terça-feira, novembro 17, 2009
Exportação
Cabo Verde
Cabo Verde é um país que se afirma, no plano mundial, pelo seu forte sentido de responsabilidade, com uma administração rigorosa, que garante a eficaz aplicação de todas as ajudas que recebe. É um exemplo para o mundo.
segunda-feira, novembro 16, 2009
António Pinho Vargas
No sábado passado, actuou com grande sucesso no festival Jazzy Colors, organizado pelos institutos culturais estrangeiros em Paris.
Ontem à noite, foi a vez da Embaixada de Portugal em Paris se encher para o ouvir ao piano, no 5º concerto da série "Entre-pautas/Entre-partitions", organizado pelo Instituto Camões de Paris.
A quem não esteve (e a quem esteve) presente, recomendo vivamente os dois últimos álbuns duplos de António Pinho Vargas, o "Solo" (de 2008) e o recente "Solo II". Aí estão, entre muitos outros temas, o clássico "Tom Waits" e duas versões do magnífico "La Corazón", dedicado a Corazón Aquino.
domingo, novembro 15, 2009
Mimetismo
"Nem imagina!, senhor secretário de Estado", responde o diplomata. "Estes climas nórdicos, para além de serem muito incómodos, criam uma pressão psicológica terrível sobre as pessoas, levam a alguns desregramentos, como o alcoolismo, e chegam a originar doenças do foro psiquiátrico. Há por aqui imensos suicídios!" E o embaixador continua, por vários minutos, a discorrer sobre as óbvias desvantagens das longas noites, da ausência de sol e dos respectivos impactos negativos.
O secretário de Estado deve ter regressado a Lisboa com a plena confirmação daquilo que sempre suspeitara, sobre os malefícios do tempo na Escandinávia.
Algumas semanas depois, o nosso embaixador recebe um almirante em fim de carreira, homem bonacheirão e "bon vivant". O clima local continuava o mesmo, claro.
"Sabe, senhor Embaixador? Eu acho que é muito confortável sentir este contraste entre o tempo frio que faz lá fora e o ambiente simpático dentro das casas, nestes países nórdicos. De certo modo, este clima ajuda-nos muito à concentração, a apreciar os bons momentos da leitura de um livro, de uma conversa à lareira, com um copo ao lado. Eu devo confessar-lhe que sempre achei muito estimulante, intelectualmente, este tipo de tempo". E o almirante tira uma baforada do Cohiba e bebe mais um golo do "Royal Salute", que o embaixador guardava para os grandes visitantes.
O anfitrião sorri e anui, de imediato: "Tem o senhor almirante toda a razão! Isto de se estar em casa - e as casas aqui são quase sempre muito cómodas, como sabe -, com a neve e o frio como pano de fundo, é um estímulo fantástico para o bem-estar, para a relação dentro das famílias, para criar um ambiente muito saudável. Estas sociedades nórdicas não são ricas por acaso: é porque as pessoas se sentem bem e, naturalmente, isso estimula o trabalho e a eficácia. O clima é uma das chaves da felicidade nestes países, pode crer!".
Woody Allen criou a figura de Zelig, a personagem que mimetizava aqueles de quem ficava próximo. Este embaixador não era um homem hipócrita, nem sequer vivia na busca obsessiva de ser bem visto pelos seus visitantes, colando-se-lhes às opiniões. Pela minha experiência, tinha apenas uma despojada ausência de opinião própria, vivendo na eterna hesitação entre inteligentes argumentos contraditórios, relativamente aos quais não se conseguia decidir, mas que era capaz de aprofundar genuinamente, sempre com o entusiasmo das grandes convicções.
sábado, novembro 14, 2009
Petróleo
Há anos, a Galp e a Petrobras estabeleceram um acordo que previa a realização de sondagens, com o mesmo objectivo, também nessa área. Perdi o assunto de vista e não faço ideia do calendário de execução desses trabalhos. A experiência comum das duas empresas na detecção de petróleo em zonas de profundidade, que teve grande êxito em áreas da costa brasileira, abre uma interessante expectativa.
Que há petróleo em Portugal, na costa e "inshore", nunca houve dúvidas. A questão está em saber se é numa quantidade que justifique a sua exploração. Recordo-me bem, há anos, de ver equipamento de sondagens instalado entre a Atalaia e a Merceana, perto de Torres Vedras. Mais tarde, ouvi também falar de trabalhos idênticos na zona de Alcobaça.
