cumplicidade cívica subliminar, reforçada pelo nosso sportinguismo, que eu, porém, nunca quis aprofundar. Um dia, convidou-me para uma sua iniciativa, creio que um debate, no qual me disse que estariam pessoas de várias tendências, alguns não crentes, como seria o meu caso. Fiquei de pensar no assunto e, no final, desisti de ir. O meu sectarismo da época não era compatível com esse tipo de exercícios, que achava uma mera perda de tempo. Tenho ideia de que ficou sentido com essa minha recusa.

Perdemo-nos por completo de vista, a partir de meados de 1973. Ouvia falar dele, a espaços, à família. Mais de uma década depois, em 1987, ocorreu a sua morte trágica, em condições infelizmente nunca esclarecidas. Lembrei-me dele agora, ao ler a bela evocação que o seu conterrâneo, Fernando Paulouro das Neves, aqui lhe fez.

segunda-feira, junho 09, 2014

Britânicos

Está a ser interessante seguir o aparente braço-de-ferro entre o PM britânico e outros dirigentes conservadores europeus, na sua recusa de aceitar o nome de Jean-Claude Juncker para presidente da Comissão Europeia. A experiência mostra que os britânicos são especialistas em "trade off" e que não é de excluir que, no termo desta barganha, a intransigência de Londres possa vir a ter como resultado vir a ganhar, noutro "tabuleiro", um qualquer "prémio de consolação" que satifaça alguma das suas várias reivindicações diluidoras da densidade da construção europeia. Mas também pode dar-se o caso de Londres estar a "fazer o frete" a outros Estados que também não querem Juncker, mas não o podem dizer, a fim de tentarem ainda a hipótese de um outro nome. Na Europa, tudo é possível.

Aproveito para relembrar um episódio que é bem definidor da forma britânica de negociar.

Foi durante a discussão de um dos dois tratados europeus (Amesterdão e Nice), em que fui "chief negotiator" português. No início de cada negociação, o nosso objetivo era tentar manter os ingleses "on board", isto é, procurar descobrir fórmulas que acomodassem os seus interesses e preocupações. Sabíamos que isso era sempre muito difícil, mas um tratado seria tanto mais forte quanto não comportasse quaisquer "exceções" nacionais, que quase sempre abriam caminho a outros casos similares. Assim, num determinado e importante dossiê, lembro-me de que, ao longo das semanas, fomos progressivamente prescindindo do "wording" inicial, mais ambicioso, para desespero de certos Estados, com vista a tentar caminhar para um consenso que nos pudesse vir a aproximar dos britânicos. Os seus negociadores iam alimentando essa esperança, dando sinais de que, se aceitássemos uma linguagem mais diluída, isso talvez fosse possível. Nós íamos transigindo, cada vez mais, até que se chegou a um limite máximo possível dessa diluição. E, nesse momento, mesmo perante uma fórmula já muito "soft", os britânicos informaram que lhes era impossível aceitarem, anunciando o seu tradicional "opt out", isto é, à sua desvinculação dessa política. Porém, com essa tática, havia conseguido diluir o compromisso que os restantes já tinham aceite. E, naturalmente, já era inviável o regresso à "square one", à fórmula inicial mais ambiciosa, a qual, se acaso os negociadores britânicos não tivessem estado presentes, teria sido aceite por todos. Com este expediente dilatório, Londres garantia o que, de facto e desde o primeiro momento, pretendia: ficar fora do acordo e que o tratado, de que pontualmente se desvinculava, não se afastava exageradamente daquilo que era o seu interesse. Ficava também claro que, desde o início, o Reino Unido nunca verdadeiramente tinha encarado a possibilidade de se juntar a qualquer compromisso. E nós tinhamos caído na "esparrela"...

ps - como se terá notado pelos termos ingleses utilizados no texto, os britânicos já entram a ganhar, pela língua, nas negociações europeias.

domingo, junho 08, 2014

Conversas

Decididamente, o país mudou. Durante estes últimos três anos, a conversa entre amigos passava-se entre a "heróica" minoria que defendia a chamada maioria (as eleições provaram que a maioria "já vai" em 28%) e os que não gostavam de Passos Coelho, Paulo Portas "y sus muchachos" - sendo que, dentre estes últimos, tenho amigos e familiares que oscilam entre os que acham que "isto só lá vai à bomba" e alguns, os mais complacentes, que estão apenas "descontentes". Parte destes, não querendo votar socialista ou na atomização anti-governo, passaram-se para a cómoda abstenção.