Um mito político antigo atribui a Salazar a seguinte reacção, quando o foram informar da descoberta de petróleo em Cabinda: "Só nos faltava mais essa!". O nosso paroquial ditador revelava assim a consciência de que a descoberta de petróleo em Angola só iria aumentar as ambições internacionais sobre o território, ameaçando ainda mais a tutela colonial portuguesa.
Hoje, tenho a certeza que a reacção dos nossos dirigentes, se acaso fosse descoberto petróleo em quantidades e condições exploráveis na nossa costa, seria bem diferente. Contudo, temo que, por muito tempo, acabemos por ter de nos contentar com o petróleo que o saudoso Raul Solnado descobriu no Beato...
Cidade Universitária (2)
A Casa de Portugal foi construída pela Fundação Calouste Gulbenkian, com desenho do arquitecto José Sommer-Ribeiro e tem uma história muito interessante, de que já aqui falei, em especial por nela se terem reflectido alguns períodos da vida política francesa e portuguesa, como o Maio de 1968, o 25 de Abril e o período revolucionário que se lhe seguiu.
Segundo se lê em "Les Portugais à Paris" (Chandeigne, 2009), a Casa de Portugal foi inaugurada em 1967, tendo passado a ter o nome de André de Gouveia em 1972 (ver aqui). Dos originais 29 quartos, a residência passou a ter 170, após uma recente reforma. Salazar comentaria, a propósito dos estudantes que a utilizavam: "Eles vão para Paris para, de seguida, irem para Moscovo". Em alguns casos, teve razão...
Durante o encontro de hoje, suscitei a ideia de se poder fazer uma recolha de testemunhos sobre a história da Casa de Portugal, por forma a permitir reconstituir uma memória escrita de um dos locais emblemáticos da presença portuguesa em Paris. Prontifiquei-me a colocar a Embaixada disponível para ajudar nessa tarefa.
Cidade Universitária (1)
C'os diabos!? Como é que foi possível ter-se deixado desaparecer a indicação Casa de Portugal?
Na minha intervenção, feita em frente de todos os antigos residentes e da principal directora da Cité Universitaire, não deixei de manifestar esta minha perplexidade, que traduz também o meu desagrado. Pessoal e como embaixador. E que fica aqui registado, para todos os fins úteis.
Desastres & Crises
Sem excepção, todas as reportagens, depois de apresentarem os factos, viam-se obrigadas, por um tropismo compensatório que parecia corresponder a algum mal-estar com o carácter positivo da notícia, a complementá-los com uma frase de teor negativo, do estilo "no entanto, estes números não podem esconder o facto de ...", em que deliberadamente se procurava desvalorizar o que acabava de ser dito.
O mais interessante é que este movimento auto-flagelatório, que imagino deva fazer parte dos "livros de estilo" das redacções, raramente funciona em sentido inverso, sendo absolutamente impensável um frase do género: "Continuam a aumentar os casos de gripe H1N1 detectados em Portugal. Porém, o número de mortos por habitante situa-se, no nosso país, em níveis muito inferiores à média mundial e, de acordo com especialistas internacionais, isso fica muito a dever-se às medidas preventivas e de educação sanitária oportunamente postas em prática pelas autoridades portuguesas, que criaram uma reacção médica e hospitalar eficaz perante a detecção de novos casos".
Era só o que faltava estar a dar notícias onde o "saldo" fosse positivo!
Recordo-me de um texto de Nicolau Santos, já com alguns anos, intitulado "Portugal vale a pena". Nesse artigo, aquele responsável do "Expresso" elencava casos de sucesso na economia portuguesa, nomeadamente em áreas de alta tecnologia. Na altura, cheguei a ler um blogue que se recusava a transcrever o texto ou a fazer um link para ele, não fosse dar-se o caso de alguém poder vir a atribuir tais êxitos, na área do sector privado, à acção das autoridades públicas. Aqui fica esse texto, para quem quiser recordá-lo.
Este comportamento - porque não qualificá-lo com frontalidade como "biased"? - que faz parte da matriz identitária d(e toda)a nossa televisão, que torna as más notícias no prato de resistência dos seus noticiários, com isso habituando os seus espectadores a uma espécie de "cultura de crise", recorda-me sempre a resposta dada, há anos, por uma criança da comunidade portuguesa na Suíça, que vi e ouvi na televisão, ao ser perguntada sobre o que gostava mais nos telejornais da RTPi: "Os desastres!".
sexta-feira, novembro 13, 2009
Hollande
Hollande vai bastante mais longe e faz uma "radiografia" dos tempos menos fáceis que vive o socialismo francês - aproveitando para dar a sua leitura sobre o que hoje pode significar o conceito de socialismo.