Desde há duas semanas que o país discussante se alterou. Agora, parece que as pessoas alinham todas as suas opiniões em favor de Seguro ou de Costa. De súbito - terá sido efeito da possibilidade de voto aberta pelas "primárias"? - não há bicho careta, por mais "reaça" ou "comuna" que seja, que não se ache no direito de "amandar bocas" sobre a crise interna do PS, tomando "partido" ou, mais modestamente, alinhando palpites sobre o saldo que resultará do debate. Os mesmos que, há semanas, enchiam a boca com o "programa cautelar" ou a "saída limpa", já só falam, com uma desenvoltura "xuxa", sobre a importância de haver "congresso+diretas" ou as "primárias". E têm opinião!

Quase que comove ver o país tão preocupado com a escolha para o Rato. Receio apenas que isto possa acabar num relativo "esquecimento" de Passos Coelho. Seria uma injustiça se isso acontecesse.

O autor

Ontem à tarde. Estava sentado a uma pequena mesa, recuado, entre duas barracas, na feira do livro. À frente tinha um pequeno banco. Desocupado. Sobre a mesa havia três livros e uma esferográfica. Era o autor. Estava distante da zona comum onde os seus pares, entre amigos e editores, vão disfarçando, às vezes por horas, a escassez de admiradores. Ele não, estava completamente sozinho. Discretamente, procurei ler o nome e o título do livro. Não me diziam rigorosamente nada. O livro era vendido na barraca em frente, de uma editora menos conhecida. O sucesso de vendas não era coisa evidente. Andei por ali uns minutos, por curiosidade. Ninguém se aproximou da mesa. Subi e desci a feira. Quando por lá voltei a passar, tudo estava igual. O autor, estóico, continuava sentado, com os mesmos três exemplares e a caneta sem préstimo, com um esgar de resignação. Confesso que cheguei a ter a tentação de comprar um livro, mesmo que o tema me não interessasse. Mas não. O homem não precisava de compaixão, precisava de leitores. E eu nunca seria um deles.

sábado, junho 07, 2014

Conveniências

O meu pai costumava contar que, no tempo da sua juventude em Viana do Castelo, havia um cavalheiro que ficou conhecido por não ter reagido quando um dia a sua mulher foi agredida em público por um homem. A justificação dada, confrontado com a indignação dos amigos da família que o inquiriam sobre a razão pela qual assumira tal passividade, colou-se-lhe à pele para sempre: "não me convinha!"
 
Lembrei-me da expressão ao ter visto já apoiantes das duas possíveis candidaturas à liderança dos socialistas (outras pode vir a haver, já pensaram?), em artigos, declarações e blogues, a recomendar aos respetivos líderes que se abstenham de discutir, desvalorizando-as ab initio ou considerando-as inoportunas, algumas propostas apresentadas pelo seu adversário. A razão não é dita, mas trata-se de mera conveniência política.
 
Termino lembrando que o homem de Viana do Castelo não ficou muito bem no retrato da memória local.

sexta-feira, junho 06, 2014

Normandia

Foi em Deauville, na Normandia, depois de um jantar, em 2010. Falava com o "maire" da cidade, a quem havia manifestado a minha admiração pelo facto de, em muitos locais da região, ter encontrado, lado a lado, bandeiras francesas e alemãs, em cemitérios que celebravam as vítimas da guerra em que ambos os países se haviam defrontado de forma trágica, entre 1939 e 1945. 

Meses antes, durante vários dias de férias, havia percorrido toda (mas mesmo "toda") a "costa do desembarque", passando pelas célebres praias que os americanos tinham crismado com nomes bem sonantes. Visitara as casamatas alemãs, museus militares e restos das lanchas aliadas utilizadas no "dia D", 6 de junho de 1944. Desde criança que eu era um "viciado" no tema. O meu pai falava-me com entusiasmo desse dia histórico em que os aliados desembarcaram na Normandia, dando um impulso decisivo à derrocada da agressão nazi na Europa. Tornei-me desde então um leitor compulsivo de livros sobre a Segunda Guerra mundial, um assunto sempre muito presente nas conversas e nas prateleiras de livros lá de casa. Viver em França deu-me oportunidade de percorrer, de mapa na mão e de forma organizada, todos esses locais que tanto haviam mobilizado a minha imaginação.