Língua portuguesa
O cineasta Fernando Lopes, na "Visão" desta semana, entende que a amizade entre as mulheres, ao trocarem histórias pessoais entre si, é um tanto "açordeira".
Devo confessar que adoro este tipo de expressões. Elas são a prova de que a língua portuguesa está bem viva e criativa.
quinta-feira, novembro 12, 2009
Coabitação (2)
Para quem possa não estar familiarizado com o conceito, importa dizer que o termo "coabitação" se aplica, no actual regime francês, à coexistência de um presidente da República e de um primeiro-ministro oriundos de famílias políticas opostas. Alguns verão similitudes com o que se passa noutros cenários geográficos, mas a realidade francesa é muito típica: o presidente da República tem uma vasta gama de poderes, nomeadamente na ordem externa, e preside aos Conselhos de ministros. Em rigor, a filosofia funcional do actual regime francês vai no sentido de fazer coincidir as orientações programáticas de ambas as personagens, sendo originalmente a "coabitação" um fenómeno quase fora da normalidade institucional. Porém, o facto de se terem produzido já alguns casos dessa natureza como que criou já em França uma "jurisprudência" de comportamento político, nesse cenário de regulação de vontades eventualmente conflituais.
Hoje, queria deixar uma nota sobre outra "coabitação" que Mitterrand manteve durante os seus dois mandatos, desta vez com Edouard Balladur. O antigo primeiro-ministro publicou há pouco tempo o livro "Le pouvoir ne se partage pas/Conversations com François Mitterrand", que nos ajuda a fazer a leitura dessa figura complexa que foi o antigo presidente socialista.
Com este livro, Balladur quer deixar um testemunho desses pouco mais de dois anos, reconhecendo que pode ser objecto da "suspeita de ser inspirado por motivos egoístas, com risco de ver a sua boa-fé posta em causa, com a crítica de travestir a realidade" em benefício da sua reputação. Lido o livro, e sem descartar a possibilidade dessa leitura ser fixada em alguns leitores, ficou-me mais a sensação da necessidade do antigo primeiro-ministro "utilizar" (e não digo isto no sentido pejorativo) Mitterrand para se definir a si próprio politicamente, assegurando melhor, por esse meio, o seu lugar na história política da direita francesa.
Mas notemos um passo do que Balladur refere sobre a sua relação com Mitterrand: "À bien des égards, je me sentais plus proche de lui que de beaucoup d'autres par les goûts intellectuels, la formation reçue, les affinités nées d'un regard semblable porté sur les hommes et sur l'histoire. Mais il allait si loin dans la recherche de la connivence qu'il m'était difficile de ne pas voir mis à nu les ressorts de la comédie qu'il me jouait. Et, cependant, il existait entre nous, sinon une forme de sympathie, du moins l'impression de se trouver l'un avec l'autre en terrain familier."
FCO Bloggers
Anunciados ou alojados nessa plataforma estão ainda mais de um dezena de blogues de pessoal diplomático britânico, alguns deles de natureza colectiva.
Fica o registo. E o link para quem quiser consultar.
quarta-feira, novembro 11, 2009
Arafat
Estávamos em Gaza, em 5 de Novembro de 1995, após um jantar oficial, regressados à "guest house" da Autoridade Palestiniana, numa inédita visita do Presidente da República portuguesa iniciada nessa tarde, que eu acompanhava em substituição de Jaime Gama. A simpatia por Portugal e o imenso respeito de Arafat por Mário Soares ficaram patentes em vários gestos, desde a nossa chegada. O líder palestiniano fazia questão de recordar a atitude corajosa e solidária de Soares quando, anos antes, este fora visitá-lo a Beirute, sob fogo, durante o cerco sofrido pelas forças da Al Fatah.