Ao "maire" de Deauville perguntei se aos mais velhos, àqueles a quem a guerra tinha afetado diretamente as suas vidas, não chocava essa convivência com a bandeira do antigo inimigo. Explicou-me que, de facto, para algumas pessoas dessa geração que vivera a guerra "a quente", não terá sido fácil aceitar a normalidade da relação pós-conflito, com um país que lhes infligira tanto sofrimento. Mas esse era o "preço" da nova Europa, da nova amizade franco-alemã à volta da qual se construíra a paz e a unidade económica e política das Comunidades. 

O "maire" acrescentou, contudo, algo por que eu não esperava. Disse-me que muitos habitantes da Normandia, no período imediatamente após a guerra, mantinham sentimentos ambivalentes face aos ingleses e aos americanos - que eu pensava, com naturalidade, serem vistos como os libertadores que, de facto, foram. "Convém não esquecer que, para a população civil que habitava a Normandia, a força aérea inglesa e americana era vista responsável por meses de bombardeamentos de posições militares alemãs distribuídas por toda a região, cuja precisão estava muito longe de ser total, frequentemente destruindo casas de civis, provocando vítimas francesas, em muitas noites de terror". Nunca tinha pensado nisso: o "friendly fire" também mata.

Passam hoje 70 anos sobre essa data memorável. As praias da Normandia foram cenário de comemorações sobre a paz reconquistada na sequência do "dia D". Mas a guerra não desapareceu por completo da Europa, primeiro nos Balcãs, agora na Ucrânia. A paz é o bem mais inseguro da História.

Culturgest

É hoje, sexta-feira, às 18h30. Mais uma conferência do ciclo de conferância "Portugal – Propostas para o Futuro", no Pequeno Auditório da Culturgest, com entrada gratuita. O tema não podia ser mais atual: "Que fazer com os Fundos Estruturais no período de 2014/2020?".

No painel estarão vozes qualificadas como Elisa Ferreira, João Ferrão e José Mariano Gago. A moderação estará a cargo de José Manuel Félix Ribeiro. Trata-se de mais uma iniciativa de um grupo de que faço parte, com Fernando Bello, José Manuel Félix Ribeiro, João Ferreira do Amaral, João Salgueiro, João Costa Pinto e Miguel Lobo Antunes, este último diretor da Culturgest.

quinta-feira, junho 05, 2014

Os amigos e as cerejas

Com a idade, sinto que os amigos são como as cerejas: vão uns atrás dos outros. Desde esta manhã, debatia-me com a ideia de que, à data de hoje, já passou um ano desde que António Pinto da França nos deixou. Há minutos, na caloraça da feira do livro, para onde me "desenfiei" entre duas reuniões e uma tosta a fingir de almoço, dei de frente com Onésimo Teotónio de Almeida, um "browniano" que atravessou o Atlântico para vir à capital do império. E veio à baila um amigo comum que também já se foi, o José Guilherme Stichini Vilela. Por imperativos meus, a conversa teve de ser breve. Mas esta dupla e triste evocação estragou-me, de certo modo, a tarde deste soberbo dia de insuperável sol lisboeta. Ao mesmo tempo, estou grato ao Onésimo por me ter trazido à memória a imagem desse outro amigo. Relembrá-lo, traz alguma melancolia mas também um sentimento de um certo conforto, a certeza que não o esquecemos e que a sua evocação nos deixa marcas. Volto ao princípio: com os anos, a vida torna-se numa espécie de album de recordações. De imagens que já foram a cores e que agora são, inapelavelmente, a preto e btanco.

A cidade proibida

Lembro, como se fosse hoje, as imagens televisivas. Ceausescu está na varanda do edifício da presidência, em Bucareste. À sua frente, espalha-se uma grande e organizada manifestação de apoio, a tentar contrariar os ventos com que as "democracias populares" estavam, por essa época, a ser definitivamente varridas das História europeia. Engorrado para o inverno, o ditador romeno saúda, com um sorriso plástico, a multidão oficiosa que o aplaude, quando, de repente, se começam a ouvir longínquas vozes de protesto, vindas de outros manifestantes algures na praça. Nota-se que Ceausescu fica atónito por aquela contestação inédita, que "não pode" estar a acontecer, num regime como era o seu. A câmara não nos mostra essas pessoas, não faço ideia se se saberá o que lhes aconteceu. Mas, para sempre, passei a ligar a atitude daquela gente, um punhado de pessoas num ambiente altamente hostil, sujeitos à repressão mais selvática, à verdadeira definição da coragem cívica.
 
Veio-me isto à memória ontem, quando revi a imagem patética daquele cidadão chinês, de saco plástico na mão, que, há 25 anos, na praça de Tiananmen, se colocou em frente dos tanques militares, protestando contra o esmagar da tentativa de liberdade, prestes a iniciar-se. Seria interessante saber o que terá dito aos militares, os mesmos que, curiosamente, travaram o tanque para o não atropelar, minutos antes de reprimirem barbaramente milhares de pessoas. Nunca se soube quem foi esse herói, se ainda é vivo, depois de afastado por amigos, se acaso escapou à razia feita mesmo às portas da "cidade proibida". E que continuou a sê-lo.     

quarta-feira, junho 04, 2014

"Granta"

A "Granta" é uma revista/livro que descobri há muitos anos, creio que quando vivi em Londres. Apelativa pelo grafismo elegante, embora sóbrio, incorpora quase sempre um interessante e pretendido "new writing", muitas vezes com autores muito pouco conhecidos, ao lado de nomes consagrados, misturando a ficção com outros registos. Comprei, ocasionalmente, algumas das edições temáticas, às vezes em alfarrabistas, que vou lendo a espaços - porque a "Granta" é uma publicação que se lê sem pressas. É uma revista para se ir lendo.
 
Há meses, vi que a "Granta" ia publicar uma edição em português (a "Granta" tem outras edições, além da original inglesa, sendo que a francesa, talvez não por acaso, nunca existiu), sob a batuta culta e de bom gosto de Carlos Vaz Marques, figura que só conheço dos "media", mas que verifico ser sempre garantia de qualidade em tudo aquilo em "que se mete". A "Granta" portuguesa é igualmente excelente. E acho magnífico que, num tempo de crise, haja coragem para avançar com este tipo de iniciativas. Leiam o seu nº 3 "Casa". Eu já comecei a ler. 

Pikkety

Portugal tem coisas curiosas.

Anda para aí toda a gente a falar do livro de Thomas Piketty, "O Capital no século XXI", que já foi considerado um dos livros económicos da década, por uma figura tão ilustre como Paul Krugman. Trata-se de uma obra de economia que, ao que vejo, recupera certas categorias inspiradas no famoso livro de Karl Marx, "O Capital". Quando o livro saiu em França, no final de 2013, não teve um sucesso estrondoso, o que só aconteceu depois de ter circulado em versão inglesa. Hoje, não se fala noutra coisa. A versão portuguesa ainda demorará uns meses.

O debate em torno das teses do livro já começou. Hoje, recebi um mail com uma boa dezena, não apenas de recensões críticas, mas também de artigos, a favor ou contra. Entre nós, a sensação que tenho é que se iniciou uma polémica em torno do livro... na maioria por gente que o não leu e que apenas tem (já) opiniões "sobre" ele, feita à luz do que escreveu quem, de facto, o leu. Não querendo "perder o pé" ao que está na moda, a muito do nosso "impressionismo" doméstico basta a opinião dos outros. E, por isso, já hoje vi comentários sobre a análise feita à obra por Vitor Gaspar (que, claro, a leu cuidadosamente), por parte de quem só quer aproveitar a onda para mandar bitaites, as mais das vezes cavalgando até a maré política.

País curioso, este.

terça-feira, junho 03, 2014

Spam

Já não é a primeira vez que algumas pessoas se queixam de que colocaram um comentário neste blogue e ele não apareceu. Às vezes, não muitas, foi o meu "lápis azul" que exerceu os seus direitos, por não me apetecer dar cobertura a ataques a terceiros ou a insultos que passam as margens do meu sentido autoflagelatório.
 
Mas hoje, carregando na tecla do "spam" dos comentários, fui por lá descobrir, entre mais de sete centenas de mensagens que a presciência do blogue travou, mais de duas dezenas de anódinas mensagens, que os leitores devem ter estranhado não terem aparecido publicadas. Tarde embora, os comentários integram agora os "posts" a que respeitavam.
 
A esses amigos, peço desculpa pela minha imprevidência ao não ter cuidado em visitar a caixa de "spam" há quase dois anos. 