A comitiva portuguesa saíra de Jerusalém, nessa manhã, após uma visita oficial de três dias a Israel. A presença do presidente português ficara marcada pela contínua expressão da amizade e admiração de Itzhak Rabin e de Shimon Peres, que viam em Mário Soares, simultaneamente, um sólido amigo de Israel e um militante pela reconciliação no Médio Oriente, defensor dos direitos do povo palestiniano. Viviam-se os tempos de esperança posteriores aos Acordos de Oslo e Washington e, a avaliar pelas medidas de segurança excepcionais que rodeavam Rabin, que haviam obrigado a súbitas mudanças do programa, pressentiam-se os riscos que o primeiro-ministro israelita estaria a correr para forçar, de uma vez por todas, as portas da paz possível. Mas estávamos muito longe de pressentir a tragédia. Arafat despediu-se de nós, nessa noite, com uma sombra triste no olhar que não perderia na manhã seguinte, quando abreviámos a visita, para nos deslocarmos ao funeral de Rabin. Acto a que ele, contudo, não pôde assistir, como desejaria. Recordo as palavras trocadas por Soares com Arafat, no momento da nossa saída de Gaza. Do pesar que ambos sentiam pela desaparição de Rabin ressaltava a consciência mútua de que nada voltaria a ser igual no destino daquilo a que então se chamava o Processo de Paz do Médio Oriente.
Voltei a encontrar Arafat algumas outras vezes - em Barcelona, em Malta, em Bruxelas e em Nova Iorque. Sem excepção, perguntava-me sempre pelo seu "amigo Mário Soares" e teimava em relembrar, na sua voz cada vez mais trémula, aquela noite em Gaza, que lhe deve ter ficado na memória dos seus sonhos perdidos de uma Palestina livre.
Yasser Arafat cometeu, nos anos que se seguiram, uma imensidão de erros políticos, imerso numa conjuntura em que se deixou enredar, em que o radicalismo tomou conta dos acontecimentos, de um lado e do outro de uma barricada de ódio, hoje ironicamente simbolizada num muro real de incompreensão. O conflito israelo-palestiniano converteu-se, entretanto, numa imolação de inocentes, numa bola de neve de violência e de terror, com que já convivemos sem espanto, à vista do cinismo estratégico dos feiticeiros da realpolitik, da cobardia complacente de alguns e da fraternidade hipócrita de outros. O mundo tarda em perceber que, graças à aliança objectiva de messianismos contraditórios, alimentados pelo desespero e pelo fanatismo, se ateou a partir das margens do Jordão, à vista de todos, um incêndio imenso, que não pára de estender-se e que está, cada vez mais, longe de ser debelado, ardendo como o petróleo que lhe alimenta as raízes.
Em 5 de Novembro de 1995, morreu Itzhak Rabin. O ocaso de Yasser Arafat terá começado na mesma data, precisamente nove anos depois. Esta coincidência sela o destino trágico dos dois homens que mais perto estiveram de obter a paz para os seus povos."
Apetece-me perguntar: mudou, entretanto, alguma coisa?
Europa
Essa coragem foi hoje, em Paris, assumida por Angela Merkel e por Nicolas Sarkozy, como corajoso havia já sido o primeiro entendimento entre De Gaulle e Adenauer, bem como, mais tarde, a imagem das mãos dadas entre Helmut Kohl e François Mitterrand. Sob o mesmo Arc du Triomphe, junto ao qual Adolf Hitler fez passar as suas tropas e fez a arrogante visita a Paris, a chanceler alemã mostrou que a qualidade dos políticos também se afirma na forma como conseguem, com grande dignidade, enterrar a História no passado a que ele pertence. E o gesto do presidente francês, ao convidá-la a partilhar o dia em que, até agora, a França comemorava a derrota alemã, esteve bem à altura dessa atitude.
Tenho a sensação que nós, portugueses, não obstante termos as nossas vítimas no termo do primeiro grande conflito mundial, nunca entendemos bem o sentimento profundo do que foi a imensa tragédia vivida nesta parte da Europa, durante todo o século passado. O peso da ditadura e a nossa concentração no patético estertor da aventura imperial, colocaram Portugal num mundo à margem dessa penosa realidade, a que foi possível escaparmos. Com efeito, não vivemos directamente uma tragédia que explica muito do que viria a passar-se mais tarde e que dá maior valor a este tipo de exorcismos, feito em torno de comemorações onde se sublinha, quase obsessivamente, a ideia da paz. Talvez ainda por essa mesma razão, em Portugal, não se olha para a Europa e para o seu projecto de unidade política da mesma maneira que outros o fazem e não valorizamos devidamente o fantástico empreendimento que a construção europeia representa e em que agora temos o ensejo de participar em pleno.
Maneta
Fui ver a essa magnífica ferramenta informática que é o Ciberdúvidas e confirmei que, na origem da expressão, está a figura do General francês Loison, companheiro de Junot, durante a primeira invasão francesa. Loison, segundo revela Orlando Neves, no seu "Dicionário de Expressões Correntes", havia perdido um braço numa batalha e, em Portugal, "revelou-se um homem de extrema ferocidade e malvadez, que exercia torturas violentas nos presos e foi responsável por várias mortes".