A hora do presidente

Vai para nove anos, o país elegeu um presidente da República que, tal como os seus três antecessores no regime democrático, jurou "cumprir e fazer cumprir a Constituição". O país já não terá mais nenhuma oportunidade de, pelo sufrágio, manifestar a sua avaliação sobre a prestação da pessoa que escolheu para a chefia do Estado. Alguns adivinham que este seu segundo mandato será julgado com grande severidade pelo juízo histórico, pela inoperância do que deveria ter sido a sua magistratura de influência, pela parcialidade com que se situou no terreno político, por episódios menos edificantes que entretanto protagonizou, enfim, por uma leitura negativa sobre a sua capacidade de estar à altura das exigências do difícil momento que Portugal atravessa. Outros vão mesmo ao ponto de considerar que o modo como o professor Cavaco Silva exerceu o seu mandato contribuiu para uma degradação da própria posição da chefia do Estado no quadro interinstitucional. Outros não.

Nestes dias complexos que atravessamos, a responsabilidade das instituições torna-se ainda mais evidente, pela exigência acrescida que lhes é colocada face ao modo como afirmam e dignificam os valores que souberam decantar de cerca de quatro décadas de regime democrático. Umas têm uma legitimidade democrática direta, outras resultam do compromisso que o Estado encontrou para garantir os "checks and balances" que o consenso maioritário do país, expresso no texto constitucional, concordou ser indispensável para limitar o poder dos órgãos de soberania e articular a sua mútua interação.

O Tribunal Constitucional é um desses órgãos. Resulta da vontade maioritária e qualificada da democracia representativa, foi criado para preservar a integridade da lei constitucional, para dar aos cidadãos a certeza de que a administração do Estado tem uma "linha vermelha" que não pode ultrapassar. As decisões que profere não estão, nem podem estar, imunes ao escrutínio e à eventual censura pública. Mas a sua dignidade institucional não pode ser posta em causa, em especial pelos restantes órgãos de soberania: a sua existência e a forma da sua composição dependem apenas dos eleitos diretos do povo, pelo que só se o mesmo consenso maioritário e qualificado que o criou vier a modificar-se é que o seu lugar na arquitetura do Estado, ou o desenho da sua estrutura, podem ser revistos. E esse consenso está muito longe de existir, pelo que a instituição Tribunal Constitucional tem democraticamente de ser respeitada e preservada.

Ora o país elegeu o chefe do Estado para ser o garante do normal funcionamento das instituições, como portador de um mandato direto e único, fonte de legitimidade incontestável e referente de equilíbrio do sistema. Por essa razão, o presidente da República não tem o direito ao silêncio, que não quero adjetivar, perante os desafios institucionais de que o Tribunal Constitucional está a ser alvo. Tem mesmo o dever, se quer estar minimamente à altura da sua responsabilidade democrática, de sair a terreiro e deixar a palavra serena sobre a necessidade de respeito pelos órgãos da República. O professor Cavaco Silva tem, nesta questão, uma oportunidade única para redimir o seu mandato. Esperamos que a não perca.

segunda-feira, junho 02, 2014

Informando Klow

                       
Como é sabido, entre a Bordúria e a Sildávia mantém-se, de há muito, um tenso conflito, ao pé do qual a luta pela liderança dentro do PS não passa de um mero arrufo. Um comentador deste blogue, muito atento à vida das embaixadas, conseguiu - imaginem! - obter o telegrama que o embaixador da Sildávia (residente em Paris mas acreditado em Lisboa) enviou hoje às suas autoridades em Klow, ainda a propósito da situação política portuguesa. Sem surpresas, o tom é algo diferente do do seu colega da Bordúria. Aqui fica, para as devidas comparações:

"Sendo embora residente em Paris, não deixo de seguir o que se passa em Portugal, país onde estou acreditado, Estado nosso amigo e cada vez mais nosso aliado, graças à minha acção persistente e incansável. A nossa firme atitude contra a Bordúria, após o grave incidente de fronteira na ribeira Tentenokayas, em que invasores expansionistas borduros caçaram e grelharam um cabrito sildavo, em clara violação dos acordos de Nogent-sur-Marne de 1990, tem-nos grangeado vivas simpatias da parte de todos os partidos responsáveis de Portugal e o eco destes incidentes na imprensa local excedeu as minhas melhores expectativas ( ver meu 111).