Na memória popular ficou o verso:
"O Jinot (sic) mai-lo Maneta
julgam Portugal já seu:
É do demo que os carregue
e também a quem lho deu."
Outros tempos, em que imagem da França, apesar de dividir sectores da opinião portuguesa, não era a que é hoje. Felizmente.
terça-feira, novembro 10, 2009
Pousadas & Verdades
Acabo de receber um amável esclarecimento do presidente das Pousadas de Portugal que me dá conta da falta de fundamentação de tal notícia, na base da qual elaborei o meu anterior post. Segundo tal esclarecimento, a Pousada de Alijó terá um encerramento apenas temporário, para a execução de obras determinadas por lei, não estando em causa a continuidade desta unidade hoteleira.
A empresa considera que houve uma deliberada deturpação das suas intenções e que foi lançada uma inverdade que afecta a sua boa imagem. Só posso lamentar ter aqui feito um involuntário eco de uma falsidade que, como referi, apareceu a público com foros de verdade.
As Pousadas de Portugal são uma referência identitária do nosso país e foi a preocupação causada pelo anterior encerramento e a alienação de outras unidades, que analisei no post em referência, que terá contribuído para dar credibilidade a este boato. Pelo menos, foi isso que ocorreu no meu caso.
Só me resta reiterar as minhas desculpas às Pousadas de Portugal pela imprecisão da referência factual que fiz. Bem gostaria de ver a sua rede preservada na sua integridade e, se economicamente possível, mesmo aumentada - como aconteceu com a criação de uma nova unidade em Viseu, em que, com gosto, me alojei em Julho passado.
Jorge Sá Borges (1933-2009)
Jorge Sá Borges, nome que nos dias de hoje já não é muito conhecido dos portugueses, foi um militante católico que se destacou na crise académica de 1962. Advogado de profissão, fundou o PPD, de que viria a afastar-se. Foi ministro e secretário de Estado nos tempos dos Governos provisórios.
Pessoalmente, conheci-o mal, apenas como amigo de amigos comuns, e, nesse contexto, tive ocasião de conversar com ele algumas vezes, em especial em noites do Procópio, por onde, em tempos, passeou a sua elegância e um humor muito fino.
A rainha
Pouco mais de uma hora antes do momento em que teria de estar de volta ao meu "posto", rumei a casa, ao volante do meu carro, para vestir a casaca e ir buscar a minha mulher. Ia muito tenso, ainda com preocupações na cabeça, a pensar se algumas coisas me tinham escapado. Num cruzamento, pouco antes de chegar a casa, por distracção e precipitação, esbarrei de lado contra uma viatura: nada de ferimentos, mas latas amolgadas e alguns faróis partidos. E a culpa era toda minha!
Era uma senhora inglesa que guiava o automóvel atingido pela minha imprudência. Juntaram-se logo transeuntes a confirmar o óbvio da minha culpabilidade. Para alguma surpresa dos circunstantes, também eu dava toda a razão à condutora abalroada. A vítima da minha imperícia queria, naturalmente, chamar a polícia, porque deve ter pensado que isto de diplomatas, sempre protegidos pelas imunidades, é uma raça que costuma ser tentada a fugir às responsabilidades criminais.
segunda-feira, novembro 09, 2009
Álvaro Morna
Era uma figura amável e delicada, com um registo de entusiasmo profissional que seduzia, um trato humano onde se adivinhava uma personalidade de bem consigo mesmo, que gostava de fazer aquilo a que se dedicava. Rigoroso e conhecedor dos temas, fazia parte daquela magnífica espécie de profissionais com quem se pode falar sem qualquer receio de vir a ser mal citado, sem rasteiras ao canto de uma pergunta.
Exilado desde novo em França, Álvaro Morna trabalhou na Radio France Internationale, tendo sido aqui correspondente da Lusa, do Diário de Notícias e da Rádio Renascença. Andou muito pelo mundo e escreveu dois livros. Morreu em 2005. Deixou família e muitos amigos que, volta e meia, me falam dele com saudade.