A recente crise no PS português insere-se no drama geral das sociais-democracias na Europa que, apanhadas nos laços de uma malha normativa europeia que apenas permite aos Estados a execução de uma política ordo-liberalista (ver meu 222) , se debatem como peixes fora de água acabados de pescar, à procura de uma palavra a dizer. De um lado, o radicalismo idealista, filho da ética da convicção e sem necessidade de atender à responsabilidade, que alguns traduzem num simples "rasgar o memorando", que eles sabem impossível de rasgar; do outro, os que estão prontos a alinhar na Grande Missa Europeia, que à alternância veio substituir a mera dança de cadeiras e que aparecem a público, com grandes promessas de mudança, para depois virem simplesmente fazer o que lhes mandam - a França está muito perto daqui para se poder esquecer o resultado dessas políticas.

Os que os "rebeldes" do PS podem representar é a possibilidade de um outro jogo: de, através de uma plataforma com forças políticas diferentes, para além da clivagem tradicional esquerda-direita, se construir uma política "patriótica" (sem medo da palavra) de defesa dos interesses da economia portuguesa contra os telecomandados pela nova "ideologia alemã". Será possível? Talvez não, mas é a única saída. Renzi não hesitou em apunhalar Letta e o capital de entusiasmo ali está. Servirá para alguma coisa? Tentemos. Navegar é preciso.

Longa vida a Sua Majestade Muskar XV e que o espectro da abdicação de um rei de um país aqui vizinho nunca possa assombrar a nossa amada Sildávia!

a) Klopstock"

Juan Carlos

Fui oficialmente educado a detestar a Espanha. Desde os livros da escola primária, o "perigo castelhano" só me não perturbava o sono por mera inconsciência juvenil e porque, em casa, as coisas era faladas de outra forma. No liceu, a História do (velho) Mattoso era um apelo profundo à reconquista de Olivença e um aviso subliminar à perfídia eterna de Madrid. Com a idade, comecei a olhar para outras Espanhas, de Unamuno a Llorca. Percebi que, por ali, nem tudo começava em Primo de Rivera e acabava no primarismo de Franco. Emocionei-me com as tragédias da Guerra civil e com a sorte dos vencidos, de Guernica a Madrid, das Asturias a Barcelona. Cedo fiquei ao lado de uma das "duas Espanhas". Quando entrei para a diplomacia, encontrei ainda, pelos corredores, os resquícios de uma cultura anti-Espanha, instilada por décadas de doutrinação salazarenta. Só Juan Carlos de Bourbon, que hoje anunciou que vai resignar, reconciliou Portugal, em definitivo, com a Espanha, como um todo. A Europa fez o resto. A Espanha, e com ela a península, devem muito à sabedoria de um homem que demonstrou sempre ser um bom amigo de Portugal. Em Espanha, eu teria sido "juancarlista". Embora o nome do novo rei não soe muito bem aos nossos ouvidos lusitanos, espero que consiga seguir o exemplo do pai. No que nos respeita, melhor é impossível.

Informando Szohôd

"Há uma semana, aqui em Portugal, o PS ganhou as eleições europeias por uma vantagem de cerca de 4% sobre a coligação de direita. Dentro e fora do partido, surgiram de imediato vozes a considerar esse resultado como pouco expressivo, atendendo em particular ao elevado desagrado que a política do governo havia criado no país e que, aliás, reduziu a maioria a um resultado muito baixo, sem paralelo na História democrática recente. Essa leitura interpretou negativamente o facto do PS ter captado apenas 32% dos 72% dos votos que não beneficiaram os candidatos da maioria e atribuiu isso a uma prestação insatisfatória do atual líder socialista, António José Seguro, nomeadamente pela formulação do que foi considerada uma pouco convincente alternativa política.

Convirá notar que Seguro tem no seu palmarés de líder da oposição duas vitórias eleitorais (autárquicas e europeias) e, nesta última, deixou a quase 10 pontos o PSD (a coligação teve 28%, podendo presumir-se que isso corresponde a 22 ou 23% para o PSD e 6 ou 5% para o CDS). Acresce que Seguro assumiu a liderança do PS após uma derrota fragorosa deste partido, em junho de 2011, que largos setores da opinião pública ligaram a um juízo fortemente negativo sobre o saldo financeiro dos últimos anos de gestão socialista. Seguro herdou um PS internamente dividido e preso ao compromisso assumido com a "troika", ainda subscrito pela anterior liderança, de cujos principais protagonistas se afastou e cujo património político foi acusado de não defender. Ao longo do programa de ajustamento, confrontou-se com um governo que, dia após dia, foi recebendo de quase todos os setores da comunidade internacional vagas constantes de elogios - que acabou por instalar em muitos e diversos meios internos a ideia de que não havia uma real alternativa à política de austeridade - e com um presidente da República cuja atuação muito favoreceu, na globalidade, a maioria no poder. Na sua gestão da oposição, Seguro foi obrigado a colocar-se no caminho muito estreito entre o cumprimento das metas internacionais previstas no acordo com a "troika" e a propositura de outras alternativas em matéria de política económica, sendo que a maioria das ideias que apresentou vieram a encontrar escasso eco externo e abertamente contrariavam as orientações do BCE, da Comissão Europeia e do FMI. A perceção desta relativa "solidão" internacional de Seguro não terá deixado de ter consequências na sua credibilidade interna.