Muros
Há mais de três décadas, atravessei pela primeira vez o “checkpoint Charlie”, em Berlim, entre as duas Alemanhas. Fi-lo como interessado turista, naquela curiosidade de observador distante de uma Guerra Fria que apenas conhecia no preto-e-branco dos filmes e dos livros de espionagem. Tal como me iria acontecer em outros contactos com o “socialismo real”, a experiência deixou-me um sabor amargo e triste, como se consagrasse a despedida definitiva de uma ilusão residual – a mim, que nunca tinha cultivado nenhum fascínio pelo modelo que, para alguns, foi o “sol da terra”. Porém, pertencente a uma geração política de quantos, cada um à sua maneira, acreditaram na possibilidade dos “amanhãs” poderem vir a cantar, via-me forçado, pela força da realidade, a concluir que, no passado, o futuro era bem melhor…
Porque à época da queda do muro ainda alimentava algumas dúvidas sobre o que a Alemanha iria fazer com a sua nova unidade, não fiz parte daqueles que saudaram, com grande euforia, a festa de Berlim, embora percebesse bem a alegria dos que a partilhavam. Sei que hoje não é popular escrever isto, mas assumo-o sem o menor pejo, porque é pura verdade. Como é igualmente verdade que não verti nenhuma lágrima de nostalgia pelo fim daqueles regimes feitos de tristeza e de tom cinza que a tutela moscovita conservara como cómoda almofada entre si o Ocidente.
O fim da Guerra Fria, para quem, como eu, assume não ser, por natureza, um desbravador obsessivo das incógnitas do futuro, não me sossegava muito, principalmente porque sentia algum incómodo ao pensar que uns Estados Unidos “à solta” poderiam ser tentados a algumas aventuras, basicamente concentradas no egoísmo dos seus interesses, para as quais, de uma forma ou de outra, acabaríamos por ser arrastados.
Enganei-me numas coisas, acertei noutras.
Enganei-me no que pensava sobre os riscos que a Alemanha podia fazer correr à Europa. A unidade alemã foi extremamente positiva para o desenvolvimento do processo de reconciliação política do continente e (agora) Berlim constitui um dos factores em que assento a residual esperança de que o projecto integrador possa suplantar as tensões que hoje tendem a desagregá-lo.
Noutras coisas acertei. Deixada sem contrapoder, uma certa América fez-nos correr uma aventura cujo saldo está ainda hoje por apurar e que adubou, de forma trágica, alguns conflitos para que foi arrastada. A circunstância de uma “outra” América ter, entretanto, reaparecido, no mercado das forças políticas com expressão à escala global, pode ajudar-nos a tentar atenuar essas derivas, mas as hipóteses de retoma do curso normal das coisas estão, em definitivo, já afastadas.
O mundo que hoje vivemos, goste-se ou não, é ainda um mero produto da Guerra Fria. O modelo das nossas instituições multilaterais mais não é do que uma projecção dos equilíbrios saídos do final da Segunda Guerra Mundial. A prova provada é que ainda andamos às voltas para tentar dar à NATO uma finalidade diferente daquela para que havia sido criada. Verdade seja que, do lado de Moscovo, sente-se uma filosofia de acção externa muito tributária de uma mentalidade tradicional de cerco, que rigidifica posições e provoca contra-reacções do mesmo sinal. Para nos recordar que esses tempos não estão mortos, regressou recentemente a temática do Tratado CFE (sobre forças convencionais na Europa) e mantêm-se os “frozen conflicts” de antanho (Transnístria, Nagorno-Karabasch), alguns com afloramentos muito pouco saudáveis (Ossétia do Sul, Abcásia).
A Europa que aí temos, a União Europeia alargada, mais não é do que uma filha directa da Guerra Fria, embora agora liberta das antigas peias dos pais geradores. Algumas atitudes que detectamos em certas capitais europeias face a Moscovo trazem consigo os germes dos traumatismos passados e tornam-nos a todos reféns involuntários dessa História regional.
Ora o mundo mudou, o 11 de Setembro deu um forte sinal que parece não ter sido entendido, mesmo por quem o sofreu dramaticamente na pele. As lições do Iraque, os riscos novos no Irão, os impasses no Afeganistão, bem como o barril de pólvora no Paquistão parece não serem suficientes para nos fazer acordar para a necessidade de mudança de paradigma do nosso quadro das relações internacionais.
Nesta cegueira estratégica, a atitude de uma certa Europa perante a questão turca prova que vivemos ainda no mundo do passado e que alguns teimam em não perceber que, pedra a pedra, estamos a colocar as fundações para um novo muro.
(Texto publicado hoje num suplemento especial do Diário Económico sobre a queda do Muro de Berlim)
O outro 25
Se a manifestação dos 50 anos do 25 de Abril foi o que foi, nem quero pensar o que vai ser a enchente na Avenida da Liberdade no 25 de novem...