As linhas positivas que alguns detetam na prestação do líder socialista não convencem, contudo, os seus críticos internos, que os resultados das eleições europeias estimularam a abandonar o silêncio tático que vinham mantendo, decidindo apoiar com entusiasmo a esperada candidatura à liderança de António Costa, o popular presidente da Câmara de Lisboa. O antigo ministro, apreciado em áreas à esquerda e à direita do PS, é dado por muitos como tendo uma imagem pública capaz de melhor mobilizar a oposição para uma vitória nas eleições legislativas previstas para 2015. Trata-se de um dos mais experientes políticos portugueses, de quem muito também se fala como futuro candidato presidencial. Em 2011, Costa escusou-se a disputar a liderança do PS contra Seguro, após a saída do anterior PM Sócrates, tendo recusado também a possibilidade de o voltar a desafiar no Verão de 2013, quando outra crise idêntica, embora menos tensa, atravessou o partido. Há quem diga que este não seria ainda o seu "timing" mas que, se recusasse este novo ensejo, poderia estar a comprometer definitivamente as suas ambições. Não se conhece ainda a Costa o corpo de ideias que possa vir a apresentar como programa para uma futura liderança da oposição, mas o desagrado que deixou claro quando o PS aprovou o Tratado Orçamental e a sua atitude, mais entusiástica do que a de Seguro, favorável a uma reestruturação da dívida pública são elementos que podem indiciar a sua adesão a uma linha mais confrontacional no plano externo - o que também é reforçado pelo leque de apoios partidários que tem vindo a recolher. Mas será errado presumir-se que Costa possa ser tentado a dissociar-se de uma política de responsabilidade, em matéria financeira internacional, se acaso vier a ascender à liderança da oposição.

Sob forte pressão, Seguro decidiu sublinhar a sua legitimidade e não facilitar a iniciativa desafiadora de Costa, recusando-se a convocar um congresso do partido, escudado nos estatutos e num aparelho que maioritariamente (pelo menos, por ora) o apoia. Em contrapartida, e num movimento de surpresa, sugeriu a realização de um processo eleitoral do futuro candidato socialista a primeiro-ministro, através de umas inéditas "eleições primárias", seguindo aparentemente o modelo francês de 2012, esclarecendo já que se demitirá de secretário-geral do PS em caso de derrota no sufrágio. Os observadores não adiantam prognósticos quanto ao saldo final deste debate.

Neste entretanto, o governo, confrontado com mais uma recusa do Tribunal Constitucional em aprovar algumas das últimas medidas de austeridade que tinha acordado com a "troika", o que pode redundar num novo pacote de impostos, pode contar com a supracitada situação no principal partido da oposição, entretido nas suas guerras fratricidas, e, por essa via, fragilizado na sua capacidade de combate. Segundo alguns meios, cuja credibilidade não é possível precisar, esta situação poderia levar o primeiro-ministro a propor ao presidente da República uma "clarificação" política, através de uma antecipação das eleições legislativas para o segundo semestre deste ano, confiante em que algumas melhorias na situação económica do país e um eventual descalabro visível na oposição poderiam desenhar um cenário que acabaria por lhe ser favorável.

Mas, neste país, atlântico na franqueza, europeu nos costumes visíveis, mediterrânico nos hábitos públicos e levantino na insuperável capacidade para tornar complexas as coisas mais simples, nada é mais imprevisível do que o futuro daquilo que hoje se toma por certo. O que, aliás, é muito pouco".

(Tradução do telegrama que o embaixador da Bordúria em Lisboa enviou há minutos às suas autoridades em Szohôd)

domingo, junho 01, 2014

Auguinha


A janela é da antiga prisão de Caminha. Passei por lá ontem e lembrei-me de uma história que o meu pai evocava, dos tempos em por aquela terra trabalhou, vai quase para nove décadas.

Na então vila de Caminha, havia um pobre diabo, daqueles que era (e infelizmente é) muito comum encontrar em todas as localidades: um pouco atrasado de espírito, fazia recados, vivia de expedientes e, não raramente, era alvo fácil da chacota popular. Perdi-lhe o nome, que o meu pai referia quando contava o que se segue.

A gandulagem da cidade nem sempre se portava bem, "metia a unha" ou armava rixas, pelo que, de quando em vez, ia parar aos calabouços, que tinham esta janela para a rua. Porque o serviço "hoteleiro" da prisão não era estrelado, através das grades pediam água a quem passava. A tal figura popular, chamada a ajudar, apiedava-se deles e lá ia procurar com que lhes matar a sede.

A gratidão não era, contudo, a melhor das qualidades desse pessoal. Quando se viam cá fora, em lugar de premiar aquele que os ajudava em momentos menos fáceis, voltavam à gozação ao homem, achincalhavam-no e riam-se dele. O tal pobre diabo reagia então, avisando de que, no futuro, se tivessem problemas, não poderiam voltar a contar com ele, dizendo: "Hádes querer auguinha!"

sábado, maio 31, 2014

Tweets do início do fim de semana

- Um segredo bem guardado: há uma maneira do Tribunal Constitucional não vetar as leis do governo. Basta elas serem conformes à Constituição!

- A decisão do Tribunal Constitucional é uma coisa séria. O governo deveria ter aprendido que não pode brincar com as leis e atuar como se elas não existissem.

- A Constituição é o consenso qualificado do país. O governo tem maioria mas não tem legitimidade para violar unilateralmente esse consenso.

- Tentar desqualificar politicamente o Tribunal Constitucional é um ato vergonhoso de desrespeito pela Justiça. E um insulto à idoneidade profissional dos juízes,

- A diabilização do Estado, o desprezo pelos direitos e a cobardia de atacar os mais fracos teve um travão na decisão do Tribunal Constitucional. Uma decisão honrada.

- Os que protestam contra a Constituição, estariam aos gritos se a sua liberdade fosse limitada. É a Constituição que o impede, sabiam?

- Quem acha justo que entre o salário de um jovem e a pensão de um idoso só este último pague CES?

- Será que a ninguém no governo perturba o facto de estar a ter como alvo de medidas reformados e idosos, pessoas que não podem regressar ao mercado de trabalho e estão numa fase fragilizada da vida?

- Há algo que não entendo: como é possível que alguém não considere como obscenos cortes em rendimentos de pessoas que ganham pouco mais de 20 euros por dia.

sexta-feira, maio 30, 2014

Alberto Costa e Silva

Há alguns meses, contei por aqui um episódio. Um dia, numa intervenção pública que proferi no Rio de Janeiro, no início das minhas funções no Brasil, afirmei que era chegado o tempo de abandonarmos a retórica nas relações bilaterais e passarmos a preenchê-las com a substância do relacionamento humano, cultural e económico desses novos tempos. No final dessa minha fala, o antigo embaixador brasileiro em Portugal, Alberto Costa e Silva, aproximou-se de mim e disse: "Não despreze a retórica, Francisco. Ela tem sido historicamente essencial ao nosso relacionamento bilateral. Foi ela a "almofada" de afetividade que permitiu sustentar as nossas relações, quando as coisas correram mal". Tomei nota dessa observação e, com os anos, vim a dar plena razão àquele nosso amigo.

Há minutos, uma jornalista quis saber a minha opinião pelo facto de acabar de ser atribuído a Alberto Costa e Silva o "Prémio Camões". Fiquei imensamente satisfeito com a decisão, que distingue uma personalidade riquíssima da cultura brasileira, que é igualmente um bom amigo de Portugal e uma das figuras da intelectualidade brasileira que maior atenção tem dado às questões africanas. Se há alguém que pode, com legitimidade, ser visto como representando bem a lusofonia que está na matriz do Prémio Camões, essa figura é o meu amigo Alberto da Costa e Silva.

Um forte abraço, Alberto.

Ponto

A ver se nos entendemos. O presidente da AR, pelo regimento, não pode impedir um deputado de dizer dislates. Mas, pela ética e pela decência...